Artigos de Opinião

SNQTB

Paulo Gonçalves Marcos

 

Artigos de Opinião do Presidente do SNQTB

 

Artigos

Prestar contas de forma pública, aos associados, aos parceiros, à sociedade, deve ser mandatório para toda e qualquer organização sindical ou profissional. É um imperativo moral que tem que ser também legal.

 

Quando alguém adere a uma organização sindical ou profissional deve estar ciente que é uma decisão com impacto sobre a sua situação presente, mas também com potenciais benefícios (ou danos) nas próximas décadas.

 

Isto é tanto mais verdade se tais organizações, para além das funções clássicas de representação (no domínio laboral, mas também em áreas menos óbvias como nos fundos de pensões estabelecidos por contratação coletiva, por exemplo), negociação coletiva e apoio jurídico e contencioso laboral, prestarem também serviços de assistência: médica e medicamentosa, social, residências assistidas, unidades de prestação de cuidados de saúde. Entre tantos outros exemplos possíveis.

 

Tal como a aquisição de uma residência ou uma mudança de carreira profissional, a adesão a uma organização sindical ou profissional deve ser precedida de uma análise cuidada e prévia a um conjunto de realidades: comportamentos e valores éticos da organização; capacidade de gestão, experiência e desempenho dos seus dirigentes; análise económico-financeira aos principais elementos patrimoniais e de exploração corrente.

 

Porque as organizações não são todas iguais, espanta-me que muitas não publiquem contas, não as auditem por entidade independente e credível e não apresentem estudos prospetivos da sua capacidade futura (próxima e a médio prazo) de serem sustentáveis.

 

Espanta-me que muitos profissionais façam escolhas sem fazerem uma análise básica e sem exigirem transparência a essas organizações. Como fazer parte de uma organização que não publica suas contas? E não publica porquê? Tem receio de algo?

 

Falha na legislação, que ao primar pela capacidade de autogoverno, numa lógica supletiva do Estado face às organizações emanadas da sociedade civil, ignora os poderosos incentivos que existem para a pouca transparência por parte dos detentores do poder em cada uma dessas organizações.

 

Algumas organizações assumem compromissos futuros (a muito longo prazo), recebendo vultuosos fundos adiantados. Quando não publicam contas, não as auditam e não publicitam as reservas dos auditores, estão provavelmente a assumir compromissos que não terão capacidade de honrar, num prazo muito curto. Curtíssimo.

 

Deve ser matéria que preocupe os respetivos associados, os parceiros (mormente entidades empregadoras), e o poder político, porque existe um risco, não negligenciável, de deixarem na mão da sociedade a prestação dos serviços cujos compromissos assumiram.

 

10.12.2021 - Jornal Económico

Com os últimos números de outubro, referentes à inflação, de uma coisa estamos agora cientes: acabou a era da inflação baixa.

 

Não deixa de ser arrepiante o discurso de alguns banqueiros centrais, sobre o alegado caráter temporário deste disparar dos valores da inflação. Eles, que inundaram o mundo com dinheiro grátis, substituindo-se na tomada de decisões aos políticos eleitos, conscientes que estavam dos efeitos de suas ações sobre o emprego, investimento, aforro, estabilidade do setor financeiro, curiosamente parecem agora ter sido apanhados de surpresa pelas suas ações.

 

Os mercados das obrigações, livres de restrições políticas ou de efeitos de halo das decisões dos banqueiros centrais, têm sido razoavelmente assertivos: acreditam que nos próximos anos as metas de inflação dos bancos centrais serão ultrapassadas, ainda que sem uma perda total de controlo.

 

Mostram também que acreditam que a economia alemã, após uma década de deflação, entrou num ciclo de inflação alta. E que tal padrão poderá ser o novo normal das restantes economias da União Europeia. E isto explica o motivo pelo qual em sede de concertação social, na mesma nação locomotiva da Europa, se discutem aumentos das cláusulas de expressão pecuniária do trabalho na ordem dos 5%. Sim, caro leitor, leu bem.

 

Os dados de outubro mostram ainda que as pressões inflacionistas, até ao início do verão muito associadas ao reabrir da economia, agora se espalharam por um leque alargado de setores, de categorias de produtos e de alguns serviços. Já não estamos apenas no domínio da reabertura da economia ou de meros efeitos da base de cálculo.

 

Acresce que o recente recrudescimento da pandemia continuará a colocar pressão nos preços dos bens, agravando mais ainda os problemas das cadeias de abastecimento locais.

 

Do que acima se refere decorre que esta realidade inflacionária será tanto mais sentida por todos aqueles que tiverem que se deslocar por meios próprios para trabalhar, precisem de fazer obras em casa ou sofram de um inverno frio com a necessidade de aquecerem as suas residências e os seus locais de trabalho.

 

Por tudo isto, prestam um mau serviço aqueles que querem fazer acreditar à opinião pública, às famílias, aos aforradores e aos trabalhadores, que a inflação (e a perda de poder de compra) é temporária. Sejamos muito claros. Está em curso uma imensa redistribuição de rendimento pela calada, à boleia desta inflação.

 

26.11.2021 - Jornal Económico

A crise política em que Portugal se encontra mergulhado provoca-me a maior das estupefacções enquanto cidadão. Ao nosso país, com um padrão de especialização concentrado no sector do acolhimento, esta crise não poderia ter sido menos oportuna.

 

Tendo sofrido de forma desproporcional por este padrão de especialização e pelo elevado endividamento público (limitador do volume e da dimensão dos apoios públicos ao sector empresarial e às famílias), apetece questionar o racional desta crise, logo agora que precisamos de concentrar esforços na recuperação da economia, dos empregos perdidos e na preparação de um padrão de especialização mais diversificado.

 

Confesso a minha surpresa pelo anúncio desnecessário, qual fasquia colocada demasiado alta, pelo Presidente da República, sob a forma do ultimato de Orçamento ou dissolução. Sem que se descortine razão constitucional para este cutelo assim anunciado.

 

Ao primeiro-ministro, a quem todos reconhecemos o sentido de oportunidade e sensibilidade política apurada, várias perguntas terão que ser endossadas.

 

Aquilo que os seus parceiros de geringonça pediam era de tal molde que justificasse o esticar da corda ao ponto de ver chumbado o Orçamento?

 

Importa perceber o porquê de António Costa parecer ter preferido ir a eleições agora, ao invés de aquando do próximo Orçamento ou mesmo, como seria expectável, no final do prazo normal da legislatura. Porque logo agora, com a esperada bazuca europeia e um lento retomar do turismo e dos sectores do acolhimento, toda esta crise parece irreal e trágica.

 

Terá sido para melhor clarificar e marcar o terreno dos seus putativos delfins e sucessores?

 

Terá sido devido à falta de microprocessadores que já fez parar a fábrica da Autoeuropa por quatro vezes? Ou pelo facto de os preços à saída das fábricas (de todo o mundo), da energia, dos fretes marítimos, das matérias-primas, entre outras, ter crescido entre dois e três dígitos altos?

 

Será pelo facto de a China ter interrompido uma série longa de crescimentos na ordem dos dez pontos percentuais do PIB anuais e estabilizar em metade disso, com os refluxos expectáveis sobre a Alemanha e as economias exportadoras europeias?

 

Será pelo facto da conjugação de todos estes factores ter levado os preços ao consumidor a subir para a casa dos 5% em Espanha, Alemanha e EUA, e existirem dúvidas e receios sérios de que as disrupções da Covid-19 e a inflação tenham efeitos muito mais duradouros do que o antecipado?

 

Será pelo regresso da ortodoxia financeira e do equilíbrio das contas públicas na Zona Euro, a partir de 2023, num cenário de retirada de estímulos monetários (e com uma alta de juros à espreita) para combater a inflação?

 

Será pelo receio que com a conjugação destes eventos venhamos a ter um cenário de estagflação como tivemos nas crises energéticas anteriores? Será que desta vez os mesmos eventos e factores provocarão uma história diferente?

 

Tudo leva a pensar que António Costa acredita que a história se repete e que desta vez não será diferente. O presente afigura-se mais risonho quanto o futuro de médio prazo. Assim, quanto mais cedo as eleições, melhor.

 

12.11.2021 - Jornal Económico

O recente discurso de Andrea Enria, presidente do Conselho de Supervisão do Banco Central Europeu (BCE), foi o momento mais marcante das últimas semanas para os bancários europeus e para a nossa concepção de sociedade.

 

Na sua intervenção, Enria defendeu a concentração dos bancos à escala europeia, como opção preferencial de robustecer rendibilidades. Complementarmente, os bancos adquiridos devem ser transformados em meras sucursais comerciais.

 

Não é, em bom rigor, o primeiro interveniente na banca europeia a propor soluções desta natureza. Contudo, pelas funções institucionais que desempenha, o seu discurso assume outra relevância.

 

Na prática, indo por essa via, estamos a falar de uma opção que ditará, possivelmente de forma assimétrica, enormes perdas de emprego qualificado, de centros de acumulação de capital e de base fiscal. Inevitavelmente, este será o triste destino dos mercados e dos países sem pensamento estratégico, salientou Vítor Bento, com a sua habitual lucidez, em recente entrevista ao jornal “Público”.

 

Por tudo isso, os sindicatos e as estruturas representativas de quadros e trabalhadores no sector bancário, mas também noutras áreas profissionais, devem encetar movimentos de associação e federalização para com isso ganharem poder de influência, trocarem informação e adquirirem capacidade de projeção da sua voz junto dos centros de decisão europeus.

 

A recém-criada Federação Ibérica dos Sindicatos de Quadros da Banca e das Instituições Financeiras (FISBANCA), unindo sindicatos de Portugal e de Espanha, é um passo nesse desiderato estratégico de reforço da capacidade dos sindicatos no sentido de exercerem os seus poderes enquanto parceiros sociais.

 

O sector bancário está em grande disrupção, o que potencia a obsolescência de determinadas funções. Nessa medida, tudo tem de ser feito para evitar a obsolescência de muitos trabalhadores. E serão os sindicatos, que não devem obediência a nada, para além dos interesses de seus associados, sem submissão a partidos ou organizações mais ou menos discretas, aqueles que estarão na linha da frente deste combate.

 

Pelos desafios e mudanças estruturais que o sector defronta e pelas especificidades legislativas, fiscais e regulatórias portuguesas, é absolutamente vital que empregadores e sindicatos tenham capacidade de trabalhar em conjunto para repelirem os aspectos mais nefastos deste processo no contexto português.

 

Repito, trabalhar em conjunto. Naturalmente, isso implica que os sindicatos participem, ab initio, nos planos prospectivos que os empregadores encetam. E que um pacto para o emprego e a requalificação seja assumido como contrapartida deste trabalho conjunto a fazer, absolutamente vital para o restabelecimento dos necessários equilíbrios.

 

29.10.2021 - Jornal Económico

Começou a temporada de apresentação e discussão do Orçamento Geral do Estado (OGE), provavelmente o acto anual mais nobre do Parlamento. Este é o momento onde a carga fiscal e o destino dos nossos impostos vão ser decididos, o que num país de desenvolvimento médio, com elevada carga fiscal, tem toda a relevância para o comum dos cidadãos.
 
Compete aos partidos políticos a primazia de tal discussão, mas não se devem ostracizar os contributos dos parceiros sociais, mormente as confederações e uniões, sindicais ou empresariais.
 
Enquanto um dos representantes do lado sindical, gostaria de convidar os leitores a conhecerem, num breve introito, algumas das propostas da USI – União dos Sindicatos Independentes e de como procuramos valorizar as pessoas, os cidadãos, os contribuintes e os trabalhadores.
 
Assim, parece-nos que deveremos ter um punhado de objectivos de longo prazo, para a verdadeira reforma que Portugal precisa: aquela que valoriza os trabalhadores, quem se esforça, trabalha, produz e cria riqueza.
 
Por isso o OGE deve reforçar os incentivos à contratação não só de desempregados de longa duração, mas em especial daqueles que têm mais de 50 anos de idade. Verdadeira praga social, o desemprego dos trabalhadores maduros, vítimas de um atavismo cultural que valoriza a idade e despreza a experiência e o saber feitos. Incentivos para as empresas, em sede de IRC e de contribuições para a Segurança Social para quem crie postos de trabalho, em especial nas duas faixas etárias mais afectadas pelo desemprego estrutural: jovens e trabalhadores com mais de 50 anos.
 
O OGE deve também aumentar as deduções específicas com dependentes a cargo (descendentes ou ascendentes), com contribuições voluntárias para planos complementares ou substitutivos de reforma, ou com educação e formação profissional. É justo social e economicamente reprodutor e criador de riqueza e tem sido insuficientemente acautelado em sucessivos orçamentos. Pelo que urge rever.
 
Finalmente, a grande discussão ainda e sempre incompleta. O diferencial salarial entre os quadros médios e superiores da administração pública e o sector privado. Mesmo considerando o prémio de (não) risco que os funcionários públicos têm implícito nas suas remunerações, importa ter uma trajectória plurianual de correção da disparidade. Importa traçar um compromisso político alargado, para uma ou duas legislaturas, sem o qual iremos continuar a privar a administração pública da capacidade técnica e científica, da autonomia, da capacidade de retenção e valorização do seu saber. Estas são verdadeiras pedras angulares de um Estado que se quer ao serviço da comunidade e não aprisionado por interesses partidários ou privados.
 
Pois que uma verdadeira política de rendimentos tem que incorporar muito mais que desdobramentos de escalões de IRS ou aumentos de salários mínimos. Isso não passará de uma leve brisa de jasmim, que não resolve os problemas de fundo do Estado, dos trabalhadores e dos empresários.
 
15.10.2021 - Jornal Económico

Permitam-me partilhar o meu orgulho enquanto cidadão e trabalhador por dois actos de civismo e amor à pólis e à República.

 

O primeiro para salientar os muitos cidadãos eleitores que deixaram o conforto das praias e dos convívios com familiares e amigos para votarem nas eleições autárquicas. Umas eleições que contrariaram o senso comum de que os incumbentes não são derrotáveis, pois que muitos dos autarcas em exercício foram copiosamente derrotados.

 

Foram derrotados o caciquismo, a arrogância e o senso de serem donos disto tudo, a tentação de personalizarem os recursos do Estado (nisso incluindo o dinheiro, mas também a dívida a ser contraída pelo PRR – Plano de Recuperação e Resiliência).

 

Estiveram bem, muito bem, os cidadãos que rejeitaram, nas vilas e cidades, uma após outra, o modelo mexicano de simbiose entre líderes partidários/partidos e o Estado. Os mesmos cidadãos que não são tolos e que revelaram no segredo da urna o que não tinham querido dizer às empresas de sondagens.

 

O segundo momento de orgulho, pela greve dos trabalhadores bancários do Banco Comercial Português e do Banco Santander Totta.

 

Um e outro com processos de despedimento colectivo que revelam uma forma impositiva de ver as relações sociais e de trabalho. Onde trabalhadores parecem ser apenas uma fonte de rendibilidade para o factor capital. Processos cuja intencionalidade, celeridade e modelo impositivo, perante o silêncio do primeiro-ministro, correm o risco de caucionar, se não contrariados, um modelo de empobrecimento e destruição da classe média.

 

Por isso, pela primeira vez em 33 anos, todos os sindicatos bancários decretaram greve. Porque a nenhum português serve a chacina das famílias e da classe média portuguesa.

 

Porque os cidadãos e os contribuintes portugueses estão fartos de uma sociedade que venera os vistos meramente especulativos para estrangeiros adquirirem uma residência fiscal, e que nada fazem pelo bem-estar dos seus congéneres.

 

Porque é toda uma classe que está ameaçada de extinção. Não apenas a dos bancários, mas a de todos os trabalhadores por conta de outrem em grandes empresas. Empresas estas que deveriam ter uma preocupação social genuína, e não mera propaganda, comprada com umas bolsas de estudo, umas iniciativas junto da sociedade civil e, pasme-se, prémios atrás de prémios de melhor empresa para trabalhar.

 

Sobre estes prémios, tudo percebemos pelo que fazia o alegado mago das telecomunicações (que supervisionou a destruição da empresa líder em Portugal e a sua entrega aos predadores sem rosto).

 

Porque uma empresa que despede, sem qualquer necessidade económica, financeira ou de mercado, não limpa sua reputação com iniciativas avulsas.

 

Por tudo isto, saudamos a classe trabalhadora bancária pela sua coragem e atitude. Pela recusa do unilateralismo. E pela promessa de prolongar pelo tempo, por muito tempo, o seu protesto.

 

1.10.2021 - Jornal Económico

Uma das empresas mais extraordinárias a actuar em Portugal, o Banco Comercial Português (BCP), anunciou na semana passada um despedimento colectivo. Um processo de reestruturação que agora está a terminar e no âmbito do qual os sindicatos chamaram a atenção para a desproporcionalidade, unilateralidade, demasiada celeridade e absoluta desnecessidade.

 

É certo que a pandemia provocou a destruição de centenas de milhares de postos de trabalho, causou muito sofrimento em inúmeras famílias, e colocou sectores inteiros da economia em situação periclitante. Mas as empresas de telecomunicações e os bancos não sofreram qualquer impacto com a pandemia de Covid-19. Antes pelo contrário. No caso do sector financeiro, o processo político das moratórias evitou um cataclismo. Acresce que, fazendo aumentar os volumes de crédito e de negócio, as moratórias incrementaram o produto bancário, reduziram as provisões para cobranças duvidosas e fizeram disparar os lucros.

 

Isto dito, confrontados com processos de reestruturação no meio da pandemia, ainda assim a actuação dos sindicatos pautou-se pela razoabilidade, privilegiando sempre o diálogo. Nesse contexto, ocorreram inúmeras reuniões com o BCP, foram expressas as posições dos sindicatos em artigos de opinião e em diversas entrevistas na comunicação social.

 

Os sindicatos procuraram sensibilizar os grupos parlamentares, a ministra do Trabalho e o ministro da Economia para a desnecessidade destas reestruturações, na forma e no conteúdo. Faltou aos sindicatos procurar sensibilizar o primeiro-ministro, que não nos recebeu, e cuja ausência e silêncio são ensurdecedores, tanto mais que fora tão lesto a tratar, e bem, dos lesados do papel comercial do GES.

 

O próprio Presidente da República recebeu a União dos Sindicatos Independentes, ficando a par do que estava a ocorrer na banca. Em suma, os sindicatos procuraram exercer todo um magistério de influência, em nome da razoabilidade.

 

Nada demoveu, porém, a actual comissão executiva do BCP. Ao contrário da sua antecessora, não conseguiu, ou não quis, evitar um lamentável despedimento colectivo.

 

Alcançado este ponto, o BCP passará a integrar o lote das grandes empresas que se comportam apenas como maximizadoras de lucros, ignorando tudo o resto, incluindo as suas responsabilidades sociais. Por isso, esgotadas todas as vias do diálogo e da razoabilidade, e porque a isso os obrigam aqueles que ignoram as suas responsabilidades perante todos os stakeholders, os bancários vão fazer greve.

 

Será a primeira greve de todos os sindicatos em 33 anos.

 

Isto dito, os distraídos António Costa, Rui Rio, Francisco Rodrigues dos Santos, João Cotrim Figueiredo e André Ventura devem fazer aquilo que se impõe: condenarem, à semelhança do que fizeram outros líderes partidários, a ausência de responsabilidade social destas grandes empresas despedidoras; mexerem nos bónus de quem despede sem necessidade; reporem os valores de indemnização por despedimento nos níveis pré-troika; e, reintroduzirem o princípio do tratamento mais favorável para os trabalhadores, em sede de leis laborais.

 

E, sim, queremos saber se os nossos líderes partidários são heróis e responsáveis, ou meros cúmplices de quem faz mal ao povo votante e contribuinte.

 

17.09.2021 - Jornal Económico

Vivemos dias estranhos. Era suposto que, por esta altura, o legado pernicioso da troika já fosse uma história do passado. Afinal, temos hoje um Governo de Esquerda, suportado no Parlamento por partidos políticos à sua esquerda, tradicionalmente sensíveis a estas questões. Contudo, há desequilíbrios penalizantes para os trabalhadores que permanecem por corrigir no Código de Trabalho.

 

O que explica esta inércia? Não deveria ser o Estado o principal defensor dos mais fracos? Não era suposto o Governo, e o Parlamento com a sua maioria de Esquerda, zelarem pela proteção daqueles que têm muitíssimo menos meios para se defender? Aqueles que, sob enorme pressão, se a Lei não os protege, são obrigados a aceitar o que não querem?

 

Infelizmente, lamento ter de o dizer, nalguns aspetos cruciais, o Governo e o Parlamento parecem ter-se esquecido dos trabalhadores. Sim, estou a medir bem as palavras. Atualmente, a realidade continua a ser dura para o trabalhador que queira impugnar judicialmente o despedimento coletivo.

 

Hoje, tal como foi imposto pela troika, se quiser impugnar um despedimento coletivo, o trabalhador tem de devolver a indemnização legal. Indemnização legal que no final do processo judicial será sempre sua, mas que, com a atual moldura, o priva de meios para resistir ao calvário judicial.

 

Como é possível que esta norma iníqua, repito, iníqua, continue a constar do Código de Trabalho?

 

Todos sabemos que, por razões financeiras (e em boa parte por causa desta norma indigna), muitos trabalhadores ficam impossibilitados de impugnar, ou manter o processo de impugnação de despedimento coletivo, tanto mais que esses processos são particularmente morosos e, por regra, ultrapassam a duração do subsídio de desemprego.

 

Com o tabuleiro inclinado a seu favor, as entidades patronais jogam com a fraqueza dos trabalhadores, sabendo que poucos terão capacidade para resistir psicológica e materialmente a tão dura prova. Muitos optam por não litigar. Outros chegam a acordo antes ou durante os processos judiciais. Uns e outros abdicando de um futuro melhor apenas porque a ganância de alguns assim o impõe. Sob o olhar passivo, repito, do Governo e do Parlamento.

 

É imoral que empresas altamente lucrativas queiram mais e mais lucros à custa dos trabalhadores. Empresas que poderiam e deveriam conduzir os processos de redução dos seus trabalhadores de outro modo. Empresas ingratas que descartam sem pestanejar os trabalhadores que muitas vezes sacrificaram a sua vida pessoal porque eram essenciais no posto de trabalho. Era um objetivo trimestral que tinha de ser cumprido. Um prazo que não podia ser ignorado. O preço?

 

As férias que tiveram de ser adiadas, a festa de aniversário a que se teve de faltar, os filhos que não se viu crescer, o casamento que ruiu.

Agora, a contrapartida patronal é uma indemnização alegadamente generosa, mas que de generosa nada tem. É o fundo de pensões de que se abdica. É o subsistema de saúde que se deixa de usufruir. Horas e horas de dedicação, muitas horas extraordinárias não pagas, serões até às tantas no escritório, para nada.

 

Lamento, mas isto tem de ter um ponto final.

 

Assim, perante a passividade do Estado, numa iniciativa inédita em Portugal, o Sindicato Nacional dos Quadros e Técnicos Bancários (SNQTB), que lidero, decidiu constituir um Fundo de Apoio Sindical (FAS). Este Fundo visa tornar o terreno menos inclinado em desfavor dos mais fracos. Por isso, vamos conceder empréstimos, sem juros, a todos os trabalhadores que queiram impugnar judicialmente os despedimentos de que possam vir a ser alvo.

 

Uma vez que o Estado persiste em se demitir das suas responsabilidades, vamos nós criar as condições necessárias para que os trabalhadores lutem judicialmente pelos seus direitos, se assim entenderem. Por um futuro e um país melhor.

 

03.09.2021 - Jornal Económico

Quando o leitor estiver a ler estas linhas, estarei provavelmente em representação da União dos Sindicatos Independentes (USI) em audiência com o senhor Presidente da República. Uma audiência que procura sensibilizar o máximo representante do Povo português para a indignidade e a imoralidade perpetradas por grandes e lucrativas empresas que estão a promover processos de despedimento colectivo. Empresas que, pela sua dimensão e história, deveriam perceber que têm especiais deveres de responsabilidade social. Empresas muito lucrativas que a pandemia não afectou e cujos trabalhadores foram incansáveis no serviço prestado aos seus clientes.

 

Como tive oportunidade de expressar recentemente na Comissão Parlamentar de Trabalho e Segurança Social, a propósito dos casos Banco Santander Totta e Millennium BCP, a sensibilização é útil, mas por vezes o autismo das elites obriga a que existam leis que não permitam imoralidades.

 

O que me leva a António Costa e Rui Rio. Um contente com o tipo e a (baixa) intensidade de oposição que lhe é feita. O outro aparentemente satisfeito porque achará que o tempo lhe corre de feição e o poder lhe cairá no colo de maduro.

 

Um e outro ao não quererem encarar o tema da revisão das leis laborais, para as tornar mais amigas dos trabalhadores e dos contribuintes portugueses, prestam um mau serviço a Portugal e aos portugueses. Se é certo que Pedro Passos Coelho teve que ceder aos credores internacionais, em todo o caso é tempo de António Costa e Rui Rio ouvirem as três Centrais Sindicais e reintroduzirem o princípio do tratamento mais favorável aos trabalhadores.

 

O recurso ao despedimento colectivo é um mau exemplo vindo das grandes empresas, num país em que as PME tiveram a fibra moral para aguentar o emprego dos seus trabalhadores, como se viu pelas recentes estatísticas publicadas pelo INE.

 

Uma empresa incumbente de telecomunicações que em quase 120 anos de história, nunca tal desiderato tinha sido tentado. Ou um banco que beneficiou de tempo e dinheiros dos contribuintes, quando os accionistas privados se evaporaram numa recapitalização que tinha que ser feita, mas que agora não quer conceder aos seus trabalhadores o tempo e a dignidade que os contribuintes lhe deram.

 

A terminar, algumas sugestões de leitura. Porque as elites são cínicas e tendem a considerar os outros à sua imagem e valores, recomendo a leitura do notável “Humanidade” (Rutger Bregman, Bertrand) que nos mostra que a grande maioria dos seres humanos, ao longo da história, são bons e cooperantes.

 

Recomendo também a leitura de “Vera Lagoa – um diabo de saias” (Maria João da Câmara, Oficina do Livro), sobre uma mulher de coragem na denúncia dos totalitarismos, homens providenciais, ou das vanguardas revolucionárias pretensamente iluminadas. Fê-lo, importa frisar, numa altura em que não era seguro fazê-lo.

 

E porque o Verão é calor e água, recomendo igualmente “Afastar-se” (Luísa Costa Gomes, D. Quixote), treze contos em torno da água, naquilo que será, talvez, a primeira colecção temática da autora.

 

Finalmente, a terminar, um caloroso abraço para os trabalhadores bancários da CGD que no passado dia 9 de Agosto dignificaram a profissão repudiando a injustiça.

 

20.08.2021 - Jornal Económico

Olhando para o silêncio em curso, até parece que o futuro dos portugueses não é matéria relevante para o Governo. Um silêncio que parece deixar transparecer que o bem-estar dos portugueses e a preservação dos seus postos de trabalho não são matérias relevantes.

 

Ao mesmo tempo que a República Portuguesa consome recursos escassos para atrair investimento estrangeiro, em total contradição, o Estado português nada faz perante a destruição metódica e sistemática de postos de trabalho perpetrada por algumas empresas, altamente lucrativas, nos sectores da banca e das telecomunicações.

 

Um silêncio da parte do Governo, tanto mais estranho, porque foi precisamente o PS que tanto afirmou no passado, com inteira razão, existir uma alternativa à orientação imposta pela troika. Ora, o Governo tem todas as condições políticas e parlamentares para desfazer o legado pernicioso da troika, alterando algumas matérias no âmbito da legislação do trabalho.

 

Muitos trabalhadores sentem, por estes dias, uma enorme revolta. Não compreendem. Não compreendem que empresas que beneficiaram da ajuda dos cidadãos e dos contribuintes, através das obrigações convertíveis em capital, as célebres CoCos, agora revelem tamanha insensibilidade social e falta de noção do seu papel na salvaguarda da coesão nacional.

 

Não compreendem igualmente os trabalhadores que um dos bancos mais eficientes da Europa, e um dos mais eficientes do seu grupo europeu, tenha de proceder a uma brutal sangria da sua força de trabalho num curtíssimo espaço de tempo.

 

Ironia do destino, o mesmo banco que recusou prescindir no passado dos contratos com os célebres Swaps de tão má memória, Swaps esses que tanto custaram aos contribuintes, não é agora capaz de fazer um esforço para reajustar a sua mão de obra portuguesa de forma faseada no tempo?

 

Custa-me escrever este artigo. Nada disto é pessoal, e não me quero imiscuir no combate partidário. Aliás, alguns dos administradores destas empresas são meus conhecidos, colegas de universidade e de estrada nas nossas vidas profissionais. Isto dito, o que se está a passar é intolerável.

 

Compreendo, em parte, que alguns deles estejam entre a espada e a parede. Pressionados pelos acionistas e pelo seu apetite predatório, não têm forma de contrariar a avidez sôfrega pelo lucro imediatista, mesmo que isso colida com os seus valores pessoais de decência e solidariedade.

 

Por isso, os próprios conselhos de administração destas empresas necessitam do respaldo de uma intervenção dos representantes da República Portuguesa (Presidente, primeiro-ministro, ministra do Trabalho, Parlamento) ao abrigo dos seus magistérios de influência. Só assim poderão justificar um travão à chacina dos trabalhadores portugueses perante o capital estrangeiro.

 

No momento em que tanto se fala dos fundos da bazuca, temos sectores sustentáveis que estão a atirar para uma situação de necessidade futura os seus trabalhadores. Absolutamente intolerável. Os portugueses podem contar com os seus representantes nas mais altas instituições do Estado, ou os mesmos vão continuar a assobiar para o ar?

 

06.08.2021 - Jornal Económico

Na passada semana, confrontados com violentos processos de reestruturação, os bancários juntaram-se, numa concentração inédita de todos os sindicatos do sector, defronte do Parlamento. A esse propósito, aproveito para saudar os deputados do BE, PCP e PSD que se juntaram, em solidariedade, aos bancários nesse dia, e que com esse gesto político dignificaram e prestigiaram as suas funções.

 

Os bancários fizeram ouvir bem alto a sua indignação quanto à violência e rapidez com que estão a decorrer alguns processos de reestruturação. Nada justifica que um banco queira reduzir 14% dos seus trabalhadores em pouco mais de dois meses e que outro se proponha reduzir cerca de um quarto da sua força laboral em 11 meses. Não há justificação económica e racional estratégico. O estafado argumento da digitalização não colhe. Portugal é um dos países da Europa onde a exclusão e a iliteracia digital são mais elevadas.

 

Também não colhe o argumento do sobredimensionamento da rede de agências bancárias. Em primeiro lugar, a pandemia nada mudou desse ponto de vista. Mais importante, cerca de metade da rede de balcões já encerrou nos últimos 12 anos. Hoje, restam os balcões de proximidade e de aconselhamento e com relevância acrescida na medida em que nunca foi preciso tanto trabalho bancário: além dos milhares de moratórias, o crédito à habitação está ao rubro, o crédito ao consumo em alta homóloga, os depósitos e outros recursos dos clientes em máximos históricos.

 

Querer sobrecarregar cada vez menos bancários com o trabalho que deveria ser feito por muitos mais, revela uma abordagem que prima pela ganância. E esta revela-se também na total ausência de planeamento e preocupação com a requalificação dos bancários. Sabendo de antemão da necessidade de trabalhadores qualificados e certificados em áreas como planeamento e controlo, canais digitais, risco, inteligência artificial, data science, relacionamento especializado em particulares de alto rendimento, o que fizeram os bancos que se afadigam em processos mal-amanhados de reestruturação?

 

Nada.

 

Não se iludam os néscios. Os trabalhadores agora dispensados serão, a breve trecho, substituídos por outros, com as qualificações referidas. Como todos os bancos sabem há largos anos.

 

E não colhe também o argumento da falta de recursos financeiros, pois que as rescisões por mútuo acordo (RMA) libertam recursos substanciais nos fundos de pensões, reduzindo as necessidades de contribuições futuras, num contexto de baixas taxas de juro. Na prática, as RMA libertam recursos dos bancos para o reforço dos fundos próprios. Acresce que o ‘waiver’ do BCE quanto aos requisitos de capital, justificado pela pandemia, deveria ser utilizado a favor da requalificação dos bancários.

 

Em suma, é nossa exigência, a par da cessação dos processos unilaterais e musculados, um Plano de Requalificação Estrutural dos bancários, financiado pela libertação dos valores supracitados dos fundos de pensões. Elementar.

 

A ganância não pode ser nunca o valor moral que nos norteia. Por isso, lutaremos, incansáveis, contra ela e os seus intérpretes.

 

23.07.2021 - Jornal Económico

Os bancários são actualmente confrontados com diversos processos de redução de postos de trabalho. Estes processos estão a ser implementados de forma massiva e sem precedentes, encontrando-se o direito constitucionalmente consagrado da segurança no emprego sob um ataque tão intenso, quanto impensável.

 

À luz deste contexto, algumas instituições financeiras têm implementado “processos de reestruturação”, a coberto dos quais têm vindo a confrontar milhares de bancários com propostas de rescisão por mútuo acordo (RMA) ou reformas antecipadas, com especial enfoque para as RMA.

 

Em conjugação com esta situação, tem vindo igualmente a vulgarizar-se a comunicação antecipada da implementação de medidas unilaterais, vulgo despedimentos colectivos, com prazo certo anunciado, ao arrepio do que a legislação laboral prevê, criando, ou visando criar, o pânico e o temor generalizado nos bancários, de forma que desistam de lutar pelos seus direitos.

 

A situação é de tal forma preocupante e grave que, num movimento sem precedente histórico, os sindicatos do sector, todos eles, num gesto de unidade sem igual, decidiram mostrar a sua indignação e manifestar a sua firme oposição quanto ao injustificado e desnecessário processo massivo de destruição de postos de trabalho.

 

Este massacre é tanto mais extraordinário se se tiver em conta que estamos a falar de um sector decisivo para o apoio aos portugueses, às empresas e à economia nacional, conforme foi, aliás, demonstrado pelos bancários, quando a pandemia se encontrava na fase mais perigosa e exigente.

 

Compreende-se, portanto, por tudo o que acima se referiu, e muito mais haveria para dizer, nomeadamente sobre os bons indicadores de desempenho da generalidade das instituições de crédito a operar em Portugal, que os bancários sintam uma enorme revolta. Revolta que os levará na próxima semana a manifestar-se em frente ao Parlamento.

 

Para se perceber a dimensão do que estamos a falar, importa salientar que nunca os bancários adoptaram tal forma de protesto em Portugal desde a transição para a democracia.

 

E compreende-se também os pedidos de audiência que foram solicitados ao primeiro-ministro, bem como ao presidente da Assembleia da República, pelos sindicatos bancários.

 

Acresce que é chocante que instituições financeiras que recorrem regularmente a outsourcing, ou a trabalho temporário, estejam a despedir parte da sua força de trabalho, sem requalificar ou reconverter os trabalhadores de que dispõem nos seus quadros.

 

Muito se fala da ascensão do populismo e no desencanto dos portugueses perante o regime democrático. Não é preciso ir mais longe para perceber as raízes desse descontentamento. Como é possível esta brutalidade que está a acontecer no sector bancário? Como é possível que à gestão de vista curta de algumas instituições financeiras, o poder político não ponha um travão?

 

Em nome da maximização do lucro, vale tudo?

 

09.07.2021 - Jornal Económico

O discurso de Jerome Powell, presidente da Reserva Federal dos Estados Unidos, na passada semana, ainda que sem o dramatismo dos grandes discursos de Winston Churchill e desprovido das certezas inabaláveis de Mario Draghi, tem profundas implicações para os bancos e para as pequenas economias, como é o caso da portuguesa.

 

Powell sinalizou uma dupla subida das taxas de juro diretoras em 2023, quase um ano antes do estimado pelos analistas até há uma semana atrás. Uma subida ínfima, notarão alguns observadores, mas ainda assim uma subida que não foi antecipada. Subida essa que ocorrerá com a possibilidade de a inflação, nos Estados Unidos e na União Europeia, ser mais alta que o antecipado e a recuperação económica mais forte, com isso pressionando no sentido da retirada, paulatina, dos programas de compras de ativos.

 

Um pouco por todo o mundo, os bancos têm vindo a normalizar a sua política de provisões, ajustando-as em montantes similares ao estádio prévio à pandemia. Uma normalização que tem vindo a libertar parte das vultuosas provisões que tinham constituído.

 

A subida das yields das obrigações dos Tesouros e das taxas diretoras, por um lado, e a normalização das políticas de provisões, por outro, são boas notícias para os bancos, nomeadamente os europeus, duramente fustigados por taxas negativas. Aliás, um primeiro reflexo disso têm sido as intensas valorizações acionistas, ocorridas desde meados de abril.

 

Há, portanto, alterações em curso que são boas notícias para os bancos cujos centros de decisão se situam em Portugal. E são boas notícias extensíveis à economia portuguesa no seu todo, pois em conjunto significam que, por fim, se interrompe o processo de destruição de capital ou de baixa rendibilidade dos bancos, tornando-os mais disponíveis para o pleno exercício da função creditícia.

 

Se isto não bastasse, o normal funcionamento dos preços do mercado do dinheiro (juros) produz um reforço da capacidade de aforro, viabiliza o exercício de poupanças de longo prazo e de sistemas de capitalização de previdência, e uma melhor afetação de recursos no mercado de crédito. Mais boas notícias, portanto.

 

Não deixa de ser irónico, contudo, que a valorização de quase 30% no valor das ações dos bancos não tenha que ver com exercícios de eficácia (produtos ou serviços inovadores, por exemplo) ou de otimização de eficiência, mas mais, muito mais, derivada do discurso de Jerome Powell, da campanha de vacinação e de normalização económica.

 

25.06.2021 - Jornal Económico

O Sindicato Nacional dos Quadros e Técnicos Bancários (SNQTB) celebrou esta semana, no dia 9, o seu 38º aniversário. São quase quatro décadas de uma história muito rica.

 

Naturalmente, é um orgulho enorme liderar este sindicato, mas também uma grande responsabilidade. Além de gerir um dos melhores subsistemas de saúde, o SNQTB conduz intensa actividade sindical e tem vindo a seguir com acrescida atenção os fundos de pensões geridos pelas instituições de crédito.

 

Nestes 38 anos, nem tudo tem sido fácil. O período de vigência da troika em Portugal foi particularmente duro, como todos sabemos. A actualidade e o futuro próximo também não estão isentos de preocupações, importa dizer.

 

Isto dito, o SNQTB tem seguido sempre uma orientação que dá primazia à independência. É óbvio que se paga um certo preço por isso, nomeadamente na forma como se tem acesso a certos círculos do poder, mas é um efeito colateral que do nosso ponto de vista vale bem a pena suportar.

 

E justifica-se esse caminho, por vezes solitário, porque há temas que para nós não são negociáveis. Da nossa parte, o foco está e contínua exclusivamente na defesa dos interesses dos sócios e dos trabalhadores bancários, sem qualquer tipo de cedências perante qualquer outro tipo de agendas.

 

Outros optaram por uma via diferente. É tão legítima como a nossa, naturalmente. Contudo, também como a nossa, é passível de escrutínio e de avaliação. Ora, sejamos claros, a suposta proximidade de alguns sindicatos junto dos círculos do poder, a alegada mais-valia em se prescindir de parte da independência na defesa dos bancários, não se tem reflectido em ganhos suplementares para os trabalhadores.

 

Antes pelo contrário. O que daí tem resultado têm sido cedências relevantes sem contrapartidas e o enfraquecimento geral da capacidade negocial dos sindicatos.

 

Infelizmente, parece existir quem não perceba que, hoje em dia, a luta sindical centra-se na acção de rua, na comunicação social e na capacidade de influenciar legisladores. Deste ponto de vista, as organizações independentes e livres, como o SNQTB, são muito mais eficazes na salvaguarda dos interesses dos trabalhadores bancários.

 

O SNQTB tem sido liderante porque tem condições para isso, nomeadamente de independência. E sem independência não há capacidade de liderança, nem espaço para salvaguardar de forma continuada no tempo e no modo os interesses dos trabalhadores.

 

Nestes 38 anos, de uma coisa temos a certeza. A independência não tem preço e tem sido uma opção estratégica absolutamente vital.

 

Por tudo o que acima referi, não posso deixar de agradecer aos fundadores do SNQTB que tiveram a ousadia de criar, contra a corrente, este sindicato e a União dos Sindicatos Independentes. Cá estaremos para celebrar muitos mais aniversários, se Deus quiser.

 

11.06.2021 - Jornal Económico

Sem dúvida que a pandemia, numa primeira observação superficial, parece ter contrariado a globalização, ao semear o caos nas cadeias logísticas, na migração dos trabalhadores e nos fluxos de viagem.

 

Contudo, um avisado gestor de uma organização, que se queira resiliente e liderante, não pode deixar de levar em conta os desafios que emergem da pandemia, no que toca à gestão das pessoas.

 

Muitos trabalhadores não querem voltar a tempo inteiro ao escritório e, por inerência, a terem que viver perto do mesmo, especialmente quando os escritórios corporativos têm, agora, uma função meramente simbólica ou decorativa. Qual o sentido de passar duas horas no trânsito?

 

Um trabalho que dignifique os seres humanos e que permita um melhor equilíbrio entre vida pessoal, familiar e profissional. É o que todos queremos. Por isso os trabalhadores querem voltar, ocasionalmente, ao escritório, mas poucos o querem fazer todos os dias. Infelizmente as confederações patronais sentadas na construção jurássica chamada de Conselho Económico e Social (não confundir com os CES das Regiões Autónomas, espaços de diversidade e pluralidade) não percebem ou não querem perceber a realidade.

 

A tecnologia permitiu, para os trabalhadores do conhecimento, o desemparelhar do trabalho de um local físico. E isso, implica, entre outras coisas, a necessidade de perceber que a cultura da organização não é algo que exista no interior de umas paredes, mas dentro das pessoas. Adeus políticas de presentismo. Chegámos à era da construção da cultura assente em valores, métodos de trabalho, atitudes, mas construída e mantida fora dos edifícios corporativos.

 

E claro, o Teams, o Zoom e o Webex tornaram-se os grandes fomentadores da igualdade. Dando uma machadada séria na politiquice de escritório, desanuviando ambientes de trabalho e o nepotismo que minam o ideal meritocrático das organizações que perseguem uma verdadeira centralidade no talento e nas pessoas. É muito mais difícil o papel daqueles que fingem que trabalham, quando não está ninguém a reparar neles.

 

Se a tecnologia, os valores e as atitudes tornaram possível trabalhadores mais produtivos, felizes e equilibrados, é justo relembrar que a disputa pelo talento é das coisas mais maravilhosas a que vamos assistir. São boas notícias para os trabalhadores do sector financeiro, formação profissional e serviços profissionais. Entre outros.

 

E por isso, cultura de empresa, condições de aprendizagem e progressão profissional, horários ou locais de trabalho flexíveis, aumentos salariais, são o novo normal das empresas com perspectiva global e que escolheram Portugal como base de prestação de serviços para todo o mundo. Os outros, os jurássicos, que ocupam as notícias por lapsos de memória de dirigentes, bónus surreais para um punhado, e propostas de aumento zero para todos ou outros, a esses apetece dizer que ficaram parados no tempo, mas que os seus trabalhadores estão em movimento.

 

 

04.06.2021 - Jornal Económico

Segundo dados divulgados pelo Eurostat, quase 13% da população portuguesa não tem acesso a cuidados de saúde oral. Esta é a segunda pior percentagem da União Europeia. E, pior ainda, o facto de quase um em cada seis portugueses estar excluído é mais do dobro da percentagem do país vizinho e quase quatro vezes pior que a média da União Europeia. Números preocupantes, não acha?

 

Esta exclusão, segundo todos os inquéritos, deve-se à incapacidade dos portugueses em suportar os custos. É quase chocante ter conhecimento que cerca de um décimo da população portuguesa não tem dente algum, segundo dados oriundos do Barómetro de Saúde Oral da Ordem dos Médicos Dentistas.

 

Que isto aconteça no país que ombreia com os melhores em esperança de vida, em cobertura de cuidados médicos aos recém-nascidos ou em vacinação é, digamos, quase surreal. Tanto mais que, fruto do investimento privado, hoje temos capacidade formativa ímpar na área da medicina dentária, sendo que Portugal é o terceiro país na União Europeia com mais dentistas por cada cem mil habitantes.

 

Resumindo, não temos um problema de oferta. Temos, isso sim, um enorme problema de incapacidade da procura.

 

Muito provavelmente, os dados que citei acima, referentes a 2019, ter-se-ão agravado com a pandemia e com as restrições sanitárias, que vieram limitar ainda mais o acesso dos portugueses aos cuidados de saúde oral. Importa relembrar que a fileira dos profissionais deste sector foi das mais afectadas com o confinamento e com as medidas de precaução adicionais.

 

É justo reconhecer que tem vindo a ser feito pelo Estado um esforço para melhorar o acesso dos portugueses a cuidados de saúde oral. Programas como o cheque-dentista, uma forma de auxílio directo à procura sem cair no erro de estatizar ou burocratizar a oferta, vieram no sentido certo. Contudo, importa alargar o programa, torná-lo universal e adequado ao esforço, à necessidade e à complexidade dos actos médicos a praticar. Tal como está, o programa cheque-dentista tem critérios demasiado restritivos, penalizando duplamente a classe média que o financia através dos seus impostos mas que dele não beneficia.

 

A terminar, reconheça-se o papel relevante dos subsistemas de saúde, colmatando as falhas e a omissão do Estado. Concebidos como complementares ao Serviço Nacional de Saúde, e financiados apenas como tal, os subsistemas têm desempenhado um papel verdadeiramente substitutivo (e não apenas complementar) no acesso dos portugueses à saúde oral. Não nos rogamos a esforços, e o comprometimento dos subsistemas está em crescendo, apesar do alheamento das entidades empregadoras no que às necessidades de financiamento diz respeito. Compete ao Estado, agora, assumir as suas responsabilidades constitucionais.

 

28.05.2021 - Jornal Económico

Até à semana pretérita a maior parte das instituições de crédito a operar em Portugal apresentou os seus resultados trimestrais. Conquanto com variações importantes entre os diversos intervenientes, os resultados são, globalmente, positivos, o que naturalmente saudamos. Queremos bancos e empresas fortes, bem geridas, condição primeira e essencial para promover o crescimento do emprego e a qualidade do mesmo.

 

Resultados globalmente positivos, importa frisar, apesar de custos de contexto portugueses, tornados muito desfavoráveis por escolhas e decisões políticas, que tendem a penalizar o sector financeiro e a sua capacidade de gerar retornos. Custos de contexto que têm, naturalmente, implicações sobre a capacidade de atracção do sector, tanto do ponto de vista de acionistas como de trabalhadores (atuais e potenciais).

 

Estes resultados positivos, malgrado o contexto institucional e legislativo, são uma reconfirmação do que temos vindo a dizer. O sector tem capacidade para fazer actualizações das cláusulas de expressão pecuniária nos contratos colectivos de trabalho. Actualizações essas com impacto nas tabelas dos activos, reformados, pensionistas, mas também no financiamento dos SAMS.

 

Realce para o facto de, nalguns bancos, terem sido as operações internacionais, ou em descontinuação, que penalizaram os resultados consolidados de uma actividade doméstica muito positiva no primeiro trimestre. Uma reconfirmação de que os piores receios sobre o impacto da pandemia sobre a qualidade da carteira de crédito poderão ter sido infundados.

 

Por tudo isto, vai sendo tempo de a banca a operar em Portugal incorporar mais e melhores modelos de governação, tendo atenção não apenas aos accionistas mas a todos os interessados na saúde financeira dos bancos: trabalhadores, Estado, clientes, para além dos clássicos accionistas.

 

A digitalização, sempre esse papão tão apregoado, não pode servir de pretexto para recompensar unicamente os shareholders em detrimento de todos os stakeholders.

 

Para terminar, duas notas. A primeira para saudar a vitória do Sporting Clube de Portugal. É o futebol português que ganha com isso porque fica mais competitivo e mais forte. A segunda para agradecer a presença de todos os trabalhadores do Banco Santander Totta que participaram nas acções de protesto em Lisboa, Porto e Coimbra.

 

21.05.2021 - Jornal Económico

Esta é uma semana diferente. Uma semana em que os bancários estão em protesto, um pouco por todo o país. Apesar de desde Outubro termos vindo a insistir com a administração, de um dado banco, de que o movimento de redesenho organizativo, pela sua aparente profundidade, era uma verdadeira reestruturação, tal não foi reconhecido como tal, até muito recentemente. O que é pena, pois queremos negociar, encontrar as melhores soluções, em consenso e valorizando o trabalho e o empenho dos trabalhadores bancários que tanto, mas tanto deram de si ao banco.

 

Uma semana diferente, porque defendemos o respeito pelos contratos livremente assinados entre as partes. Incluindo, como não poderia deixar de ser, os contratos de trabalho. O respeito pelos contratos, livremente assinados entre as partes, constitui uma peça fundamental que distingue uma sociedade civilizada da barbárie. A confiança entre parceiros sociais, entre os seres humanos é o cimento que tornou possível os nossos antepassados deixarem as cavernas e criarem as sociedades modernas.

 

Uma semana em que honramos a galhardia, o profissionalismo e a coragem dos trabalhadores bancários, verdadeiros apanágios de profissionalismo, dedicação e empenho à empresa, aos clientes e aos portugueses.

 

Uma defesa em que reafirmamos a nossa preferência por processos de redimensionamento voluntários, com enfoque nas reformas antecipadas, na redução dos contratos com fornecedores externos de serviços (e sua atribuição a trabalhadores bancários) e em processos abertos de rescisões por genuíno mútuo acordo. E em que tais processos decorrem de forma faseada, no tempo, sem pressas exageradas nem o “queimar” de etapas que retiram tranquilidade e serenidade a processos sempre complexos.

 

Porque acreditamos na centralidade da pessoa humana, porque repudiamos extremismos, porque temos no nosso ADN o diálogo social, acreditamos que a razão e o bom senso prevalecerão.

 

14.05.2021 - Jornal Económico

Na passada semana tomámos conhecimento no Sindicato Nacional dos Quadros e Técnicos Bancários (SNQTB), que o Banco Santander Totta (BS Totta) vai despedir cerca de 150 trabalhadores e que fez uma provisão extraordinária de 164,5 milhões de euros, o que antecipa muitos mais despedimentos.

 

Permitam-me algumas palavras, unânimes e solidárias, em nome da direção que lidero com muito orgulho.

 

Choca-nos, em contexto de pandemia, num momento em que a todos se exige fazer a sua parte em nome do bem comum, que ordens superiores que acreditamos serão oriundas de Espanha, imponham o rolo compressor que vem sacrificar muitos postos de trabalho, ainda que sem urgência ou necessidade.

 

E choca-nos também que esta administração portuguesa do BS Totta seja incapaz de lutar em Espanha pela salvaguarda dos postos de trabalho dos portugueses que lideram do Minho ao Algarve, não esquecendo os Açores e a Madeira.

 

Estamos perante um movimento unilateral, sem razoabilidade, no preciso momento em que o BS Totta acabou de anunciar, relativamente ao primeiro trimestre de 2021, um rácio de eficiência de 34,1%, aumento do produto bancário de 18,7%, redução dos custos operacionais de 2,5%, resultado de exploração que subiu 33,7%, recursos de clientes que subiram 5%, crédito a clientes que subiu 5%, moratórias que diminuíram 25% e rácio de capital (CET1) de 20,1%, o que corresponde a um acréscimo de 4,3 pp.

 

Estes resultados são excelentes. É, por isso, incompreensível que administradores portugueses, sob tutela espanhola, procedam desta forma quando nada lhes exigia um sacrifício brutal dos trabalhadores portugueses do BS Totta.

 

Lamentamos ter de o lembrar, mas os portugueses não são objetos descartáveis por indicação oriunda de Espanha. Para além do mais, o recurso a processos unilaterais de despedimento não honra a história do BS Totta, nem está em linha com equipas de gestão portuguesas anteriores, que sempre souberam impor a Espanha a salvaguarda dos interesses dos nossos colegas do BS Totta.

 

Isto dito, no SNQTB somos responsáveis. E patriotas, naturalmente. Por isso privilegiamos o diálogo e a concertação como instrumentos preferenciais no relacionamento com as instituições bancárias. Nessa medida, estamos sempre disponíveis para cooperar com ações e iniciativas que visem assegurar o sucesso estrutural e a longo prazo das entidades do sector bancário.

 

Esta administração do BS Totta, porém, toma como seu um processo de reestruturação que, na sua forma unilateral, não obedece aos interesses dos trabalhadores portugueses.

 

Sejamos, portanto, muito claros. A direcção do SNQTB não aceitará o sacrifício desnecessário dos portugueses, quando os resultados operacionais são francamente bons. Por isso os defenderemos em todas as frentes: perante a administração do BS Totta, em Portugal e em Espanha, em cada local de trabalho, na praça pública e na comunicação social, junto do Governo e dos grupos parlamentares. E junto dos Tribunais, se for esse o caso.

 

E é por isso mesmo que vamos sair à rua para fazer ouvir a nossa voz, dias 11 a 14, em Lisboa, Porto, Coimbra e Faro, sequencialmente. Pelos portugueses e por Portugal, por muito que isso doa a alguns interesses espanhóis poucos conhecedores da realidade e da História de resistência portuguesa.

 

07.05.2021 - Jornal Económico

Vão estar em discussão, a partir de Maio, três projectos de grupos parlamentares sobre o teletrabalho e a sua regulamentação. E outros se anunciam para entrarem na liça.

 

Saudamos, uma vez mais, os representantes eleitos dos portugueses e permitam-nos ajudar à discussão do que se vai seguir, relembrando o que está em jogo. E como vários grupos de interesse se movimentam na arena pública.

 

De um lado, os imobilistas, dizendo que não se deve legislar a ‘quente’. Ignorando que estamos em pandemia há quase 15 meses e já se vem fazendo tarde regulamentar e normalizar o que não pode ser apelidado de raro ou excepcional.

 

Temos também os minimalistas, que preferem legislação avulsa e não querem mexer no Código do Trabalho. Talvez queiram contribuir para o emaranhado de leis, quantas vezes contraditórias, que fazem a delícia dos prevaricadores e criminosos, entupindo tribunais e iludindo a justiça.

 

Ou ainda os preguiçosos, que não querem trabalhar muito, pois que sabem que terão que rever vários artigos do Código do Trabalho, bem como rever a Lei 98/2009 sobre acidentes de trabalho e doenças profissionais (mormente o artigo 8), o decreto-lei 442-A/88 (Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares) e a Lei 110/2009 (Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social). Muito trabalho, bem sabemos, mas essencial para assegurar matérias como a Igualdade do Teletrabalho, os direitos à privacidade, aos períodos de descanso, direitos sindicais, apreciação e recusa da prestação em teletrabalho, exclusão da tributação em IRS/SS do ressarcimento dos custos do teletrabalho, entre tantas outras.

 

O grupo dos mais finórios, dizendo que é na Contratação Colectiva que cada sector deve estabelecer os seus padrões. Quiçá querendo fazer esquecer a dura realidade: no ano de 2020, em plena pandemia, apenas 1,4% das convenções colectivas regulamentavam o teletrabalho, pois falta vontade às organizações patronais em querer participar de forma construtiva nesta matéria.

 

Ou ainda os ‘sofisticados’, aqueles que reconhecem que existem custos para os trabalhadores em teletrabalho e se propõem discutir os valores concretos em negociação colectiva, ignorando que os custos do teletrabalho serão muito constantes, qualquer que seja o sector. Pretendem, está bem de ver, atirar para as “calendas gregas” uma coisa tão simples quanto um valor mínimo de ressarcimento dos custos dos trabalhadores (Usando critérios como os custos médios dos consumos domésticos ou o custo de espaço doméstico, estimamos em 67,40€ mensais, por trabalhador).

 

Se queremos menos pegada ecológica, melhor conciliação entre vida profissional e pessoal, trabalhadores mais produtivos e empresas mais lucrativas, temos que legislar quanto antes sobre o teletrabalho. Que, relembre-se, em modelo puro ou híbrido, são a escolha da maioria dos trabalhadores, nas funções que o permitem.

 

30.04.2021 - Jornal Económico

No momento em que escrevo, logo no início da semana, a agenda está marcada pelo anúncio da intenção de alguns dos clubes europeus mais notórios em constituírem uma Super Liga Europeia. Como que em modo de circuito fechado. Um espaço de acesso restricto apenas a uma elite. Percebe-se a intenção de concentrar em poucos clubes os direitos televisivos mais apetecidos, aumentando o número e a constância de jogos entre alegadas super equipas.
 
Sem correr os riscos de uma eliminação aos pés de um qualquer Ajax, Benfica, Olympiacos, Porto ou Sporting.
Uma espécie de liga fechada, sem subidas nem descidas para um grupo restricto, em linha com modelos oriundos do desporto norte-americano.
 
Talvez tenha sido apenas um balão de ensaio para forçar a UEFA a uma Liga dos Campeões que, no essencial, assegure o objectivo dos promotores: aumentar a sua exposição e tempo de competição, com o brutal acréscimo de receitas a reverterem para um punhado, e apenas um punhado, de clubes.
 
Provavelmente as alegadas super equipas não querem o alargamento que a UEFA se preparava para fazer no formato da Liga dos Campeões, na medida em que dividirá a receita por mais clubes e países. Como é justo que aconteça. No fundo, incomoda-os uma Liga dos Campeões mais centrada no mérito e êxito desportivo e não na maximização pura e dura dos lucros.
 
É claro que as alegadas super equipas procuram disfarçar um pouco as suas pretensões. Sem sucesso, refira-se. A verdade crua é clara e a intenção dos promotores da Super Liga Europeia ilustra como a ganância pode ser o valor supremo da vida. Ignorando que o futebol, para que existam um punhado de equipas globais, vive de milhões de praticantes, dirigentes e clubes anónimos. E que a padronização das regras de jogo, a existência de campeonatos regionais e nacionais, e a centralização de direitos televisivos foram os elementos da tríade que permitiram à Europa dominar este desporto.
 
Eis o futebol como espelho do que se passa em muitos outros sectores das nossas economias e sociedades. A ganância de uns poucos, que se querem aboletar do que a muitos diz respeito, parece, para já, ter esbarrado na forte oposição da UEFA, das Federações Nacionais e dos jogadores profissionais.
 
Mas não nos iludamos. A procissão, nesta pretensão egoísta de a poucos querer destinar o que a muitos deve pertencer, ainda só vai no adro. Bancos de investimento norte-americanos, fundos não regulados, entre outros sujeitos habituais, juntar-se-ão a uma profusão de protagonistas jurídicos que procurarão argumentar que a UEFA (e as Federações Nacionais) abusa de sua posição dominante e viola os tratados europeus. E relembre-se que a Comissão Europeia (e já agora o TJUE) tem sido da opinião que o futebol é uma mera actividade económica, devendo ser regido como tal no enquadramento da política de concorrência da União.
 
23.04.2021 - Jornal Económico

Tempos estranhos, estes que vivemos. Numa semana em que se discute acerrimamente méritos e deméritos de um despacho instrutório, como que testando ao limite o princípio republicano e democrático de separação de poderes, tem passado despercebido junto da opinião pública um escândalo por omissão executiva e legislativa. O que não deixa de ser curioso quanto o tema das moratórias de crédito tem tudo, porque sistémico e específico da nossa realidade, para ser o assunto mais importante da actualidade nos próximos meses.

 

Refiro esta questão a propósito da empresa do sector empresarial do Estado, a Parvalorem, que é um centro valioso de competências na resolução de créditos incobráveis e em incumprimento bancário. Uma empresa especialista na esfera pública, nascida da parcela tóxica dos créditos do então BPN.

 

Recentemente a administração da empresa e os sindicatos outorgaram um Instrumento de Regulação Coletiva de Trabalho (IRCT), integrando a Parvalorem na normalidade jurídica-laboral e resolvendo um problema que se arrastava há anos e que anteriores administrações da empresa não quiseram ou foram capazes de solucionar.

 

Menos notável é a incapacidade (ou falta de vontade?) do Ministério das Finanças em negociar com a Comissão Europeia a preservação e a continuidade plena da empresa, com a sua missão, competências e dimensão.

 

Igualmente escandaloso é que à incapacidade política do Executivo se junte a omissão legislativa (e os leitores sabem como, amiúde, tenho aqui elogiado a acção da Assembleia da República e os deputados). Pois que no cumprimento de uma lei iníqua e muito datada, tenha o Ministério do Trabalho solicitado o parecer, no âmbito de um eufemisticamente denominado “plano de reestruturação”, a duas e somente duas centrais sindicais. Uma delas sem qualquer filiado ou associado na Parvalorem. A outra, muito minoritária.

 

Por isso, têm razão para se indignar a União dos Sindicatos Independentes (USI) – Confederação Sindical e os trabalhadores da empresa. O saber e a experiência da Parvalorem e dos seus trabalhadores são activos estratégicos para Portugal e para o nosso futuro colectivo.

 

O definhamento da Parvalorem, a prosseguir, é um erro (mais um, a juntar a outros) que iremos todos, enquanto cidadãos e contribuintes, pagar.

 

16.04.2021 - Jornal Económico

Agora que encetamos aquilo que se espera que seja o último episódio do ciclo de confinamentos/desconfinamentos, importa olhar para o que de muito bem fomos capazes de fazer e o que fomos, enquanto sociedade, menos competentes.

 

Como muito competentes a resposta europeia à crise económica e a capacidade de aprovar medidas de política monetária, económica e sanitária. Dinheiro barato e abundante, moratórias dos créditos, medidas de apoio à preservação de emprego e compra centralizada de vacinas, tudo aspectos que valorizam a União Europeia e que demonstram, de forma exuberante, como seria muito mais difícil a nossa vida fora dela. Um projecto europeu cheio de percalços, mas ainda hoje uma construção histórica, um espaço de paz e de progresso único para os povos da União.

 

O consenso social e político que se formou, entre Governo, Presidente e partidos, em Portugal, em 2020, aquando da primeira vaga, foi digno dos melhores momentos da nossa centenária história e evitou uma tragédia de enormes proporções sobre o emprego e as famílias. Relembro que na anterior crise (2011-2014), bem menor que esta, a taxa de desemprego foi quase o triplo da actual (e a taxa de sub-utilização do trabalho quase o dobro).

 

E nenhum Governo, empresa ou trabalhadores poderiam ter feitos planos de contingência, por antecipação, para um cenário de pandemia. Digno da ficção científica, é utopia pensar que poderíamos estar preparados, de antemão. Ninguém poderia, em lado algum do mundo. Simples.

 

A capacidade de resposta da sociedade civil tem sido notável, ao longo destes treze meses. Empresários responsáveis, sindicatos construtivos, outra face do sentido de missão que a todos nos deve mover em face de uma ameaça nunca antes defrontada. Deixo ao leitor que relembre como para além dos óbvios profissionais da saúde, tivemos muitos outros trabalhadores a desempenhar funções de suporte críticas: bancários, transporte de passageiros, farmácias, supermercados, ensino. Uma lista longa de gente e profissões que tantas, mas tantas vezes, são vituperadas como se a ganância de uns poucos pudesse ser culpa de tantos trabalhadores anónimos.

 

Tendo vacinado metade da população mais frágil pelo critério dominante da idade, foi com expectativa que assistimos nos últimos fins de semana à vacinação dos docentes e pessoal administrativo e assistente, das escolas básicas e secundárias. Um segundo grupo profissional, logo depois dos da saúde. No que parece também ser um critério razoável de vacinar grupos que desempenham serviço público e que são essenciais para o funcionamento da economia.

 

Sejamos consequentes e sem tergiversações. Que sejam vacinados todos aqueles que atendem público em serviços essenciais: supermercados, agências bancárias, farmácias, transportes colectivos, restaurantes, finanças, conservatórias, notários, clínicas dentárias. Uma lista decerto longa, mas essencial. Vacinas para quem trabalha na linha da frente, pois claro.

 

09.04.2021 - Jornal Económico

Observo com atenção o desenrolar do processo de vacinação em Portugal. De uma lentidão exasperante, sem que se vislumbre um racional sobre prioridades, ritmos e motivações. Ao início, parecia que tínhamos seguido as directrizes europeias, e tido como prioridade os mais velhos e aqueles com maiores comorbilidades. Agora, sem discussão prévia, e quando mais de metade dos mais velhos e dos mais doentes ainda não foi vacinada, a prioridade parece ter mudado. E sem qualquer debate ou discussão dos méritos da iniciativa.

 

Em certos pequenos países, como Israel ou a Sérvia, percebemos a estratégia, conquanto discutível. Em Portugal, em situação de rarefação de vacinas, está tudo muito errático, para dizer o mínimo.

 

Entretanto, começou o ciclo da negociação colectiva. Exigente, a requerer cada vez mais profissionalismo, preparação técnica e força política por parte dos sindicatos. Reclamar sem sentido, esbracejar sem conteúdo, ou fazer ameaças de pólvora seca, são exemplos de peditórios que não subscreveremos.

 

Ao invés, contem connosco para reclamar aumentos e progressões de carreira com base naquilo que verdadeiramente interessa: os aumentos de produtividade, a rendibilidade dos capitais empregues, o poder de compra perdido na segunda década deste século, o adicional de custos que o teletrabalho trouxe a alguns trabalhadores por conta de outrem, o aumento dos custos de saúde.

 

Com argumentos técnicos, não deixando margens para dúvidas.

 

E sim, apesar da pandemia, muitos e variados sectores tiveram um bom ano económico em 2020. Serviços profissionais, banca, indústria, energia, telecomunicações, entre tantos, foram capazes de um desempenho económico e financeiro muito interessante. É de elementar justiça que os trabalhadores e os quadros sejam recompensados pelo seu decisivo contributo.

 

Num tempo que urge especificar e melhor regulamentar tantas matérias laborais, realce para duas iniciativas de partidos políticos que pretendem, por um lado, repor a exequibilidade de contestação judicial em processos de despedimento, e aprofundar direitos e deveres do teletrabalho, por outro.

 

Já é tarde para definir o perímetro dos custos do teletrabalho a ressarcir pelas empresas aos seus trabalhadores. Que são fáceis de quantificar e estimar. Investimento inicial em mesa, cadeira e iluminação; custo de oportunidade em metros quadrados domésticos afectos a actividade profissional; uma proporção das despesas de electricidade, aquecimento/arrefecimento e água. Existe, aliás, um precedente, em sede de IRS, sob a forma das despesas domésticas razoáveis e proporcionais que os trabalhadores independentes podem deduzir ou afectar à sua actividade profissional.

 

Na ausência de resposta legislativa, contem connosco para fazer chegar aos parceiros sociais uma fórmula de fácil entendimento entre todos. E que acabe esta originalidade portuguesa de serem os trabalhadores a financiarem os meios de produção do teletrabalho. Dignificar o trabalho e os trabalhadores. Simples.

 

01.04.2021 - Jornal Económico

Há uns anos, a propósito das crises económicas, um par de economistas laureados escreveu um famoso livro relembrando o carácter recorrente das crises e glosando a crença dos decisores políticos e económicos, de cada era, ao pensarem que a sua crise fora diferente, muito diferente, das que os antecederam.
 
Esse livro salientava como esse carácter alegadamente distintivo, essa percepção errada, os impediu de perceber a tempo as circunstâncias e de actuar oportunamente sobre causas e consequências das crises que tinham pela frente.
 
Como quase sempre acontece, a crise em curso afecta de forma desproporcional as pessoas e menos os factores de produção ligados ao capital. Até aqui, nada de novo. Mas desta vez tem um impacto muito relevante e de forma muito assimétrica sobre os empregadores e os trabalhadores dos serviços, e não tanto da indústria. Afecta principalmente todos aqueles sectores, trabalhadores e empresários, cuja natureza de funções não permite, ou não rendibiliza, o teletrabalho.
 
Para perceber isto, basta estar atento ao proliferar de portugueses sem-abrigo nas nossas cidades. Um exército esfomeado, com frio, que desta vez tem nas suas fileiras pessoas pouco habituais. No entanto, se olharmos com olhos de ver, constatamos que são rostos familiares. O trabalhador da oficina, a ajudante de cabeleireira, a empregada de balcão da pastelaria.
 
Uns e outros desempregados, amiúde ambos os progenitores, lado a lado com crianças. Ou em lay-off. Pessoas incapazes de pagar os quartos onde viviam. Pessoas a quem os subsídios chegam, se chegarem, demasiado tarde.
 
Cerca de 24% da população está em sofrimento extremo. Não o psicológico, de não conseguirem desligar-se do teletrabalho ou da ausência de afectos físicos com amigos e familiares. Mas o sofrimento de quem não tem onde se abrigar, tomar banho, alimentar ou dormir em segurança.
 
Acresce que este mês acabam as moratórias privadas de parte dos créditos bancários e que os processos de execução por dívidas ao Fisco e à Segurança Social serão retomados. Muitas das empresas que retomaram a sua actividade estarão em condições muito mais débeis do que há um ano atrás. Por isso, só não antecipa o que lá vem quem não quer.
 
Vivemos num contexto em que a Europa que não consegue vacinar os seus cidadãos em tempo útil. Uma Europa em que alguns Estados-membros não fazem chegar o dinheiro a quem precisa.
 
Exige-se um sobressalto cívico. Temos que tomar o destino comum nas nossas mãos. De outro modo, a burocracia de Bruxelas vai permitir, por inacção e lentidão, que uma chacina social tenha lugar.
 
Deve o sector social dar o exemplo e liderar o combate à pobreza extrema dos trabalhadores que agora estão expostos à crise.
 
Mas exijamos também aos poderes públicos resolução, determinação e que façam chegar dinheiro, dinheiro mesmo, às pessoas que sofrem. Exijamos das empresas lucrativas que suspendam processos de restruturação. Isto não pode continuar.
 
26.03.2021 - Jornal Económico
 

Apesar dos percalços iniciais, nomeadamente sob a forma da ‘chico-espertice’ de alguns que tomaram a vacina fora do tempo próprio, as últimas semanas têm sido marcadas por um ritmo crescente de inoculações contra a doença pandémica. Vale a pena relembrar que foi a solidariedade europeia, sob a forma de escrutínio, negociação e aquisição em conjunto para os países da União Europeia, que permitiu a pequenos países, como Portugal, terem acesso, em tempo útil e em valores comportáveis, às vacinas.

 

E descontando a política agressiva, proteccionista quanto à produção, proibição de exportações e injecção de centenas de milhões nas farmacêuticas com o fito de assegurar abastecimento privilegiado, que encontramos nos Estados Unidos, Emirados Árabes Unidos, Israel e mais um par de países, a vacinação europeia tem seguido um rumo paulatino que terá que contar com a participação cívica dos portugueses.

 

Todos temos o dever cívico de tomar a vacina, face às evidências científicas conhecidas ao dia de hoje. Fazer uma pausa ou abrandar o ritmo de vacinação é escancarar a porta a uma quarta vaga e comprometer a recuperação económica.

 

Não deixa de ser curioso de observar a vocalização de certos grupos profissionais, na ambição que os seus membros sejam vacinados. Outros, essenciais, prestadores de verdadeiro serviço público e expostos a contacto com o público, têm sido bastante mais comedidos nos seus pedidos. Pois que impera um dever cívico e sentido de responsabilidade, quando há grupos de portugueses mais frágeis, mais doentes ou mais idosos a quem deve ser dada prioridade.

 

Bancários, carteiros, pessoal de manutenção de infra-estruturas de água, luz, aquecimento, professores e demais profissionais da educação, também eles devem ser vacinados, assim que os mais necessitados tenham sido atendidos.

 

Com tudo isto dito, vale a pena recordar como em Portugal uma parte desproporcional do embate da crise tem estado não no Orçamento Geral do Estado, mas nas empresas (que mantêm o emprego e uma parte significativa dos custos), nos trabalhadores (que em lay-off perdem parte de suas remunerações) e nos bancos que concederam moratórias privadas para os créditos de empresas e particulares aos seus clientes. Com a perigosa originalidade portuguesa de não existir garantia estatal para estas moratórias, ao arrepio do que acontece na generalidade dos países da OCDE.

 

Os Estados Unidos, a China e um punhado de outros países perceberam, quer através da produção e inoculação massiva de vacinas, quer pela prestação de garantias estatais de suporte às moratórias dos bancos, ou distribuição de cheques pela população, que a saúde dos seus cidadãos, a capacidade creditícia e os capitais próprios dos seus bancos e a capacidade e a apetência de consumo dos seus cidadãos, são tudo facetas da mesma realidade para uma recuperação incisiva da economia e do emprego. E sem estas, não existe verdadeira independência nacional.

 

19.03.2021 - Jornal Económico

É com algum sentimento de tristeza que tenho de reconhecer que o motor da meritocracia gripou. Nos dias que correm, um sentimento de predestinação, aliado a desenvolvimentos fiscais e tecnológicos, tornaram a meritocracia um mito perigoso para a classe média.
 
Ao contrário das elites nobiliárquicas, que sabiam ter tido a sorte de ter nascido na família certa e isso lhes dar um sentimento de decência e compaixão para com os que tiveram menos sorte, as novas elites meritocráticas atribuem o seu sucesso unicamente às suas capacidades e ao seu esforço. Julgam-se predestinadas a altos voos. Como que dotadas de capacidades extraordinárias que, contudo, na maior parte dos casos, ninguém lhes reconheceu ao longo das duas primeiras décadas das suas vidas. Estas elites ignoram que a sorte também teve uma palavra a dizer nas suas vidas e que as bafejou de forma especial.
 
A elite que hoje domina a medicina, a consultoria, os negócios, o direito, a política, é composta pelos filhos das primeiras elites meritocráticas de há três ou quatro décadas atrás. Contudo, a geração actual não reconhece o papel da sorte, ignora que os ascendentes familiares lhes proporcionaram a linguagem ‘certa’ e os contactos perfeitos para o êxito.
 
Naturalmente, o esforço e a abnegação têm o seu papel, mas a sorte (de um produto, de uma empresa, de um chefe ou padrinho profissional, de ascendentes familiares certos) não é despicienda.
 
Esta elite, que se julga predestinada, não tem a humildade de reconhecer a sorte que teve e considera os outros como menos capazes. Não fizeram o suficiente, ou não se esforçaram o quanto deviam, entre outras considerações similares. São, por isso, menos predispostas a partilhar os seus ganhos com os demais, a serem solidárias com quem teve menos sorte, mas não necessariamente menos esforço. No seu entendimento, os ‘outros’ merecem ser ‘restruturados’ porque são onerosos demais, esses ‘outros’…
 
Acresce que os impostos sobre o rendimento do trabalho e as contribuições para a Segurança Social tornaram o trabalho o factor mais caro num processo produtivo. Logo, os estímulos induzem a desenvolvimentos tecnológicos que visam poupar nos custos com o trabalho. A robotização e a digitalização são formas privilegiadas de eliminar os postos de trabalho dos medianamente qualificados, rumo a empresas apenas com uma elite gestora e algoritmos.
 
Infelizmente, a chacina da classe média segue o seu curso, ainda que seja cada vez mais evidente que precisamos de uma nova ética no mundo empresarial e de um sistema fiscal que não discrimine as pessoas. Mais do que eliminar a classe média, essencial para a estabilidade do regime democrático, necessitamos de inovação que não vise substituir as pessoas por máquinas, mas que torne os trabalhadores mais produtivos.

12.03.2021 - Jornal Económico

É atribuída a Sun Tzu a observação de que não há maior perigo do que subestimar o adversário. Com declinações, a reflexão tem sido repetida ao longo da história. Sinal que a lição, apesar de intemporal, nunca está verdadeiramente assimilada? Ou que há sempre quem pense que consigo será diferente?

 

Ciclicamente surgem decisores que incorrem no erro de avaliar mal o seu poder, ou a sua influência. Sem razão aparente, acreditam que conseguem subjugar o oponente sem qualquer tipo de diálogo. Estes decisores, olham para as dinâmicas nas empresas numa lógica de soma nula e impõem abordagens que potenciam a conflitualidade.

 

Na verdade, a sua impetuosidade revela inexperiência ou desconhecimento. Inexperiência, ou imaturidade profissional, porque com encurralam o oponente e lhe retiram espaço para compromisso. Desconhecimento porque confirmam não conhecer o contexto e o opositor. Na prática, com a abordagem de soma nula, estes decisores acabam por ser os piores inimigos dos seus interesses.

 

O resultado acaba por ser quase sempre prejudicial. O que poderia ter sido, desde o início, uma estratégia cooperativa e ancorada em compromissos, acaba por desencadear reacções conflituais desnecessárias.

 

Não há acordo possível quando uma das partes é encostada às cordas. Inevitavelmente, a colisão de interesses não intermediados tem custos para a marca, tem riscos para a reputação da empresa e, em última instância, potencia uma situação que não serve os interesses de ninguém. Não é isso do domínio do óbvio ululante? Claro que sim. O que constatamos é que esta húbris acontece com uma frequência inesperada.

 

Não tem de ser assim. A inexperiência e o desconhecimento não são sinónimos de intransigência ou teimosia cega. Com determinação, mas também com bom senso, estas estratégias maximalistas são colocadas na ordem. Tal como um organismo vivo, o corpo reage à anomalia e aos estímulos. Nessa medida, após algumas iterações conflituais, a cooperação ganha espaço de afirmação, prevalecendo o interesse comum entre accionistas, administradores e trabalhadores.

 

Há quem insista em esquecer que, mais do que potenciar os seus interesses desrespeitando os de terceiros, o diálogo é a melhor solução. Qualquer outra via é uma irresponsabilidade.

 

Permitam-me, a terminar, uma palavra em causa própria. Os sindicatos responsáveis sabem a que porto se dirigem. Nessa medida, a salvaguarda dos interesses dos trabalhadores nunca deixa de ser o seu referencial. O resto é mera táctica circunstancial e espuma dos dias.

 

Ora, a tática é flexível e ajustável. A salvaguarda dos interesses dos trabalhadores, porém, não é negociável. Quem insista em encurralar os sindicatos acaba sempre por pagar o preço da sua altivez. Porém, quem opte pela negociação terá, da sua parte, um parceiro na procura de soluções de compromisso.

 

Invocando o filósofo Lao-Tsé: aquele que conhece o outro é inteligente. Poderia ser de outra forma?

 

05.03.2021 - Jornal Económico

Há poucos anos atrás, numa visita sindical a locais de trabalho, deparei-me com uma entidade financeira em que mais de um terço dos trabalhadores eram subcontratados. Lado a lado, trabalhadores com situações laborais muito distintas, numa escala que julgava que seria imprudente para qualquer gestor experiente. Sem surpresa, a dita entidade entrou, pouco tempo depois, em falência.

 

O racional subjacente à subcontratação de produção, operações e sistemas de informação, até parece ser sólido aos olhos dos accionistas e a intenção é óbvia: baixar os custos laborais e possibilitar ganhos adicionais de escala.

 

Mas a subcontratação massiva, o outsourcing, destrói o elevador social, degrada a classe média, aliena os trabalhadores e, no longo-prazo, diminui as margens das empresas. Amiúde, o resultado final é a falência.

 

Todos nos lembramos da famosa Kodak, fundada em 1888. Durante mais de um século a Kodak foi absolutamente dominante e inovadora nos mercados de fotografia. Porém, o digital, de que a empresa tinha sido a pioneira, levou-a à bancarrota em 2013. Uma década de subcontratação massiva de produção na Ásia e a empresa perdeu competências na produção, engenharia e desenvolvimento de produto.

 

Esqueceu-se que ter mantido a produção internalizada permitiria o desenvolvimento de ideias que levam ao desenvolvimento de novos produtos e serviços. Com a subcontratação massiva, a Kodak abriu as portas aos concorrentes que puderam contratar os mesmos fornecedores e usar a mesma tecnologia. Em breve as margens reduziram-se a tal ponto que a orgulhosa Kodak desapareceu.

 

O cenário tem vindo a repetir-se sector após sector. Como as empresas industriais ocidentais perceberam, tarde de mais, com a emergência dos novos concorrentes chineses, outrora seus subcontratados, em sectores como as telecomunicações, automóvel, meios de diagnóstico médico, entre tantos outros.

 

Aparentemente, imunes às lições da história, parece ter chegado o tempo de as empresas de serviços serem acometidas da mesma miopia estratégica. No sector financeiro, as posições administrativas (mas também técnicas e, em menor grau, de gestão) estão a desaparecer, sendo subcontratadas a terceiros fatias cada vez maiores de processos como a contratação e tramitação de crédito, o fornecimento e manuseamento de numerário, o desenvolvimento aplicacional, pagamentos e transferências, terminais de pagamento, habilitação de herdeiros, entre tantos processos que paulatinamente vão sendo transferidos para terceiros.

 

Percebemos a opção pela subcontratação em casos em que há manifestamente problemas de qualidade ou ausência de escala mínima. Mas em todas as outras situações, com a subcontratação minamos a lealdade dos trabalhadores e a sua motivação, ao defrontarem-se com o espectro da redundância ou com outros, ao seu lado, em modalidades que mais parecem saídas de um livro de Charles Dickens.

 

Em moldes massivos, a subcontratação é perniciosa para as hipóteses de longo-prazo das empresas e tóxica para os trabalhadores. Nenhum sindicato pode ficar indiferente ao seu recurso indiscriminado.

 

26.02.2021 - Jornal Económico

Uma das ‘profissões’ mais antigas do mundo é a de profeta da desgraça. Estas personagens conseguem descortinar problemas e inibições onde os mais razoáveis anteveem oportunidades e progresso.

 

Recentemente, uma consultora veio prognosticar a desgraça, se a banca não fizer em três anos tanto quanto fez na década anterior: fecho de um terço dos balcões e diminuição de 40% dos trabalhadores.

 

Teve azar, a dita consultora, porque nos dias subsequentes assistimos às apresentações dos resultados de 2020 pelos principais bancos presentes no mercado português. Apesar da pandemia e da prudência no reforço das provisões, todos apresentaram resultados positivos, conquanto em baixa. Louve-se a prudência, mas atente-se nos resultados de forma mais granular e desmonte-se a narrativa dos que querem apenas reduzir balcões e trabalhadores.

 

A primeira observação é que com a variação das provisões em cima dos resultados líquidos, vários bancos tiveram resultados brutos que comparam muito bem com o ano anterior à pandemia. Depois, com uma ou outra excepção, a margem financeira, em volume, subiu. Acresce que a rendibilidade dos capitais próprios é positiva e na generalidade dos casos é de um dígito alto, bem acima do retorno das obrigações empresariais.

 

Um dos bancos, de direito português, mas integrado num grupo financeiro global, tem um rácio de eficiência muito abaixo do que esse grupo obtém em mercados de maturidade (Espanha ou Reino Unido) similar ao nosso e muito mais próximo do que se verifica na América do Sul. De facto, o rácio de eficiência em Portugal compara bem com vários países de cultura ou dimensão geográfica próxima da nossa.

 

E enquanto os principais mercados bancários europeus reduziram um terço de balcões na década anterior, em Portugal a redução foi de quase dez pontos percentuais acima. Em suma, redução mais rápida de balcões e trabalhadores mais baratos. De que se podem queixar os gestores dos bancos?

Talvez do rácio de transformação ser de 85%, resultante do acréscimo de poupança e das menores oportunidades de concessão de crédito, fruto da pandemia, que se espera mitigada em breve com a vacinação.

 

Ou de Portugal ser um país original em que a capacidade dos bancos em cobrar pelos seus serviços é limitada por lei, numa prática nos antípodas do que acontece na maioria dos países europeus. E o facto de não sermos um paraíso para lavagem de capitais, o que nos prejudica nas comparações apressadas de volume de activos por empregado bancário.

 

Mas isso não permite que se tome a nuvem por Juno. Importa dizê-lo bem alto: somos eficientes, de bons níveis de rendibilidade accionista e geramos resultados suficientes para fazer face aos requisitos regulatórios.

 

Não temos trabalhadores bancários em excesso. A mais, demasiado a mais, há na banca uma legião de trabalhadores integrados em prestadores de serviços vários, amiúde trabalhando lado a lado com trabalhadores bancários, mas sem os mesmos direitos. Tema para uma próxima reflexão.

 

19.02.2021 - Jornal Económico

A primeira vez que li a palavra “restruturação” foi num documento de há três décadas, de uma consultora de gestão estratégica, que escrevia sobre a muito necessária restruturação da banca portuguesa. E julgo que compreendi o sentido, então. Segmentar, reforçar competências tecnológicas e marketing, cultura de serviço ao cliente, redesenho dos espaços dos balcões. Recomendava, a consultora, o envolvimento dos trabalhadores, através de seus representantes sindicais em processos que envolviam muito esforço de adaptação e requalificação profissional. Então, como agora, uma busca de mais e melhor. Ênfase na eficácia, e muito menos na eficiência.

 

Os bancos a actuar em Portugal fizeram tudo isso, conseguiram níveis de rendibilidade interessantes no contexto europeu, atraíram capitais e remuneraram condignamente os trabalhadores. Mérito a estes e às equipas de gestão. E à forma como foram envolvendo os diversos interessados e parceiros das empresas bancárias.

 

Ultimamente começaram-se a ouvir os novos arautos, vindos da mesma consultora, da “restruturação imperiosa”. Continuando a usar um anglicismo, veio o ponta-de-lança oficioso avisar que os bancos teriam que fazer uma nova restruturação. Além de ter de ocorrer num curto espaço de tempo, a dita restruturação seria sinónimo apenas de encerramento de balcões e redução de quadros de pessoal.

 

Infelizmente nada se diz sobre renovados modelos de negócio, ou sobre maneiras de combater a desintermediação financeira, o excesso de regulação e os absurdos requisitos de capitais próprios. Nem uma palavra sobre os concorrentes que não empregam, não pagam impostos e operam a partir de praças pouco reguladas. Nada, de nada, sobre a política de taxas de juros nulas do BCE.

 

E, espantosamente, nada diz sobre o papel dos parceiros sindicais nessa restruturação. Nem uma palavra sobre a necessidade de envolver os representantes dos trabalhadores no desenho da banca do futuro. Ignorando como os alemães e nórdicos usam os abundantes recursos da co-gestão para assegurar empresas mais resilientes, com melhores empregos e melhores remunerações accionistas.

 

Claro que alguns bancos pretendem usar por cá a receita míope desta consultora: encerrar balcões e desvincular trabalhadores. Tudo à bruta, ao arrepio da lealdade dos clientes e do esforço e dedicação de décadas dos trabalhadores.

 

Bastava que olhassem para o transporte aéreo, fortemente condicionado em toda a Europa (ao contrário dos bancos não tiveram lucros para apresentar em 2020) e onde em todos os processos de restruturação são envolvidos os sindicatos e as comissões de trabalhadores. Mesmo na TAP se recorreu à concertação de todos para produzir menor dor e acelerar a recuperação da companhia.

 

Não envolver os representantes laborais é sinal de pouca inteligência, falta de visão estratégica ou, porventura, de má-fé. Por isso é importante relembrar aos accionistas o sentimento dos soldados britânicos na Primeira Guerra Mundial, quando sentiam, amargamente, como líderes burros e incompetentes os levavam a uma morte certa. Alguns trabalhadores bancários sentem-se, tal como os soldados de há um século, “lions led by donkeys”.

 

12.02.2021 - Jornal Económico

A semana pretérita foi marcada por notícias, de conteúdo oposto, no que diz respeito à banca a actuar em Portugal. Estudos dizem que a sua reputação está longe de ser admirável, mas ao mesmo tempo há quem ganhe prémios de “melhor empresa para trabalhar”.

 

Num estudo de uma consultora de Marcas e Comunicação, ficámos a saber que nenhum banco granjeia os lugares cimeiros no que toca a reputação ou a admiração dos consumidores portugueses. Marcas alimentares, software e telemóveis, disputando os lugares cimeiros. Automóveis, hospitais privados, depois. No fim da tabela, bancos de retalho. Em linguagem futebolística, diríamos que estão na zona de descida ou a disputar uma liguilha de rebaixamento.

 

O contraste não poderia ser maior quando comparado com os rankings das décadas de 1980, 1990 e no início do século XXI. Tema, decerto, a merecer a atenção dos accionistas, executivos e sindicatos do sector financeiro. E até dos reguladores e dos poderes políticos.

 

Não querendo tomar a nuvem por Juno, e porque a maior parte dos bancos são respeitosos e cumpridores, indago os leitores sobre a natureza destes resultados.

 

Será que é porque em tempos se vendiam produtos de dívida e de capital dos accionistas de controlo, como se produtos de aforro garantido fossem ocultando a sua verdadeira natureza?

 

Será porque há quem menorize os parceiros sociais, recusando-se a admitir que enceta processos de restruturação, impedindo o cumprimento da lei e a participação, ab initio, dos representantes dos trabalhadores?

 

Será que é porque há quem intime os trabalhadores a aceitarem “rescisões por mútuo acordo”, com o anúncio de uma extinção de posto de trabalho ou de um despedimento colectivo? E depois da recusa continuam a “convidar” a ponderar?

 

Será que é porque desrespeitam a lei e a convenção colectiva ao comunicarem (por vezes apenas oralmente) o encerramento do balcão, não dando oportunidade aos trabalhadores de conciliar a vida familiar com a profissional?

 

Será que é porque comunicam que o balcão vai encerrar, mas nada dizem quanto a nova ocupação, transmitindo oralmente ao trabalhador para ficar em casa a aguardar contacto posterior dos Recursos Humanos com proposta de rescisão, violando o dever do empregador à ocupação efectiva dos trabalhadores?

 

Será que é porque às cartas dos Sindicatos a pedirem a suspensão do processo, nunca admitido, de restruturação, enquanto durar o Estado de Emergência, nada respondem?

 

Será que é porque a comunicação social de outros países relata práticas da casa mãe ou suas filiais, identificando-as como assédio moral, as quais são agora replicadas em Portugal?

 

Será porque a comunicação social portuguesa vem dando eco disto tudo?

 

No meio de uma busca incessante de eficiência, insensível às pessoas, ficamos muito desconfiados sobre os “prémios” de “melhor empresa” para se trabalhar. Uma medíocre reputação por parte dos consumidores, trabalhadores atingidos na sua dignidade, a comunicação social a dar nota disso mesmo. Alguém acredita nos “prémios”?

 

05.2.2021 - Jornal Económico

Ainda antes da eclosão da pandemia, o Governo português manifestou a intenção de regulamentar várias matérias emergentes, nomeadamente o trabalho em plataformas e o teletrabalho. Por motivos que ultrapassam o âmbito deste artigo, importa destacar que um e outro ficaram de fora de sucessivas revisões do Código do Trabalho.
  
Mas façamos um pequeno flashback. O desejo de aprofundar o tratamento do teletrabalho, em sede legislativa e regulamentar, pelo reconhecimento da sua importância e do seu crescimento, foi comunicado pelo Governo à Assembleia da República e aos parceiros sociais no final de 2019.
  
Uma vez que se trata de dois temas aos quais somos particularmente sensíveis, desde logo manifestámos o nosso regozijo por esse anúncio, que aliás teve amplo eco na comunicação social na altura. Infelizmente, a verdade é que, desde então, pouco se avançou.
  
Ora, estando todos nós mergulhados numa crise da natureza pandémica cujos impactos se fazem sentir há quase um ano, não deixa de ser desconcertante a omissão legislativa e o recente anúncio de remissão do tema para a negociação e a contratação colectiva.
  
A ideia até poderia ter os seus méritos. Acontece que, ao longo de 2020, os principais sindicatos e federações sindicais tentaram aperfeiçoar e detalhar as condições de prestação do teletrabalho. Como é do conhecimento público, a lei laboral deixa muitas zonas cinzentas, o que não augura nada de bom quando acabarem os sucessivos estados de emergência e a catadupa de legislação decorrente de cada um deles.
  
Da nossa parte, acreditamos que a contratação e a negociação colectiva são pedras basilares do progresso social e económico. Mas convém recordar a originalidade portuguesa de ter querido ferir, de morte, a negociação colectiva, com a adopção de limitações legislativas e uma revisão retrógrada do Código do Trabalho. Uma imposição da troika que não teve outra finalidade que não fosse tornar mais baratos os despedimentos e as horas extraordinárias.
  
Actualmente, para que a negociação colectiva seja valorizada, importa repelir o essencial do que os nossos credores nos impuseram: nomeadamente as indemnizações pouco decentes, a caducidade das convenções colectivas, e a negação do princípio do tratamento mais favorável para os trabalhadores. Neste âmbito, importa salientar que esteve bem a Assembleia da República ao aprovar, recentemente, a suspensão temporária da caducidade da convenção coletiva. É um primeiro passo, ainda tímido, mas na direcção adequada.
  
Regressando ao teletrabalho, tal implica custos acrescidos para os trabalhadores desempenharem as suas funções. Estes encargos, como nos parece óbvio, por todos os motivos, deverão ser suportados pelos empregadores. Nessa medida, temos colocado o tema em cima da mesa em contratação colectiva. Infelizmente, a oposição tenaz dos empregadores tem sido a nota dominante. Uma posição, importa notar, em contraciclo com o que se faz pela Europa fora.
 
Acreditamos que se trata de uma reivindicação justa e razoável. Os trabalhadores têm de ser ressarcidos dos custos em que incorrem em teletrabalho. Perante o bloqueio, compete ao Governo dirimir o conflito pela via legislativa.
  
29.1.2021 - Jornal Económico

Eis-nos mergulhados de novo em período de confinamento. Infelizmente, tudo indica que medidas mais duras e com maior impacto económico ainda serão necessárias. Por isso, paira entre nós uma certa sensação de frustração e desânimo. Como foi possível chegar aqui?

 

Os bancários têm sido cidadãos cumpridores, se outra razão não existisse pela exigência decorrente de serem uma classe profissional na linha da frente. Mas somos humanos, como todos os portugueses. Esta pandemia também nos tem causado fadiga, dificuldade em separar a vida pessoal da vida profissional, a necessidade de saber desconectar, o afastamento dos nossos familiares, entre tantas outras maleitas.

 

Como a qualquer cidadão. Mas cumprimos, por treino profissional e por sentido cívico. Com muito orgulho, importa frisar. E exortamos todos os cidadãos a cumprirem o confinamento, sem busca de excepções artificiais ou a desvalorização dos enormes riscos colectivos.

 

Exigimos, por isso, às empresas em que trabalhamos que respeitem o espírito da letra da lei, no que toca ao teletrabalho. O teletrabalho tem de ser uma realidade, sem contemplações ou subterfúgios. No limite do possível, bem entendido, para não prejudicar os nossos clientes. A nossa exigência não é um capricho. É a responsabilidade social das empresas que assim o determina.

 

Acreditamos na centralidade da pessoa humana, alfa e ómega do trabalho e das relações sociais. Acreditamos também que deriva desta centralidade o princípio do Bem Comum. Nessa medida, fazer o Bem à comunidade (trabalhadores, clientes, fornecedores, accionistas, Estado, entre outros) tem de ser a medida de referência para os dirigentes, para todos aqueles com responsabilidade de gestão.

 

Acreditamos igualmente que o trabalho tem um valor económico e moral, porque é promotor de justiça social e das dimensões social e individual da pessoa humana.

 

Por isso, percebemos mal que grandes instituições, empresas líder de mercado, resilientes, tenham a ousadia de manter processos de restruturação em plena pandemia. E que se prestem a jogos semânticos e a comunicados de imprensa tentando escamotear uma prática aberrante em contexto de emergência nacional.

 

Na Carta Encíclica “Fratelli Tutti”, sobre a fraternidade e a amizade social, o Santo Padre Francisco exorta-nos a sermos todos irmãos. Um apelo que o seu antecessor subscreveria sem estados de alma. E é nestes momentos que o teste do algodão é feito. Somos consequentes ou procuramos iludir o princípio do Bem Comum e da proporcionalidade?

 

22.1.2021 - Jornal Económico

Eis-nos de novo em confinamento para travar a propagação da pandemia. Inevitavelmente, a recuperação económica vai ser colocada em causa. Um mês de confinamento implicará 15.000 milhões de euros de produto perdido e provavelmente muitas dezenas de milhares de postos de trabalho. Por isso, e para evitar uma tragédia, importa repensar as moratórias dos empréstimos e introduzir moratórias sobre despedimentos.

 

O Presidente da República esteve bem ao salientar que as moratórias sobre os créditos concedidos pelo sistema financeiro deveriam continuar até 2023-2024, de forma que o PIB recuperasse para os níveis de 2019. Marcelo Rebelo de Sousa percebeu, parcialmente, o dilema da questão. Mas, permitam-me afirmar com clareza, não chegará. Vai ser preciso ir mais além.

 

Portugal, a par do Chipre, Itália e Grécia, é um dos países europeus onde o crédito em moratória tem maior proporção face ao crédito total concedido pelo sector bancário. A proporção portuguesa é sete vezes superior à espanhola, por exemplo. Na União Europeia, quase 900 biliões de euros de crédito estão em moratória. Mas no caso português a dimensão atinge uma escala proporcional que não tem respaldo na Europa dos grandes países. Por isso convém actuar, desde já, para não sermos confrontados com resultados e medidas europeias que fragilizem as pessoas, as empresas e os bancos em Portugal.

 

A densidade da fileira turística e a estrutura económica assente em PME, explicam grande parte do que acontece nos países do sul da Europa. Mas o contraste com a Espanha, com um modelo de especialização económica similar ao nosso, não poderia ser mais evidente.

 

Temos que actuar sem tibiezas, como fizeram os responsáveis políticos espanhóis. Ir além das directrizes da Autoridade Bancária Europeia e conceder uma garantia estatal para as moratórias. Tal como estão, com a incerteza e os custos a recair sobre os bancos, teremos, uma vez mais, um potencial risco sistémico sobre o sector financeiro.

 

Adicionalmente, porque bancos e bancários prestam serviço público, e continuarão a prestar no novo confinamento, é de toda a urgência introduzir uma moratória nos processos de redução de número de trabalhadores bancários, quer através de rescisões, quer pela via de reformas antecipadas. A exigência de uma garantia estatal, e do prolongamento dos prazos, das moratórias, essencial para não comprometer a recuperação económica no período pós-vacina, terá de ter uma forte restrição sobre os ditos processos de restruturação bancária. É um imperativo moral e terá de ser legal, se necessário. Têm a palavra o Governo e a Assembleia da República.

 

15.1.2021 - Jornal Económico

Desde a primeira hora, fiéis à matriz e aos valores humanistas fundadores dos sindicatos, que nos temos batido pela moldura criminal do assédio no local de trabalho. Quando outros se dedicavam a ser correias de transmissão de interesses alheios aos trabalhadores, o Sindicato Nacional dos Quadros e Técnicos Bancários (SNQTB) contribuiu para que opinião pública e legisladores tomassem consciência da importância de lutar contra o assédio.

 

Todos nos lembramos do caso extremo de Cristina Tavares, operária corticeira, cabeça de casal em família monoparental, discriminada reiteradamente por parte da entidade patronal. Honrando a justiça portuguesa, sucessivos juízes e instâncias têm condenado a empresa, em decisões transitadas em julgado.

 

Não se pense, contudo, que o caso de Cristina Tavares é um episódio isolado. Ou que situações como a sua se passam apenas no contexto de uma PME fabril. Infelizmente, é também uma realidade no contexto dos serviços e dos trabalhadores dos sectores de conhecimento intensivos. Por isso, é importante que este tema seja discutido em sede do Conselho Económico e Social, seja no continente, seja nas regiões autónomas.

 

Também por isso o SNQTB criou uma linha de denúncia, garantindo segurança, confidencialidade e protecção aos denunciantes. Numa iniciativa pioneira, a que a comunicação social tem dado, e bem, destaque. Mas com sentido de responsabilidade, advindo de as denúncias necessitarem de ser assentes em elementos probatórios sólidos. E não serem elas próprias fontes de assédio, agora de sentido ascendente.

 

Compete às empresas fornecerem o treino, a qualificação e a certificação para que os gestores de linha e de recursos humanos sejam capazes de detectar, prevenir e actuar prontamente sobre comportamentos tóxicos, destruidores de valor accionista e atentatórios dos valores fundamentais da dignidade humana.

 

O sector financeiro foi capaz de lidar com os códigos de conduta voluntários, primeiro, e depois com as exigências dos reguladores e legisladores, dotando-se de competências e quadros de pessoal, infra-estruturas, software e processos para a prevenção do branqueamento e lavagem de capitais.

 

Exigimos o mesmo rigor, compromisso e envolvimento da gestão de topo, no combate às práticas de assédio moral, e uma liderança inequívoca pelo exemplo. Lideranças essas que não podem eximir-se a responsabilidades que não são endossáveis a responsáveis intermédios e a alegados casos isolados.

 

8.1.2021 - Jornal Económico

Recentemente veio a público a notícia da redução da pensão de reforma de um antigo banqueiro, fundador inovador e emérito de um banco relevante no sistema financeiro português. Mas esta aparente boa notícia esconde um problema muito mais grave, de natureza sistémica.

 

Aqui e acolá vamos percebendo que alguns anos de serviço como administrador, ou presidente executivo de um banco, deram origem, desde os anos 1990 até há poucos anos, a generosas pensões de reforma, nos antípodas das regras atinentes aos fundos de pensões dos bancários. Como que a fazer jus a pensadores liberais que dizem que os inimigos de uma sociedade livre, mais justa e democrática, estão por vezes na liderança das instituições.

 

Pensões vitalícias calculadas com base nos últimos vencimentos, inclusão de prémios referentes a anos de ouro sem a correspondência de medidas de mitigação (políticas de clawbacks e malus), entre outras más práticas usadas para o aparente cálculo de valores a pensionar. Tal como outrora acontecia para os detentores de cargos políticos, um punhado de anos de serviço deram azo a reformas cujas regras de atribuição são difíceis de serem explicadas a trabalhadores, clientes e pequenos accionistas. Regras que não foram objecto de debate público. E porque estas reformas milionárias, absurdas, desafiando o bom senso e a razoabilidade, nada têm a ver com o mérito ou com a premiação que desempenhos excepcionais devem ter. As reformas milionárias são pagas pelos fundos de pensões (e com a capacidade contributiva dos bancos) dos trabalhadores bancários, o que torna tudo isto mais relevante.

 

Mas um outro ataque, insidioso, está a ser preparado às carreiras e às reformas dos bancários. Ao contrário dos demais trabalhadores abrangidos pelo regime geral da Segurança Social, os bancários, que foram integrantes da antiga Cafeb, estão duplamente desprotegidos. Estão a ser massacrados com propostas, abruptas, de término de sua carreira, quer através de reformas antecipadas quer através de propostas de rescisão por mútuo acordo. Menos, ou ausência, de rendimento presente e menos, muito menos, pensão de reforma no futuro.

 

Uma reforma antecipada, num momento em que as despesas de educação dos descendentes ou da prestação da casa ainda se fazem sentir, e para o qual nada preparou a classe bancária para um encurtamento brutal da carreira e para a quebra de rendimentos que se seguirá.

 

Ou para uma saída do sector, via uma rescisão negociada e apresentada amiúde com única solução. Nestes casos, uma perda de valores de pensão de reforma nunca inferior a 40 por cento do que aconteceria se a reforma acontecesse dentro do sector bancário. E que pode chegar a ser superior a 70 por cento se o ex-bancário tiver de optar, aos 57 anos, por uma reforma antecipada. O que não tem similitude com nenhum outro trabalhador abrangido desde sempre pelo regime geral da Segurança Social.

 

Uma saída da banca, por despedimento colectivo, extinção de posto de trabalho ou por mútuo acordo tem sempre uma perda de rendimentos, presentes e futuros, para o bancário. E, pormenor não despiciendo, um ganho para o fundo de pensões sob a forma de menores contribuições futuras das entidades empregadoras.

 

Uma sociedade que se indignou com as reformas generosas de quem prestou serviço por um punhado de anos apenas, deve também indignar-se pelo ónus que está a ser imposto aos trabalhadores bancários. Que pagam essas reformas imorais e ficam sem a sua.

 

31.12.2020 - Jornal Económico

Diz o senhor Presidente da República que a pandemia e a crise económica que se seguiu acarretam o perigo de desatar os nós invisíveis que fazem uma sociedade coesa. A coesão social, aquele cimento que nos faz aceitar as regras democráticas, o respeito pelos direitos de outros, e que introduz previsibilidade e confiança nas relações sociais, laborais e comerciais.

 

Outros observadores e dirigentes políticos têm afirmado o mesmo.

 

Têm todos razão. Contudo, a principal ameaça deriva não apenas da pandemia, que a todos toca, mas também da distribuição muito assimétrica dos efeitos da crise económica que se seguiu e seguirá por tempo ainda difícil de descortinar. E da nossa, aparente, incapacidade para atenuar de forma significativa a perda daqueles que tudo, ou quase tudo, perderam na área da cultura, recreio, desporto, restauração, trabalhadores imigrantes, profissionais liberais, entre tantos outros. Todas as crises deixam efeitos assimétricos, mas provavelmente a pandemia acentuará esta assimetria a níveis nunca antes imaginados.

 

Neste panorama, não posso deixar de considerar que os bancários têm estado particularmente bem. Num primeiro momento, que até hoje se prolonga, mantendo os postos de atendimento abertos e ao serviço do público. Balcões, sucursais, centros, serviços centrais, quaisquer que fossem os nomes, continuaram abertos e a fornecer liquidez, operacionalizar moratórias, gerir poupanças, entre tantas funções centrais de um sistema bancário moderno. E foi feito, tudo isto, no meio dos mesmos medos e incertezas que todos os cidadãos sentiram.

 

Adicionalmente, milhares de bancários são, por todo o país, cidadãos empenhados nas causas cívicas e solidárias. Participando com o seu tempo, empenho e conhecimento, no desenvolvimento das atividades de centenas de IPSS, agremiações locais as mais das vezes. Por eles, e com eles, chegam um pouco mais longe os esforços e os contributos de solidariedade de toda uma classe. Porque todas as sociedades, mesmo as mais justas e prósperas, precisam de uma rede complementar que concretize o Estado Social.

 

No meio desta rede que potencia a noção de Estado Social e a Democracia, gostaria de salientar os esforços da Fundação Social Bancária.

 

No ano em curso, fazendo jus ao esforço redobrado de solidariedade que se impõe, tem tido uma presença ainda mais acutilante de apoio às IPSS regionais e locais. Sem descurar o reforço da sua atuação direta na igualdade de oportunidades de acesso à educação superior e na mitigação dos casos de emergência social. Estão de parabéns os bancários, mais uma vez, pelo apoio em crescendo que têm dispensado à Fundação Social Bancária.

 

Está na mão de todos ajudarem a que a sociedade não desfaça os laços que a todos nos mantêm unidos e em paz.

 

24.12.2020 -  Jornal Económico

Chegados aos últimos dias do ano, encerra-se um longo processo negocial respeitante ao Acordo Colectivo de Trabalho (cláusulas de expressão pecuniária e demais cláusulas), na banca em Portugal.

 

Num processo que tinha tudo para ter sido concluído de forma bem mais célere, pela preparação do processo e empenho, colocados por sindicatos e pelo grupo negocial das instituições de crédito, não fora a pandemia e a emergência sanitária, que num primeiro tempo concentrou todas as atenções.

 

No que toca às cláusulas de expressão pecuniária, conseguiram-se importantes progressos feitos em matéria de tabelas remuneratórias, activos e reformados, subsídio de natalidade e subsídio de almoço. Reconhecendo as dificuldades de um ano atípico, com elevada disrupção sobre as actividades clássicas de intermediação e aconselhamento financeiros, foram conseguidas actualizações nominais, tanto mais relevantes quando lidas em simultâneo com a progressão do índice geral de preços ao consumidor. Pela segunda vez consecutiva, os bancários terão ganhos reais de poder de compra. O esforço combinado (numa novidade, em mais de 37 anos) de todos os sindicatos outorgantes, filiados da USI e da UGT, permitiu o resultado alcançado.

 

Sinal de maturidade cívica e sindical, onde novas lideranças conseguem concertar esforços para o bem comum. Rompendo com o paradigma da desunião que nunca terá aproveitado aos trabalhadores bancários.

 

Foi também o reconhecimento do papel cívico, corajoso e profissional dos bancários durante a pandemia, coesos e firmes nos seus postos de trabalho, prestando um verdadeiro serviço público à comunidade e ao país. País que por vezes maltrata bancos e bancários, impondo limites à actuação e limitando a sua capacidade de gerar receitas, num processo sem paralelo na Europa. Que no limite dificultam condições de exploração, rendibilidade e empregabilidade daqueles que em Portugal têm a sede, aqui geram emprego qualificado e dignificam o trabalho sindical.

 

Nas cláusulas relativas às condições de trabalho, as instituições de crédito tiveram medo de ser liderantes e darem um exemplo ao país, via contratação colectiva, preferindo esperar pelas iniciativas legislativas, governamentais ou da Assembleia da República, e por um eventual acordo em Concertação Social.

 

Um medo que paralisou os empregadores e impediu que fossem os bancários a dar um exemplo de como regulamentar, devidamente, temas como o teletrabalho, para citar apenas um exemplo.

 

Se alguma coisa este longo, demasiado longo, processo negocial demonstrou, é que independente das condições económicas, sanitárias ou políticas, para chegar a um Acordo, é condição necessária e suficiente a vontade; a vontade não tolhida pelo medo. A mesma vontade que foi capaz de trilhar o mais habitual (tabelas pecuniárias), deveria ter sido audaz e capaz nas demais matérias.

 

Basta a vontade e o Acordo será também possível em 2021. Que o medo não tolha os empregadores, são os nossos votos.

 

18.12.2020 - Jornal Económico

A Associação Mutualista Montepio é a maior e provavelmente a mais antiga associação mutualista de Portugal. Fundada em 1840, como lembra sempre de forma orgulhosa, esta Associação Mutualista foi pioneira no tipo de apoios que introduziu na sociedade portuguesa, nomeadamente no âmbito das soluções de poupança e de proteção social. Atualmente com mais de 600 mil associados, para o bem ou para o mal, a sua relevância na sociedade portuguesa é incontornável.

 

Ora, a designação Montepio tem sido presença assídua e recorrente na nossa comunicação social. Acontece que muitos portugueses, não tendo o dever de estar informados com maior detalhe, fruto da similitude de nome entre o Banco e a Associação Mutualista, julgam ser uma única entidade, quando, na verdade, são duas realidades distintas.

 

O Banco Montepio é um ativo estratégico para a Associação Mutualista Montepio, não só porque é o acionista maioritário, mas também porque os associados são também eles próprios clientes do banco. Acresce que, pela sua relevância, a Associação Mutualista Montepio e o Banco Montepio são instituições de interesse para os portugueses, em geral. Por estas e por outras razões, o bem-estar, a solvabilidade e as perspetivas de desenvolvimento futuro da Associação Mutualista interessam a todos os portugueses e não apenas aos que nelas estão diretamente envolvidos.

 

Face ao exposto de forma sucinta, a discussão na praça pública, claramente a destempo, de temas organizacionais e de questões estratégicas da esfera da Associação Mutualista é algo que apenas interessa a um punhado de aventureiros e aos inimigos de uma sociedade civil robusta. Naturalmente, há quem queira apalpar terreno e contar possíveis espingardas em batalhas futuras, mas não é esse o interesse comum e, digo-o sem hesitação, o interesse nacional.

 

Não me interpretem mal. A discussão de projetos e de propostas alternativas é um elemento central dos processos democráticos, do debate que lhe está associado e do progresso das sociedades. Acresce que a liberdade de expressão e os atos eleitorais são cruciais nas democracias modernas.

 

Tudo tem, no entanto, um tempo e um modo próprios. Fora dos calendários eleitorais percebe-se mal que haja quem o queira fazer, dado o grau de aventureirismo e os riscos inerentes de potencial desestabilização.

 

Por tudo isto, só posso concluir e afirmar que estou convicto que os associados da Associação Mutualista e os trabalhadores do Banco Montepio não deixarão de estar atentos e de penalizar aqueles que, numa lógica fora do tempo próprio e do interesse de longo prazo, não olham a meios para alcançar os seus fins particulares.

 

Nesta altura, recato e contenção é o que se exige. Quem não o perceba dificilmente está habilitado para dirigir o futuro da Associação Mutualista.

 

11.12.2020 - Jornal Económico

Matrimónio. Trabalho. Aquisição de habitação ou de automóvel. Partilhas. Estes são apenas alguns dos muitos aspectos da vida em sociedade que são regulados por contratos. Todos esperamos que os contratos sejam respeitados e honrados. A violação, retrospectiva de contratos, sob qualquer pretexto, sabemos que nos conduz ao imprevisível.

 

Na construção filosófica do Estado moderno, tal como formulado pelos Iluministas, a autoridade absoluta de reis, príncipes e bispos, foi substituída por leis universais que a todos se aplicam, sem distinção de estatuto social.

 

Os cidadãos concedem ao Estado o privilégio e o monopólio da defesa interna e externa, a representação face a terceiros Estados e a administração das leis e da justiça. São estes os pilares de um Estado moderno. Um Estado que arbitra disputas, que se baseia no Direito Natural (e não em qualquer suposta interpretação de um Direito Divino) e na igualdade de todos perante a lei.

 

Um Estado que dá o exemplo e se norteia por elevados padrões éticos, procurando sempre o Bem Comum.

 

Tudo isto a propósito da rábula parlamentar em torno de quase certa nova injeção no Novo Banco, por parte do Fundo de Resolução. Em 2014 fomos dos poucos que escreveram que ao velho BES deveriam ser afectos a totalidade dos créditos da sua carteira e ao Novo Banco os depósitos e uma base de capital sem ónus ou legados. E que o Novo Banco deveria ficar, temporariamente, na esfera pública. Financiando, prioritariamente, as PME e microempresas portuguesas. Hoje parece óbvio que assim deveria ter sido. Mas não é isso que está em causa.

 

Os trabalhadores, e provavelmente os clientes, os fornecedores e os obrigacionistas, sentem que o seu Novo Banco é uma arma de arremesso político. Num jogo perigoso, em que alguém parece querer colocar na berlinda a viabilidade de milhares de postos de trabalho, no banco e nas empresas suas clientes. Ignorantes que são do potencial de um choque sistémico, cuja magnitude pode ser similar ao de uma pandemia.

 

Um arremesso político jogado por incautos que querem fazer tábua rasa dos contratos e compromissos da República Portuguesa.

 

Nada temos contra auditorias. Mas se permitirmos que contratos, livremente celebrados entre as partes, sejam rasgados pela República, nada mais estará a salvo.

 

Está nas mãos dos cidadãos mostrarem o seu repúdio por jogadas políticas que em nada os beneficiam. Os trabalhadores bancários estão fartos de serem vilões de culpas alheias.

 

04.12.2020 - Jornal Económico

Chefias que anunciam que fulano está supranumerário e que pode aguardar em casa, que um contacto posterior lhe será feito para lhe ser apresentada uma proposta de rescisão.

 

Era uma vez um banco oriundo de uma pequena, mas próspera região peninsular. E que se fez grande, em duas décadas.

 

Um banco que soube ser paciente, esperando por momentos de crise de outros, para crescer por aquisições e absorções, não raras vezes a pedido das autoridades.

 

E assim, pé ante pé, saltou de uma mera relevância regional para um potentado no seu país, primeiro; no país vizinho (o nosso) depois; seguiram-se a Europa e as Américas.

 

Um banco que soube, como poucas empresas no mundo, cultivar os círculos da ciência e da educação universitária, com isso ganhando relevância, notoriedade e capital afectivo junto dos círculos de poder e de opinião publicada.

 

Mas um banco que por lusas paragens, talvez recebendo não bons ventos do país vizinho, parece querer alinhar numa reestruturação, púdico eufemismo para o desemprego de centenas de trabalhadores bancários. Os mesmos que conseguiram que esse banco fosse um marco na rendibilidade e serviço aos clientes.

 

Trabalhadores que não se conformam a que a sua empresa bancária seja vista, pelos accionistas, numa lógica meramente extractivista que teria feito as delícias de uma qualquer Companhia das Índias de tempos idos.

 

Chefias que anunciam que alguém está supranumerário, ignorando os deveres que competem aos empregadores. Reuniões de apresentação de condições de rescisão, primeiro, e de comunicação de decisão por parte do trabalhador. Com este a recusar, uma e outra vez, a ‘oferta’. E a chamada telefónica, algum tempo depois, indagando se não quer mudar a posição, pois a intransigência não parece sensata. Talvez ignorando que assédio moral é coisa feia, indigna e criminalmente punida.

 

Onde em violação das leis da República os trabalhadores são deslocalizados, geograficamente, sem terem direito ao pré-aviso que permita reconstituir as deslocações e a conciliação com obrigações familiares e escolares.

 

Num banco que nos habituámos a admirar, este comportamento deverá ser de molde a questionarmos os notáveis, a opinião publicada e os círculos dos decisores políticos, até agora próximos do banco, se se revêem neste comportamento.

 

Porque nós não alinhamos na violação de leis e de direitos. Tal como nunca nos eximimos aos nossos deveres.

 

27.11.2020 - Jornal Económico

É fácil detectar nas imediações dos centros comerciais e dos seus restaurantes, ou dos grandes edifícios de escritórios, um exército de caras tristes, olhando fixamente para o telemóvel, nas suas motas ou carros com autocolantes TVDE. São a face mais visível da economia do biscate. Uma parte muito significativa deles, provavelmente esmagadora, fazem desta actividade a sua profissão única. Verdadeiros trabalhadores dependentes e subordinados, em tudo menos no nome. Cabisbaixos e explorados, mas trabalhadores essenciais em períodos de confinamento.

 

Num modelo de negócio em que não usufruem de salário mínimo, de duração máxima da jornada de trabalho, ou protecção na saúde ou social, passavam, pré-pandemia, 30% ou 40% do seu tempo em modo de ‘espera’, em que estão disponíveis, mas não estão a ser remunerados por essa espera e disponibilidade.

 

Um modelo em que os lucros se acumulam em Silicon Valley, mas os trabalhadores são portugueses ou aqui residentes. Um modelo que enxameia a cidade de veículos em circulação constante, sendo responsáveis por uma fatia imensa de congestionamento e poluição urbana.

 

Há poucos dias atrás, a Califórnia levou a referendo um conjunto de propostas legislativas, entre as quais a infame Prop 22. Apesar do apoio ao voto de ‘não’ de Joe Biden e Kamala Harris, entre muitos notáveis democratas, um inédito montante de 224 milhões de dólares foi aplicado na campanha do ‘sim’ por parte de empresas de “Transporte Individual e Remunerado de Passageiros em Veículos Descaracterizados a partir de Plataforma Electrónica” (TVDE) ou de entrega de comida. Uma grande parte investida em anúncios nas televisões e nas redes sociais, superando os valores investidos na recente campanha presidencial!

 

Esta Prop 22 vem, na prática, repelir a eficácia da Assembly Bill 5 (AB5) da Califórnia, que impunha que as empresas considerassem os falsos trabalhadores independentes com direitos típicos dos trabalhadores por conta outrem. Salário não inferior ao salário mínimo nacional, acesso ao subsídio de desemprego, a um seguro de acidentes de trabalho, entre outros, são coisas que os falsos independentes terão dificuldade em ter acesso.

 

Pior do que o poder do big money, a aprovação da Prop 22 vem legitimar um modelo de negócio, baixando os riscos e os custos futuros que estes negócios das plataformas enfrentam. E estabelece um precedente perigoso, rumo a uma maior precarização dos trabalhadores.

 

Felizmente que em Nova Iorque, e um pouco por toda a Europa, a tendência legislativa parece ir em sentido de proteger estes trabalhadores e atenuar os efeitos perniciosos da desregulamentação.

 

É muito importante que o Governo e a Assembleia da República concretizem, quanto antes, um dispositivo legal para que a acumulação de lucros não se faça à custa dos trabalhadores residentes e imponha um conjunto mínimo de direitos a estes trabalhadores fragilizados e essenciais.

 

20.11.2020 - Jornal Económico

Queixar-se-ão alguns da impreparação e falta de assertividade no reforço do Serviço Nacional de Saúde (SNS). Pessoalmente queixo-me de um acto legislativo que, por omissão grosseira, desprotege os trabalhadores e permite o triunfo do abuso.

 

Todos perceberam que existiria uma segunda vaga, pior que a primeira. Disseram-nos os epidemiologistas e relembraram-no os historiadores (pela analogia com a gripe espanhola).

 

Tivemos seis meses para nos preparar e reforçar o SNS para esta segunda vaga: recrutar enfermeiros, suprir as saídas por reforma dos médicos, aumentar as equipas de testagem e monitorização de quarentenas, e alojar em hotéis (agora vazios) aqueles trabalhadores dos lares e demais serviços essenciais que vivem em alojamentos sobrelotados, onde o distanciamento social é impraticável.

 

Foi o teletrabalho adoptado, novamente, com força legal. Medida inteligente, sensível, não obstante os perigos de perda do sentido social do trabalho e da disrupção que isso pode causar em empregos de prestação serviços presenciais. Estamos conscientes disso.

 

Claro que a obrigatoriedade de ser exercido numa lista, mutável, de pouco mais que uma centena de concelhos, adiciona incerteza e imprevisibilidade num processo que as dispensava.

 

Depois, conceder às empresas a possibilidade de, fundamentando, recusar o teletrabalho, nos moldes em que está legislado, é uma coisa digna de amadores. Pois que tem de ser o trabalhador, individualmente, e não qualquer estrutura representativa dos trabalhadores (como os sindicatos) a deduzir oposição, num muito curto prazo de três dias úteis, para a Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT). Que tem igualmente um prazo curtíssimo para verificar da exequibilidade da queixa apresentada.

 

Não obstante o profissionalismo e o sentido de serviço público dos seus trabalhadores, a ACT não poderá estar dimensionada para este reforço inopinado de competências em plena pandemia. Receamos que seja excessivo querer que seja a ACT a última linha de defesa.

 

O resultado vai ser o esperado: os trabalhadores, individualmente considerados, terão fundados receios de reclamar e várias empresas estarão a obstaculizar o teletrabalho para as mesmas funções e posições em que o autorizaram na primeira fase. Já ouviram falar em equipas em espelho e providenciar condições tecnológicas para que o teletrabalho se possa realizar?

 

Por isso, não me queixo de um reforço do SNS que poderia e deveria ter sido mais intenso e assertivo. Queixo-me, isso sim, daqueles que por impreparação, omissão ou obediência a eventuais interesses inconfessáveis, propiciam que o abuso triunfe e que reduzem a eficácia de mais um quase-confinamento.

 

13.11.2020 - Jornal Económico

Está em consulta pública o anteprojecto do Código de Actividade Bancária (CAB). Porém, mais importante, seria o Banco de Portugal começar por divulgar o relatório “Costa Pinto”, sobre a actuação do regulador, nomeadamente do governador em funções na altura, no caso ESFG/BES e no desfecho que conduziu à resolução em Agosto de 2014.

 

A capacidade de ser transparente é fonte de legitimidade quando se procede a uma consulta pública sobre um anteprojecto que terá que ser aprovado pelo Parlamento e quando se pretendem poderes muito mais alargados do que aqueles que os cidadãos têm concedido, até agora, ao regulador.

 

Isto dito, esteve bem o regulador ao sujeitar a consulta pública o anteprojecto que o dotará de mais instrumentos de actuação na área da supervisão comportamental. Se aprovado, será um passo positivo porque vem obrigar a maior transparência das estruturas de participação social dos grupos de accionistas relevantes.

 

Igualmente importante, será positivo porque proíbe a concessão de crédito para a aquisição de instrumentos financeiros dos próprios bancos ou dos seus accionistas de referência. Acresce que tem sentido, e reduz a complexidade, criar uma tipologia única de sociedade financeira, com capital social escalonado em função do objecto autorizado, bem como dotar o regulador da capacidade de impor multas diárias relevantes. Tal como é importante limitar a colocação de instrumentos financeiros próprios em clientes de retalho, ainda que o limiar de 100 mil euros pareça decalcado de outras praças financeiras e possa ser muito restritivo.

 

É igualmente interessante a menção expressa à possibilidade de proibição dos bancos operarem com jurisdições pouco cooperantes em matéria de partilha de informações, mais relevantes no caso da prevenção do terrorismo e branqueamento de capitais. Mas, nesse caso, o que dizer de praças financeiras, algumas europeias, que demoram anos a responder a cartas rogatórias da justiça portuguesa sobre coisas como beneficiários efectivos de contas e movimentos financeiros? Onde está a “lista negra” dos países pouco cooperantes?

 

Porém, conferir ao regulador o poder de afastar accionistas, forçando a venda de posições ou inibindo de forma provisória os seus direitos de voto, com base em suspeitas sobre a sua idoneidade ou incapacidade de os acionistas dominantes fazerem aumentos de capital ou tomarem empréstimos subordinados, já nos parece um passo menos amadurecido. Creio ser uma pretensão muito marcada por um caso específico e, repito, o famoso relatório “Costa Pinto” pode não legitimar este reforço pretendido de poder.

 

Como sempre, esta consulta pública é bem-intencionada, mas o diabo está nos pormenores, e não resulta óbvio que estejam suficientemente garantidas as liberdades e direitos constitucionais. Sabemos que iremos colocar na mão do regulador mais competências e poderes, que poderemos dificultar a atratividade de captação de capitais para a banca e que bancos com sede em Portugal terão dificuldades adicionais face aos concorrentes sediados fora do país.

 

O anteprojecto deveria ter sido precedido de um relatório onde o regulador clarificasse que tinha aprendido com os processos BPP, BPN, ESFG/BES, fizesse uma demonstração inequívoca que tinha diminuído a sua dependência em relação a processos declarativos e que tinha igualmente adquirido as competências de investigação e preditivas verdadeiramente preventivas. Tal não aconteceu.

 

Ainda assim, como cidadão e bancário, relevo a qualidade técnica do documento e a sua oportunidade. Contudo, importa frisar, legislar apenas não chega.

 

06.11.2020 - Jornal Económico

Agora que se assiste a notícias sobre alegadas reestruturações na banca em Portugal, três coisas têm de ser ditas: não temos bancários a mais em Portugal; não temos balcões em excesso e os bancos são lucrativos!

 

De facto, e quem o diz é o Banco de Portugal, o emprego bancário português está abaixo da média europeia. Temos um pouco mais de quatro bancários por cada mil trabalhadores em Portugal, contra mais de cinco na média europeia. Ou seja, estamos cerca de vinte pontos percentuais abaixo.

 

E quanto aos balcões? Sendo certo e sabido que alguns encerramentos, principalmente do banco público, vieram limitar as opções das famílias e das comunidades, sobretudo no interior de Portugal, quanto ao acesso a serviços bancários e financeiros, convém relembrar que temos menos, muito menos, balcões que em Espanha e comparamos bem com a Itália e a França. Numa escala relativa, claro.

 

E, finalmente, o retorno dos capitais próprios empregues, na banca em Portugal, é positivo e muito acima do retorno que oferecem outras classes de activos. Compara muito bem com as obrigações e a dívida quer da República Portuguesa quer da emitida pelas melhores empresas a operarem na Europa, e está no percentil 60% no que ao rácio da margem financeira/produto bancário diz respeito.

 

Percebe-se mal este afã de querer anunciar uma vaga de despedimentos como se coisa inevitável se tratasse. Percebemos que querem condicionar a opinião pública, através de coisa publicada, procurando diminuir a vontade de resistir dos trabalhadores e dos sindicatos. Não contem connosco para nos deixarmos seduzir com tamanha pobreza argumentativa!

 

Finalmente, uma nota sobre o Orçamento do Estado. Nota positiva quanto ao novo apoio social para os mais expostos a situação de pobreza e nas regras mais flexíveis, conjunturalmente, de acesso ao subsídio de desemprego. Nota positiva também quanto à redução do IVA nos escalões mais baixos de consumo doméstico de electricidade; na redução da retenção na fonte do IRS ou na manutenção dos impostos especiais sobre consumo.

 

Sobre a menor ênfase quanto aos estímulos às empresas e ao investimento, deixamos a outros que não sindicatos, opinarem sobre tal.

 

Curioso ler que estão previstos 160 milhões de euros em dividendos oriundos da CGD. A mesma instituição que parece querer abandonar métodos graduais de reestruturação e por acordo entre as partes, para enveredar por abordagens mais musculadas, sem que se descortine qualquer racionalidade económica.

 

Finalmente estive esta semana no programa “Tudo é Economia” da RTP, verdadeiro serviço público, onde as ideias podem ser explanadas sem que o sensacionalismo se procure sobrepor. Aliás, tal como nas páginas deste jornal, um espaço onde a opinião é livre e a informação não é enviesada.

 

30.10.2020 - Jornal Económico

Há alguns dias atrás foi conhecida a intenção do Governo de propor à Assembleia da República a suspensão temporária da caducidade da contratação colectiva. Trata-se de uma medida no sentido certo, mas que infelizmente peca por defeito. É preciso ir mais longe e acabar com a caducidade das convenções colectivas, protegendo assim, de forma robusta, os direitos laborais e sociais dos trabalhadores em Portugal.

 

À primeira vista, o tema poderá não parecer muito relevante para o leitor. Na verdade, é da própria saúde e da qualidade da nossa democracia que estamos a falar. Isto porque qualquer democracia consolidada assenta na existência de uma classe média sólida. Sem aforro, elevados níveis de escolaridade, acesso universal a cuidados de saúde, e a defesa dos direitos dos trabalhadores, a classe média definha e com ela o próprio regime democrático.

 

De forma muito abreviada, é também por isto, ainda que não apenas por isto, que a sindicalização tem sido vital para uma mais equilibrada repartição do rendimento, entre capital e trabalho, e para a melhoria das condições de trabalho e aposentação, para os trabalhadores por conta de outrem.

 

Ora, o actual Código de Trabalho tem uma disposição particularmente gravosa sobre a temática da denúncia e caducidade das convenções colectivas, e urge repelir como medida da mais elementar justiça social, no país que sujeito a ela é o mais desigual da União Europeia.

 

Tal como está, a norma empobrece trabalhadores, os portugueses e outros residentes em Portugal, e enriquece accionistas, em grande parte capital estrangeiro.

 

Estranho e desigual país este que desprotege seus cidadãos e a saúde do seu próprio regime democrático.

 

Sejamos muito claros. As relações laborais devem alicerçar-se no respeito institucional das diferenças entre as partes, na negociação, na tentativa de melhorar condições de trabalho e de exploração das empresas, num equilíbrio de longo prazo que induz ganhos superiores a trabalho e capital.

 

Infelizmente, como tem sido evidente, a moderação e a capacidade de compreender o outro, em vez de se tentar impor soluções à força, têm sido olimpicamente ignoradas pelos mais radicais. Radicais estes que são minoritários no mundo do trabalho, mas muito prevalecentes e vocais nas esferas do poder económico.

 

Regresso ao início. Esteve bem, por isso, o Governo ao propor a suspensão da caducidade das convenções colectivas. Para desgosto, decerto, dos radicais do poder económico. Mas esta suspensão deve ser definitiva, e não apenas por 24 meses como parece prever a proposta. É uma exigência de civilidade e de salvaguarda da própria democracia. Haja coragem. Terão o apoio de todos os trabalhadores e da maioria silenciosa da opinião pública!

 

23.10.2020 - Jornal Económico

A pandemia veio trazer, em vários sectores, alterações profundas de modelos de distribuição, de relacionamento com todos os intervenientes na cadeia de valor, na maneira de satisfazer as necessidades dos clientes, entre tantas outras alterações.

 

Adicionalmente, as medidas de prevenção sanitária e o acelerar da digitalização vieram tocar quase transversalmente em todos os sectores de actividade. Muitos terão de se reinventar, o que nem sempre será fácil.

 

Neste esforço em que novas maneiras de trabalhar e de gerir terão de ser a realidade, importa salientar que estes processos de reconfiguração de empresas e de sectores só serão susceptíveis de serem feitos com parceiros sociais dotados de verticalidade, sentido ético e de respeito pelo papel institucional de uns e outros.

 

Sindicatos e representantes dos accionistas terão sempre perspectivas diferentes das empresas. Só regimes totalitários procuraram iludir a realidade, com os grémios ou com os sindicatos controlados pelo partido detentor do poder político. Mas que ninguém tenha dúvidas sobre o empenho dos sindicatos nas condições de exploração das empresas, nas suas condições de resiliência, na qualidade da gestão e no desejo que a ética seja um valor importante nas relações laborais. Aliás, por todos os exemplos, veja-se o caso da Alemanha onde a co-gestão é regra, e onde as empresas são melhor geridas, mais prósperas, mais estáveis no emprego e com maior rendibilidade.

 

Vem isto a propósito dos processos de reestruturação, em vários sectores de actividade, que têm vindo a ser divulgados na comunicação social. Com todo o respeito que nos merece o quarto poder, mas estes terão de envolver os sindicatos, ab initio. Não é nos jornais que os processos devem começar ou ser geridos. Conhecer o racional, os objectivos e as metas, a calendarização, e com base nessa informação poder dar contributos construtivos, é uma exigência decorrente da lei, da boa gestão e do senso comum.

 

Acresce que processos desta natureza exigem uma repartição equilibrada dos custos sociais, envolvendo accionistas, gestores, trabalhadores e outros stakeholders eventuais, não podendo recair em exclusivo sobre os trabalhadores, os seus direitos adquiridos (nomeadamente nos seus serviços de assistência médica e social) ou em formação (mormente sacrificando as reformas e pensões futuras).

 

Esta é uma ressalva e uma exigência que sempre faremos. Toda e qualquer reestruturação deve obedecer à lei e observar elevados critérios éticos, respeitando os direitos das pessoas e a sua liberdade de decisão, procurando que daí resulte uma organização mais resiliente, ágil e mais bem preparada para o futuro.

 

16.10.2020 - Jornal Económico

A transição de sociedade rural para urbana, assente nos serviços e na indústria, foi célere. No espaço de uma geração, milhões deixaram as suas aldeias de nascença, os amigos, os rios não poluídos, a vida marcada pelos ciclos da natureza, da agricultura e dos animais, para vir habitar nos subúrbios e trabalhar nos empregos criados por uma economia aderente da EFTA, primeiro, e da CEE, depois.

 

Pelo meio, o desafio de participar no esforço de guerra colonial, pagando com as suas vidas e com incapacidades permanentes, aquilo que os políticos do tempo do Estado Novo não tiveram a vontade e o talento de resolver. Nunca, mesmo nunca, um pequeno país se tinha envolvido em três frentes simultâneas de guerra.

 

Eles que, pela sua capacidade de trabalho, entrega, estudo e sacrifício, foram capazes de desencadear um processo de desenvolvimento económico que fez de nós um caso de sucesso, de transição de uma economia pobre para outra de desenvolvimento médio-alto. Foi este esforço que permitiu o Estado Social, modelado nos exemplos nórdicos, começado na Primavera marcelista e consolidado na democracia.

 

Foram eles que aforraram e permitiram que os seus filhos pudessem estudar nas universidades e perseguir o sonho do elevador social. Não obstante todos aqueles que se achando dotados de direitos dinásticos, lhes procuraram cercear a ambição e ascensão.

 

Foram eles capazes de enquanto sustinham, com o seu sacrifício e sangue, um regime caduco, operar uma transição democrática que foi um caso exemplar de moderação, no campo político.

 

A estes heróis que, sem guerras civis, foram capazes de tanto, existe uma geração que tem que lhes agradecer. A minha e a do leitor.

 

A estes heróis não fomos capazes de dedicar os recursos e o tempo para lhes proporcionar uma velhice tranquila e com qualidade. Deixados em lares onde falta pessoal médico e de enfermagem, onde os auxiliares não têm treino e qualificação, foram os nossos heróis deixados em regime de confinamento quase permanente, indefesos quando deveriam ser protegidos. Entre aberturas, breves, seguidas de encerramentos, longos, a visitas sempre curtas em duração e com distância física, ficaram os nossos heróis impedidos de abraçar, beijar ou ver os seus entes mais queridos.

 

Aos mesmos heróis que defenderam as infraestruturas, as cidades, os caminhos e as matas insondáveis de Angola, Moçambique ou da Guiné, a estes mesmos recusamos que decidam qual o nível de confinamento que querem ter. A estes recusamos um abraço, uma cápsula de café ou uma saída para vir apanhar sol. A estes heróis, tratados como dispensáveis, devemos muito, mesmo muito.

 

O grau de civilidade de um país afere-se, também, pela maneira como tratamos estes heróis. Os nossos pais.

 

08.10.2020 - Jornal Económico

Entre 14 e 17 de Setembro, teve início o novo ano lectivo. Segundo o Ministério da Educação, estamos perante um universo de cerca de 1,2 milhões de alunos do ensino pré-escolar ao ensino secundário, a que se somam cerca de 210 mil docentes e não-docentes, distribuídos por 812 agrupamentos escolares. Uma fonte potencial de disseminação da Covid-19, como se temia?

 

Nem por isso. No início desta semana, segundo os dados divulgados pela Direcção-Geral da Saúde (DGS), de entre as mais de cinco mil escolas, apenas tinham sido reportados 12 surtos activos de Covid-19. Um número manifestamente reduzido, de algum modo afastando os receios mais pessimistas.

 

Não sabemos, com rigor, se este número inicial e inexpressivo de surtos se deve às medidas de mitigação implementadas, ou se decorre apenas da ausência do vírus na comunidade. Em todo o caso, é um número que não gera preocupação ou alarme, e os primeiros dados, portanto, parecem dar razão a quem defendia, como é o meu caso, o regresso à normalidade possível e às aulas presenciais.

 

Todos sabemos que o ensino à distância prejudica os mais frágeis, aqueles que não têm um computador, acesso com um mínimo de qualidade à Internet, ou cujos pais não têm meios para pagar explicações. E todos sabemos, igualmente, a importância da socialização nestas idades.

 

Importa, no entanto, que o Governo corrija as falhas detectadas e responda aos apelos da comunidade, nomeadamente oriundos dos sindicatos, garantindo que as escolas têm os assistentes operacionais necessários, que as turmas não tenham um número excessivo de alunos e se cumpra o distanciamento físico mínimo exigido pela DGS.

 

Isto dito, a nossa economia não pode voltar a parar como no primeiro semestre deste ano. Seria uma catástrofe para as empresas e para as famílias, num contexto em que o Estado seria colocado perante escolhas muito difíceis.

 

Importa, por isso, regressar à normalidade possível, mitigando riscos e tendo plena consciência que haverá semanas boas e outras que nem tanto. É crucial que se mantenha a economia a funcionar, os bancos a operar, as empresas a produzir e as famílias a garantir o seu rendimento, gerando consumo, por um lado e, por outro, originando impostos e receita para o Estado, os quais, por sua vez, permitirão apoiar aqueles a quem o infortúnio já bateu, ou baterá ainda, à porta, na forma da perda do seu posto de trabalho.

 

A pandemia é um problema e um risco, mas importa calibrar a resposta. É possível manter um mínimo de normalidade, como o regresso às aulas parece confirmar. Urge, agora, olhar para a área da Saúde onde estamos ainda muito longe de restaurar o nível serviços similar ao pré-Covid. Também aqui, tal como na educação, os mais frágeis são quem sofre as consequências, incapazes de recorrer a alternativas no sector privado.

 

02.10.2020 - Jornal Económico

Em Portugal existe um preconceito contra os trabalhadores. As badaladas e sempre desejadas reformas laborais, tão queridas por alguns gestores, políticos profissionais e comentadores sem espessura intelectual, têm subjacente a crença mágica, pueril, no poder salvífico de tais reformas. Isto a par com uma ignorância absoluta sobre o mercado de trabalho.

 

Os custos laborais em Portugal são uma parte menor dos custos das empresas, genericamente falando. Custos de contexto, gestores impreparados e corruptos, ou créditos de cobrança duvidosa são muito mais relevantes.

 

No passado recente, a quase falência da República Portuguesa trouxe a troika. Desconfiados e desconhecedores do sistema de justiça português e da sua morosidade, logo os representantes dos nossos credores internacionais trataram de impulsionar as reformas laborais.

 

Quando pensaríamos que era desta vez que gestores e trabalhadores iriam ser qualificados, que os crimes de colarinho branco iriam ser punidos em tempo útil, que fusões empresariais iriam ser estimuladas para se ganhar massa crítica na esfera internacional, ou que os custos de energia iriam convergir para a média comunitária, tivemos apenas despedimentos mais baratos; redução do valor das horas de trabalho suplementar; aumento das horas trabalhadas e a limitação do direito dos trabalhadores em requerem justiça em disputas laborais.

 

Este último ponto merece ser enfatizado, pois tem escapado ao escrutínio dos cidadãos. Isto porque para contestar um despedimento injusto, tem o trabalhador que abdicar da indemnização legal (aquela que terá sempre direito) enquanto uma decisão judicial não transitar em julgado. Ou seja, fica sob o espectro de que o subsídio de desemprego dure menos de metade do tempo que irá demorar o processo judicial.

 

Tal é o mesmo que condenar, por antecipação, os trabalhadores a uma escolha difícil: defender a justiça e arriscarem-se à indigência e miséria absoluta, por falta de meios para prover o seu sustento nos longos anos que durará o litígio; ou resignarem-se a aceitar as condições de uma qualquer rescisão por mútuo acordo.

O Estado de Direito, a dignidade da pessoa humana, a centralidade do trabalho na vida dos cidadãos, tudo isso foi obliterado pelos credores internacionais, certamente crentes que a justiça fazia o seu caminho em poucos meses, e por portugueses seus discípulos acéfalos.

 

Por tudo isto continuaremos a pugnar para reverter a obrigação de não aceitar a indemnização legal em caso de recurso aos tribunais de trabalho. Que esta devolução, ou não aceitação, não seja uma condição prévia a qualquer acção judicial que os trabalhadores queiram intentar.

 

A dignidade das pessoas não é e não pode ser um tema de Esquerda ou Direita. A ideologia não é para aqui chamada. A dignidade humana é o que nos separa da barbárie.

 

25.09.2020 - Jornal Económico

Começou no Conselho Económico e Social (CES) continental a discussão sobre o salário mínimo e as pretensões de o elevar. Independentemente da cristalizada representação social deste CES ter sido decalcada dos vencedores do 11 de Março de 1975 e estar, por isso, muito aquém de representarem, na sua totalidade, patrões e trabalhadores, algumas notas são devidas.


Percebemos as preocupações dos líderes empresariais com a competitividade, afinal o Alfa e o Ómega para a prosperidade de qualquer economia. Mas sabemos, igualmente, que os custos de contexto (energia, transportes, rendas, impostos) pesam muito mais nos custos operacionais da maioria das empresas que os custos laborais. Um dos problemas das últimas décadas no mundo ocidental, mas com especial acuidade em Portugal, tem sido o declínio relativo das remunerações do trabalho no rendimento nacional. Juros, dividendos, direitos e rendas têm levado a melhor, em detrimento das pessoas.


Entraves à contratação colectiva, abrir caminho à desregulação laboral, tornar mais baratos os despedimentos, onerar o recurso aos tribunais em disputas laborais, atacar o valor da sindicalização, congelar os salários mínimos, têm sido as armas de destruição massiva de um modelo de repartição do rendimento nacional que se quer mais equilibrado. Apesar da recessão que se avizinha, existem todos os fundamentos para um aumento do salário mínimo (e este tende a arrastar o salário médio, pormenor não despiciendo) e do valor das horas extraordinárias. Os principais problemas para as empresas são a falta de procura, primeiro, e os custos de contexto, depois. Não os custos laborais.


O desafio dos Governos (nacional e regionais), e das autarquias, será o de restaurar a confiança dos consumidores e famílias, assegurando que o consumo privado e actividade económica prosseguem em condições de segurança sanitária. Por isso, e sabendo que as famílias de mais baixo rendimento são as que têm maior propensão ao consumo, o aumento do salário mínimo parece ser uma política inteligente de colocar mais dinheiro nos bolsos das famílias que o gastarão em alimentação, transportes, roupas e cultura.


Como os anos de 2017 a 2019 ilustram, o aumento dos rendimentos do trabalho aumentou a procura agregada, e isso foi benéfico para as empresas. Lembre-se que por toda a Europa os governos nacionais adoptaram medidas de apoio às empresas, mormente moratórias de empréstimos e rendas, subsídios à suspensão temporária dos contratos de trabalho (na Alemanha foi agora proposto estender a duração de 12 para 24 meses), diferimento do pagamento dos impostos, entre outras. E bem.


Contudo, nenhuma destas medidas provoca, per si só, um aumento da procura dos bens e serviços produzidos pelas empresas como aquilo que acontecerá pelo acréscimo do salário mínimo e das horas extraordinárias. Este é um caso virtuoso, em que beneficiar os trabalhadores beneficiará a maioria das empresas nacionais. Além de que a subida do salário mínimo também potencia mais oferta de trabalho por parte de trabalhadores um pouco mais qualificados.


Adicionalmente, importa relembrar que em todo o mundo uma larga percentagem das funções essenciais (cuidados de saúde, abastecimento alimentar e combustíveis, cuidados a idosos, serviços financeiros, ensino) ao funcionamento de uma economia, em contexto de pandemia, são prestados por trabalhadores que auferem o salário mínimo. Com um peso desproporcionado, em Portugal, de trabalhadores jovens, mulheres e imigrantes. Cerca de 20 por cento daqueles que trabalham, em Portugal, são pobres. São estes uma boa parte dos heróis dos tempos da pandemia, classificados como trabalhadores essenciais. Soubemos elogiar o seu desempenho e profissionalismo. Saibamos transformar esse apreço que lhes devotamos em algo palpável para as suas vidas!

 

18.09.2020 - Jornal Económico

Esta semana foi noticiado que o CaixaBank e o Bankia estariam em conversações sobre uma possível fusão que dará origem a um novo superbanco. Exemplo prático da pressão expectável dos NPL sobre os capitais dos bancos, a que aqui fazia referência na passada semana, e da visão das autoridades espanholas no sentido de criarem bancos demasiado grandes para serem ‘resolvidos’ pelas autoridades europeias. Uma jogada inteligente. Ventos de Espanha.


Isto ocorre num momento em que está a recomeçar o ano lectivo e onde os bancários e os bancos vão continuar a assegurar a prestação de serviços bancários, qualquer que seja o cenário sanitário futuro. Este é o tempo de relembrar o nosso profissionalismo e o nosso estoicismo. Não somos descartáveis, portanto.

 

Esteve bem o secretário de Estado da Finanças ao suspender o “Projecto Miraflores” (de alienação de imóveis), mas estranhamos a omissão no denominado “Projecto Oeiras” de externalização de serviços. Ou seja, o espectro da redundância paira, ainda, sobre os trabalhadores da Parvalorem. Ganham os fundos abutre, perdem os portugueses.


Realce para a nossa Assembleia da República que resolveu, e bem, divulgar a famosa auditoria da Deloitte Portugal aos créditos que originaram as imparidades reconhecidas pelo Novo Banco. Sem surpresas, 95% destas imparidades tiveram origem em créditos anteriores à resolução do BES ou em compromissos assumidos com a Direcção-Geral da Concorrência da União Europeia (DGCom). Claro que falta perceber quem eram (ou são) os beneficiários efectivos desses créditos, onde está o dinheiro, os mecanismos de recuperação desses montantes, entre tanta outra coisa. Mas a auditoria ressalta, novamente, como os trabalhadores bancários são alheios às decisões de conceder grandes créditos ignorando regras de prudência tradicionais da profissão bancária. E, pormenor não despiciendo, como a resolução do BES foi pouco feliz.

 

No meio de tanta discussão mediática, importa realçar dois pontos: deixem trabalhar os bancários (naquilo que eles sabem e gostam de fazer melhor: servir os seus clientes!); e que não sejam dados pretextos a equipas de gestão para sacrificar trabalhadores.

 

11.09.2020 - Jornal Económico

Ao ler as notícias desta semana, e a decisão do secretário de Estado das Finanças em suspender as alienações do património da Parvalorem, não pude deixar de me recordar de Luís de Sttau Monteiro e a sua peça centrada na ética e no direito à revolta dos cidadãos. Esteve bem o nosso governante, pois os fundos abutre, de beneficiários efectivos impossíveis de descortinar, mais não fazem do que transferir riqueza nacional para paraísos fiscais.

 

Dito isto, importa recordar que a Parvalorem pode ser o embrião para uma solução de um problema que se avizinha.

 

Todos aqueles com alguma experiência no sector financeiro, memória histórica ou estudo, sabem que no decurso das crises, a curva do U invertido do rácio dos non performing loans (NPL) acentua-se de forma dramática, podendo atingir até cerca de 20% da carteira de crédito do sector financeiro.

 

Antecipar níveis futuros de NPL é crítico para formular estratégia de solução, pois que altos níveis do rácio impactam na solvabilidade dos bancos, restringem a concessão de crédito e a criação de moeda, prolongam estados recessivos e altos níveis de desemprego na economia. E desta vez o turismo não nos salvará como que por artes mágicas.

 

Portugal, não obstante um sistema financeiro muito desenvolvido, tem tido dificuldade em resolver os NPL resultantes de crises económicas ou financeiras, sendo dos países da OCDE mais lentos na diminuição deste indicador e na libertação de recursos produtivos para as empresas viáveis. A maior capacidade nacional de solucionar os créditos concedidos a empresas zombie ou famílias insolventes, vai estar no cerne da explicação porque umas economias europeias recuperarão mais rápido que outras.

 

A capacidade para separar os temas de liquidez dos de ausência de viabilidade económica terão que nortear a estratégia de ‘desmame’ das moratórias e das garantias do Estado. As moratórias de crédito e a sua eventual extensão no tempo, as sociedades veículos (bad banks) nacionais ou europeias que libertem NPL, as anormas contabilísticas (a este propósito, será a IFRS-9 catalizadora ou atenuadora de reconhecimento dos NPL?) e a decisão política, formam um sistema integrado.

 

É vital que a opinião publicada e os decisores políticos se concentrem nesta discussão, que está a ser feita no eixo franco-alemão, sob pena de se prolongar a recessão ou a anemia económica portuguesa. Se alguma coisa aprendemos com as duas décadas perdidas deste milénio, em termos de crescimento económico, é que mesmo com bancos com bases de capital robustas, a não existência de uma estratégia nacional para os NPL condenou toda uma geração ao desemprego e à emigração. Como vai ser desta vez?

 

04.09.2020 - Jornal Económico

Num Verão que já vai adiantado, talvez o mais importante seja relembrar que com ou sem vacina, teremos de voltar a abrir escolas e universidades ao ensino presencial enquanto modo mais rico e produtivo de ensinar e aprender. Este é um processo inevitável, com todas as implicações que isso terá na forma como organizamos o trabalho nas empresas e instituições.

 

Contudo, enquanto Setembro não chega, gostaria de deixar aos leitores três sugestões de leitura para as férias.

 

Rubem Fonseca, provavelmente o escritor brasileiro (e de toda a língua portuguesa?) mais relevante da segunda metade do século XX, e o homem que inventou o policial moderno, deixou-nos em Abril deste ano. A prática profissional enquanto advogado e comissário da polícia, com fortes conhecimentos de medicina legal, ter-lhe-á fornecido o contexto e o suporte sobre o qual a sua obra se desenrola. Prémio Camões em 2003, e várias vezes vencedor do Prémio Jabuti, Rubem Fonseca lega-nos um conjunto de obras sempre plenas de tensão narrativa, de que “Calibre 22” (Editora Sextante), com as suas vinte e nove ‘estórias’ curtas, é um bom exemplo. Leitura de um só fôlego, em versão urbana, violenta, mas erudita, afinal a marca distintiva deste autor. E uma boa porta de entrada para os seus romances, de que destaco “A Grande Arte”.

 

Afonso Cruz, apesar da sua juventude, já é um autor português consagrado. Com o seu mais recente “Os livros que devoraram o meu pai” (Editora Caminho), deixa-nos com um miúdo, Elias Bonfim, de doze anos, que perdeu o pai, alegadamente vítima de um ataque cardíaco. O progenitor, funcionário das finanças entediado, tinha o hábito de levar consigo novelas e romances para a repartição onde exercia. O filho desconfia que o pai terá desaparecido dentro de um dos livros. Consequentemente, resolve procurá-lo na biblioteca do sótão familiar, com tardes inteiras de leitura. Ali, seguindo as pistas que o pai fora deixando em inúmeras anotações nos livros que lera. Fascinante.

 

Depois do fabuloso “Prisioneiros da Geografia”, o jornalista Tim Marshall regressa com “A era dos muros” e com ela a geopolítica e o tentar dar sentido a uma das estupefações do nosso tempo: como é que num mundo cada vez mais global se percebe que existam cada vez mais muros físicos entre países. Raça, religião, política e níveis de riqueza, parecem desempenhar o papel principal.

 

Boas leituras!

 

28.08.2020 - Jornal Económico

Esta semana um alto responsável associativo empresarial, acossado por uma bastonária, não hesitou em descartar eventuais falhas comportamentais institucionais e apontar a eventuais actos individuais de trabalhadores a quem teriam que ser assacadas responsabilidades. Num repisar, clássico e ad nauseam, dos actos dos soldados a desresponsabilizarem os generais.

 

As longas noites de Verão deram-nos também a oportunidade de ler as mais de quatro mil páginas de uma dada acusação. A ser provada a tese do Ministério Público, o que está longe de ter acontecido e que caberá aos tribunais, percebe-se a desfaçatez de montar comunicações codificadas, uma sala de mercados paralela (à oficial) e clandestina, e uma prática de desvio de poupanças de milhares de aforradores em favor de um punhado de indivíduos.

 

Estes mesmos personagens que não se coibiram de arruinar largos milhares de famílias e trabalhadores. Uns e outros escolheram uma dada instituição financeira, mais que centenária, de entre as múltiplas alternativas, para nela aforrarem ou trabalharem. A julgar pelo que consta na referida acusação, a dedicação, empenho e lealdade de clientes e trabalhadores foi destruída por um punhado de gangsters.

 

Acolitados por uns gananciosos, que se prestaram a executar o plano de quem tudo sabia. Gananciosos que receberam prebendas, amiúde em jurisdições offshore e não raras vezes tendo como destinatários fictícios pais reformados e filhos menores, todos eles alegados prestadores de serviços de consultoria.

 

E que dizer do antigo CEO de uma operadora de telecomunicações que promoveu a venda da sua subsidiária mais lucrativa, a aquisição de uma outra em termos ruinosos, a aplicação de excedentes de tesouraria em papel comercial de entidades falidas, tudo e mais alguma coisa, até que a empresa fosse desmantelada e vendida a capital estrangeiro especulativo. Não passou despercebido, contudo, que o mesmo CEO teria recebido uns valentes milhões de euros, em contas offshore, liberalidade de um dado acionista, a troco de uma suposta fidelização dele e de uns alegados quadros superiores.

 

As instituições desaparecem pela falta de ética, pela sensação de impunidade de quem lidera e pela complacência dos que deveriam funcionar como contrapeso, e que são tornados cúmplices.

 

Não foram os clientes insatisfeitos, os produtos obsoletos ou tecnologia menos adequada que estiveram na origem da queda de gigantes como a Enron, Pan Am, PT ou BES. Foi a ganância de uns e a cumplicidade de outros. Um punhado deles bastou.

 

21.08.2020 - Jornal Económico

Foi recentemente aprovado, em sessão plenária da Assembleia da República, o regime jurídico da constituição e do funcionamento dos fundos de pensões e das entidades gestoras de fundos de pensões. A Lei nº 27/2020, de 23 de julho, que entrou em vigor no passado dia 1 de Agosto, veio reforçar, entre outros, os deveres informativos prestados aos participantes e beneficiários, por parte das sociedades gestoras desses mesmos fundos de pensões.

 

Tendo por base a necessidade de transposição de uma directiva europeia relativa às actividades e à supervisão das instituições de realização de planos de pensões profissionais, os deputados à Assembleia da República, em sede de Comissão Especializada de Finanças e Orçamento, revelaram a capacidade e a inteligência de ir para além da mera transposição.

 

Estão de parabéns, os deputados da dita comissão, por terem logrado a quase unanimidade e por terem adicionado, ou melhorado, novos direitos, mormente o da portabilidade em caso de cessação do vínculo laboral entre o trabalhador e o associado (empregador). E ainda por terem reparado um erro histórico e tornado obrigatória a participação de um representante de cada um dos dois sindicatos mais representativos do sector de actividade, para além de um representante da comissão de trabalhadores, na comissão de acompanhamento de cada fundo de pensões.

 

A anterior versão da lei tinha feito tábua rasa do papel dos sindicatos, outorgantes, em boa parte deles, nos anos 80 e 90 do século passado, das convenções colectivas que, amiúde, tinham estabelecido os fundos de pensões como mecanismos constitutivos, substitutivos ou complementares do sistema público, das reformas dos trabalhadores.

 

Historicamente, até então os sindicatos tinham tido uma presença permanente nas comissões de acompanhamento. A lei previa que os principais interessados, os trabalhadores, pudessem estar representados, condição primeira para um efectivo acompanhamento, com o intuito de monitorizar a política de investimentos e a adequação dos mesmos e do seu perfil de risco com o objectivo de pagar reformas, prevenir conflitos de interesse, e de prestar informação aos participantes e beneficiários.

 

Esta exclusão foi agora corrigida. Estiveram bem por isso os deputados porque foram sensíveis aos que, como o SNQTB, passaram os últimos quatro anos a sensibilizar os nossos eleitos para a relevância deste tema. Porque nos lembramos das fraudes que existiram no mundo anglo-saxónico, em que os fundos de pensões foram usados e falidos de forma imoral e ilegal, precisamente por ausência de controlo e de acompanhamento dos principais interessados.

 

A presença dos sindicatos assegura que os outorgantes dos contratos colectivos se mantêm vigilantes e levam para as ditas comissões de acompanhamento a capacidade técnica e o peso político dos sindicatos.

 

Prevenir, tanto quanto possível. Estou absolutamente convicto que os deputados prestaram um belíssimo serviço aos trabalhadores, aos reformados e pensionistas, e aos contribuintes em geral. Bem hajam!

 

14.08.2020 - Jornal Económico

O mecanismo de prémios por desempenho, enquanto instrumento motivacional, há muito que tem sido estudado e teorizado por diversos ramos do saber, mormente pela psicologia social.

 

A sua expressão máxima encontra-se nas equipas de desporto profissional, onde todos percebem como o valor do conjunto pode, em muito, exceder a mera soma de talentos individuais (por via das dúvidas, vale a pena atentar nas equipas de Sérgio Conceição no F.C. Porto).

 

Sem surpresa, nestas equipas profissionais o prémio (de vitória, de conquista de um troféu ou de apuramento para uma qualquer eliminatória da Liga dos Campeões) é igual para todos os jogadores. Para todos os convocados e amiúde para todo o plantel. Como bem ensinava Jorge Araújo (treinador campeão de basquetebol do mesmo F.C. Porto, com vários livros muito oportunos sobre construção de equipas), estes prémios são iguais porque é vital que os suplentes e os jogadores menos utilizados treinem com intensidade e obriguem os craques e os demais titulares a darem o seu máximo. Afinal, treinar é igual a jogar, disse José Mourinho.

 

Nos antípodas disto, há a realidade importada dos EUA. Pátria de tantas coisas boas e outras nem tanto. Importamos a ganância e o medo como elementos centrais da gestão de pessoas em várias das muito grandes empresas.

 

Empresas essas que de forma deliberada desvalorizam a contratação colectiva. Onde a carreira, a procura de mais saber e melhor fazer, a busca de melhores competências, a dedicação à empresa, salários dignos e justos, afinal os pilares da negociação e contratação colectiva são substituídos por prémios.

 

Por prémios individuais, cujas regras do jogo mudam de forma abrupta e retroactiva.

 

Em que promoções e prémios são, não raras vezes, subjectivos e desligados de um processo sério de avaliação.


Onde os prémios são gritantemente díspares; tanto que, por vezes, parecem ser meros pretextos para remunerar um pequeno grupo de forma principesca.

 

Substituir um mundo de salários dignos e que reflectem ganhos de produtividade e progressão na carreira, por um outro onde salários nominais são estagnados e os tais prémios ocupam, quando ocupam, o espaço vazio, é um passaporte para o dumping salarial, para a perda de sentido colectivo, para a negação do amor à camisola.


Gestores míopes promovem a ganância e o medo. Naquilo que de mim depender, não lhes darei tréguas.



07.08.2020 - Jornal Económico

Não sabemos exactamente quais os contornos futuros do teletrabalho, na sequência da pandemia. Tornar-se-á o novo normal, como agora se diz, ou apenas se desenvolverá massivamente?

 

Uma empresa francesa de recrutamento, via internet, com base num inquérito aos seus utilizadores pessoais e profissionais, traça-nos um cenário de uma Susana, trabalhadora convertida de modo permanente ao teletrabalho, perseguida pela falta de exercício físico e de interacções sociais. Movimentando-se quase que em exclusivo entre a cama e o local adaptado a escritório caseiro.

 

Mês após mês, esta ausência de exercício cobra o seu preço e a obesidade surge como corolário. Má postura corporal com cifose cervical e dores lombares crónicas são outras das exteriorizações na Susana. Olhos vermelhos e lágrima seca, fruto da exposição permanente ao écran, consequências indesejáveis. Finalmente, pela falta de luz solar, a perda de cabelo agrava-se.

 

Se a DirectApply é apocalíptica (ou realista?), outros traçam uma visão alternativa muito mais optimista. Menos pressão sobre os trabalhadores, mais tempo para acompanhar os filhos menores e menos sentimento de culpa, mais oportunidade de exercício físico.

 

Provavelmente a realidade situar-se-á algures entre as duas visões. Mas, mais importante, é que dada a natureza social dos seres humanos, trabalhadores ou não, uma coexistência entre teletrabalho e presença física, com dias ou semanas dedicadas a um e a outro, parece poder prevenir perigos e potenciar vantagens.

 

O regime legal do teletrabalho está previsto no Código de Trabalho (artigos 165.º a 171.º), tratando-se de uma forma de trabalho que, antes da pandemia, era perfeitamente excepcional e pouco conhecida das empresas e trabalhadores. A realidade é dinâmica e tudo mudou em poucos meses.

 

Nesta medida, consideramos que os princípios e normas regulamentadoras do teletrabalho devem ser consolidadas nas convenções colectivas de cada sector de actividade, as quais permitem adaptar e melhorar o regime legal, tendo em devida consideração as especificidades de cada sector, das empresas e dos respectivos trabalhadores.

 

Perante a nova realidade e generalização do teletrabalho, importa antecipar e até motivar a evolução legislativa que venha a ocorrer e regular em convenção colectiva o direito à desconexão, a definição de locais de trabalho, a conciliação da vida profissional e pessoal, entre outras matérias que se mostrem relevantes, sabendo assim aproveitar, no bom sentido da expressão, a experiência dos últimos meses.

 

Reforçar o princípio da igualdade de tratamento entre teletrabalho e trabalho presencial, nas convenções colectivas, nomeadamente quanto às condições retributivas, carreira e formação profissional, deverá ser uma prioridade dos sindicatos.

 

Uma abordagem ponderada, equilibrando o trabalho remoto com o presencial, parece ser mais consentânea com a dignidade humana, ao mesmo tempo que fecha a porta a radicalismos e a experiências nunca tentadas, que tendem sempre a causar o enfraquecimento do vínculo laboral e a desproteção dos trabalhadores. Daqui até à ‘uberização’ das relações de trabalho, vai apenas um pequeno passo.

 

31.07.2020 - Jornal Económico

Foi sem surpresa que assistimos à audição parlamentar do professor Mário Centeno, enquanto indigitado pelo partido do governo para governador do Banco de Portugal. Infelizmente, o exercício centrou-se muito em questões de ética, importantes em todo o caso, mas pouco naquilo que é a sua visão para o magistério de influência e de decisão que prevê desempenhar no seio do BCE, e para a estabilidade do sistema financeiro operante em Portugal.

 

Guardaremos para um futuro artigo uma reflexão sobre a relevância, para um pequeno país, do seu papel no supervisor europeu e na concretização da União Bancária, por ora num limbo que não parece aproveitar ao nosso país.

 

Mais premente, porque se trata de uma prioridade, é a questão da estabilidade do sistema financeiro em Portugal.

 

Ultimamente, tem sido dado o devido destaque ao papel que o Serviço Nacional de Saúde teve no combate e na preparação para a primeira fase da pandemia de Covid-19. Diversos observadores têm destacado o papel dos profissionais de saúde e dos gestores hospitalares, a sua experiência e conhecimento, o modo como foram absolutamente decisivos na detecção, testagem, isolamento, tratamento e contenção do vírus.

 

Estamos a falar de profissionais cuja experiência e cujos estudos foram e são nas áreas profissionais que escolheram. Assim, como não poderia deixar de ser, tivemos médicos e enfermeiros a cuidar dos doentes, nos cuidados intensivos, e não economistas ou arquitectos. Não sei se existe um processo de “fit and proper” hospitalar, mas tenho a certeza que seria irrazoável que amadores tivessem tido a responsabilidade de prestar funções nos cuidados intensivos hospitalares.

 

Por isso, seguindo o mesmo raciocínio lógico, na banca o “fit and proper” nunca poderá ser um processo que abra as portas a amadores para cargos de gestão, ou que afaste, sucessiva e irremediavelmente, os profissionais com carreira bancária, apenas porque a tiveram.

 

Também compete ao governador assegurar que os bancos têm as almofadas de capital relevantes para acomodarem imparidades, sob cenários de maior pressão, ou que os seus accionistas de controlo, a existirem, possuam a capacidade de o fazer se assim forem solicitados pelas circunstâncias. Todos sabemos o que aconteceu ao Banif, BPN ou BES, o tempo que se perdeu e a destruição de valor e de empregos, quando os accionistas, incapazes, usaram de manobras várias, adiando ao extremo a revelação da sua incapacidade para realizar os necessários aumentos de capital. Perderam-se três bancos, milhares de postos de trabalho directos e indirectos.

 

A um governador do Banco de Portugal pede-se que esteja preparado para uma capitalização pública atempada e fulgurante, se necessário. Fizeram-no os italianos e os espanhóis no passado. Infelizmente, nós não tivemos a audácia e a prontidão de uns e de outros, com as consequências nefastas que sofremos.

 

Acresce que eventuais sacrifícios devem ser partilhados por todos, a começar nos accionistas e nos obrigacionistas. Não devem ser os trabalhadores a pagar pelos erros de terceiros. Além de moralmente injusto, seria apenas inútil e irrelevante, pois os problemas de competência de gestão, ou de sub-capitalização, não se resolvem com menos um punhado de bancários.

 

Equipas de gestão experientes e qualificadas. Capitalização robusta e escalável. Tem a palavra o senhor governador. Sugiro-lhe, se me permite, que comece pelo Banco Montepio.

 

24.07.2020 - Jornal Económico

Não me tenho cansado de escrever sobre o papel histórico dos bancários na afirmação de uma classe média instruída, competente e profissional, consciente dos seus deveres e direitos cívicos, a quem a democracia e o desenvolvimento económico e social tanto devem.

 

Vem isto a propósito da recuperação de créditos bancários. Como é sabido, mas vale a pena relembrar, a quase falência da República Portuguesa implicou a aceitação de soluções draconianas de austeridade e de alienação de activos, de forma a satisfazer os credores estrangeiros. Veio a representação física dos credores, sob a forma dos empréstimos de emergência tutelados pela troika e com ela um violento sufoco sobre a capacidade creditícia dos bancos a operar em Portugal. Novos critérios de liquidez, de provisões e de capitais próprios, forçaram os bancos a encolher os seus balanços, reduzindo crédito concedido às empresas com isso agravando a política de austeridade e a recessão que se seguiu.

 

E porque a memória tende a ser curta, importa recordar que foram os credores que impuseram as condições e fizeram de Portugal, do Chipre e da Grécia um laboratório das suas experiências. Para mal dos cidadãos destes três países, convém deixar claro.

 

Os bancos ficaram com uma montanha gigante de créditos incobráveis, e entre execuções de garantias, dações em pagamento, entre outras, foram forçados a alienar, depressa, um imenso património imobiliário e mobiliário. Este exercício depressa se percebeu que seria elaborado com preços deprimidos e que os fundos abutre aproveitariam a oportunidade. Abutres porque se limitaram a aproveitar da desgraça alheia, porque não trouxeram tecnologia, e porque procederam a uma gigantesca transferência de riqueza de agentes económicos portugueses para terceiros.

 

Contudo, fruto das decisões políticas e dos compromissos assumidos pelo Estado português no desfecho dos bancos BPP, BPN e Banif, constituiu a República três entidades, a saber: BPP em Liquidação; Parvalorem e Oitante. Comum a todas estas empresas a preservação de valor, o tratamento profissional e a ausência de conflitos de interesses. Tudo feito por bancários!

 

Quando se percepciona que a crise desencadeada pela Covid possa ter impactos severos sobre as carteiras de imparidades dos bancos, seria de elementar prioridade e bom senso robustecer as três entidades supracitadas, com provas dadas.

 

A acontecer que o poder político queira liquidar estas empresas de recuperação de créditos, despedindo pessoas e alienando carteiras, é um desfavor para os contribuintes, os cidadãos e os bancários. E cujo aproveitamento vai parar a fundos abutre, sitos em jurisdições opacas, que não pagam impostos ou criam emprego. Será que vamos cometer os mesmos erros, outra vez?

 

Tem a palavra o senhor ministro das Finanças.

 

17.07.2020 - Jornal Económico

O processo de negociações directas, encetado logo nos primeiros dias de Dezembro de 2019, em que três sindicatos bancários se têm sentado para negociar com a administração do Millennium bcp, relativo à revisão para 2020 das tabelas e cláusulas de expressão pecuniária e não pecuniária do Acordo Coletivo de Trabalho, foi apenas brevemente interrompido na fase do estado de emergência.

 

Na retoma das negociações, o banco apresentou uma contraproposta de aumento de 0,3% da tabela salarial, pensões de reforma, pensões de sobrevivência e das cláusulas pecuniárias. Longe da proposta de 2,5%, por parte do coletivo constituído pelo SNQTB, SBN e SIB, os três supracitados sindicatos. É um primeiro passo no sentido do desbloqueio das negociações, com a administração do banco a reconhecer, e bem, que em tempos de pandemia é possível e legítimo proceder a aumentos das tabelas e de outros valores retributivos. Porque a responsabilidade social e o sentido de dever deve impelir as partes negociantes à procura do que podem ser as melhores decisões para a atividade de intermediação e aconselhamento financeiro, em geral, bancária no caso particular.

 

A pandemia obriga-nos a olhar para os trabalhadores como fundamentais para garantir o presente, e o futuro, em condições de rendibilidade e sustentabilidade social, impulsionando as transformações necessárias para assegurar a continuidade do negócio bancário, hoje e amplamente demonstrado, indispensável ao apoio à recuperação económica, sustentada, de empresas e famílias em Portugal.

 

Não nos esquecemos, em momento algum, que os bancários estiveram, desde a primeira hora e ininterruptamente, na primeira linha, mantendo o pleno funcionamento dos bancos em todo o país, pelo que merecem inquestionavelmente que o seu profissionalismo e entrega seja devidamente considerado na revisão salarial para este ano.

 

Não obstante a proposta do Millennium bcp ainda estar longe das pretensões, fundamentadas, dos sindicatos, e distante dos acordos alcançados em contratação coletiva de outros sectores, não deixa de ser um sinal inequívoco para outras mesas negociais no sector bancário, ainda e sempre agarradas a uma ladainha dos “tempos negros que se advinham”. Ineficaz e sem sentido, pela sua reiterada utilização, ano após ano, qualquer que seja a fase do ciclo económico.

 

Em resumo, um primeiro passo, mas não o último, a denotar sentido de liderança e responsabilidade social. Quer o Millennium bcp, quer por maioria de razão os outros bancos, têm condições de ir mais além. É justo que o façam! Os bancários nunca viraram a cara às adversidades.

 

10.07.2020 - Jornal Económico

Como não poderia deixar de ser, a aparente designação do professor Mário Centeno para o cargo de próximo governador do Banco de Portugal está a gerar algum debate. Não se trata de uma nomeação para um banco qualquer, mas para o regulador prudencial e comportamental do sector bancário.

 

Por isso, não colhe, à laia de invocado precedente, o argumento de que anteriormente responsáveis das finanças (ministros ou secretários de Estado) transitaram directamente do Governo para o Banco de Portugal. Tradições nefastas e contrárias ao bem comum não podem servir para que tudo fique na mesma.

 

Vale a pena comparar o processo de escrutínio de um candidato a presidente de um município, com um de governador. Indicado por um partido, tem que se sujeitar a um processo de seleção, quais primárias locais. Indicado por um grupo de independentes, o desafio ainda é maior. Não acaba aqui. Uma vez candidatos, começa o processo de escrutínio profissional e moral do candidato. Todo o seu percurso é avaliado pelos cidadãos e pela comunicação social. Um processo que começa antes da campanha, e se prolonga, no mínimo, até ao dia de ida às urnas. E, depois, uma vez eleito, terá um mandato de apenas quatro anos, onde voltará a ser avaliado em eleições. Processos concorrenciais, intenso escrutínio, possibilidade de não renovar por derrota eleitoral.

 

E que dizer do processo de seleção de um reitor para uma universidade pública? Concurso internacional, avaliação curricular, entrevistas de um júri, culminando tudo numa votação dos seus futuros colegas. Abertura, transparência, possibilidade de qualquer português ou estrangeiro se candidatar.

 

Aqui nesta coluna temos dado nota da nossa estupefacção pelo facto de alguns bancos, felizmente cada vez menos, terem vindo a apresentar nomeações para os seus conselhos de administração que causam a máxima preocupação. Pela impreparação técnica, comportamental e notória ausência de experiência de tais executivos. E porque os bancos são empresas sistémicas, criadoras de moeda e de crédito, fundamentais para o tecido económico nacional, as más escolhas dos grandes accionistas tendem a tornar-se perdas para os trabalhadores bancários, para os pequenos accionistas, para os contribuintes e, potencialmente, para os detentores de obrigações e para os clientes.

 

Não está em causa a provável competência do professor Centeno. Nem o quanto a nação possa, ou talvez deva estar-lhe grata. Mas porque o cargo de governador do Banco de Portugal é tão susceptível, no exercício de seu mandato longo (demasiado longo?) de trazer grandes danos para o erário público, ou um impacto assimétrico de perda ou retenção de centros de decisão em Portugal, para citar apenas algumas das consequências das decisões de governadores neste milénio, que não deveria bastar ser amigo do primeiro-ministro. Do actual ou de qualquer outro.

 

O governador não deveria ser menos que um qualquer reitor. Porque o potencial impacto das suas decisões é imenso, e será pago pelas gerações vindouras em caso de erro. Concurso internacional, entrevistas públicas, avaliação pelo Parlamento e pela comunicação social. Era assim que deveria ser. O mérito do governador deveria ser inquestionável.

 

03.07.2020 - Jornal Económico

Quase 1.200 bancários responderam às questões colocadas num inquérito realizado pelo Sindicato Nacional dos Quadros e Técnicos Bancários (SNQTB). Este é o maior inquérito realizado em Portugal, até ao momento, entre os trabalhadores bancários, com o intuito de avaliar a forma como viveram a pandemia até agora.

 

Em traços gerais, os resultados obtidos – e que faremos chegar às administrações das instituições bancárias – confirmam algum do feedback por nós recebido ao longo dos últimos meses através das comissões sindicais e delegações do SNQTB, ou em contacto pessoal connosco, a nível diretivo. Em todo o caso, há alguns dados surpreendentes e que emergiram a partir das respostas.

 

Por limitações de espaço, não é meu intuito analisar aqui de forma detalhada os resultados globais (que poderão, em breve, ser consultados no nosso site). Por isso, com a vossa permissão, salto para duas linhas de força que gostaria de destacar.

 

Nos últimos meses, todos nós passámos por um autêntico terramoto profissional. Porém, no caso dos bancários, com o intuito de assegurar a continuidade dos serviços financeiros essenciais ao normal funcionamento da nossa economia, em pouco tempo foi necessário ajustar comportamentos a uma nova realidade que veio alterar, de forma significativa, as rotinas profissionais. Os bancários fizeram-no sem qualquer interrupção nos serviços bancários prestados, trabalhando mais horas e assumindo um maior volume de tarefas, para que tudo decorresse com a normalidade possível.

 

Isto dito, ultrapassado que está este primeiro embate com a pandemia, não seria razoável, como recompensa pelo brio e empenho dos bancários, agora que o teletrabalho deixa de ser ‘obrigatório’, manter essa opção em cima da mesa, pelo menos até ao final do ano? Sempre que tal seja possível e se essa for a preferência do trabalhador? Aprofundar o seu enquadramento para o futuro?

 

Da nossa parte, há muito que lutamos, em sede de contratação colectiva, por uma regulamentação do teletrabalho mais pormenorizada. Essa é a vontade de uma parte não despicienda dos trabalhadores bancários, pretensão que não colide em muitas circunstâncias com os interesses das entidades patronais. Importa, por isso, aproveitar a janela de oportunidade e avançar para o seu aprofundamento.

 

Igualmente importante, seria justo que os bancários que estiveram, e ainda estão, na linha da frente, mais expostos ao risco de contágio, beneficiassem de um subsídio de risco. Um subsídio que poderia revestir a forma de um complemento pecuniário, ou de dias adicionais de férias.

 

Em suma, aprofundamento da regulamentação do teletrabalho e subsídio de risco. Escutámos os bancários e vamos dar a devida sequência ao seu feedback em sede de negociação. Por uma razão muito simples. São justas e razoáveis.

 

26.06.2020 - Jornal Económico

Não me esqueço da primeira vez que andei de avião, ainda criança, e da emoção que envolveu essa experiência. Enquanto português, tenho pela TAP um especial carinho, aliás tal como muitos portugueses, tendo em conta o seu papel crucial na ligação com a diáspora dispersa por três continentes.

 

Isto dito, o que me importa enquanto cidadão e contribuinte é o carácter estratégico da TAP, pelo volume de emprego que gera directamente e, de forma indirecta, nas empresas situadas a montante ou a jusante da cadeia de valor do sector onde actua. A TAP é uma empresa estratégica também pelas tecnologias que usa e desenvolve, pelas técnicas de gestão avançadas susceptíveis de serem replicadas por outras, pelos impostos que aqui paga, pela acumulação de capital físico e intangível que deixa em Portugal e pelas pessoas que desenvolve.

 

Interessam-me as questões relacionadas com a eficiência, e por isso a iniciativa e a gestão privada tendem, com excepções, derivadas de falhas de mercado, a produzir melhores soluções. Mas além disso valorizo também os aspectos distributivos decorrentes da riqueza criada pela maior eficiência e o seu impacto sobre a coesão e o desenvolvimento social.

 

Por tudo isto, e por muito mais, entendo mal a antipatia de alguns em relação a uma ajuda estatal à TAP. Uma antipatia ainda mais difícil de perceber se se reparar que diversos países europeus não hesitaram em ajudar as suas companhias aéreas.

 

Na última década, a TAP foi uma peça central na aproximação que fez ao Brasil, o facto estratégico mais marcante dos últimos 70 anos na relação bilateral. A TAP desempenhou um papel estratégico com brutal impacto diplomático, económico, demográfico e social. Em poucos anos, no Brasil passámos a ser vistos como um país que valia a pena visitar, viver, investir e adquirir produtos. Mais recentemente, o mesmo movimento estava a ocorrer na relação com os EUA. Acresce que a TAP, com a sua dinâmica empresarial e estratégica, catalisou a transformação do aeroporto de Lisboa no maior polo empregador do país.

 

Comparar o papel estratégico que a TAP tem desempenhado, em benefício do interesse nacional, com o papel no mercado das companhias low cost só pode ser ignorância ou desonestidade intelectual.

 

Uma empresa estratégica é do interesse de toda a sociedade. Não é um assunto que interesse apenas aos accionistas e aos gestores por eles nomeados, mas diz respeito a todos os stakeholders: aos trabalhadores, organizados pelos sindicatos, aos clientes, aos fornecedores e aos cidadãos representados pelo Estado. Uma empresa estratégica não pode depender da vontade exclusiva dos accionistas e nenhum stakeholder se pode demitir das suas responsabilidades, sejam elas companhias aéreas, na área das infraestruturas, concessionárias de serviços públicos, ou bancos.

 

Desenganem-se todos aqueles que pensam em aproveitar a pandemia para, no recato dos seus gabinetes de administração, ignorarem ou menosprezarem os legítimos interesses dos trabalhadores, ou da sociedade onde se inserem, desenhando reestruturações que transferem de forma assimétrica os custos para os outros. Nem pensem que o vão conseguir fazer e muito menos pela calada.

 

19.06.2020 - Jornal Económico

Fez esta semana 37 anos da fundação do Sindicato Nacional dos Quadros e Técnicos Bancários (SNQTB). A propósito desta efeméride, permitam-me os leitores partilhar convosco algumas ideias.

 

Nos inícios da década de 1980 pulsavam ainda pendores autoritários de quem queria afirmar a unicidade sindical. Esta, a ter sido concretizada, seria a negação da liberdade duramente reconquistada, poucos anos antes. Por tudo isso, não podemos deixar de elogiar os fundadores deste sindicato independente, livre de amarras e sujeições. De gente que pensou pela sua cabeça. Daqueles que ousaram criar e afirmar pela diferença, contra as opiniões dominantes, as crenças, a indiferença (quando não a hostilidade) de tantos colegas do mesmo ofício. Eles foram os heróis que ousaram dançar.

 

Este é um sindicato que não se afirma contra nenhum outro, nem contra ninguém, mas apenas e sempre na defesa dos interesses dos seus associados e dos trabalhadores do seu sector. Porque acreditamos que no médio e longo-prazo a viabilidade das empresas está mais assegurada quando estas defendem o emprego, a qualificação, a formação e a remuneração digna dos seus trabalhadores.

 

Por isso nos indignamos, amiúde, contra políticas de gestão míopes, que colocam toda a ênfase no curto-prazo e em cortes draconianos, ou na negação dos valores e da dignidade do trabalho.

 

Em Portugal, num dos países mais desiguais do mundo ocidental, talvez seja tempo de pensar porque a filiação sindical é, comparativamente com os países do Centro e do Norte da Europa, baixa. Ou porque nos mobilizamos tanto em torno do futebol, de concursos de talentos musicais, das redes sociais, entre outras coisas, e tão pouco em torno de temas laborais, da defesa de melhores condições remuneratórias, ou de uma melhor redistribuição dos rendimentos gerados na economia.

 

Talvez seja tempo de questionarmos a razão que leva a que sindicatos e sindicalistas sejam apresentados sempre, por alguma comunicação social, numa óptica populista e eivada de preconceitos bebidos nos anos 1930. Na concepção fascista italiana, que influenciou o Estado Novo, os sindicatos eram agremiações de tipos perigosos e que agregavam os mais energúmenos da sociedade. Por tudo isto, numa sociedade tolerante e coesa como a portuguesa, olhar para os sindicatos com os olhos de Salazar e de Mussolini, é contribuir para a anomia social, para as baixas taxas de sindicalização e de participação política e cívica. No fundo, é contribuir para a perpetuação da pobreza e para a desigualdade terceiro-mundista.

 

Queremos aproximar-nos dos níveis de exigência, transparência de governação, conforto material e qualificação dos alemães? Sindicalizem-se, meus caros.

 

12.06.2020 - Jornal Económico

Como por vezes tenho vindo a referir nesta coluna, o tema das pensões de reforma é vital enquanto peça numa visão holística de carreira profissional de todo e qualquer trabalhador.

 

Conquanto a reforma dos trabalhadores em Portugal seja principalmente assegurada pela Segurança Social, logo dando-lhe um cunho de garantia soberana que é justo valorizar, é da mais elementar clareza que a formação, o cálculo e a aquisição de direitos constitutivos de uma pensão de reforma sejam evidenciados de forma individual para cada trabalhador. O que está longe de estar assegurado com simuladores que não englobam a totalidade das carreiras contributivas, nuns casos, ou não relevam as especificidades das carreiras com mecanismos substitutivos ou complementares da pensão pública.

 

Importa relembrar que, tradicionalmente, aos bancários era aplicado somente o regime previdencial das convenções colectivas, ao abrigo das quais, por regra, apenas é considerada a retribuição de base e diuturnidades, não contemplando outras retribuições, como sejam os complementos retributivos e isenções de horário de trabalho.

 

Vale isto a propósito de uma acção judicial intentada, contra o Estado português, nos Tribunais Administrativos, no já longínquo ano de 2005 pelo sindicato que represento, na qual invocamos a inconstitucionalidade da não integração dos bancários no regime geral de Segurança Social aplicado aos demais trabalhadores portugueses.

 

Foi nosso racional, nestes últimos 15 anos, que por esta não integração resulta que as pensões de reforma dos bancários não são calculadas sobre toda a remuneração auferida, com prejuízos pessoais para dezenas de milhares de pessoas. Estes prejuízos emergem da omissão legislativa do Estado, ao não providenciar a integração dos bancários na Segurança Social. E por virtude dos danos, peticionamos uma indemnização, a liquidar após decisão final condenatória transitada em julgado.

 

Agora, 15 anos decorridos desde a acção intentada, vem o Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa considerar a dita como improcedente.

 

Não obstante o período de tempo decorrido e de terem ocorrido entretanto alterações legislativas que integraram parcialmente os bancários na Segurança Social (e que impactaram favoravelmente nos bancários entrados no sector após 2009), por razões de princípio e porque a integração plena não ocorreu, iremos interpor recurso desta decisão judicial.

 

Muito se fala de factores de substituição, mas esquecem a opinião pública e os poderes do Estado esta tragédia que atinge duramente os bancários, i.e. a profunda injustiça de ter uma carreira profissional longa e de a pensão vir a representar menos de metade dos montantes auferidos enquanto no activo.

 

Não nos conformamos, claro está!

 

05.06.2020 - Jornal Económico

Os CTT são uma empresa mais que centenária, com um claro contrato de serviço público. É uma empresa que os portugueses se habituaram a considerar, com carinho, como parte integrante da sua vida.

 

Após a privatização da empresa, a administração anterior encerrou inúmeras estações, com isso frustrando populações e sendo alvo de indignação de cidadãos e partidos políticos. E, a par de outros encerramentos de serviços públicos, contribuindo para a desertificação do interior do país.

 

Igualmente, em anos anteriores, procedeu a uma distribuição agressiva de dividendos, levando muitos a questionar até que ponto tal comportamento preparava a empresa para as necessidades de investir em formatos mais modernos de distribuição, nas encomendas expresso e na digitalização.

 

Um novo presidente executivo chegou, e com ele o reconhecimento de erros cometidos e um arrepiar parcial de alguns encerramentos. Pareceram ser boas notícias e talvez mesmo boa imagem, numa empresa cujo contrato está prestes a expirar e que muitos cidadãos reclamam que volte a ser nacionalizada.

 

Em tempo de pandemia está a ser notável o esforço dos trabalhadores dos CTT, com a sua entrega e profissionalismo, mantendo os postos de atendimento abertos e os serviços de apoio operacionais. Verdadeiros heróis da causa pública. Com a sua atitude e entrega, deram uma lição a alguns gestores que ignoram a função social das empresas e procuram apenas a maximização de lucros e de dividendos, como se as empresas fossem entidades amorais, desligadas da sociedade envolvente.

 

Encaramos as relações laborais com respeito pela negociação, uma postura profissional que procura ter uma visão holística de todos os interesses em compita, independência face a entidades externas aos trabalhadores, respeito pela propriedade privada, e a noção de que os seres humanos são o princípio e o fim de toda a actividade económica. Valores e postura que nos colocam nos antípodas de outros, para quem as relações laborais assentam em dialética e posições maniqueístas.

 

A União dos Sindicatos Independentes (USI) tem entre os seus membros três estruturas sindicais que representam trabalhadores dos CTT: SITIC, SICOMP e FENTCOP. Estas e os demais sindicatos convocaram uma greve para dia 29 de Maio, protestando contra a imposição do cartão de refeição.

 

Como é evidente, mandaria o bom senso que se continuasse a procurar uma solução de compromisso, que se salvaguardasse os interesses de todos, o que só se alcançará à mesa das negociações. Não foi esse o entendimento da administração dos CTT. Teríamos preferido, em tempo de pandemia, solidariedade e entrega à causa pública, que a administração usasse a força de eventuais argumentos superiores e não a pobreza da imposição.

 

Convidamos a administração dos CTT a repensar e a corrigir um rumo autoritário que a todos prejudicará e que não honra os pergaminhos da empresa. Em todo o caso, se é essa a vontade da administração, que fique claro que também não viramos a cara à luta. A USI não deixará de estar ao lado dos trabalhadores no dia 29 de Maio.

 

 

29.05.2020 - Jornal Económico

Sempre que os partidos políticos com representação parlamentar apresentam novos projetos de lei, tal como decorre de imposição legal, estes são submetidos a apreciação pública. Assim, ao longo de uma sessão legislativa, centenas de projetos de lei são sujeitos a escrutínio público prévio. Naturalmente, é muito positivo que tal suceda, na medida em que se trata de um fator de transparência, de escrutínio e, em última instância, um mecanismo que enriquece a nossa democracia.

 

Ora, compete à sociedade civil, às organizações laborais, entre muitas outras, e aos cidadãos, se assim entenderem, fazerem uso desta oportunidade que lhes é oferecida e transmitirem ao Parlamento a sua apreciação, independentemente de ser concordante ou discordante.

 

Nem todos os projetos de lei me interessam, como é evidente. Enquanto líder sindical, como é compreensível, são as propostas que incidem em particular sobre matérias de natureza laboral que me merecem especial atenção.

 

Mais do que atenção em abstrato, são alvo em concreto de apreciação. Por uma questão de cidadania, mas frequentemente também por ter interesse direto nestas matérias, o sindicato que lidero faz sempre questão de dar o seu parecer sobre os projetos de lei que incidam sobre matérias laborais.

 

A título de exemplo, este ano já nos pronunciámos sobre 12 propostas que incidiram sobre matérias laborais, e no ano passado fizemos chegar à Assembleia da República o nosso parecer sobre as 39 propostas legislativas que se focavam nos trabalhadores.

 

Há, no entanto, um dado curioso, diria até desconcertante, que tenho vindo a observar, ano após ano. Confesso que, enquanto líder sindical, é com algum desconforto que tenho vindo a constatar que os projetos de lei que dizem respeito diretamente aos trabalhadores são oriundos, na sua esmagadora maioria, de um núcleo muito concreto de forças partidárias.

 

E, em sentido contrário, não tenho podido deixar de notar a – surpreendente, para mim – ausência reiterada de outras forças políticas e partidárias, como se o seu universo eleitoral não incluísse cidadãos que, espanto dos espantos, trabalham e gostariam de ver melhoradas as suas condições de trabalho.

 

De algum modo, olhando para o que se passa no Parlamento do ponto de vista legislativo, é difícil não concluir que há alguns partidos que, por razões que só a eles lhes compete clarificar, parecem não estar muito interessados em contribuir para a melhoria das condições de vida dos trabalhadores. Como se nada existisse para melhorar. Como se nada carecesse de aprofundamento. Como se tudo estivesse bem, tal como está.

 

Realidade estranha, esta em que vivemos. O mundo do trabalho, por omissão, é espaço legislativo exclusivo de alguns. Ora, aquilo que a história nos ensina é que o vácuo tende sempre a ser preenchido. Bem vistas as coisas, talvez não seja por acaso, ou coincidência, que estão a emergir no nosso sistema político novas forças políticas com representação parlamentar.

 

22.05.2020 - Jornal Económico

Neste período de enorme incerteza tenho aqui elogiado repetidamente o amplo consenso político e social, que permitiu evitar a anunciada catástrofe sanitária, bem como o papel exemplar dos administradores hospitalares do Serviço Nacional de Saúde (SNS), na reformulação de circuitos, no estabelecimento de procedimentos de testagem, acolhimento, internamento e tratamento dos doentes com Covid-19. Um exemplo extraordinário de competência ao nível da gestão.
 
Importa também elogiar a prontidão e a decisão política no tocante à criação das linhas de crédito e das moratórias, aliviando pressões de tesouraria de empresas, preservando emprego, até ver e dentro do possível, e mantendo a funcionalidade e a capacidade de consumo das famílias.
 
Mas queria elogiar também a prontidão, a capacidade de execução e rapidez dos bancos de retalho, e dos bancários que neles trabalham, absolutamente críticos no fornecimento de liquidez e no alívio das famílias e empresas. Este é outro dos momentos marcantes na sociedade portuguesa, ombreando com a capacidade de gestão, com a entrega e a competência dos profissionais do SNS. Obrigado, bancários. Não foram (e são) os únicos a ter um papel crucial, mas é justo destacá-lo, pois sem vós o país tinha colapsado!
 
Olhando para Espanha, ou para a Alemanha, vemos que as nossas medidas de política económica foram acertadas. Mas a dimensão e a relevância económica ainda estão longe daquilo que a economia requer. Sabemos que a capacidade de endividamento dos países não é igual. Mas sem quaisquer dúvidas, e até porque as “linhas de crédito Covid-19” estão esgotadas, vai ser necessário reforçar os seus montantes, de forma significativa e quanto antes. Sob pena de termos uma vaga de falências e desemprego sem precedentes, provavelmente pior do que o ocorrido na Grécia aquando do resgaste de há meia dúzia de anos.
 
E por falar em Banco de Portugal, o nosso regulador nada diz sobre o facto de alguns bancos estrangeiros estarem a repatriar dividendos para os países de origem?
 
Infelizmente, a tentativa de uma certa chanceler de intimar os seus cidadãos a fazer férias domésticas ou dos juízes de Karlsruhe de tentar intimidar as decisões dos órgãos da União Europeia, uma e outros potencialmente aprofundando a recessão portuguesa (sim, o turismo é a nossa força e fraqueza), ou a desconfiança dos mercados de capitais face aos PIGS, só pode ter uma resposta política: agir com rapidez e de forma decisiva para mitigar os efeitos económicos da pandemia.
 
15.05.2020 - Jornal Económico

No meio da emergência sanitária e da pandemia, estalou uma polémica a propósito da forma como alguns decidiram comemorar o 1º de Maio.

 

Argumentaram uns que a data tinha de ser comemorada de forma pública, como sempre foi, e que os desafios que se nos apresentam impunham que esta comemoração se continuasse a fazer na rua. Outros, pelo contrário, salientaram que era suposto respeitar o estado de emergência, e por isso celebrar a data de forma mais virtual.

 

Abundaram igualmente críticas sobre quem legislou, autorizou e cedeu meios, para que as restrições aplicadas aos outros cidadãos, mormente à circulação ou o distanciamento social, tivessem admitido tal excepção.

 

Independentemente da justiça dos argumentos de uns e de outros, permitam-me reiterar que existem três mitos que estão na base desta discussão. No fundo, querer reduzir o movimento sindical português a uma Alameda, é tomar a nuvem por Juno.

 

O primeiro é que o 1º de Maio é, no essencial, uma festa marxista-leninista, o que manifestamente não é. A data celebra direitos vitais de quem trabalha: horários, direito ao descanso, remuneração digna, proteção contra acidentes e doença, ou férias pagas, e homenageia aqueles que em Chicago, em 1886, deram a vida, numa impressionante manifestação, para que hoje os trabalhadores do mundo livre pudessem ter estes direitos. Tudo muito anterior aos partidos políticos continentais europeus. O 1º de Maio não tem donos nem ‘herdeiros’ designados por testamento autoproclamado.

 

O segundo mito é que os sindicatos são todos controlados por partidos de extrema-esquerda. Lamento, mas não são, ainda que alguns gostassem que assim fosse. A manifestação em rua, o preenchimento do espaço mediático, não são o exclusivo de uma forma de sindicalismo em oposição a todas as outras. A maior parte dos sindicatos, em Portugal, são de matriz independente, não filiados em qualquer partido político. Lamento que alguma comunicação social reduza o mundo sindical a preto e branco, quando existem muitos tons e matizes. Ignorar a diversidade sindical pode ser útil para alguns, mas é uma realidade que não corresponde aos factos.

 

O terceiro mito é que a defesa dos direitos dos trabalhadores não se pode fazer de diversas formas. Só o protesto de rua corresponde ao genuíno sindicalismo. Nada de mais errado. A negociação, a capacidade de perceber os interesses e as posições antagónicas, o ser capaz de chegar a compromissos, em nada diminuem os direitos dos trabalhadores, ou a salvaguarda dos seus interesses a longo-prazo.

 

Num 1º de Maio têm lugar todas as visões e ideologias, incluindo daqueles que recusam servidões partidárias. Foi da livre disputa entre várias visões que o movimento sindical cresceu, foi ganhando robustez e se tornou responsável pelos maiores avanços nas condições de vida dos trabalhadores. É a partir da defesa intransigente dos trabalhadores, sem subserviências que não aos próprios, que podemos aspirar a uma sociedade mais justa, onde o labor, o mérito e a competência possam frutificar.

 

Seria melhor que a sociedade portuguesa valorizasse mais a negociação colectiva e pugnasse pela existência de uma concertação social mais plural. A discussão sobre uma qualquer Alameda perderia certamente relevância. Afinal, em Portugal, no mundo sindical não há Donos Disto Tudo.

 

08.05.2020 - Jornal Económico

Nas últimas semanas, ao abrigo do estado de emergência, foram decretadas medidas de excepção que colocaram em suspenso um conjunto de direitos, liberdades e garantias cívicas e laborais. É certo que tal ocorreu a título temporário, mas ainda assim importa estar vigilante para que, passada esta fase mais aguda de ameaça da Covid-19 e das vagas recorrentes que se esperam, a crise em curso não sirva de pretexto para sacrificar os direitos dos trabalhadores perante o altar da tão desejada recuperação económica.

De facto, perante a urgência de se combater a pandemia, nas últimas semanas relegámos para segundo plano uma discussão importante sobre os direitos dos trabalhadores. Alguns exemplos?

Primeiro: os trabalhadores que prestam serviços públicos essenciais em contexto de pandemia, sejam eles profissionais de saúde ou dos supermercados, funcionários de lares, bancários, trabalhadores de farmácias, entre muitos outros, não deveriam auferir de um subsídio de risco?

Segundo: é aceitável que inúmeras empresas e sectores tenham suspenso os processos negociais relativos a 2020 e 2021, remetendo para uma data mais ‘oportuna’ a negociação de cláusulas laborais e de actualização pecuniária?

Terceiro: é admissível que metade dos desempregados não tenha acesso ao subsídio de desemprego? E o que dizer dos trabalhadores independentes, dos falsos recibos verdes, dos empresários em nome individual ou dos empresários das micro-empresas, remetidos para o caixote do quase esquecimento?

Quarto: tem sentido que os layoff, as suspensões totais ou parciais da prestação de trabalho, incidam, e de forma apenas parcial, sobre a remuneração base, deixando de fora componentes regulares e importantes da remuneração dos trabalhadores?

Quinto: é eticamente aceitável que empresas de serviço público, com contrato de concessão, recorram ao mecanismo de layoff?

Sexto: vamos reabrir as escolas sem assegurar as condições de higiene, distanciamento social, desconcentração espacial e os equipamentos de proteção individual a alunos, professores e demais pessoal escolar?

Os exemplos poderiam continuar, claro está.

Gostaria ainda de notar que os maiores bancos têm vindo a suspender a distribuição de dividendos, enquanto outros operadores financeiros, quase sempre subsidiários de empresas não nacionais, mantêm a remuneração dos seus accionistas, com isso não acautelando o reforço da solidez que, em caso de necessidade, permitirá manter a operação e os postos de trabalho. Sobre isto, curiosamente, o regulador nada diz?

No essencial, as medidas de emergência coartaram, e bem, direitos de circulação, impuseram confinamento social e encerraram algumas actividades. Contudo, de forma que me deixa perplexo, permitiram legislar por decreto em matérias que afectam os trabalhadores, sem que tenham beliscado o interesse das sociedades anónimas e dos seus accionistas.

Por tudo isso, há nuvens carregadas no horizonte da negociação colectiva. O quase imperativo de recuperação económica, a que todos aspiramos, poderá trazer a tentação de um modelo mais desregulamentado, fazendo pairar o espectro de que o layoff ou o teletrabalho se tornem o ‘novo normal’, com isso precarizando vínculos laborais e fragilizando as formas organizadas de representação laboral.

O dever de vigilância de todos aqueles que trabalham não pode abrandar, sob pena de um mundo novo estar a chegar.

 

30.04.2020 - Jornal Económico

Ele veio para ficar, pelo menos por longos e dolorosos meses. Muitas interrogações e poucas respostas definitivas: como se transmite, quão contagioso é, qual a letalidade real, quantos ventiladores existem em Portugal, e qual a capacidade de resposta dos cuidados intensivos (contando com o SNS, mas também com os cuidados de saúde prestados nas esferas social e privada).

Se, nos primeiros dias de Março, é incontroverso que poderia Portugal ter actuado de forma mais decisiva, é igualmente um facto indiscutível que depois do encerramento das escolas demonstrámos liderança política, obediência social, empenho e profissionalismo na preparação para a pandemia, e para os seus efeitos sanitários e económicos.

Agora, porém, vamos entrar na fase mais complexa, que passa por assegurar a reabertura da economia, levantando restrições e calibrando a supressão do vírus com as consequências económico-sociais do confinamento.

As respostas políticas têm sido no sentido certo. Mas a falta de músculo financeiro da República fará com que apenas ocorra uma compensação parcial dos efeitos económicos nefastos da pandemia. Isto dito, importa frisar que foi evitada uma crise bancária, o que não é, evidentemente, um dado irrelevante.

Estes dias finais de estado de emergência serão decisivos para identificar forças e fraquezas no dispositivo sanitário de identificação, isolamento, tratamento e internamento, e para reforçar a capacidade de resposta, recorrendo a todos os recursos disponíveis.

Dito isto, no mês de Maio teremos um grande desafio a várias dimensões. Por um lado, teremos de manter o isolamento e o dever de recolhimento e de protecção dos mais idosos e mais frágeis de saúde. Por outro, para a restante população, as restrições ao trabalho deverão ser levantadas, mas continuando em vigor a opção pelo teletrabalho, sempre que possível.

Quanto às empresas, a maior parte dos sectores podem e devem operar, sempre que respeitem as normas de distanciamento social, de teletrabalho e os protocolos sanitários. Contudo, ainda assim, algumas restrições à mobilidade regional e nacional deverão ter de continuar. Restam, porém, muitas dúvidas sobre a razoabilidade da eventual reabertura do sector dos ‘eventos’.

Nesta fase, como tem sido evidente, urge dar especial atenção aos temas da desinfeção dos ambientes hospitalares e dos lares, locais que têm sido importantes focos de contágio, bem como do alojamento dos trabalhadores imigrantes, não raro congestionados, eles que são vitais no cuidado de idosos e nas tarefas de natureza agrícola.

No meio da devastação sanitária e económica, gostaria de terminar este artigo realçando as inúmeras iniciativas de mitigação destes efeitos, por parte de grupos voluntários de cidadãos, IPSS, misericórdias e fundações. Não nos esqueçamos deles, quando consignarmos o nosso IRS ou IVA. Para estas instituições, todos os cêntimos são preciosos. Reabertura e solidariedade. Cara e coroa. Seremos capazes?


24.04.2020 - Jornal Económico

CEC European Managers is the voice of one million managers from 17 countries of the European Union (EU) and wants to express its solidarity and support for the measures that must be taken by the EU to face the current crisis. Europe is battling the most serious pandemic outbreak in the past XNUMX years, with the highest number of victims so far. Similar episodes have reached the world before: we can see in history how they shaped economies and marked political and social developments.

 

This time, the EU exists as a framework for cooperation. The institutions showed the ability to react and guarantee their basic functions. During the health emergency, the EU was able to keep the single market open, guarantee the return of citizens, support the euro in the global financial market and provide aid funds. This emergency will soon be followed by other dramatic consequences.

 

Firstly, a humanitarian crisis, both at the borders of the EU and elsewhere, which will explode when poverty meets Covid-19. Others already have signs of democratic degradation that is spreading to countries where the basic principles of the rule of law are being suspended by authoritarian emergency laws.

 

Second, a socio-economic crisis that is already profoundly affecting countries. Hundreds of thousands of companies have been forced to stop their activities, laying off workers and preparing for economic contractions.

 

In defining the common reaction to the economic crisis, we hope that the European institutions will be able to act boldly, inspired by two assumptions: that no European country, no matter how solid its public finances and its productive system, can be considered immune to shocks that will come and that financial solidarity between countries that are part of a common market is an economic necessity rather than a matter of moral duty.

 

We are confident that effective measures will be identified and we have the support of Member States to enable their implementation. They should identify a recovery path focused on sustainability, accelerating the transition to new business models. In this process, the social partners are essential: in representing the agents of economic recovery, they are in the best position to understand what is working and what is not.

 

The management workforce can bring more information, thanks to the role of building bridges that managers play between the two sides. When the time comes for reconstruction, for strong leadership capable of anticipating appropriate policy scenarios and responses, it will be crucial. The people we represent, managers and professionals from all sectors and various hierarchical levels are daily faced with this task, making the right decisions to ensure that companies thrive in respect of common needs and future generations.

 

In these special moments that lie ahead, the values ​​of competence, responsibility, foresight and perspective thinking - values ​​that identify managers - are highly necessary. Exceptional circumstances like these call for unprecedented measures and unprecedented cooperation between policy makers and all stakeholders in society. Make sure that European managers are there, ready to play that role in this historic challenge.

 

17.04.2020 - Jornal Económico

Felizmente existe um quase consenso na sociedade de que os tempos de excepção que atravessamos acarretam duas dimensões que têm de ser conciliáveis: a emergência sanitária e, quase a par e passo, o apoio às empresas e às famílias que estão a sofrer (ou irão sofrer) com a paragem da economia portuguesa.

 

Anteriormente, salientei aqui que o padrão de especialização da nossa economia, a baixa rendibilidade das micro e pequenas empresas, e os baixos salários dos trabalhadores, irão implicar um esforço acrescido de capacidade de liderança e de solidariedade, sob pena da recessão que vamos sofrer se transformar numa depressão sem igual.

 

Em nome da solidariedade, em todos os países da OCDE, que estão a decretar moratórias e a tomar medidas para fazer chegar liquidez às empresas e às famílias, os bancários e os bancos estão a desempenhar um papel crucial.

 

Não me refiro aos pseudo-bancos que não têm balcões, que não pagam impostos em Portugal e que beneficiam de dumping fiscal, e que nem empregam trabalhadores portugueses. Pseudo-bancos virtuais, pelos quais nos últimos anos os portugueses pareciam apaixonados por não cobrarem comissões, mas agora que precisam deles, estão ausentes.

 

Na hora da verdade, restam-nos os bancários dos bancos que realmente têm portas abertas em Portugal e que em poucos dias montam as moratórias ou as linhas de tesouraria que as famílias e as empresas necessitam. Os mesmos bancários que prestam serviço público, de apoio à emergência económica, e que estão a servir os portugueses, independentemente das condições de segurança sanitária nos seus locais de trabalho.

 

Naturalmente, seria conveniente que a República Portuguesa tivesse um sistema de garantias mútuas mais generoso (abrangendo tanto coberturas perto dos 100% dos créditos, como empresas em NPL, mas a laborar, a empregar e a pagar os seus impostos), mais rápido, e mais capaz de acompanhar a eficácia e a eficiência dos bancários. Este é o papel de quem está a prestar serviço público no sector financeiro, i.e. fazer chegar o alívio de tesouraria a quem dele mais precisa e com toda a celeridade.

 

Estes são os mesmos bancários que no passado foram vítimas de ‘banqueiros’ que, fruto de políticas de concessão de crédito imprudente, colocaram os seus bancos em sérias dificuldades. Claro está que não nos esquecemos que foram os contribuintes, os accionistas, muitos deles pequenos aforradores, e os bancários (um em cada três perdeu o seu posto de trabalho), os grandes prejudicados pela imprudência na concessão de crédito a grandes empresas que incumpriram de forma estrondosa.

 

Que me perdoem todos os demais, mas os bancários foram imolados na praça pública por crimes que não cometeram e os verdadeiros responsáveis, após todos estes anos, continuam sem ser julgados nos tribunais.

 

Os bancos devem prestar todo o apoio à economia? Claro que sim. É um imperativo moral, ao qual acresce uma responsabilidade social inelutável, dentro de saudáveis critérios de prudência e de racionalidade económica. Apoiar a economia, sim, mas sem populismos bacocos e sem esquecer o quanto nos custaram os resgates passados.

 

Os bancários não voltarão a ser vítimas inocentes da imprudência do passado, alvos colaterais de populistas ou de gestores imprudentes. Estamos e continuaremos a estar ao lado dos portugueses, nesta hora em que tanto precisam de nós, contribuindo activamente para apoiar a economia. Apenas e só, o que não é pouco.

 

09.04.2020 - Jornal Económico

Tenho aqui escrito sobre a crise da Covid-19 e a importância de actuar em simultâneo nas diversas realidades presentes: os mecanismos de contágio e contenção; a saúde das empresas e o rendimento dos trabalhadores (englobando trabalho dependente, independente, gerentes e empresários das micro e pequenas empresas).

Por ora o foco da opinião pública incide nos mecanismos de contágio e contenção. Recolhimento social, estado de emergência, testar e isolar, tratar, tudo isto. E bem.

Mas convém manter a perspectiva de que Portugal, com a sua enorme dependência do turismo, das indústrias de acolhimento e socialização e nos serviços, muito provavelmente vai ser o país europeu mais afectado pela pandemia. Diversos estudos, aliás, corroboram este prognóstico.

O Banco Central Europeu (BCE) tem respondido de forma competente a esta crise. Porém, o programa de dívida dos Estados-membros, apesar de vultuoso, apenas dará para um par de meses de apoios à economia e às pessoas. E com a política monetária, manietada por taxas de juros nulas ou negativas, despojada de eficácia, claramente o actual rumo do BCE não vai chegar. Vamos precisar de mais. Muito mais.

Vamos precisar que a União Europeia e o BCE financiem um Rendimento Mínimo Universal (RMU). Um RMU regular, mês após mês, dirigido a todos e a cada cidadão individual, incondicional, sem qualquer requisito de rendimento ou de trabalho (conquanto possa ser objecto de tributação nos escalões superiores).

Aquilo que os economistas cunharam como o ‘helicóptero’ do dinheiro. Colocar o BCE a criar dinheiro para que cada Estado-membro o possa utilizar para manter a dignidade das pessoas, a sua capacidade de consumir e de manter a economia a funcionar.

O grande risco de não fazer voar o ‘helicóptero’ é o de termos uma enorme depressão. Algo de uma magnitude nunca vista anteriormente. Baixas taxas de juro ou compra de dívida pública (por mais massiva que seja), de pouco servirá aos trabalhadores, aos pequenos empresários e às famílias que viram os seus rendimentos diminuir brutalmente.

É tempo de olhar para o ‘helicóptero’ do dinheiro em discussão no Canadá e nos EUA. Já!


03.04.2020 - Jornal Económico

Esta é uma crise diferente e única. Estamos a viver um choque em simultâneo do lado da procura e da oferta, ambas em retracção, num contexto de política monetária sem eficácia, apesar das taxas de juro próximas de zero ou negativas, e com uma rede de integração global das cadeias de fornecimento. Esta é uma pandemia que não poupa ninguém.

Estiveram bem o Presidente da República e o primeiro-ministro, na declaração e implementação do estado de emergência. Está em causa a nossa saúde e a nossa própria sobrevivência. Todas as horas são decisivas para tentar mitigar o número de mortos e para implementar o brutal desvio de recursos que vai ser necessário para combater esta pandemia.

A Covid-19 e o seu efeito destruidor sobre as nossas vidas, os sistemas de saúde e o emprego dependem de um trio de competências onde tudo se joga: colocar a taxa de retransmissão abaixo de 1; implementar políticas que preservem os postos de trabalho e rendimentos dos trabalhadores; e fornecer liquidez abundante, e tendencialmente grátis, às empresas.

Não haja ilusões. Vai ser necessário fazer muito para poupar, na medida do humanamente possível, os trabalhadores e as famílias, agora e sempre os grandes esquecidos do poder político e empresarial.

Vai ser preciso preservar os rendimentos dos trabalhadores que tiverem que prestar assistência aos filhos, após a quinzena inicial de encerramento das escolas. Este ano não há férias da Páscoa e os trabalhadores não devem ser minimamente penalizados por uma medida de elementar segurança e combate à pandemia, como é o caso do encerramento, potencialmente sine die, das escolas, determinada pelo Estado. Ou pelo decorrente cumprimento do dever legal de assistência aos seus filhos. Sim, é uma obrigação, não é uma opção.

Por outro lado, precisamos que os mecanismos de suspensão dos contratos de trabalho, vulgo lay-off, sejam mais simples, mais directos, sem presumir que as empresas terão tesouraria para adiantar a parte da Segurança Social.

Necessitamos, ainda, que os trabalhadores afectados por lay-off, extinção de postos de trabalho, não renovação dos contratos a prazo, ou pelo encerramento das empresas, vejam grande parte do seu rendimento preservado. Nunca menos de 80%. É patético estabelecer limites superiores para subsídios de desemprego/lay-off tão baixos que não permitem, para uma pandemia que queremos debelar em algumas semanas ou meses, que se preserve a capacidade de viver, comer, pagar a educação dos filhos ou a renda das casas.

É imoral fingir que interpretações restritivas do salário-base correspondem à remuneração dos trabalhadores, tal como querer atribuir subsídios a calcular sobre baixos salários-base. Seria melhor e mais justo respeitar o conceito de remuneração mensal efectiva.

Todos os indícios mostram que esta pandemia vai afectar de forma desproporcional muitos sectores e países. O turismo e o acolhimento, enquanto sectores, e os países em que o PIB está orientado para os serviços, vão ser os maiores perdedores. Sim, isso mesmo. Na Europa, os países do sul irão liderar o pelotão onde os impactos económicos e o sofrimento das famílias, dos trabalhadores e das empresas serão maiores.

Está na mão da nossa ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social mostrar de que fibra é feita: queremos sujeitar os trabalhadores portugueses ao maior choque de que há memória e arriscar a sua (in)solvência financeira (os tempos da troika, por comparação, irão parecer uma mera brincadeira), ou vamos optar por preservar a sua dignidade e a sua capacidade de voltarem rapidamente ao mercado laboral?


27.03.2020 - Jornal Económico

Os portugueses têm uma relação de carinho com as classes profissionais que associam ao serviço público. No sentido judaico-cristão de entrega, dedicação aos outros, em especial em situações de calamidade ou de emergência.

 

As Forças Armadas quando nos livram de uma ditadura; os bombeiros, quando enfrentam as chamas e protegem a vida e a propriedade de terceiros, em montes e vales inacessíveis; os médicos e os enfermeiros, quando não rejeitando sacrifícios, nos atendem nas urgências, numa qualquer, e não apenas em situação de pandemia.

 

Talvez por tudo isto, estas sejam algumas das classes profissionais mais admiradas em Portugal e que a comunicação social, bem, valoriza.

Nos últimos dias, correram céleres as imagens de uma enfermeira italiana, exausta, no seu posto de trabalho. Ou a verdadeira tragédia, no momento em que escrevemos estas linhas, de quase 20% dos infetados com o novo coronavírus serem médicos. Tocante. Dramático. Sinal de muita impreparação e falta de planeamento de quem tem responsabilidades.

 

E numa altura em que uns se aproveitam de forma imoral da tragédia que vivemos, sejam vendendo máscaras, luvas e gel desinfetante a preços pornográficos, ou aproveitando para despedimentos e encerramentos, talvez os portugueses, como um todo, se estejam a esquecer de tantas outras classes profissionais que honram a noção de serviço público, independentemente serem ou não funcionários públicos. Portugueses que são agentes essenciais para o funcionamento das sociedades modernas e que colocam os interesses de clientes e utentes, em primeiro lugar.

 

Os exemplos que nos chegam de outros países, onde sérias medidas de restrição social já foram implementadas, mostram que mesmo em Estado de emergência, ou de calamidade, há certos serviços e profissionais que são absolutamente indispensáveis para não regredirmos, num ápice, para o caos e a idade da pedra. Estes profissionais arriscam a sua saúde e, no limite, as suas vidas, ao serviço da comunidade, num momento em que enfrentamos um desafio que não terá paralelo no espaço de uma ou várias gerações.

 

Profissionais como, entre outros, os motoristas dos transportes públicos e de mercadorias, os funcionários das estações de serviço, dos serviços de limpeza, das forças de segurança, das farmácias, dos supermercados e os bancários. Sim, os bancários que, por vezes, uma certa opinião pública tem pretendido transformar em vilões de crimes cometidos por outros. Os bancários que mantêm os seus balcões ao serviço dos seus clientes.

 

Todas estas classes servem os seus clientes ou utentes com elevado sentido de responsabilidade, em condições de segurança aquém do que seria desejável, como é fácil de perceber.

 

Todos eles em contacto de proximidade com clientes e utentes. São eles, também, os heróis desta luta contra a pandemia e que me fazem ter tanto orgulho em ser português e ser bancário!

 

20.03.2020 - Jornal Económico

Nas últimas duas semanas temos vindo a assistir a grandes oscilações nas bolsas de valores, num movimento contínuo que se tem caracterizado por uma queda assinalável a nível mundial. Um quadro de incerteza fortemente ampliado pelo impacto da guerra de petróleo entre a Arábia Saudita e a Rússia, por um lado, e pelo efeito do Covid-19, por outro.

Pouco a pouco, vamos tomando consciência de que os impactos sobre a economia mundial poderão ser mais intensos e duradouros, e com repercussões relevantes para lá das próximas semanas. Impactos no turismo, decerto, mas também nas cadeias globais de produção de produtos semi-acabados e acabados.

Neste novo contexto em formação, é provável que algumas atividades económicas sejam trazidas ou replicadas em vários continentes, nomeadamente Europa e Américas, assim deixando de ser um monopólio da Ásia. Podemos, por isso, estar prestes a assistir a um fenómeno de near shoring, trazendo de volta empregos industriais perdidos no passado para o Sudoeste Asiático e o subcontinente indiano. Falta perceber, todavia, se a retração no turismo será temporária ou permanente, tema que interessa sobremaneira aos agentes económicos portugueses.

Ao mesmo tempo, os próximos dias poderão trazer o encerramento paulatino de atividades escolares, espetáculos e um progressivo alargar de áreas sob quarentena. Trata-se de medidas necessárias, mas que não deixarão de elevar o nível de ansiedade da sociedade.

Isto dito, esteve bem o Governo ao aprovar um conjunto de medidas de apoio às empresas e aos trabalhadores potencialmente afetados. Convém aprender com Itália, e atuar sem tibiezas, tentando conter o Covid-19. Com uma taxa de mortalidade acima dos 3% e com mecanismos de transmissão, conquanto ainda não totalmente conhecidos, que parecem ser bastante céleres, todo o cuidado é pouco.

A terminar, uma nota de alerta. Os cidadãos e os trabalhadores terão de estar particularmente atentos, pois é nestas alturas de alteração de paradigma que emergem os pequenos ditadores, atores de uma ópera bufa, em que os homens providenciais não tardarão a colocar as culpas no outro, no estrangeiro, ou numa qualquer minoria.

E deverão trabalhadores e cidadãos estar também vigilantes, porque em breve não faltarão os empresários e os gestores incompetentes a falar em lay-off, negação de aumentos salariais e outros sacrifícios a impor aos trabalhadores, em nome de uma qualquer crise ao virar da esquina. Estejamos, pois, atentos e vigilantes, muito atentos e vigilantes.


13.03.2020 - Jornal Económico

Os códigos de conduta devem procurar traduzir de que forma os valores organizacionais, as crenças e a cultura de cada organização norteiam, ou devem nortear, o comportamento de dirigentes e trabalhadores.

Fruto de vários comportamentos inapropriados nas áreas de mercados de capitais por parte de traders pouco escrupulosos e gestores complacentes, os códigos de conduta, antes uma raridade, foram fazendo o seu caminho no sector financeiro. Procurava-se, então, prevenir o inside trading, o misselling, estabelecer regras mais claras para a internalização de ordens de clientes na carteira própria dos bancos de investimento e de corretoras, entre outras questões.

A transposição para Portugal da Directiva dos Mercados de Instrumentos Financeiros foi o catalisador que levou à banalização de tais códigos de conduta e ética, que passaram a ser exigidos por vários reguladores, em cada um dos principais sectores de actividade económica.

Esteve bem a legislação portuguesa ao prever a prévia auscultação aos representantes dos trabalhadores, tornando tal parecer obrigatório, conquanto não vinculativo.

Na esteira desta vaga de fundo, várias empresas, do sector financeiro, mas não só, criaram os seus códigos de conduta. Porém, frequentemente, tais códigos extravasam a função original para que foram criados e parecem ser instrumentos de limitação, de forma unilateral, dos direitos dos trabalhadores.

Com efeito, para que entrem em vigor, é suficiente uma mera comunicação e tomada de conhecimento por parte dos trabalhadores, os quais terão apenas 21 dias para deduzir oposição e se pronunciarem, individualmente. A não resposta pressupõe a adesão e a concordância dos trabalhadores às suas exigências.

Frequentemente, as exigências traduzem-se em deveres acrescidos e limitação de direitos e liberdades dos trabalhadores, bem como na imposição de deveres excessivos que não constam dos contratos de trabalho. Ou seja, estes códigos por vezes vão mais além do que a legislação laboral ou a contratação colectiva relativamente a direitos e deveres.

Alguns exemplos. Uma determinada entidade, cotada em bolsa, obriga, por via do código de conduta, a que seus trabalhadores tenham como única actividade remunerada aquela que lhes proporciona a empresa. Mesmo actividades que não colidam com a do empregador em causa estão vedadas pelo código. Parece-nos totalmente despropositado que uma empresa do sector financeiro queira impor, sem pagar, tal noção de exclusividade.

Uma outra entidade quer que a candidatura, a mera candidatura, de qualquer seu trabalhador a órgãos de soberania seja precedida de uma comunicação prévia ao empregador. Os defensores da liberdade só se podem indignar com isto. Parece que regressámos a tempos passados de má memória…

A democracia e a liberdade de uma sociedade também se concretizam na forma como lutamos e repelimos tais exigências de deveres excessivos. Deveres que se podem confundir com uma maneira expedita de arranjar justificação para despedimentos.

Códigos de conduta a limitar direitos, liberdades e garantias constitucionalmente consagrados terão sempre a nossa veemente oposição em todos os fóruns. Sempre.


06.03.2020 - Jornal Económico

Alguns fóruns europeus têm vindo a desenvolver uma agenda que procura promover modelos de trabalho flexíveis, sem que os mesmos se transformem em soluções de precariedade ou modelos encapotados semi-esclavagistas. Estes modelos de trabalho flexíveis podem assumir diversos formatos, mas a sua implementação tem sido lenta e com elevada discrepância regional entre o Norte e o Sul da Europa.

Por um lado, existem obstáculos legais e processuais. Por outro, temos um tema de cultura de gestão. Nos primeiros encontramos temas tão diversos como a ausência de regulamentação sobre os seguros de acidentes em caso de teletrabalho ou, muito simplesmente, a ausência de enquadramento legal.

Acresce que o maior entrave estará na própria noção do que deverão ser os atributos clássicos de um bom gestor. Um bom líder ainda é frequentemente sinónimo de estar sempre disponível e presente fisicamente no escritório. Uma cultura de ‘presentismo’, ou de cara-a-cara, e o medo de que um líder perca estatuto por essa via são frequentemente o âmago da questão.

A dimensão do problema amplia-se pela falta de modelos de referência no seio das organizações e de pessoas que tenham tido sucesso profissional em trabalho flexível, ou ‘flexi-trabalho’. Os gestores de topo não se envolvem na promoção do flexi-trabalho, salvo raras excepções, e as organizações, de igual modo, não preparam planos de formação para que os supervisores e os gestores intermédios possam acompanhar, guiar e estimular a sua adopção.

Tudo isto é tanto mais incrível quanto a evidência empírica nos diz que o flexi-trabalho aumenta a atractividade das empresas no recrutamento e retenção de talento, aumenta a produtividade e os níveis de motivação, estimula a criatividade entre os trabalhadores com funções conceptuais ou analíticas, assegura mais tempo de qualidade e um balanço entre trabalho e vida pessoal mais equilibrado, tal como reforça os incentivos e melhora as condições de igualdade entre homens e mulheres.

Em Portugal, porém, os serviços públicos e as empresas privadas de média e grande dimensão pouco uso fazem do potencial destes modelos de maior flexibilidade. E, para tornar a situação ainda pior, algumas empresas de serviços, muitas vezes cotadas ou com historial no mercado de capitais, usaram e ainda usam a figura da Isenção de Horário de Trabalho (IHT) como lhes dá jeito.

Recorrem às IHT não como forma genuína de estimular o flexi-trabalho e aumentar a produtividade e a satisfação dos seus quadros e técnicos, mas como mecanismo de retenção e recompensa retributiva, à laia de aumento remuneratório, merecido, mas passível de ser retirado com pré-aviso curto. Empresas essas que aproveitam a ausência de cultura e conhecimento dos trabalhadores, mesmo os mais qualificados, sobre a verdadeira natureza das IHT, tornando precário aquilo que os trabalhadores tomaram, na sua boa-fé, como um genuíno aumento salarial e um direito adquirido.

Algumas destas empresas proclamam a sua adesão a princípios de trabalho flexível ao mesmo tempo que fazem um ataque cerrado às IHT das quais, elas próprias, usaram e abusaram. Por este andar, vamos ter uma Primavera muito agitada nos Tribunais de Trabalho…


28.02.2020 - Jornal Económico

A duplicidade na vida das sociedades, seja no domínio económico, político ou comercial, é dos aspectos que mais destrói a confiança nas instituições e nas pessoas. Vários estudos demonstram que onde predomina a duplicidade, aquilo que vulgarmente designamos de dizer uma coisa e fazer outra, a mediocridade é o fio condutor, o nível de desenvolvimento económico é baixo e as perspectivas futuras destas sociedades são negativas.

Vem isto a propósito de três momentos que marcaram a semana. Primeiro caso. A União Europeia estabeleceu uma moratória, até Dezembro deste ano, na aplicação de uma taxa sobre as transacções dos gigantes internacionais da internet. Sediadas em paraísos fiscais, estas empresas pouco ou nada pagam de impostos directos nos países onde realizam as suas receitas.

Contudo, esta semana, o Conselho de Ministros espanhol, farto da inacção dos seus parceiros europeus e da duplicidade de se dizer que se quer taxar, ao mesmo tempo que se continua a adiar sucessivamente a sua aplicação, avançou unilateralmente com a imposição de uma ‘taxa Google’, ainda que correndo o risco de retaliação dos EUA. Eis, de forma muito simples, o governo espanhol a deixar claro que não alinha em compadrios de duplicidade.

Segundo caso. Em Portugal, o Governo diz aos parceiros sociais que os referenciais dos aumentos salariais devem ser na proximidade dos 3% e que os ganhos de produtividade devem ser equitativamente distribuídos entre accionistas e trabalhadores. O que aqui, nestas páginas, saudámos em tempo oportuno. O mesmo Governo que, por outro lado, quer fazer actualizações salariais de apenas 0,3% nos funcionários públicos, sinalizando, em sentido contrário, ao das suas propaladas intenções. Ou seja, o Governo diz algo e faz o seu contrário.

Terceiro caso, no mesmo sentido. Os bancos a operar em Portugal, com uma ou outra notável excepção, têm vindo a apresentar resultados, ainda não auditados, muito interessantes relativamente ao exercício de 2019. Nalguns casos, atingindo níveis e resultados sem precedentes. Vários deles têm anunciado, aliás, obra social e benemérita variada através de fundações, bem como têm vindo a patrocinar iniciativas como seja a plantação de hortas nas varandas dos seus edifícios, sessões de ioga para trabalhadores, entre outras.

Ou seja, ao mesmo tempo em que lucros excepcionais se aliam a tais iniciativas, em que divulgam o quanto de bem têm feito à economia portuguesa, alguns destes mesmos bancos fazem propostas de actualização das tabelas de expressão pecuniária (e também para os sistemas de assistência médica e social) de… 0,2%! Como se os seus próprios trabalhadores e reformados tivessem de ser sacrificados no altar da remuneração dos accionistas. O mesmo padrão de actuação: passar uma imagem, dizer algo, e fazer o seu contrário.

A relação de confiança, entretanto, vai-se degradando e as nossas perspectivas futuras degradam-se, claro está, sem que se preserve o bem comum e se promova a construção de uma sociedade mais justa. É isto que queremos?


21.02.2020 - Jornal Económico

No meio de quase um milhar de alterações ao Orçamento Geral do Estado, propostas por todos os partidos não governamentais, surpreendentemente constatamos que pouca atenção foi dada ao tema da poupança, mormente da poupança para a reforma e invalidez.

Naturalmente, tendo Portugal uma das mais baixas taxas de poupança da zona euro, a par com uma não renovação geracional, o tema ganha especial acuidade, quer pela dificuldade que poderemos vir a ter na reposição e no acréscimo de capacidade ao stock de capital, quer pela pressão que tal poderá criar sobre o nível de vida da população, assim que for atingida a idade de reforma ou de invalidez.

Muito se tem feito nos últimos anos em prol da sustentabilidade do sistema público de reformas. Infelizmente, parece ser consensual entre nós que novas formas de financiamento terão de ser encontradas (porventura, através do valor acrescentado criado por cada entidade empresarial?), e que o segundo e o terceiro pilares terão que vir a ser desenvolvidos e aprofundados.

Mais recentemente, a presidente da JSD trouxe o tema à baila, prometendo dedicar-lhe atenção redobrada. De facto, urge cada vez mais ter uma visão holística de solidariedade inter-geracional.

Sendo economista de formação, acredito que os incentivos monetários, ou afins, induzem alterações de comportamento. Assim, vai sendo com especial preocupação que vemos o paulatino alheamento que os nossos cidadãos relativamente a este tema. No caso específico dos bancários, cujo presente e futuro nos merece toda a atenção, uma vez que têm uma das mais baixas taxas de reposição de rendimentos na reforma, o assunto assume especial relevância.

Ora, estão em discussão parlamentar, por estes dias, várias propostas sobre o funcionamento dos fundos de pensões e das entidades gestoras de fundos de pensões, o que nos apraz registar. Contudo, vai sendo tempo de introduzir incentivos de ordem diversa para que as empresas e os trabalhadores reforcem os outros pilares, mesclando um regime redistributivo adequado a conter grandes riscos, com um regime de capitalização e de individualização de contributos ao longo da carreira contributiva.

Urge levar para discussão em sede de contratação colectiva, e para a concertação social, a forma como poderão ser constituídos e reforçados os segundos e terceiros pilares, bem como a grelha de incentivos a formular. Introduzir, nestes fóruns, a discussão e a decisão, visando a sustentabilidade do sistema de reformas, envolvendo no processo sindicatos e entidades empresariais, parece-nos ser o próximo passo. Caso contrário, defraudamos o modelo social português e a crença daqueles que acreditam numa sociedade mais justa.


14.02.2020 - Jornal Económico

Os últimos dias têm sido pródigos em acontecimentos que dizem respeito aos cidadãos e trabalhadores portugueses.

Por um lado, o senhor primeiro-ministro anunciou em sede de Concertação Social (sim, essa mesma, saída do rescaldo do pacto Partidos/MFA, que ignora os sindicatos independentes, a distribuição moderna, os sectores de tecnologias de informação, a fileira das obras públicas, entre outras) que uma melhor repartição dos rendimentos entre trabalho e capital é o seu objectivo e que os ganhos de produtividade devem ser repartidos entre os dois factores de produção de forma igual.

Por outro, semanas atrás, o senhor primeiro-ministro propôs um referencial superior a 3% para os aumentos salariais em sede de contratação colectiva.

O senhor primeiro-ministro sabe muito bem que Portugal, desde o início do milénio, se tornou muito mais desigual e que o capital (dividendos, rendas, juros, direitos vários, ‘royalties’, entre outros) se apropriou de mais de 80% dos ganhos de produtividade. E sabe também como nos estamos a aproximar de um padrão de distribuição de rendimentos pouco digno dos padrões europeus.

Entretanto, a Caixa Geral de Depósitos (CGD) anunciou os maiores lucros desde 2007, com um rácio de custos operativos sobre os rendimentos de 47%, o que a coloca no pelotão da frente dos bancos europeus, e uma distribuição de 300M€ ao Estado, acima, muito acima, do previsto no Orçamento Geral do Estado (237M€).

Sim, a mesma CGD que foi vítima de um grupo, não de verdadeiros gestores, mas de comissários políticos do pior quilate, que a assolou nos primeiros anos do milénio, e que tem imposto penas pesadas às populações que se viram privadas de balcões de proximidade.

A mesma CGD que, tendo denunciado de forma despropositada, no Verão de 2018, o Acordo de Empresa, firmado de livre vontade com os sindicatos bem 2016, procura agora impor aos seus trabalhadores e aos sindicatos bancários um novo Acordo de Empresa, cujo espírito, quero acreditar, vai ao arrepio da vontade do senhor primeiro-ministro.

O Acordo de Empresa que a CGD quer agora impor vem alterar, de forma dramática, conceitos como prémio de antiguidade, anuidades e diuturnidades, entre outros. Deixando no ‘bolso’ da empresa mais de uma dezena de milhões de euros (a valores actualizados) que eram, e são, dos trabalhadores, face às propostas que apresentámos.

O mesmo Governo que afirma querer uma repartição mais equilibrada dos ganhos de produtividade, o que tem a dizer sobre isto?

Faz sentido tirar aos trabalhadores (e aos clientes) para remunerar, acima das suas próprias expectativas, o capital, ainda que o accionista seja o Estado?

Vale tudo na Caixa Geral de Depósitos? Vale fazer o contrário daquilo que foi propalado em Concertação Social? Vale denunciar, sem qualquer fundamentação económica razoável, um Acordo de Empresa, apenas e apenas só para tornar mais baratos os trabalhadores?


07.02.2020 - Jornal Económico

O actual Governo continua a sua reforma dos cuidados de saúde primários, dando prioridade, para esse efeito, ao alargamento da rede de Unidades de Saúde Familiar (USF). Esta abordagem, claramente inspirada no sistema inglês, foi introduzida em Portugal em 2006 pelo ministro da Saúde, António Correia de Campos. Desde então, com maior ou menor ímpeto, as USF mantiveram-se como um dos pilares da estratégia de cuidados de saúde primários dos governos posteriores.

 

Comparativamente aos centros de saúde, as USF introduziram um modelo de gestão e atendimento diferente e o seu objectivo passava, e ainda passa, por resolver, de forma gradual, o problema da falta de médicos de família em Portugal.

 

No panorama nacional, as USF foram uma pequena revolução, ao contribuir em parte para a reestruturação e a reconfiguração dos cuidados de saúde primários. As USF de modelo B, em particular, introduziram um nível de contratualização com patamares de desempenho mais exigente. Na prática, com maior autonomia de gestão, médicos, enfermeiros, administrativos e outros profissionais das USF de modelo B, atendem mais doentes e por isso têm o correspondente incentivo financeiro.

 

Maior eficácia e eficiência, profissionais mais motivados e mais portugueses com médico de família. Eis o resultado prático de um modelo vencedor e que, simultaneamente, liberta os hospitais do Serviço Nacional de Saúde (SNS) das falsas urgências.

 

Como é amplamente reconhecido, apesar das queixas, os cuidados de saúde primários em Portugal estão entre os melhores a nível mundial e as USF, como salienta, por exemplo, Rui Nogueira, presidente da Associação Portuguesa de Medicina Geral e Familiar, “vieram melhorar os cuidados de saúde primários”. As provas, refira-se, confirmam-no.

 

Mais do que desmontar fatia a fatia o SNS, como alguns desejariam, importa inovar nos modelos de organização, combater o desperdício e a ineficiência, e redesenhar processos de gestão. As USF foram na sua origem e são ainda hoje um passo nesse sentido, com evidentes ganhos para os portugueses. Maior autonomia e mais incentivos financeiros, tendo como contrapartida uma maior produtividade, sem que isso coloque em causa a qualidade dos cuidados de saúde primários.

 

Ter médico de família é fundamental para todos os portugueses, mesmo para aqueles que têm seguros ou subsistemas de saúde. Como já referi em artigo anterior, o SNS foi uma conquista civilizacional de que muito nos devemos orgulhar. As USF são apenas uma das diversas faces desse esforço e dessa conquista.

 

Por isso, é com enorme satisfação que, ciclicamente, vou lendo as notícias sobre o alargamento da rede de USF e sobre o esforço que os sucessivos governos vão fazendo no sentido de reforçar o investimento que lhe está subjacente. A aposta no SNS é um imperativo de saúde, mas também moral. O nosso SNS, de todos, incluindo daqueles que beneficiam complementarmente de subsistemas de saúde.


31.01.2020 - Jornal Económico

Conquanto os últimos dados oficiais digam respeito ao primeiro trimestre de 2018, tudo aponta para que seja em 2020 que, pela primeira vez, os medicamentos genéricos ultrapassem, em Portugal, a fasquia dos 50% de quota de mercado.

Face ao seu sucesso inegável, tendo passado em 20 anos apenas de pouco mais de 0% de quota para os 50 pontos percentuais que estimamos virem a ocorrer durante este ano, convém que não percamos o essencial do que está em causa e do caminho que ainda teremos de trilhar.

Mas sempre tendo em mente que o medicamento genérico é aquele que “tem a mesma substância activa, forma farmacêutica e dosagem e com a mesma indicação terapêutica que o medicamento original de marca, que serviu de referência” (Infarmed). Ou seja, os genéricos e os medicamentos de marca têm uma equivalência terapêutica, pelo que o aumento progressivo da penetração de medicamentos genéricos permite, e permitirá, ao SNS e aos subsistemas de saúde poderem dedicar recursos a novas patologias que vão surgindo, ao mesmo tempo que asseguram a sustentabilidade.

Os medicamentos genéricos, são, grosso modo, medicamentos cujas patentes foram caducando. Se um medicamento novo demora e custa a desenvolver (invenção, desenvolvimento, testes e aprovação), valores na casa das centenas ou milhares de milhões de euros, em contraposição, os medicamentos genéricos têm essencialmente o custo de produção e de distribuição. Tendo que passar pelo mesmo crivo e processo de análise e eventual aprovação por parte das Autoridade Nacional do Medicamento. Mas esses menores custos, e uma concorrência mais alargada, ditam preços de comercialização mais baixos.

O mesmo processo de escrutínio por parte das autoridades implica um mesmo nível de segurança para os utentes.

Não é relevante se as caixas são diferentes, se as cores, a forma ou mesmo o sabor dos medicamentos genéricos e de marca se diferenciam. Nada disto implica com a qualidade, segurança e a eficácia terapêutica. Assim, cai por terra um dos mitos mais enraizados de que os genéricos não teriam a mesma eficácia nem seriam tão seguros. Mitos. Os diversos estudos empíricos confirmam que quanto maior o nível de desenvolvimento económico e social de um país, maior a penetração dos medicamentos genéricos face aos medicamentos de marca. E Portugal ainda tem um caminho a percorrer até que os genéricos tenham uma quota de mercado de 65% a 70%, ombreando com os melhores.

No mesmo sentido, importa tornar ainda mais alinhadas as medidas do lado da procura, com o intuito de incentivar a prescrição, a dispensação e a utilização de maior proporção de medicamentos genéricos. Compete ao Estado incentivar os diversos intervenientes, de forma condigna, para que o desiderato seja atingido. Remunerando melhor a dispensação, majorando as comparticipações, entre outras medidas. Porque um serviço público relevante não pode ser feito às custas de apenas alguns, em benefício de outros, tal como aqui temos vindo a dar nota. Compete também ao Estado criar os incentivos para que em ambiente hospitalar os genéricos e afins façam o seu caminho, regulando e incentivando comportamentos.

Tem a palavra, por tudo isto, a senhora ministra da Saúde. E relembro, já agora, que o anterior governo tinha como meta atingir uma quota de mercado de 60 pp no final da legislatura anterior.


24.01.2020 - Jornal Económico

Gostaria de partilhar convosco três episódios recentes para ilustrar os meus receios de que se esteja a transformar a saúde numa mercadoria e num negócio.

Primeiro: uma dor de dentes e uma visita ao médico dentista. Uma mera inflamação para a qual o dentista receita Ibuprofeno. Na farmácia, o funcionário foi buscar o medicamento genérico. Quando o cliente vai pagar, o empregado repara que beneficia de um subsistema que paga os medicamentos na parte que excede a comparticipação do Serviço Nacional de Saúde (SNS). De imediato lhe tenta substituir o genérico por outro de marca que custa quatro vezes mais. O cliente reclama. O funcionário diz-lhe que nada irá sentir no bolso, dado que o seu subsistema fará a comparticipação na íntegra. O cliente resiste à substituição, uma vez que os genéricos têm a mesma eficácia que os medicamentos de marca, todos são aprovados pelo Infarmed e contêm os mesmos princípios activos. Simples e linear. Naturalmente, uma margem bruta de 20 pontos percentuais sobre um preço de venda maior produz mais proveitos para quem vende a retalho o medicamento. O cliente a querer preservar a sustentabilidade do seu subsistema de saúde e o vendedor a tentar vender pelo preço mais alto. Interesses contraditórios, provavelmente.

Segundo episódio: uma urgência pediátrica num moderno e grande hospital privado de Lisboa, num fim-de-semana, às 19 horas. Primeira dificuldade: o médico não se encontrava presente. Estava de chamada. Em gíria, tal queria dizer que haveria um sobrecusto, para o cliente, pelo simples facto de ser necessário chamar o médico.

Terceiro caso: um ortopedista conversa com o seu paciente sobre a necessidade de fazer uma cirurgia. Nesse hospital, a cirurgia custaria ao cliente e ao seu subsistema mais de cinco mil euros. Num outro hospital privado, com menos glamour, a cirurgia custaria menos de metade. A mesma equipa médica e os mesmos honorários médicos. A diferença? O custo de piso de sala, os medicamentos em meio hospitalar, onde a administração de um simples analgésico pode custar mais que uma caixa inteira adquirida numa farmácia, e o preço de alojamento. Um hospital cobrando valores razoáveis. O outro cobrando mais que uma estadia no famoso Burj Al Arab.

Resumindo: um caso em que se tenta vender algo que custa quatro vezes mais; outro em que se pretende cobrar por serviços inexistentes; um terceiro em que se procura cobrar muito mais do que a decência deveria permitir.

Tudo isto ocorre numa altura em que estão em curso poderosos ataques, de interesses por certo bem instalados, contra o SNS.

O SNS que nas últimas décadas garantiu o prolongamento da esperança de vida dos portugueses, ou níveis de mortalidade infantil dos mais baixos do mundo, tem, seguramente, muitos problemas. A permeabilidade às ideologias e a ausência de ferramentas de gestão de carreiras e de autonomia de gestão, a par de um crónico subfinanciamento, são alguns deles. Mas um SNS forte e bem gerido é condição essencial para regular o mercado e disciplinar aqueles para quem a saúde é apenas um negócio.

Compete aos utilizadores, aos doentes, que recorrem preferencialmente ao sector privado, fazer uso criterioso dos recursos postos à sua disposição, usar medicamentos genéricos, reclamar em caso de facturação de serviços não prestados, ou procurar alternativas mais equilibradas na relação entre custo e qualidade. Estas são condições essenciais para se procurar evitar que a saúde seja um negócio obsceno, que se aproveita da desgraça e do desconhecimento dos seus clientes. Um Estado que regula e pune o lançamento de pontas de cigarros para o chão, infelizmente anda tão ausente na regulação das matérias de saúde.


17.01.2020 - Jornal Económico

Nunca é demais relembrar ao que o frenesim da dívida, aparentemente sem limites, nos levou: hipotecas subprime, falências em série e contracção das economias. No caso português, uma espiral de endividamento estatal e privado, com uma violenta retracção do volume de negócios, resultados e emprego na fileira da construção e dos serviços financeiros.

A vertigem destes anos conduziu-nos a balanços dos bancos assentes no crédito a empresas em sectores não expostos a concorrência internacional e de bens não transaccionáveis. Quando o ciclo económico se alterou, e os investidores internacionais se recusaram a comprar dívida pública ou privada oriunda dos PIGS, o nosso mundo desabou.

Infelizmente, o financiamento da troika não acudiu, se não apenas de uma forma muito mitigada, para sanear os balanços dos bancos portugueses, ao contrário do que sucedeu em Espanha. Aos bancos portugueses foi imposta uma cura de emagrecimento: menos balcões, menos bancários e menos carteira de crédito. Tudo a ser feito rapidamente.

Aconteceu o que sabemos: vilas e aldeias portuguesas sem agências ou bancários, vendas com enorme desconto das carteiras de crédito com imparidades, vendas essas feitas com enormes prejuízos para os bancos, os trabalhadores bancários, os accionistas privados e os contribuintes. Vendas feitas à pressa, sempre debaixo da pressão do Banco de Portugal, a obrigar a uma desalavancagem rápida e com dor. O que se fez foi vender ao desbarato, para benefício de investidores predadores, sejam eles fundos norte-americanos, chineses, angolanos ou detidos indirectamente pelos mesmos sujeitos que levaram Portugal à falência.

Comum a tudo isto: uma enorme transferência de riqueza. Perderam os bancários, os clientes detentores de obrigações seniores no BES e no BANIF e perderam também os pequenos accionistas dos bancos.

Porém, poderia não ter sido assim. Teria sido suficiente que o Estado português tivesse exercido um direito de opção sobre a alienação destas carteiras com imparidades, vendidas em desconto em mercado aberto. Comprava estas carteiras, colocava-as nos veículos especializados que detém: Oitante e Parvalorem. Veículos estes que possuem quadros qualificados e experientes, que nos últimos anos têm feito notáveis recuperações do que era a massa de créditos com imparidades dos antigos BPN e do BANIF, e que EuroBic e Santander Totta não quiseram. E colocaria estes activos, paulatinamente, no mercado, sem pressão, e com enormes mais-valias para os contribuintes e para o Fundo de Resolução.

Afinal, não seria mais do que aquilo que fizeram, entre tantos outros, um fundo abutre com uma obscena mais-valia através da aquisição e recente alienação duma centenária seguradora, não sem antes a ter desnatado do património imobiliário mais relevante.

Por isso, confesso a minha estupefacção e indignação com aquilo que se prepara para a Oitante e a Parvalorem: ao invés de capitalizar o seu know-how e os bons resultados que estão a obter, ali parqueando mais imóveis e mais trabalho, está em marcha acelerada um plano de redução de actividade e de emprego. Com planos de encerramento das duas instituições quase que sendo antevistos por um observador atento. Como se o mesmo Governo socialista, que saneou a banca, quisesse agora continuar a alimentar as mais-valias dos especuladores internacionais e o desemprego dos bancários destas duas instituições. Centeno e Mourinho, quo vadis?


10.01.2020 - Jornal Económico

Como cidadão e contribuinte não posso deixar de me sentir satisfeito com o recente anúncio pelo secretário de Estado da Saúde, António Sales, e pela directora-geral da Saúde, Graça Freitas, de que as vacinas contra a meningite B, o vírus do papiloma humano (HPV) para rapazes e ainda contra o rotavírus (o principal causador das gastroenterites nas crianças), serão integradas no Plano Nacional de Vacinação (PNV), e com isso passarão a ter plena comparticipação estatal.

 

Infelizmente, o anúncio só peca por tardio. Em 2018, uma maioria de deputados à Assembleia da República, confrontada com a inacção dos poderes públicos na área da saúde, já tinha aprovado a inclusão destas três vacinas no PNV.

 

Isto dito, repito, é com evidente satisfação que reajo ao anúncio da sua inclusão. Nas minhas funções profissionais de gestor de um subsistema de saúde complementar ao Serviço Nacional de Saúde (SNS), o SAMS Quadros, fiz um trabalho incessante para que estas vacinas fossem incluídas no PNV. Um trabalho de sensibilização junto de diversos fóruns e de comparticipação das despesas que os nossos beneficiários tinham com as vacinas contra a meningite B e o rotavírus. Um trabalho tanto mais razoável porque existem vacinas no mercado com uma boa relação qualidade-preço. Um trabalho de exemplo: no SAMS Quadros colocámos “o nosso dinheiro onde está a nossa boca” e desde há muito que apoiamos a vacinação supracitada.

 

Destas três novas vacinas a incluir no PNV, destaque-se em particular a inclusão da vacina contra o papiloma humano nos rapazes a partir dos dez anos de idade. Mas caso não iniciem a vacinação nesta idade, que é a recomendável, ainda assim os nossos rapazes poderão beneficiar da vacina gratuita se iniciarem a toma (em duas ou três doses, consoante a idade) até aos 18 anos. Estima-se que 40 mil rapazes possam vir a ser vacinados todos os anos, com isto complementando o círculo de imunidade contra o cancro do útero. O PNV ainda em vigor, ao incidir apenas sobre as raparigas, deixava-as expostas, o que agora se evita em definitivo.

 

Atente-se que só o Estado possui a economia de escala para poder negociar com os produtores de vacinas de alta complexidade, e morosos custos de investigação e desenvolvimento, com isso fazendo baixar o custo para a sociedade como um todo. Numa falha evidente de mercado, compete ao Estado intervir para ajudar a corrigi-la e assim introduzir externalidades positivas de que todos beneficiarão.

 

Aliás, agora que está na ‘moda’ criticar sistematicamente o SNS, vale sempre a pena enfatizar o extraordinário trabalho feito no tocante à vacinação, onde comparamos com os melhores países do mundo. Também, por aqui, se vai ganhando a guerra contra a mortalidade infantil e pelo prolongamento da esperança de vida.

 

Ao grupo de deputados, verdadeiros representantes do povo, que em finais de 2018, aquando da discussão orçamental para 2019, tiveram a coragem de não se conformarem nem com inacções nem com cativações e avançaram com a inclusão destas vacinas no PNV, aqui fica um agradecimento público oriundo dos representados. Sem o vosso precioso contributo o PNV seria menos abrangente e inclusivo.

 

03.01.2020 - Jornal Económico

Os leitores que acompanham esta coluna podem, semana após semana, juntar-se a nós na discussão de um modelo de sociedade onde o equilíbrio é a nota dominante. Um espaço de alguém que não acredita que abordagens radicais sejam susceptíveis de aumentar o valor e o bem-estar da comunidade. Alguém que acredita em abordagens incrementais e testadas previamente. Um observador para quem o estudo da história recente deixou fundadas dúvidas sobre a validade e o interesse de engenharias sociais. Alguém que se lembra bem que as grandes tragédias se ficaram a dever a homens ‘iluminados’ a quem ninguém, ou quase ninguém, se opôs em tempo oportuno.

Os portugueses sabem como uma combinação explosiva de banqueiros imprudentes (os tribunais julgarão se também criminosos), reguladores impreparados e uma sociedade embalada pelo crédito, fomentou o caldo onde floresceu uma série de problemas graves nos sectores bancário e financeiro. E sabem também que Portugal foi a cobaia onde os reguladores europeus impuseram um modelo de resolução bancária que não mais foi aplicado em lado algum. Fomos uma espécie de atol na Polinésia onde os bancários, os bancos e os contribuintes portugueses foram alvo da bomba de destruição massiva do BCE e o Single Resolution Board.


Uma década depois, bancos houve que faliram, outros que foram desmembrados, ocorreram mudanças estruturais nos centros de domínio accionista, restrições fortíssimas de crédito, em suma, eis todo um novo panorama. Com tudo isto sofreram os trabalhadores bancários e os trabalhadores das empresas que se viram sem acesso ao crédito, muitos deles ficando desempregados no decorrer deste processo. Tudo perderam os accionistas, sem acesso a informação privilegiada, que não puderam antecipar a tempestade que se avizinhava.


Esta profunda reconfiguração do sector bancário, com a retracção de crédito que se seguiu e a imensa destruição de emprego, foram o traço mais saliente dos anos de intervenção da troika (FMI, BCE e Comissão Europeia).


À luz de tudo isto, não deixa de ser preocupante que alguns órgãos de comunicação social e comentadores, sem experiência de gestão bancária ou qualquer outra relevante neste contexto, opinem de forma irresponsável sobre o futuro do Novo Banco. Uma atitude tanto mais paradoxal quanto o banco está a cumprir com o plano que acordou com Bruxelas, e tem vindo a cumprir com eficiência e eficácia com a sua missão de captar poupança e financiar as famílias e as empresas portuguesas.


Uns querendo que se use, quanto antes, com eventual desconto, a totalidade dos fundos previstos no mecanismo de capital contingente para permitir a sua venda; outros, sem qualquer autoridade, perorando sobre uma eventual partição do Novo Banco entre os seus concorrentes.


Naturalmente, percebemos que os perdedores do negócio da venda do Novo Banco estejam, novamente, a querer virar o jogo a seu favor. E percebemos também que uns tantos comentadores não sabem do que estão a falar. Outros, porventura, serão porta-vozes de inconfessáveis interesses. Uma coisa é certa: temos a certeza que tentar desmembrar um banco viável é um crime de lesa-pátria e um ataque aos trabalhadores bancários e aos contribuintes.


Portugal e os portugueses precisam de mais crédito e mais concorrência no sector bancário e não do contrário. Elementar caro Watson! A quem aproveita esta conversa requentada de desmembrar e dividir entre os concorrentes?

 

27.12.2019 - Jornal Económico

O primeiro-ministro António Costa apresentou esta semana a sua proposta de Orçamento do Estado para 2020. Um documento que, como não poderia deixar de ser, se tornou alvo de toda a atenção política e mediática nos últimos dias.

Naturalmente, temos estado a ler o documento com toda a atenção e, como tem sido o nosso hábito nos últimos anos no Sindicato Nacional dos Quadros e Técnicos Bancários (SNQTB), em momento oportuno faremos chegar as nossas propostas a todos os partidos políticos com representação parlamentar.


Naturalmente, a sociedade civil e as instituições que dela emergem podem e devem dar o seu contributo para um dos debates mais importantes da nossa vida colectiva. Da nossa parte, não fugiremos à nossa responsabilidade e as nossas sugestões serão muito concretas e muito práticas. Como sempre tem acontecido, o nosso contributo terá o intuito de promover e proteger os interesses dos trabalhadores. Alterando, por exemplo, alguns aspectos das leis que regulam o trabalho, que continuam ainda distorcidas, fruto das alterações impostas pela troika entre 2011 e 2014. Contributos que visam igualmente proteger e defender a muito sacrificada classe média. Sejamos muito claros. Sem uma classe média sólida e pujante não há democracia liberal que resista.


Propostas que terão um pendor reformista, como sempre. Não se trata de um chavão. As pessoas devem estar primeiro, e connosco estão, de facto, na primeira linha das nossas reivindicações. Durante a vigência da troika, o equilíbrio na distribuição dos rendimentos entre o capital e o trabalho sofreu um desequilíbrio a favor do primeiro que ainda hoje permanece por corrigir.


Apresentaremos igualmente um conjunto de propostas que, substantivamente, visam reforçar a aposta no Serviço Nacional de Saúde (SNS). O impacto e a dimensão estratégica do SNS não se esgotam na questão imediata e directa da saúde. O SNS é um instrumento indirecto de redistribuição do rendimento e um mecanismo que contribui para a promoção da igualdade de oportunidades entre os portugueses.


Os números, por natureza, são terrivelmente frios. Porém, um Orçamento do Estado é muito mais do que a vastidão dos números que agrega. Trata-se do documento mais importante de um governo na sua definição de prioridades e na acção de redistribuição da riqueza. No fundo, é o porta-aviões da sua estratégia e o instrumento que veicula a sua identidade.


Daí a razão de ser do título deste meu artigo. Mais do que um ponto de chegada, o Orçamento do Estado é um ponto de partida. Por isso mesmo, a acção legislativa está longe de se esgotar nas Finanças. E é precisamente por essa razão que não deixaremos de dar o nosso contributo cívico e institucional. Em nome dos trabalhadores e dos bancários em particular.

 

20.12.2019 - Jornal Económico

Faz agora 26 anos que o Comité dos Assuntos Sociais, Emprego e Condições de Trabalho, sob a égide do Comissário Gil-Robles, aprovou uma resolução onde reconhecia que os Quadros tinham um enquadramento e responsabilidades especiais no contexto do mundo laboral. Contudo, tantos anos passados, importa actualizar o conteúdo de tal resolução, que impacta em cerca de 10% dos trabalhadores por conta de outrem na União Europeia.

Compete aos Quadros fazer a ponte, no local de trabalho, entre os diversos lados com interesses antagónicos, no sentido de assegurar que as estruturas económicas se aguentam e se adaptam às forças centrífugas que recaem sobre o nosso mundo laboral. Com a emergência das economias 4.0 e a polarização do mercado de trabalho que estas provocam, mais especialização e liderança efectiva está a ser pedida aos Quadros e Técnicos. É a nossa missão e dever. Que cumprimos na Europa.

Por estas especiais responsabilidades, os Quadros Europeus (CEC EuroManagers) pretendem aprofundar vários temas cruciais: a mobilidade dos trabalhadores no espaço europeu (o que se traduz na portabilidade de pensões entre Estados-membros, reconhecimento de diplomas e competências e protecção social); questões éticas relacionadas com a interacção entre humanos e máquinas; ênfase na educação e na formação contínuas (o que implicará políticas públicas de ‘re-treino’ e upskilling, e não apenas de escolaridade obrigatória); equilíbrio entre vida profissional e vida familiar; reconhecimento das doenças psico-profissionais com a mesma dignidade que os acidentes de trabalho e as doenças de foro físico; e, ainda, o necessário reforço da igualdade de género e de um local de trabalho mais inclusivo.

Voltarei, nos próximos meses, a cada um destes temas, em maior detalhe. Mas percebe-se, desde já, a importância de acautelar o futuro, assegurando que os nossos Quadros e Técnicos têm condições de empregabilidade, mobilidade e efectividade, sem as quais o futuro de Portugal será menos risonho.

Finalmente, nada disto poderá ser alcançado sem que os Quadros participem no diálogo e na Concertação Social, na base da sua representatividade. Uma realidade em toda a Europa. Toda, não! Algumas ‘democracias’ da Europa Central e Oriental e… Portugal continental(!) resistem à integração dos Quadros na Concertação Social e no Comité Económico e Social. Um absurdo pela limitação e empobrecimento do diálogo social que esta não participação causa. Inconstitucional, por violar princípios de igualdade e proporcionalidade, como inúmeros pareceres atestam. Só em Portugal continental e em democracias ‘avançadas’ o Estado designa quem deve representar os trabalhadores, em geral, e os Quadros, em particular. Bizarra companhia, diga-se de passagem. Segue, dentro de momentos, uma queixa contra o Estado português para o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem.

06.12.2019 - Jornal Económico

Começou a temporada de preparação e apresentação de propostas para o Orçamento Geral do Estado. Ainda que seja aos partido políticos, com representação parlamentar, que esteja atribuído o monopólio de apresentação de propostas em plenário e em sede de comissão especializada, em todo o caso os cidadãos e os órgãos intermédios da sociedade, como os sindicatos e as centrais sindicais, têm a responsabilidade de preparar propostas que façam avançar Portugal rumo a uma sociedade mais justa, com maior igualdade de oportunidades e dignidade do trabalho, e melhores serviços públicos.

No SNQTB e na União dos Sindicatos Independentes (USI) fazemo-lo, reiteradamente, de há quatro anos a esta parte, porque acreditamos que não são apenas os partidos políticos e as centrais patronais que são parte interessada nesta discussão. Naquilo que nos diz respeito, não nos demitimos em circunstância alguma das nossas responsabilidades cívicas.

As nossas propostas vão ser de combate! Um combate por mais justiça social e mais eficiência. As nossas propostas terão como fio condutor a intenção de elevar os salários médios, verdadeiro barómetro do estado da classe média. E, para que isto aconteça, nada melhor do que rever a legislação laboral para facilitar as portarias de extensão das convenções colectivas e dificultar, exigindo fundamentação, a denúncia dessas mesmas convenções. Afinal, isto é o que se faz em tantos países ditos sociais-democratas do centro e norte da Europa. Simples. Eficaz.

Os portugueses podem igualmente contar connosco para pedirmos um reforço das verbas para os cuidados de saúde primários no Serviço Nacional de Saúde (SNS), nomeadamente para o alargamento e cobertura nacional dos médicos de família e das Unidades de Saúde Familiar (USF). As USF, importa salientar, são um excelente exemplo de como gestão pública, com incentivos adequados de tipo ‘privado’, funciona bem. Mas os portugueses podem igualmente contar connosco para defender que os gestores do SNS tenham maior autonomia de gestão. Esta é a forma mais eficaz de contrariar e afastar as discussões ideológicas estéreis da área da saúde.

Isto dito, os portugueses podem contar connosco para outras propostas. Naturalmente, a dignificação da vida após a reforma merece uma visão estratégica. Por isso, importa ter benefícios fiscais para planos de benefício ou contribuição definida, estabelecidos por contratação colectiva. Esta é uma das formas mais eficazes e eficientes para fazer aumentar a taxa de poupança e mitigar o drama das parcas reformas de várias profissões com regimes especiais.

Por último, os portugueses podem ainda contar connosco para defender que todas as políticas públicas, com impacto plurianual na despesa pública, devem ser sujeitas ao crivo de uma rigorosa análise de custo-benefício. Só assim conseguiremos combater os demagogos e os profetas que prometem soluções ilusórias.

29.11.2019 - Jornal Económico

Que me perdoe o leitor a ousadia, mas gostaria de partilhar consigo um conjunto de pontos de vista sobre o Serviço Nacional de Saúde (SNS). Ousadia, porque do SNS apenas usufruo enquanto cidadão, nunca tendo nele tido qualquer relação profissional.

 

Sei que um Sistema de Acesso Universal, prestado pelo Estado, ou em regime de concessão do Estado, é uma marca do modelo social-democrata/democrata cristão em que assentou a construção europeia do pós-II Guerra Mundial.

 

Sei, igualmente, que o SNS português conseguiu, no espaço de uma geração, feitos impensáveis quando eu era criança: uma rede de cuidados primários de proximidade das melhores do mundo; uma taxa de mortalidade infantil das mais baixas, ombreando com os países nórdicos (e deixando a anos luz superpotências económicas); uma cobertura de vacinação quase a 100%, entre tanto, mas tanto, que haveria a dizer.

 

Contudo, ouvindo e lendo a opinião publicada fico preocupado. Primeiro, porque a ideologia quer entrar em força na gestão do SNS, o que é errado. Segundo, porque conquanto exista espaço para muito melhorar, a opinião publicada tende a remeter-nos para o patamar subdesenvolvido, o que é profundamente desfasado da realidade.

 

O SNS é um dos pilares da sociedade portuguesa. Não pode ser campo fértil para as ideologias fazerem o seu caminho. O SNS precisa de mais dinheiro, pois está sub-financiado. E precisa de mais autonomia de gestão, para poder contratar profissionais, remunerá-los e dar-lhes uma carreira. Precisa de gestores hospitalares com capacidade de ombrear, com as mesmas ferramentas, com o sector privado. E necessita de reforçar a sua universalidade, produzindo internamente ou contratualizando quem faz melhor.

 

Precisamos de mais dinheiro e mais autonomia de gestão, mas também de parcerias, para que o SNS dê resposta às listas de espera para uma consulta de especialidade ou para uma cirurgia. Precisamos que, na sequência da consulta, o cidadão possa ter acesso a meios complementares de diagnóstico e terapêutica. Precisamos de um SNS mais robusto para atender, em produção própria ou contratualizada, às solicitações crescentes em cuidados continuados e paliativos. Precisamos de um SNS na liderança absoluta do combate às doenças oncológicas, crónicas e degenerativas.

 

Este é o papel do Estado. Não o de tudo fazer, mas o de garantir as condições, de financiamento e de regulação, para que ninguém deixe de ser tratado. Precisamos de um SNS melhor e mais aprofundado. Mas também de um SNS eficiente que, sem ideologia, experimente modelos de gestão que estão comprovados.

 

22.11.2019 - Jornal Económico

Numa intervenção política recente, o primeiro-ministro, António Costa, traçou as metas do Governo relativamente ao salário mínimo nacional (SMN). Assim, em 2020, o SMN deve dar início a um processo de subida gradual que até 2023 o colocará nos 750 euros.

Até aqui nada de novo. Se há matéria, no quadro geral das políticas relativas aos rendimentos do trabalho e em sede de concertação social, que tem tido atenção política e mediática é o SMN. A novidade, porém, esteve no facto de o primeiro-ministro dar foco especial a uma política geral de rendimento que não ignore a degradação do salário médio.

Actualmente, o rendimento médio em Portugal ainda está abaixo do valor anterior à crise financeira que levou ao pedido de ajuda externa em 2011. Ora, esta aproximação entre o SMN e o salário médio é preocupante a vários níveis. Em primeiro lugar, a nível pessoal, porque significa que os níveis de rendimento dos portugueses se degradaram, num processo cuja recuperação persiste em não ocorrer, apesar de a crise financeira estar ultrapassada.

Em segundo lugar, esta tendência indicia que o capital se apropriou de uma parte dos rendimentos do trabalho e que deles não quer abdicar, colocando por essa via em causa os equilíbrios sociais. E em terceiro lugar, a persistência desta tendência é muito preocupante pela fragilidade política e institucional que introduz. Não conheço nenhuma democracia liberal que seja estável e sustentável sem uma classe média alargada e pujante. Aliás, como a História europeia (e não só) repetidamente confirma e exemplifica.

Saúdo, naturalmente, a preocupação do Governo com o esmagamento do salário médio. É um tema que nos é caro no sector bancário e com o qual nos temos vindo a confrontar nos últimos anos. Aliás, em linha com a posição do Governo, vamos continuar a insistir nele em sede de contratação colectiva.

Sejamos muito claros. O processo de empobrecimento dos bancários, cujo ciclo começou agora a inverter-se ligeiramente, tem de continuar nos próximos anos. Não há qualquer razão, em contra-ciclo com a recuperação dos bancos (ainda esta semana foi notícia que este ano a margem financeira está a crescer), da economia em geral e em oposição às linhas gerais que o próprio Governo definiu, para que as instituições de crédito insistam em políticas de remuneração cujo resultado prático consiste no esmagamento do salário médio praticado no sector e no empobrecimento dos bancários.

Desiludam-se, portanto, aqueles que pensam que os sindicatos do sector não estão preparados para a luta sindical em defesa dos seus interesses, mas também em nome do bem comum. Afinal, este não é apenas um problema que é nosso. É de todos e do próprio sistema democrático.

15.11.2019 - Jornal Económico

Enquanto sociedade com um nível de desenvolvimento médio-alto temos enraizada, entre nós, a crença de que o trabalho, o estudo, o cumprimento zeloso dos nossos deveres profissionais, é uma condição muito importante para o desenvolvimento das nossas carreiras, para o crescimento das instituições onde trabalhamos e para o bem-estar geral da comunidade e sociedade onde nos inserimos.

Sem cair na idolatria do mérito – ignorando o ambiente, a estrutura social, a sorte, entre outras variáveis – que tende a produzir as sociedades mais desiguais, acreditamos que a ascensão social, pela via profissional, deve resultar da competência, do saber, do esforço e da seriedade que cada trabalhador coloca naquilo que faz. E queremos que cada vez mais seja assim. Que não seja o berço, o compadrio político, a pertença a organizações discretas, ou os laços familiares, a determinar o sucesso ou insucesso de cada um.

Uma sociedade que se quer justa e equilibrada, onde temos gosto de viver, é feita de valores que procuram, na medida do possível e em liberdade, proporcionar igualdade de oportunidades.

Durante grande parte da minha vida profissional, tive o privilégio de ter como chefes e superiores hierárquicos aqueles que eram os melhores, os mais experientes, fruto de uma seleção natural, onde uma variedade de factores contaram, mas onde saber mais, fazer mais e liderar pelo exemplo foram o mote. Eram tempos em que os bancos serviam a economia nacional de forma eficaz, cumprindo o seu papel de multiplicadores monetários, propiciando crédito às empresas, verdadeiras criadoras de emprego e riqueza.

Depois, na viragem do milénio, com a complacência de um regulador impreparado, displicente e desprevenido, surgiu uma nova geração de dirigentes superiores da banca: berço, compadrio político, organizações secretas e discretas, tudo em conjunto, produziram uma sub-casta de gente sem preparação técnica, sem nenhuma lealdade ou sentimento de pertença para com os colaboradores ou os clientes. Que num misto de impreparação e ganância quase destruíram a honorabilidade e o prestígio da profissão e da actividade bancárias.

Aprendemos ou relembrámos todos, amiúde com o suporte dos contribuintes, que um banco é uma empresa estratégica na economia. Tanto ou mais que as infraestruturas de saúde, aeroportuárias, comunicações ou outras.

Por isso, pelo seu efeito multiplicador positivo na economia, ou pela socialização de perdas, esperamos todos mais rigor no recrutamento e seleção dos altos dirigentes bancários. Queremos pessoas de ética irrepreensível. Com carreira feita na banca, desde os escalões técnicos, passando por cargos de direção, antes de serem alcandorados a membros dos conselhos de administração. Que percebam do negócio bancário acima de tudo. As competências técnicas e funcionais, ganhas noutros locais, são importantes, mas nunca poderão ser decisivas na hora da escolha.

É intolerável, e perigoso para a sociedade, que os amadores possam dirigir empresas de natureza tão sistémica. Jamais toleraríamos que um amador brincasse às cirurgias ou pilotasse um avião comercial. Os respectivos reguladores seguramente não o permitiriam. Por isso, tem a palavra o Banco de Portugal. Uma administração bancária não pode ser lugar de refúgio, para pagar favores, ou para uma reciclagem de carreira. Não pode.

08.11.2019 - Jornal Económico

Uma vez mais, um governo manifesta a vontade de aumentar o número de escalões de IRS e de englobar todos os rendimentos que beneficiam de taxas liberatórias, de modo a que tenham um tratamento fiscal similar aos rendimentos de trabalho. Naturalmente, percebemos que uma maior justiça tributária é sinal de justiça social. Sabemos, também, que nenhum Estado de direito pode funcionar ou assegurar as funções básicas de soberania e promoção de igualdade de oportunidades – não confundir, já agora, com igualdade de resultados – sem uma base confortável de receita fiscal.

Isto dito, fazemos votos que a intenção de aumentar o número de escalões do IRS seja uma forma de desagravar os rendimentos do trabalho e não um pretexto para tratar como ricos os rendimentos e as pessoas que, em Espanha ou na quase totalidade dos países da União Europeia, seriam considerados apenas remediados.

Todos nos lembramos do enorme aumento de impostos que a falência da República Portuguesa nos impôs. Todos estamos ainda recordados do modo como foram sendo reduzidas as deduções com as despesas de saúde, os planos poupança reforma, as despesas de educação, as deduções consoante o número de filhos, entre outras. Obviamente, olhando para o passado recente e para a atitude de sucessivos governos, todos estamos legitimamente escaldados.

É claro que gostaríamos de saber que taxa efectiva de imposto vão pagar os gigantes tecnológicos que, assentes em motores de busca ou nas redes sociais, facturam centenas de milhões de euros com os residentes em Portugal. Gigantes tecnológicos que pouco ou nenhum emprego criam por cá, quase nada pagam de IRC e que usam preços de transferência, direitos de propriedade e conexos, para se furtarem a pagar impostos em território nacional.

Gigantes tecnológicos que sugam a comunicação social e os seus conteúdos, lucrando principescamente com o negócio da informação e da pesquisa. Gigantes tecnológicos que oferecem serviços financeiros sem pagarem impostos ou contribuírem para o Fundo de Resolução. A este propósito, já agora, quando é que ao Estado e aos seus organismos será vedada a contratação de serviços a empresas e entidades cujos beneficiários efectivos estejam em territórios de baixa, ou nula, intensidade fiscal?

Obviamente, causa-nos estranheza que os reformados estrangeiros estejam isentos de pagar impostos sobre as suas reformas, bem como as condições únicas oferecidas aos “vistos dourados” que quase nenhum cérebro atraíram e, portanto, nada, mas mesmo nada, nos trouxeram de novas tecnologias, de conhecimento, ou de estímulo ao desenvolvimento económico.

Continuar a fazer recair a carga fiscal, sob o falso argumento da equidade fiscal, apenas sobre os rendimentos dos remediados do trabalho, ignorando os exemplos acima referidos, apenas tornará os portugueses mais desencantados ainda com a actividade e a participação política. A justiça fiscal começa por resolver os problemas identificados. Não por taxar cada vez mais os rendimentos dos trabalhadores.

31.10.2019 - Jornal Económico

A doença do cancro é a segunda maior responsável pela mortalidade em Portugal, logo depois das doenças de foro cardiológico, com cerca de 26% do total de mortes. Segundos dados oficiais, cerca de quatro em cada mil portugueses têm um tumor maligno, uma percentagem que varia consoante os sexos (maior incidência na população masculina) e a idade (mais frequente nos menos novos).

Tanto quanto é possível prever, o efeito combinado do envelhecimento populacional com as terapêuticas de sucesso no prolongamento da vida, teremos cada vez maior incidência até 2050. Por isso é tão importante o programa nacional de rastreios, e o seu acesso a todos os cidadãos (também por isso, e não só, a importância de todos os cidadãos terem acesso a médico de família no SNS, mesmo aqueles que beneficiam de um acesso a um qualquer subsistema). Entre os mais importantes de serem realizados, os rastreios do cancro do cólon, reto, mama e oral, sempre por orientação do médico de família.

Mas o combate ao cancro não se realiza apenas com rastreios. O diagnóstico é vital, como também são o tratamento e o estadiamento (atente-se que no SNS, um doente internado fica em média dez dias de cada vez).

O aumento da prevalência na população portuguesa, caminha a par e passo com um aumento contínuo de cirurgias a neoplasias malignas, e a um disparar do custo com os medicamentos (citotóxicos, hormonas e anti-hormonas, imunomoduladores), quer nos sectores estatal, privado ou social.

Talvez devido às deficientes condições de estadiamento no SNS, pela maior cobertura de seguros de saúde privados, ou pelo facto de 15% das cirurgias no SNS serem realizadas em excesso dos tempos máximos de resposta garantidos, os hospitais privados têm reforçado a sua quota de ‘mercado’ no diagnóstico, tratamento e estadiamento nos casos de cancro.

E aqui começam os relatos de doentes empurrados para os hospitais estatais quando os seguros atingem os limites máximos contratados, ou de doentes que vão à falência. Sim, porque aqui temos uma falha de mercado. Uma situação de informação assimétrica, como dizem os economistas. De um lado, os especialistas, com toda a informação (hospitais privados), do outro, doentes (e familiares) assustados, a quem não é fornecida uma informação realista dos custos estimados de cada ciclo de tratamentos e estadias. Doentes que descobrem, impotentes e a posteriori, como não têm recursos para pagar os tratamentos e as estadias. Especialmente porque os medicamentos que lhes são administrados têm preços livres e lhes são cobrados valores muito superiores aos que o Estado paga por abastecer o SNS.

Convém que não haja dúvidas sobre isto. Alguém se aproveita da ignorância, da urgência (e os episódios de urgência são casos flagrantes onde não existem orçamentos ou previsão de custos) e da falta de informação alheia para um enriquecimento desproporcionado. Num país que tanta coisa regula, da qualidade da água que bebemos, à composição da comida que compramos, por exemplo, curiosamente não consegue combater este flagelo que afecta os doentes oncológicos em Portugal que recorrem ao sector privado.

Se há um sector em que os cidadãos exigem uma ministra da Saúde interventiva é este. Só a titular desta pasta ministerial tem a devida autoridade para regular os preços e impor regras ao modo amoral como este ‘mercado’ funciona. Uma área que é responsável por quase 6% da despesa nacional da saúde e que, em muitos casos, ainda por cima dita um empobrecimento repentino e injustificado dos doentes. Como se a doença não fosse já, por si só, uma dura experiência na vida de quem tem o azar de a ter.

25.10.2019 - Jornal Económico

Muito se falou nestas eleições legislativas na participação eleitoral. Sendo mais preciso, muito se falou nos valores registados pela abstenção. Abordagens que, em geral, se focaram na tragédia da abstenção e incidiram nos alegados males do nosso sistema político. Sem querer diminuir muitos dos argumentos válidos desta linha de raciocínio, permitam-me uma abordagem complementar.

Prefiro ver alguns dos aspectos positivos que este acto eleitoral veio mostrar. Primeiro, que o voto antecipado e por correspondência está em crescendo, com isso mostrando que o sistema tem capacidade de se adaptar aos ritmos modernos da sociedade, marcados por menos previsibilidade ou maior mobilidade. Falta ampliar, comunicar e educar para estas possibilidades, que não são novidade, mas até aqui quase restritas a militares, emigrantes e pouco mais.

Segundo, destaque-se também pela positiva o alargamento do debate a novos partidos, quer na disputa eleitoral quer na capacidade de conseguir eleger parlamentares. Novas ideias, novos discursos e novos protagonistas, uma combinação com potencial para enriquecer o debate público.

Terceiro, a consciência de que há um caminho a fazer para melhorar a proporcionalidade, em especial nos círculos mais pequenos.

Quarto, a educação para a cidadania e para o voto deve começar em tenra idade. Igualmente importante, em quinto lugar, os cadernos eleitorais terão que ser expurgados de eleitores falecidos para que então a análise da abstenção seja mais relevante.

Finalmente, da leitura dos resultados e dos desenvolvimentos partidários dos últimos dias, teremos um governo minoritário. Temas como a economia, a sustentabilidade e as relações de trabalho ganharão nova preponderância, pelas forças combinadas de um possível abrandamento económico internacional, consciência ambiental em crescendo e sindicatos mais recentrados na sua matriz laboral.

A este último propósito, os sindicatos bancários desenvolveram um crescendo de actividade neste ano que agora caminha para o final, com empenhamento e participação dos seus associados em várias acções, inclusive em actos eleitorais. Compete-me, em especial, saudar os sócios do Sindicato Nacional dos Quadros e Técnicos Bancários, que mantêm uma matriz de independência há 36 anos, que registaram uma participação histórica nas eleições para os seus órgãos centrais relativas ao quadriénio 2019/2023.

Na prática, a sua votação expressiva é o corolário do seu empenhamento cívico e sindical, bem visível ao longo deste último quadriénio. Sinal redobrado de empenhamento da sociedade civil na construção de uma sociedade mais equilibrada, como que a contrariar os deterministas que se esquecem que a vontade humana é decisiva na construção histórica.

18.10.2019 - Jornal Económico

Como salvar o sistema de saúde do Estado. ADSE debate limites de financiamento de novos fármacos. ADSE sem capacidade de resposta por falta de pessoal. Revisão das tabelas deverá estender-se até ao final do ano. ADSE põe o pé no acelerador da digitalização. Alargamento da ADSE pode chegar a 118 mil novos beneficiários. A lista poderia continuar. Estes são alguns exemplos de artigos recentes na imprensa sobre a situação presente da ADSE.

Sobre a gestão da ADSE, naturalmente, não me compete opinar, mas há aqui um óbvio fio comum que tem que ver com a sustentabilidade do sistema. E é aqui que quero chegar. Quando assumi funções, no final do ano de 2015, a minha preocupação central na gestão do SAMS Quadros (o subsistema de saúde dos bancários sócios do SNQTB), foi a sua sustentabilidade, mas também, como não poderia deixar de ser, a maximização do retorno para os associados.

Nos últimos quatro anos, de forma criteriosa e devidamente estudada, tomámos mais de uma centena de medidas que, na prática, tornaram o SAMS Quadros o melhor subsistema de saúde em Portugal. Digo-o sem falsas modéstias e com muito orgulho: o SAMS Quadros é a referência de excelência.

Alguns exemplos das medidas tomadas?

Introduzimos pagamentos mínimos para racionalizar o consumo de cuidados de saúde; capacitámos a estrutura de apoio, constituindo conselhos clínicos e chamando à gestão técnica do SAMS Quadros profissionais de referência nas áreas que nos são mais críticas; alargámos os acordos estabelecidos a mais de 400 prestadores de serviços de saúde; celebrámos acordos com mais de 50 unidades de saúde da Santa Casa de Misericórdia; renegociámos os protocolos com a generalidade da nossa rede, numa perspectiva de preço fechado; modernizámos os pedidos de reembolso, possibilitando o envio electrónico das facturas e definimos um prazo máximo de reembolso ao sócio de 72 horas.

Criámos ainda a Rede Escolha Informada para cirurgias, meios complementares de diagnóstico e tratamentos com eventos definidos a preço zero; abrimos as Óticas SAMS Quadros em Lisboa e no Porto; criámos o cheque parto, prolongámos a duração do subsídio de natalidade de 12 para 18 meses, realizámos campanhas de vacinação contra a gripe, alargámos a comparticipação no acompanhamento hospitalar de 12 para 18 anos; alargámos a comparticipação a 100% em várias categorias de análises clínicas; criámos o Gabinete de Apoio ao Doente; instituímos a possibilidade de ter acesso a uma segunda opinião médica internacional; e disponibilizámos o serviço de assistência domiciliária e de assistência médica telefónica, 24 horas por dia, todos os dias do ano.

Decidir implica estabelecer prioridades e fazer escolhas. As nossas foram, continuam a ser, muito claras e sempre orientadas para um objectivo central: manter o SAMS Quadros na qualidade de melhor subsistema de saúde em Portugal, naturalmente nunca perdendo de vista a sua sustentabilidade.

Queremos prestar aos nossos associados os melhores serviços de saúde possíveis, mas desejamos também deixar às futuras direcções do SNQTB um SAMS Quadros ainda melhor do que aquele que nos foi confiado. É para isso que trabalhamos todos os dias.

11.10.2019 - Jornal Económico

Vivi no seio familiar, em relatos em primeira mão, o entusiasmo estudantil com a candidatura do general Humberto Delgado e, por observação directa, os avanços e recuos, no meio castrense, do 25 de Abril, 11 de Março e 25 de Novembro. Lembro-me de ir com meus progenitores a todos os actos eleitorais na década de 1970, pós-25 de Abril, nomeadamente para a Assembleia Constituinte e para todas as que se seguiram.

Lembro-me bem do espírito, do debate acalorado, da busca da concretização de um futuro que se queria com mais e melhores oportunidades. Lembro-me da participação massiva dos portugueses. E do dever que incumbe a todos os cidadãos de se empenharem no processo democrático e na participação eleitoral. Talvez por isto tudo, nunca deixei de votar, para a escolha dos nossos representantes políticos. Comportamento este que tento estender às associações de qualquer género de que sou membro.

Votar em liberdade, esse bem precioso e que em tantas paragens é uma miragem. Votar, esse direito, que a não ser exercido, coloca nas mãos de minorias bem organizadas a escolha de caminhos que tantos, por ausência, por abstenção, não poderão contrariar. E não vale a pena levar a sério o argumento populista de que todos os políticos são iguais. Pois eles são iguais a nós, que neles votamos! Reflectem as nossas imperfeições enquanto seres humanos, as nossas dúvidas e certezas. Os nossos valores. Eles são o espelho do nosso empenho, da nossa participação cívica. E como em todos os grupos humanos, vários de entre os políticos são extraordinários em dedicação à causa pública.

Para estas eleições legislativas tenho apenas um desejo, o de que o meu voto ajude a valorizar o ser humano e os trabalhadores. Convido os leitores, em conjunto, a redobrarmos os esforços para que nesta legislatura este seja um país mais amigável para quem trabalha. Para que quem se esforça e se valoriza seja recompensado. Para que Portugal não seja apenas amigo dos residentes não habituais, esquecendo que um país e uma sociedade são feitos com os residentes. Para que os despedimentos colectivos, amiúde o reflexo de falta de ética dos dirigentes ou da incapacidade da gestão, requeiram fundamentação sólida e sejam menos baratos por quem por eles opta.

Para que os trabalhadores consigam impugnar um despedimento injusto, sem que isso signifique abdicar de condições financeiras mínimas de dignidade. Para que se valorize cada vez mais a contratação colectiva. Para que o financiamento da Segurança Social incida também sobre o valor acrescentado bruto e não penalize quem mais postos de trabalho cria. Para que existam maiores incentivos à contratação de desempregados de longa duração. Para que nas maiores empresas os representantes dos trabalhadores marquem presença nos órgãos de supervisão, como acontece nas democracias do Norte da Europa.

Portanto, um voto. O meu. O do leitor. E um desejo: que as pessoas sejam o alfa e o ómega da actuação dos nossos representantes políticos.

4.10.2019 - Jornal Económico

A tentativa de contornar a lei do trabalho, recorrendo à imaginação, tem levado algumas grandes empresas a olharem para os processos disciplinares como a tábua de salvação para as suas insuficiências de gestão.

Uma determinada empresa do sector financeiro, no decurso do ano de 2018, numa prática reiterada mensalmente, instruía dois a três processos disciplinares com intenção de despedimento.

Quase todos estes processos tinham por base alegadas irregularidades praticadas pelos trabalhadores que, na verdade, nada tinham a ver com movimentações fiduciárias de contas ou valores, direitos ou garantias dos clientes. Alegadas irregularidades que não tinham, em todo o caso, qualquer relevância em termos de materialidade ou eventual dano. Tudo se resumia a alegadas inobservâncias de um qualquer artigo ou alínea de um regulamento interno. Importa frisar, já agora, que no seio das grandes empresas coexistem múltiplos regulamentos, normas, instruções internas, amiúde contendo dezenas de páginas. Acresce que raras são as empresas que explicitam o que mudou quando ocorrem alterações, que ministram treino e formação sobre os regulamentos, ou que dão destaque suficiente ao que se deve ou não deve fazer sobre as situações de trabalho do dia-a-dia e o seu enquadramento nos regulamentos internos.

Não deixa de ser curioso que nos filmes policiais oriundos de Hollywood, essa grande fábrica do imaginário popular, quando algum suspeito é detido pela polícia, a primeira coisa que lhe é dito são os seus direitos, emergentes da Quinta Emenda, mais conhecidos por Direitos de Miranda: o direito de não falar, algo que diga e assine pode ser usado contra si, o direito a ter um advogado, oficioso se necessário.

O leitor ignora, certamente, como em Portugal se faz tábua rasa deste direito de defesa elementar. Voltando à tal empresa, que serve de mote a este artigo, o expediente usado permitia despedir quase três dezenas de trabalhadores anualmente, sem direito a qualquer indemnização legal, a subsídio de desemprego e libertando a instituição de parte substancial dos custos associados à pensão de reforma.

Na prática, com esse expediente, a instituição gerava uma poupança superior a um milhão de euros por ano. Tudo isto, repito, sem que o trabalhador tivesse o direito de ser acompanhado por um advogado do seu sindicato, ou qualquer outro à sua escolha.

Ora, em 1966, o Supremo Tribunal dos EUA, no famoso caso Miranda vs. Estado do Arizona, considerou que o trabalhador tinha o direito de ficar calado e de ter patrocínio jurídico, invalidando assim qualquer confissão prévia sem a presença de um advogado.

Cinquenta e três anos depois, em Portugal, algumas grandes empresas continuam a praticar métodos de despedimento que envergonham qualquer sociedade democrática. Por isso, em sede de contratação colectiva, confrontados com estas práticas, alguns sindicatos têm insistido e feito finca-pé para que, em toda e qualquer situação prévia de natureza informal, ou durante a fase formal de processo disciplinar, seja o trabalhador sempre acompanhado de defesa jurídica.

Um princípio simples, elementar, praticado no mundo ocidental há 53 anos. Resistem por cá, ainda e sempre, algumas empresas e as suas associações empresariais. Elucidativo.

27.9.2019 - Jornal Económico

Era uma vez um país fictício. Dizem alguns observadores que este país não existe e que, a existir, é fruto de um acaso histórico, algo que a globalização resolverá, apesar de vários séculos de história não o terem feito até agora. Este país fictício, plantado à beira-mar, tem um povo que parece andar alheado da realidade. Será verdade?

Dois acontecimentos fictícios, imaginados por este escriba, marcaram os últimos dias.

O primeiro é o elevado nível das audiências nos debates televisivos entre os diversos líderes partidários. Talvez para surpresa de alguns, o povo escuta com interesse os candidatos às próximas eleições legislativas. Apesar dos interesses comerciais das televisões tentarem reduzir tudo ao folclore da tagarelice sobre futebol, o povo, esse eterno desprezado pelas elites, mostra genuíno interesse e segue os debates com atenção. Nos seus locais de trabalho, nos cafés e nos seus momentos de convívio, o povo discute as intervenções dos líderes partidários, formula opinião e revela a sua resiliência. E, imaginem, vai votar nas eleições, tomando nas suas mãos o destino colectivo.

O segundo acontecimento imaginado envolve a administração de um grande banco. Depois de meses de teimosia e de recusa em proceder a aumentos de vencimentos e de reformas dos seus trabalhadores, relativamente a 2018, e de o ter anunciado publicamente aos sindicatos e à comissão de trabalhadores; depois de ter enfrentado a maior manifestação bancária dos últimos 40 anos; depois de uma interpelação na assembleia-geral de accionistas e de interpelações subsequentes nas conferências de imprensa; depois de uma comissão parlamentar de trabalho que, de forma esmagadora, apoiou as exigências de três sindicatos; depois de ter sentido a força da opinião livre e da comunicação social; depois de ter enfrentado, sob a alçada do Ministério do Trabalho, um processo de conciliação e, depois, um processo de mediação…

Dizia, depois de tudo isto, na iminência de um processo negocial que traria um novo e mais ruidoso protesto e seguiria para a fase de arbitragem, a tal administração de um grande banco resolveu lançar poeira para os olhos dos trabalhadores, activos e reformados. Numa manobra que não vou qualificar, essa dita administração fez um acordo com os dois sindicatos que tinham abdicado de discutir os aumentos de 2018 e fechou com estes um aumento para 2019 inferior ao que tinha proposto aos três sindicatos que não desistiram.

Muito interessante, pensará o leitor. Curiosamente, esta administração desse tal grande banco parece querer continuar a desvalorizar o trabalho em benefício do capital. A acontecer tal acontecimento imaginado, é claro que cá estaremos para impedir tanta imaginação.

Moral da história? Menos ficção e mais bom senso. Destes populistas estamos todos fartos. Fartos de quem procura distrair os cidadãos e os trabalhadores dos verdadeiros temas. Fartos de quem procura diminuir e dividir. De infirmis non tradit historia, i.e. dos fracos não reza a história!

20.9.2019 - Jornal Económico

Esta semana foi marcada pela boa notícia, oriunda do Banco Central Europeu (BCE), de que tomaria medidas adicionais para estimular a economia e ajudar os bancos, num contexto inédito de taxas de juros negativas. Atento ao que se passou no Japão, o BCE parece querer ajudar a rendibilidade dos bancos e aliviar as nuvens negras que alguns insistem em ver no horizonte.

Bom sinal o que os bancários têm vindo a dar, enchendo os plenários que temos feito, para discutir o que está em causa nos Acordos Colectivos de Trabalho e medidas a tomar nos próximos dias e semanas. Muita discussão, muita participação, um mandato claro! Salas e auditórios cheios, cidade após cidade.

Boas notícias também as que nos chegam do Ministério do Trabalho, que no âmbito do processo de mediação que opõe o Millennium bcp a três sindicatos bancários, fez uma proposta eivada de bom senso, para desbloquear o processo de aumentos das cláusulas de expressão pecuniária relativas a 2018.

Duas más notícias, no entanto. A primeira a referir que Portugal foi o país da OCDE onde os rendimentos do trabalho, em proporção do rendimento nacional, mais caíram entre 2004 e 2017. Ou seja, não é a globalização, a digitalização e a robotização que desencadeiam ameaças e oportunidades em todas as economias desenvolvidas, que explicam a razão porque nos aproximamos de um padrão terceiro-mundista de distribuição de rendimentos.

Há que encontrar as explicações nas alterações drásticas às leis do trabalho e ao menor peso dos sindicatos na vida laboral e na discussão das políticas de rendimentos e preços. O reforço da sindicalização, e a alteração de um par de disposições da lei do trabalho, muito fará para nos aproximar dos países em que os direitos sociais e laborais não são coisa vã.

Finalmente, uma última má notícia, na contratação colectiva na banca, onde alguns continuam a alimentar o mito de que podem dividir os bancários sem se aperceberem que o mundo mudou. Nesta mesma contratação, onde está em curso um ataque sem precedentes aos serviços de assistência médico-social (SAMS) dos bancários, construção mutualista ímpar na Europa, onde a solidariedade (inter-geracional) é o valor dominante.

Quando a OCDE, para o período de 2000 a 2016, diz que as despesas com saúde (pública, privada e mutualista), nos Estados-membros, cresceram, em termos nominais e numa base anual, entre 5% a 6% ao ano, ano após ano, esperar-se-ia que a quota parte do financiamento das instituições financeiras empregadoras acompanhasse esta realidade.

Mas quando se propõem aumentos de 0,75%, é legítimo pensar que alguns intervenientes, congelados no tempo, mais não querem que ir asfixiando, paulatinamente, os SAMS dos bancários.

Agora que as instituições bancárias convergem para níveis de rendibilidade de capitais próprios similares aos encontrados antes da crise do subprime, é caso para dizer, alto e bom som, não vamos contemporizar!

6.9.2019 - Jornal Económico

No passado, com o seu exemplo e liderança, os bancários foram marcantes na afirmação da classe média, bem como na consolidação do papel cívico e político dos cidadãos no regime democrático. Ao longo das últimas décadas, os bancários geraram líderes que foram decisivos em diversos planos para a tomada de consciência política da classe média e para a mudança de regime, para a conquista das liberdades políticas e dos direitos sociais, para a afirmação de uma imprensa livre e plural, bem como para o debate democrático e para a consolidação do poder autárquico.
Graças ao brio e ao profissionalismo dos bancários, o sector financeiro português tornou-se num dos mais modernos e produtivos na economia nacional, tendo atravessado com êxito, em poucas décadas, um conjunto relevante de choques assimétricos: a alteração das estruturas accionistas, a revolução do teleprocessamento e da informática, o atendimento diferenciado e a ênfase numa cultura de retalho, regulação, risco e cumprimento, bem como exigências de rácios de capital sem paralelo em qualquer outro sector.
A quase falência da República Portuguesa, a intervenção externa que se seguiu e o desmando de um punhado de banqueiros, vieram colocar os bancos e os bancários perante um cenário de forças centrífugas como não havíamos assistido nem durante o PREC. Numa década, para além do enorme aumento de impostos, os bancários perderam 10 mil postos de trabalho e 10 pontos percentuais de poder de compra.
Felizmente, a maré começou a mudar. Os sindicatos profissionalizaram-se, os bancários estão hoje muito mais atentos, os plenários têm casa cheia e, entretanto, os conselhos gerais sindicais aprovaram a constituição e a mobilização de fundos de greve. Não foi por acaso que, há algumas semanas, o Taguspark se encheu de manifestantes bancários como nunca se vira no passado.
Hoje em dia, os bancários partilham com outras classes profissionais o mesmo sentimento de proletarização, a mesma indignação pelo facto de grande parte das suas remunerações não contar para as suas pensões futuras, o mesmo cansaço com jornadas de trabalho que podem chegar às 13 horas, e a mesma revolta com aumentos de tabelas salariais que alguns empregadores tentam, de forma mais ou menos sub-reptícia, absorver por redução de outras componentes remuneratórias.
Nada temos contra os prémios de produtividade, de desempenho, de ‘mérito’, entre tantas outras designações imaginativas, mas desde que sejam complementares e nunca fracos substitutos de verdadeiros aumentos dignos para todos os trabalhadores.
E é igualmente difícil de aceitar que os sistemas de saúde dos bancários, de génese democrática e mutualista, estejam sob pressão financeira pelo facto de as entidades patronais os tentarem asfixiar com acréscimos de dotações anuais, per capita, de apenas 1/6 daquilo que será necessário para assegurar o padrão e o nível de comparticipações de despesas de saúde que conseguimos fazer. Por tudo isto, os bancários estão crispados e em contestação. Como não poderia deixar de ser.
30.08.2019 - Jornal Económico

Sobre a greve dos motoristas de pesados, em geral, e dos de matérias perigosas, em particular, abstenho-me de discorrer sobre a gestão política do governo, dos empregadores e dos sindicatos, ou de qualificar as actuações de uns ou de outros. Vários comentadores já o fizeram. 

Interessa-me, sobretudo, o quadro conceptual e de princípios gerais. Esta greve veio demonstrar, à sociedade, que os portugueses não gostam das greves feitas pelos outros. Não gostamos das greves na perspectiva de consumidores ou de utentes. Não gostamos de ficar sem combustível, de ter consultas, exames e cirurgias canceladas, escolas sem avaliações ou aulas. Regra geral, prevalece a lógica do consumidor em detrimento da do cidadão ou do trabalhador. 

Não gostamos de greves, grevistas ou sindicalistas. Mesmo que todos nós, ou quase, sejamos também trabalhadores. Do que gostamos é de homens providenciais, de pulso forte, que metam ordem na casa.

Acresce que largas franjas da sociedade também não gostam dos que pensam diferente, dos que falam ou escrevem diferente, dos que gostam de coisas diferentes ou dos que amam de forma diferente. Como se a diferença de opinião ou a liberdade de pensamento fossem crimes de lesa-majestade, perigosos sabotadores da ordem estabelecida. Sindicatos, igrejas, partidos políticos, associações, quando saem de um registo conformista e acomodatício são alvo de desdém ou de hostilidade, mais ou menos encoberta.

E porque não gostamos de nada disso, porque temos taxas de sindicalização baixas, porque protestamos pouco, cada vez temos mais e mais um modelo de sociedade que paga salários medíocres, que condena os jovens com curso superior ao desemprego ou à emigração, e os pais destes jovens qualificados, ao desemprego estrutural, se após os 45 anos, aquando de uma qualquer ‘reestruturação’ empresarial perderem o emprego. 

Por causa da nossa anomia social, temos uma sociedade que remunera cada vez mais o capital e cada menos o trabalho e os trabalhadores. Parece que há quem queira atribuir ao capital todos os frutos da produtividade e do aumento dos resultados. 

O trabalho é um direito fundamental, para a dignidade do ser humano e para a célula familiar. Porque o ser humano deve ser a medida e o fim de qualquer sociedade, o trabalho e a sua dignidade está primeiro do que qualquer outro factor de produção. 

Quando vejo trabalhadores a poderem ser obrigados a ter jornadas de trabalho diárias de 13 horas, sejam camionistas ou bancários, fico a pensar que política de trabalho é esta que penaliza as famílias e que reduz drasticamente o tempo dedicado ao descanso. 

Dito isto tudo, a greve é uma forma limite de luta, ainda que necessária, quando todas as outras não foram capazes de produzir os efeitos desejados pelos trabalhadores (também eles consumidores, utentes, contribuintes), nomeadamente os seus direitos e justas reivindicações. Porém, a greve é inaceitável quando acompanhada de violência, ou prosseguindo objectivos alheios ao trabalho e às condições dos trabalhadores. Como meio extremo que é, a greve deve ser proporcional, respeitando, na medida o possível, os grupos mais frágeis por ela potencialmente afectados. 

É legítimo que sejam estabelecidos serviços mínimos, mas não devem nunca ser definidos com o intuito apenas de malograr os intentos dos trabalhadores em greve. E, claro, não gosto especialmente de requisições civis, nem de militares, a executarem o trabalho de quem está em greve. Uma sociedade que quer ser pluralista e autónoma, que tem memória e estuda o seu passado, não pode deixar de se sentir incomodada ao ver estas linhas a serem ultrapassadas. 

Por tudo isto, um abraço de solidariedade pessoal para todos aqueles que lutam por jornadas de trabalho não esclavagistas, por salários declarados que correspondem à realidade, por descontos para a Segurança Social pela totalidade da sua remuneração, por tempos de descanso e por condições salariais que permitam que os trabalhadores usufruam de uma fatia justa dos rendimentos gerados. E que por isto, por tudo isto, no limite e apenas no limite, fazem greve.

23.08.2019 - Jornal Económico

À semelhança do que acontece no continente e na Região Autónoma da Madeira, a Região Autónoma dos Açores estabeleceu, recentemente, na plenitude dos seus direitos constitucionais, um Conselho Económico e Social (CES). Abstenho-me de enunciar detalhadamente os objectivos e as metas que pretende atingir um CES. Porém, importa notar que este é um espaço onde os diversos actores sociais e económicos se encontram, apresentam e debatem posições, discordam ou não entre si e institucionalizam o conflito, se for caso disso. Dito de outro modo, trazem para debate aquilo que são interesses e visões, nem sempre convergentes, sobre o que é, ou deverá ser, o bem comum.

Naturalmente, num espaço em que se cruzam sindicatos, entidades patronais, academia, ordens profissionais, associações cívicas, governo regional, entre outros actores, ninguém está à espera da unanimidade na forma de alcançar o bem comum. Mas seguramente que se pretende materializar um espaço onde se possam fazer valer ideias e posições e onde se possa construir um consenso sobre as prioridades estratégicas, as políticas de desenvolvimento e investimento público, as políticas de preços e de salários. Ou seja, num processo negocial, pretende-se alcançar um consenso no CES que depois se possa transmitir aos decisores políticos.

Como maior sindicato independente português, e com a legitimidade que decorre da nossa idade (36 anos) e da obra feita nos domínios sindical, saúde e social, o SNQTB foi escolhido, pelos restantes sindicatos independentes para os representar no CES dos Açores. Estamos cientes da importância do momento e da responsabilidade de representar os interesses dos bancários, mas também, para citar apenas alguns, dos trabalhadores oriundos de sectores tão diversos quanto as pescas, a alimentação e bebidas, os serviços, os transportes ou o turismo. Em suma, temos perfeita consciência da responsabilidade que constitui representar uma grande parte dos trabalhadores dos Açores. 

Depois de termos integrado o CES Madeira (e a Comissão Permanente de Concertação Social – CPCS), assumimos agora nos Açores este cargo com o intuito de fazer avançar uma agenda social equilibrada e consensual. 

Na Madeira, tal como nos Açores, o papel dos sindicatos independentes – quer do SNQTB, quer da USI – é reconhecido e valorizado. Escusado será dizer que lamentamos o facto de no CES (e na CPCS) da República Portuguesa, a entrada e os contributos dos sindicatos independentes (de relembrar que a USI – Confederação Sindical, vai a caminho de fazer 20 anos de existência) continuar barrada, como que pretendendo substituir a legitimidade dos sindicatos independentes por heranças ou legados dos tempos do PREC. Como se a UGT ou a CGTP tivessem o monopólio da representação sindical. Felizmente, nos Açores e na Madeira prevalece uma leitura do mundo e da realidade sindical ajustada aos dias de hoje, em que UGT e CGTP estão muito longe de monopolizar o mundo sindical. Muito longe, mesmo…

16.08.2019 - Jornal Económico

Quando era mais novo, as festas da espuma faziam a delícia dos adolescentes. Era um divertimento garantido, mas nada daquilo era muito a sério. Lembrei-me disto a propósito das declarações de alguns presidentes de bancos nas apresentações semestrais de resultados, anunciando o novo mantra: os próximos tempos vão ser difíceis na banca e por isso vai ser preciso cortar custos operativos. 

Como quase sempre acontece, uma parte da argumentação tem algum fundamento, a outra nem tanto, mais ainda quando se olha para a realidade dos bancos a operar em Portugal e depois se observa também a dos nossos parceiros europeus. A esse propósito, a Associação Portuguesa de Bancos (APB), instituição representante das entidades patronais, não poderia ter sido mais elucidativa quando comparou, entre 2009 a 2019, a evolução da banca em Portugal com a da zona euro e de alguns dos seus principais mercados. 

Os bancos a operar em Portugal reduziram a sua rede de balcões em quase 40%, um número em claro contraste com a redução de apenas 25% na zona euro. Não nos parece que os portugueses sejam mais nativos digitais do que noutros mercados. Portanto, de alguma forma, já contribuímos para o “peditório” da digitalização e do eventual papel menor que os balcões bancários irão, ou poderão, ter no futuro. A este propósito, já agora, não deixa de ser curioso que a Amazon e a Apple, expoentes máximos do mundo digital, invistam em redes de lojas físicas, em nome próprio, como que a dizer que o retalho está vivo e se recomenda. Curioso, não é verdade? 

Os custos operacionais dos bancos em Portugal, quer em percentagem do activo, quer em proporção do resultado operativo, são menores do que os da zona euro. (E muito menores, por exemplo, do que os custos dos bancos alemães!). 

Diz a APB que “desde 2015 os depósitos de clientes financiam a totalidade do crédito concedido em Portugal”. De igual modo, a partir do relatório da APB percebe-se que o stock de crédito à habitação tem crescido e passou a ter uma evolução positiva. 

É óbvio que a perda de margem poderá continuar, fruto da intensificação das pressões concorrenciais e da ausência de rendibilidade dos passivos bancários. Felizmente, a descida das yields da dívida pública e a sua manutenção em níveis negativos continuarão a ajudar o sector bancário, de certo modo contrabalançando um efeito com o outro. 

A perda de margem, importante que é, e será, não pode ser a canga para que os trabalhadores bancários venham a sofrer impactos negativos desproporcionais comparativamente às equipas de gestão e aos accionistas.

Diz ainda a APB que “o rácio de NPLs, apesar de permanecer num nível elevado, apresenta uma diminuição significativa desde o máximo atingido em Junho de 2016. Desde esse período, o montante registou uma redução de quase 24,6 mil milhões de euros”. Um valor que não é despiciendo. 

Por isso, por estes dias, no meio de tanta espuma irrelevante, este mantra está a procurar testar as águas da opinião pública e dos sindicatos. Como que a ver se ‘pega’. Não pegará!

09.08.2019 - Jornal Económico

Os últimos dias foram marcados pela apresentação de resultados pelo Banco BPI, Caixa Geral de Depósitos, Millennium BCP e Santander. Todos apresentaram resultados muito positivos, o que muito nos satisfaz, como é evidente. 

Tem razão o presidente da comissão executiva da CGD, Paulo Macedo, quando se queixa de que lhe está a ser imposta a emissão de dívida, a colocar nos mercados de capitais, quando o banco não precisa, em termos económicos, nem de liquidez nem de reforçar os rácios de capital. 

Tem razão o presidente da comissão executiva do Banco BPI, Pablo Forero, quando comenta, de forma muito polida, o facto bizarro de o multibanco ser gratuito, ao arrepio do que acontece noutros países, ou de o processo de alienação da posição accionista do BPI em Angola ser uma certeza, conquanto de prazo ainda incerto. Nada cobrar por serviços que custam dinheiro, ou sair de mercados lucrativos, por imposição do BCE, só fragiliza os bancos a operar e a investir em Portugal.

Tem razão o presidente da comissão executiva do BCP, Miguel Maya, quando diz, de forma muito vocal, que o Fundo de Resolução deveria ser financiado por uma taxa sobre as transacções financeiras a suportar por todas as instituições financeiras que operam com clientes residentes em Portugal. Isso asseguraria um level playing field justo, não penalizando apenas aqueles que têm um compromisso com Portugal. 

Todos fizeram uma antevisão sobre os desafios do futuro próximo, que o sector enfrenta, e sobre os quais tenho escrito de forma abundante nesta coluna. 

Todos poderiam ter falado ainda mais e melhor sobre o longo ciclo económico expansionista em Portugal e nos nossos principais mercados. Ou nos novos investimentos públicos ou concessionados (aeroporto e ferrovia) e privados (reabilitação urbana), cuja dimensão e ocorrência têm vindo a abrir um mar de oportunidades a empresas relacionadas e de suporte, com isso dando fôlego acrescido aos bancos. Poderiam ter falado, igualmente, da subida de rating de vários bancos (CGD, Novo Banco, Santander e BCP). 

Talvez tenha sido intencional esta quase omissão de oportunidades. Isto porque o processo negocial sobre o Acordo Colectivo de Trabalho (ACT) no sector está a progredir muito lentamente. Talvez porque queiram impor acordos colectivos minimalistas, como que fazendo um favor aos movimentos radicais que querem destruir a ordem social vigente. 

É um sinal dos tempos, muito sintomático, que nas conferências de imprensa de apresentação dos resultados tivessem que responder a perguntas inéditas sobre a possibilidade de uma greve na banca. 

Os sindicatos subscritores do ACT não permitirão que triunfem os radicais. Tanto os que querem promover um empobrecimento dos bancários como os que querem impor um mundo bafiento e ditatorial. Dure o tempo que durar, esta nossa luta. Alea iacta est. Os dados estão lançados.

02.08.2019 - Jornal Económico

A Constituição da República Portuguesa (CRP) faz questão de referir que os “direitos fundamentais devem ser interpretados e integrados de harmonia com a Declaração Universal dos Direitos Humanos”. E, simultaneamente, consagra um conjunto de direitos na área do trabalho e da sua dignificação, habitação, saúde, entre outros. 

Naturalmente, a interpretação da letra e do espírito da Constituição não é uma realidade estática. Por isso mesmo, nas quatro décadas de regime democrático, a CRP foi sofrendo ajustes. Mas ajustes não são derivas abruptas no entendimento dos direitos consagrados. Assim, nos anos de vigência (e excessos) da troika, a CRP e os juízes do Tribunal Constitucional foram a última barreira num percurso pouco amadurecido. Excessos que, ainda assim, se fizeram sentir nalguns aspectos e que já deveriam ter sido repelidos. O surto de greves que tem vindo a marcar 2018 e 2019 é disso o sintoma mais evidente. 

Os cidadãos estão fartos das alterações que ocorreram na balança de poderes entre capital e trabalho e de terem sido removidos, por via legal, alguns dos mecanismos de equilíbrio – contratação colectiva, indemnizações razoáveis em caso de despedimento, entre outros – que asseguravam um mínimo de justiça social. 

Desde o início desta década que a classe média tem sido fustigada. Primeiro foi o flagelo do desemprego, tendo como alegada ‘alternativa’ a emigração económica. Depois foi a perda do poder de compra com o tristemente célebre “enorme aumento de impostos” de Vítor Gaspar. Por último, a perda de poder de compra fruto de actualizações de salários que não têm acontecido, ou que são abaixo da inflação. 

No sector bancário, um dos baluartes da classe média que paga impostos, vota, lê e decide o sentido político dos nossos valores fundamentais, os bancos a actuar em Portugal têm vindo a recuperar a sua rendibilidade, relativa e absoluta, para os níveis pré-crise do subprime. 

Estamos conscientes da complexidade do contexto dos bancos, num ambiente de taxas de juros zero, ou negativas, num paradigma que os livros de finanças nunca previram. Estamos também conscientes dos desafios trazidos pela digitalização e por novos concorrentes oriundos de fora do sector. 

Mas nada disso explica o extremar de posições, em que algumas administrações bancárias parecem querer impor uma visão de tipo colonial às relações de trabalho. Administrações que prosseguem, de forma incansável, a maximização do retorno dos accionistas, sem se preocuparem em assegurar que os seus trabalhadores, reformados e pensionistas não continuem a sofrer com a erosão dos seus rendimentos do trabalho. 

Bancos que colocam na mesa propostas de actualização das cláusulas contratuais de expressão pecuniária que não cobrem a inflação prevista. Bancos que procuram iludir os incautos com ‘prémios’ de desempenho que, para serem instrumento motivacional, teriam sempre de ser complementares e nunca substitutos de aumentos reais de salários e pensões. 

A paciência esgotou-se e vários sindicatos bancários preparam-se para uma greve, tendo as suas direcções recebido mandato para tal. Este momento é uma verdadeira travessia do Rubicão. Os bancários estão fartos de pagar pelos erros e desmandos de terceiros. Por todos, para todos e com todos.

26.07.2019 - Jornal Económico

Quero partilhar convosco um conjunto de reflexões que me ocorreram fruto da conjugação da nossa gestão de um subsistema mutualista de saúde, o SAMS Quadros, por um lado, e da leitura da notável entrevista concedida ao jornal Público pelo professor Henrique Barros, presidente do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto e presidente do Conselho Nacional de Saúde, e do livro “Prevenir doenças e conservar a saúde” (Fundação Francisco Manuel dos Santos) do presidente da Cruz Vermelha Portuguesa, Francisco George, por outro. 

Nalguns países, nomeadamente no Reino Unido, a expectativa de evolução da esperança de vida está a desacelerar, o que faz com que se preveja que a próxima geração britânica viva menos tempo que a actual. A principal causa disso? A obesidade. 

Hoje em dia, 86% das mortes prematuras em Portugal, todas as antes dos 70 anos de idade, e de incapacidades de diversa ordem, decorrem de quatro factores que podem ser evitáveis. 

A saber, o primeiro é o sedentarismo, o que implica no futuro um programa e uma atitude de promoção do exercício físico. O segundo é o consumo excessivo de álcool e substâncias psicotrópicas. O terceiro factor abarca os erros alimentares, daí a referência anterior à obesidade, problema que em Portugal começa desde tenra idade. Por último, mas não em último, o quarto factor é a exposição, activa e passiva, ao fumo do tabaco. 

São conhecidas as restrições orçamentais do Serviço Nacional de Saúde (SNS) e o seu imobilismo, em parte derivado de regras de gestão em muitos aspectos ultrapassadas e datadas. A conjugação destes dois factores não auguram que o SNS, por si só, consiga educar para a mudança. Ora, isto é um desafio enorme para Portugal, cada vez mais confrontado com um envelhecimento galopante. 

Felizmente, o SNS tem parceiros potenciais que poderão ajudar. Os subsistemas de saúde e demais participantes na cadeia de valor – farmácias, ordens profissionais, sindicatos de trabalhadores de saúde, comunicação social, associações de pais – têm capacidade e disponibilidade para colaborar num trabalho educativo e para mostrar qual o caminho a seguir no futuro. Tudo isto, nos quatro eixos acima referidos, usando uma panóplia de instrumentos, promovendo, incentivando e premiando comportamentos, em suma, educando. Sem tibiezas. Mostrando o caminho para que os decisores políticos e a sociedade civil não ignorem a praga evitável das mortes prematuras. 

Passámos 30 anos a assistir a uma autêntica guerra civil nas estradas portuguesas, até que decidimos agir de forma estruturada para mitigar os sinistros rodoviários. Está na altura de liderarmos pelo exemplo nesta nova frente de acção. Ou a próxima geração viverá menos que a actual. 

19.07.2019 - Jornal Económico

A leitura do PS/Governo relativamente ao quadro macroeconómico é um facto público, a partir dos dados submetidos no último Orçamento do Estado, mas também decorrentes de diversas intervenções posteriores do primeiro-ministro e do ministro das Finanças. A novidade dos últimos dias, todavia, foi a apresentação pelo PSD do seu quadro macroeconómico e orçamental, bem como das suas medidas de política fiscal. 

Cito o PS e o PSD em particular pelo facto óbvio de serem os dois partidos estruturantes do sistema político e partidário português, e nada mais do que isso. O SNQTB, como é sabido, é institucionalmente independente face a qualquer força partidária, um traço do seu ADN que se tem mantido inalterado, independentemente das opções individuais legítimas dos seus sócios, ou dos membros dos seus órgãos sociais. 

Mas, como dizia, PS e PSD convergem para uma leitura de curto e médio prazo que antecipa níveis de crescimento do PIB que, não sendo brilhantes, são em todo o caso aceitáveis, dado o contexto actual e o histórico das últimas décadas. 

Naquilo que me diz respeito, registo que, do ponto de vista do PS e do PSD, o quadro macroeconómico se mantém favorável a que os bancos prossigam a redução dos créditos não produtivos, ao mesmo tempo que os seus resultados vão melhorando e com isso a capacidade de remunerar os accionistas e os trabalhadores. 

PS e PSD convergem na leitura de que a economia portuguesa continuará a crescer nos próximos anos. Uma análise que, aliás, não se lhes circunscreve. Não se percebe, por isso, a resistência de alguns sectores em incorporar valores nas suas políticas de remuneração dos trabalhadores que sejam razoáveis e justos, antes insistindo no empobrecimento dos bancários. 

A quem serve esta insistência numa estratégia de empobrecimento? 

Aos bancários não serve, de certeza absoluta, por motivos evidentes. Aos portugueses, em geral, também não, uma vez que nada lucram com isso. Ao Estado português certamente que também não, pelos mesmos motivos. O Governo e os partidos políticos também não retiram disso benefício algum, antes pelo contrário. Resta, portanto, um único beneficiário possível, i.e. os accionistas dos bancos a operar em Portugal, muitos deles estrangeiros. 

Aparentemente, estes accionistas estrangeiros estão pouco interessados noutra coisa que não seja nos resultados imediatos e em recuperarem o mais rápido possível o seu investimento, mesmo que isso se faça de forma desproporcionada e, no essencial, à custa dos trabalhadores. Pelos vistos, estes accionistas, e as administrações dos bancos por eles nomeadas, só compreendem uma única linguagem. Não é a do diálogo.


12.07.2019 - Jornal Económico

Esta semana, e num momento inédito, duas mulheres foram nomeadas para dirigir a Comissão Europeia (Ursula von der Leyen) e o BCE (Christine Lagarde). Se sobre Ursula von der Leyen é justo realçar que enquanto ministra da CDU/CSU promoveu políticas de apoio à parentalidade e à inserção feminina nos conselhos de administração das grandes empresas, para além de ser uma férrea apoiante de Angela Merkel, julgo que aos portugueses deve interessar mais aquilo que são os desafios que esperam Christine Lagarde na condução do BCE. 

Muito especialmente, o desafio que é a política de taxas de juro zero (ou negativas) e seus impactos na política monetária do BCE, bem como no modelo de sociedade portuguesa. 

Não constava dos manuais de Economia a possibilidade de existir um período prolongado de taxas de juro zero. Há 20 anos começou no Japão, no que então se pensava ser uma excepção. Mas a crise do subprime trouxe ao mundo ocidental essa mesma situação, confirmando-se agora não ser uma idiossincrasia japonesa. Recompor os balanços dos bancos e acudir ao excesso de dívida pública (e privada), estiveram no cerne desta decisão. Que perdura desde 2008 na Europa. 

E quais são as consequências nefastas deste tipo de taxas de juro? Primeiro, a mais estudada na literatura económica: a redução da capacidade de intervenção e da eficácia da política monetária do BCE, com impactos tremendos, se e quando ocorrer um choque assimétrico. Por isso temas como um orçamento europeu de valor significativo (que permitisse financiar um subsídio de desemprego comum à escala da União, por exemplo) ou o finalizar da União Bancária (com um sistema comum de garantia de depósitos) são tão críticos para os portugueses. 

E não se iludam a pensar que algures em 2020 as taxas começam a subir. As curvas de rendimento e as taxas de juro nas obrigações alemãs a 10 e 15 anos significam que os investidores esperam taxas negativas ou nulas até 2030! 

Mas infelizmente pouco se tem falado dos outros efeitos, sentidos ao nível dos agentes económicos e das famílias. Primeiro, reduz os incentivos a poupar (veja-se o caso português, com níveis historicamente baixos de poupança), verdadeiro barómetro da capacidade presente e futura de investimento. 

Segundo, comprimem-se as margens de rendibilidade dos bancos, com isso fomentando uma concentração transfronteira, que será nefasta para o financiamento das empresas e dos empresários portugueses. E com os reflexos inerentes sobre a criação de riqueza, emprego qualificado e impostos para o nosso país. Em suma, para a independência nacional. Terceiro, parar agravar o problema, o BCE terá que continuar a comprar activos sob a forma de títulos de dívida pública e privada, com isso reduzindo a rendibilidade das obrigações e pressionando os resultados, outra vez, dos bancos comerciais. 

Finalmente, taxas de juros nulas são um poderoso incentivo para o apetite acrescido por activos de risco (imobiliário) ou de dívida privada sem rating. E por isso não espanta ver aforradores portugueses, os mesmos que nunca investiram no mercado de capitais, num estado de euforia, a subscrever dívida de clubes de futebol, estações televisivas ou de companhias aéreas e a adquirirem imóveis (para ‘reabilitação’), num frenesim especulativo que sabemos, ciclo após ciclo, como acaba.


05.07.2019 - Jornal Económico

Anda a opinião pública entretida, literalmente, com a Comissão de Inquérito à Caixa Geral de Depósitos. Apesar das críticas, estas comissões têm vários méritos, mormente o de tornar impossível, doravante, que tamanhas tropelias voltem a acontecer. E demonstram, em toda a plenitude, a impreparação e a falta de classe de tantos ex-gestores bancários, especialmente de aqueles que se alcandoraram a tais posições por ligações pessoais ou partidárias. 

Enquanto isso, tem a Comissão Parlamentar do Trabalho e da Segurança Social, nas suas mãos, o imperativo de não deixar acabar a legislatura sem tentar rever os aspectos mais negativos do código de trabalho. 

Quer o Sindicato Nacional dos Quadros e Técnicos Bancários (SNQTB) quer a União dos Sindicatos Independentes (USI) têm feito chegar às senhoras e aos senhores deputados, bem como ao Sr. Ministro, muitos e variados contributos. Por nós tem sido afirmado, reiteradamente, que uma das formas de tornar Portugal numa sociedade mais justa, mais vibrante, com melhores oportunidades para quem estuda ou trabalha, passa por valorizar o trabalho e a contratação colectiva. Numa abordagem humanista, sem qualquer dialética esquerda versus direita, ou marxista versus libertária. 

Numa época em que as maiores empresas a operar em Portugal são dominadas por entidades jurídicas não-residentes, é de mera inteligência estratégica não condenar os portugueses à emigração como alternativa ao embaratecimento do valor do seu trabalho, mais a mais ameaçados que estamos por digitalizações, economias de partilha (que pouco partilham de valor monetário), automação e robotização, entre tantas outras. 

Reforçar os mecanismos institucionais, nomeadamente os legislativos que regulam as relações laborais, é um factor de coesão social e de redistribuição de rendimentos, em favor do trabalho português. Por isso, tão importante se torna que as senhoras e os senhores deputados, qualquer que seja o seu partido, votem as alterações que se impõem se queremos modernizar e valorizar as pessoas em Portugal. 

Sem ser exaustivo, é de elementar justiça social que sejam repostos os valores de indemnização por despedimento para os níveis pré-troika (porque é bom lembrar que a taxa de desemprego de longa duração, em Portugal e para pessoas com mais de 40 anos, é a segunda mais alta da OCDE); que se consagre o fim da caducidade das convenções colectivas (evitando a sua precariedade); que seja reposto o princípio do tratamento mais favorável ao trabalhador; que seja possível a não devolução da compensação pelo trabalhador em caso de impugnação de despedimento, até sentença judicial transitada em julgado (pois na situação actual, impugnar um despedimento injusto demora demasiados anos, sem qualquer rendimento para além do subsídio de desemprego, que tende a não cobrir a totalidade do tempo necessário até transitar em julgado uma sentença). 

Num país tão lesto a legislar sobre Vistos Gold e a atracção de supostos cérebros estrangeiros, que raramente o são, desfigurando cidades e repelindo os seus moradores portugueses, importa que os nossos legisladores nos transmitam um sinal claro. Preferimos que sejam mais amigos dos trabalhadores portugueses, e da melhoria do seu bem-estar, das suas perspectivas presentes e futuras, e nisso invistam os legisladores o seu tempo.


28.06.2019 - Jornal Económico

Com o Verão quase a começar, estamos a chegar à altura do ano em que a maioria dos portugueses aproveita para tirar alguns dias de merecidas férias. Permitam-me, intercalando com a leitura tradicional de jornais e revistas em ambiente de puro relaxe, algumas sugestões. 

Até ao próximo dia 11 de Setembro, a não perder no Palácio das Artes do Porto, a exposição inédita de 100 gravuras desenhadas por Pablo Picasso, entre 1930 e 1937, uma colecção detida pela Fundação Mapfre e considerada uma das mais importantes do século XX. Para alguém que muito aprecia a obra de Picasso, esta exposição – apenas possível em resultado da parceria estabelecida entre a casa de vinho do Porto Taylor’s e o Museu da Misericórdia – é simplesmente imperdível. 

Em Lisboa, até ao próximo dia 29 de Setembro, no Atelier Museu Júlio Pomar, uma exposição que reúne mais de 80 obras do grande artista plástico e pintor português, incidindo sobre o modo como o corpo, o erotismo, a sensualidade e a sexualidade atravessaram a sua obra ao longo de várias décadas.

Ainda em Lisboa, até ao dia 16 de Junho, decorre a Feira do Livro que, apesar dos seus altos e baixos ao longo dos anos, continua a ser um ponto de paragem clássico no panorama editorial. Destaco e recomendo a aquisição de três biografias recentemente publicadas: José Saramago, por Joaquim Vieira (Livros Horizonte), Sophia de Mello Breyner Andresen, por Isabel Nery (A Esfera dos Livros) e Agustina-Bessa Luís, por Isabel Rio Novo (Contraponto). 

Quanto a teatro, recomendo vivamente “A matança ritual de George Mastromas”, no Teatro Nacional D. Maria II, até ao próximo dia 28 de Junho, de Dennis Kelly e com encenação de Tiago Guedes. Para alguém que aprecia o percurso de Bruno Nogueira, o meu caso, é curioso e ao mesmo tempo estimulante ver este actor vestir uma pele diferente do habitual nesta peça. Uma aposta ganha.

No Porto, dia 22 de Junho, na Praceta Exterior Norte do Arrábida Shopping, a partir das 22 horas, a Orquestra Sinfónica do Porto Casa da Música interpreta algumas obras de George Gershwin, Darius Milhaud e Dmitri Chostakovitch, tendo como elo comum a visão de cada um destes autores clássicos sobre a música jazz. Uma noite que promete. 

Termino com futebol e ballet. Na semana em que a Selecção Nacional de futebol se sagrou vencedora da Liga das Nações da UEFA, numa demonstração, uma vez mais, de que o trabalho, o esforço e o mérito nos colocam ao nível dos melhores nos mais diversos patamares, queria também destacar o exemplo do bailarino português, Marcelino Sambé. Filho de pai guineense e mãe portuguesa, começou a dançar aos quatro anos. Num percurso de vida inteiramente dedicado à dança, em 2012 Sambé ingressou na companhia de dança Royal Ballet, onde agora acaba de ascender à ambicionada condição de bailarino principal. Parabéns! 

Sim, o talento, a dedicação e o compromisso geram resultados que nos colocam entre os melhores. E pagam-se, claro está. 

P.S. – A frase que dá corpo ao título deste artigo é da escritora sueca e vencedora do Prémio Nobel de Literatura em 1909, Selma Lagerlöf.

14.06.2019 - Jornal Económico

Uma sociedade livre e democrática, além da realização de eleições regulares, livres e justas, define-se pela forma autónoma como os cidadãos, entidades sociais e empresariais se associam e organizam entre si. Este quadro de regras é igualmente válido para a prestação e o financiamento de cuidados de saúde, tanto através de um sistema universal como por meio de subsistemas mutualistas ou cooperativos.

As notícias e especulações sobre a ADSE, que se têm repetido nos últimos meses, subsistema de saúde com o qual partilhamos muitas das características, leva-me a partilhar algumas notas sobre o que temos aprendido enquanto gestores do SAMS Quadros. No fundo, algumas observações sobre os mitos e as realidades com que se defrontam os subsistemas de saúde em Portugal.

Comecemos pelas realidades. Primeira: nenhum subsistema será viável, no médio e longo prazo, se não tiver o SNS como seu primeiro prestador de cuidados primários. Os subsistemas são, e serão sempre, na sua essência, complementares do SNS. 

A segunda realidade é que em toda a OCDE os gastos com a saúde, fruto do envelhecimento das sociedades e de técnicas mais inovadoras de terapêutica, estão a crescer entre 4% e 6% ao ano. Para acomodar isto, torna-se necessário, entre outros factores, envolver mais os beneficiários na medicina preventiva, no co-pagamento e na validação dos actos da medicina curativa. 

Terceira realidade, todos os subsistemas têm que possuir um corpo de consultores clínicos que ajudem a detectar a fraude, a preparar a negociação técnica com os prestadores de saúde e a verificar a razoabilidade de actos que devam estar sujeitos a pré-autorizações/termos de responsabilidade. As pré-autorizações, com validação clínica, devem ser a norma em cirurgias, implantes operatórios, tratamentos continuados, entre outros. 

E os mitos? 

Existem vários. O primeiro, talvez o mais enraizado, é o mito de que existe alguma coisa gratuita no domínio da prestação de cuidados de saúde no sector social ou no privado. No domínio das cirurgias, por exemplo, advogar que apenas se devem pagar os honorários médicos, ignorando o custo dos equipamentos e dos blocos operatórios. Convidando, implicitamente, a que esta ilusão seja subsidiada com o recurso a preços absurdos dos medicamentos ou dos consumíveis administrados em ambiente hospitalar. 

O segundo mito é o de acreditar que o trabalho médico pode ser mal remunerado, colocando-o ao nível do custo por hora de um trabalhador pouco especializado, quando se procura impor aos prestadores privados de saúde valores de consultas que não pagam o investimento dos médicos na sua formação. Valores que não pagam também os investimentos necessários em instalações, equipamentos de diagnóstico e pessoal de suporte. 

Acresce que quando se paga tardiamente aos prestadores de saúde, tal aumenta o prémio de risco e promove a subsidiação cruzada e artificial, enquanto instrumento protector face aos prazos de pagamento anacrónicos. 

O mito mais perigoso de todos, no entanto, é outro: o de acreditar que uma renovação demográfica, proporcionada por miríficos novos beneficiários, irá possibilitar que se ignore as realidades acima enunciadas.

07.06.2019 - Jornal Económico

Como cidadão e sindicalista, gostaria de partilhar com os leitores dois momentos muito especiais, que deixarão marcas indeléveis no mundo do trabalho português. 

A sentença do tribunal a confirmar a ilegalidade do despedimento e o assédio moral, praticado por uma corticeira, contra uma sua trabalhadora, Cristina Tavares, veio penalizar, de forma que muito nos conforta, um método de gestão assente na perseguição e no assédio, típico de maus gestores e empresários. Não obstante a dificuldade da prova e da força moral que se exige a um trabalhador que ouse contestar o assédio, a justiça fez o seu caminho. Infelizmente, nos sectores dos serviços, situações destas são demasiado frequentes. De acordo com um estudo publicado, em 2016, pela Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego (CITE), cerca de 1/6 dos trabalhadores confronta-se, ou foi confrontado, com situação de assédio. Estamos gratos à Cristina Tavares e ao sindicato que a apoiou, pela coragem e pela resiliência, ajudando a que Portugal seja uma sociedade mais justa. 

A manifestação dos bancários no campus do Millennium bcp, a maior desde 1975 e a primeira vez em que todos os sindicatos subscritores do Acordo Colectivo de Trabalho se juntaram, é também ela um marco histórico. 

De participação, enchendo a avenida principal do Taguspark. De bancários, de todas as regiões do país. De reformados, pensionistas e trabalhadores activos. Vindos com os seus sindicatos ou juntando-se espontaneamente ao protesto. Muitos abdicando dos seus tempos de pausa de almoço ou de férias, para se poderem juntar. Outros, exercendo os seus direitos, constitucionalmente protegidos, de reunião.

E preciosas ilações retiramos desta manifestação dos bancários. A primeira, é que de uma próxima vez, seremos mais, muitos mais. Se tiver que acontecer, espalharemos o protesto. A segunda, que os trabalhadores desejam o sucesso das suas empresas bancárias, mas que rejeitam que o trabalho seja uma mera mercadoria. Que o trabalho carece de valorização e de ser relembrado que a sua dignidade, tal como diz o Papa Francisco, é central na vida humana. Terceira, e como diz a canção dos Deolinda (várias delas entoadas pelos manifestantes), que “Seja Agora, tem que acontecer, porque tem de ser, e o que tem de ser tem muita força, e sei que vai ser, porque tem de ser, e se é para acontecer, pois que seja agora”. 

E o que tem que ser? O que disseram os bancários com a sua voz, com a sua presença, todos juntos? Que querem ver uma mesa negocial única de todos os sindicatos bancários. Que não percebem nem aceitam que os sindicatos bancários, todos de base democrática, aceitem ser peças de uma engrenagem (mesas negociais separadas) que não valoriza os bancários nem o seu trabalho. Que não percebem que em todos os sectores os sindicatos negoceiem a uma só mesa e na banca, com os maiores sindicatos do país, haja quem aceite participar numa divisão que a todos enfraquece. Haja quem se predisponha a fazer contra-relógios negociais, a solo, em acordos minorantes, com actualizações pecuniárias abaixo da inflação. 

Oiçam os bancários: é tempo de partilhar de forma mais justa os ganhos da banca! 

31.05.2019 - Jornal Económico

No momento em que escrevo estas linhas ter-se-á já realizado a manifestação de todos os sindicatos bancários, subscritores do Acordo Colectivo, em pleno Taguspark e campus do BCP. Momento simbólico, porque foi a primeira vez, desde o 25 de Abril, que todos os sindicatos desfilaram juntos.

Quer os sindicatos membros da União dos Sindicatos Independentes (USI) quer os da União Geral de Trabalhadores (UGT), num momento de comunhão naquilo que verdadeiramente nos preocupa: a defesa dos interesses dos trabalhadores, reformados e pensionistas bancários. Do Grupo BCP, em particular, mas de toda a classe bancária, como um todo, também. 

Sindicatos verticais e sindicatos horizontais (de quadros e técnicos) juntos. Onde os extremismos não têm lugar. Sindicatos cujos sócios são cidadãos que pagam impostos e exercem os seus direitos de cidadania, mormente votando e fazem ouvir a sua voz. Porque queremos a mudança, porque queremos denunciar a injustiça, fazemos ouvir a nossa voz. 

E vieram pessoas de todas as idades e situação profissional. De todo o país. Desde o planalto transmontano e a fronteira do Minho, até às cidades do litoral algarvio. Vieram todos. Novos e velhos. Administrativos, técnicos, gerentes, quadros superiores. Todos. Muitos. 

Como é cada vez mais evidente, ouvindo, vendo e lendo o que se tem dito nas sucessivas comissões de inquérito parlamentares, as imparidades bancárias tiveram, amiúde, origem num punhado de indivíduos que usaram os bancos enquanto instrumento dos seus objectivos de poder. Ignorando as boas práticas bancárias de concessão prudente e criteriosa de crédito. Ignorando os pareceres, ou não os solicitando, dos departamentos de análise de risco. 

Mas foram os trabalhadores que pagaram, de forma desproporcionada, os custos de ajustamento e reestruturação que se seguiram. 

Por isso, estamos crentes que apenas com todos, trabalhadores, clientes, accionistas e gestores, será possível aos bancos a operarem em Portugal voltarem a ser lugares onde apetece trabalhar. Numa altura em que os accionistas começam a ser remunerados pelo seu investimento, é particularmente desconcertante que um grande banco não queira discutir as atualizações salariais do ano de 2018, quando já todos os bancos o fizeram. Contribuindo para uma nova erosão do poder de compra dos seus trabalhadores. Também não nos parece razoável que vá demorar vários anos (quantos?) a proceder à devolução dos valores retidos pelos trabalhadores.

Protestar, fazer ouvir a sua voz, é típico de cidadãos que querem continuar a ser membros activos, conscientes e participativos da sociedade que os rodeia. Essa participação é condição para uma sociedade mais justa e equilibrada. 

Ficar em casa, não se manifestar ou não votar, é contribuir para que os retornos do capital subam enquanto as remunerações do trabalho estagnam ou caem. É contribuir para que “homens e mulheres providenciais” forneçam “soluções chave-na-mão”, como se tem visto um pouco por toda a Europa. Soluções que nunca o são, e que no final substituem o poder de uns pelo poder de outros.

24.05.2019 - Jornal Económico

Na sequência da apresentação de resultados trimestrais do Millennium bcp, vários órgãos de comunicação social noticiaram a notável progressão que o banco fez nos últimos meses, o que também nos apraz registar. 

Esta progressão é largamente motivada pela melhoria de desempenho nos principais mercados onde opera, i.e. Portugal e Polónia. Destaque para a redução acentuada, novamente, do volume de imparidades, o que evidencia a tenacidade da gestão do banco em continuar um esforço que vinha de antes. E as condições de mercado, mormente no domínio do imobiliário, favoráveis em Portugal. 

Curiosamente, neste contexto, comentadores apontaram que a par da distribuição de dividendos, por definição uma das formas de remunerar os accionistas, o banco se preparava para votar e aprovar a distribuição de resultados aos trabalhadores. Como se se distribuísse ‘dividendos’. Um dos mais lúcidos comentadores económicos, reputado professor de finanças, até elogiou o banco por querer premiar os trabalhadores, assim induzindo em erro, involuntário, os seus leitores. 

O Millennium bcp é merecedor de muitos e variados elogios, como não temos regateado, no tempo e no modo que temos julgado oportunos. Porém, o que a Assembleia Geral vai apreciar é algo de natureza bem diferente. 

Na sequência do processo de reestruturação do banco, por acordo inédito e de elevado sentido de responsabilidade, os sindicatos e a administração do banco aprovaram um memorando que permitiu preservar mais 400 postos de trabalho. Esse acordo implicou, em nome do princípio da solidariedade, o esforço acrescido dos trabalhadores do Millennium bcp, que viram os seus vencimentos retidos entre 3% e 11%, durante 34 meses. Tal ajudou o banco a atravessar com êxito o seu calvário. Os trabalhadores, da sua parte, revelaram a sua solidariedade, o seu sentido de responsabilidade, privilegiando os interesses de grupo em detrimento dos individuais. 

Todavia, apesar da reposição dos níveis de vencimentos, nesta altura ainda não foram ‘devolvidas’ as importâncias retidas durante esses longos e penosos 34 meses. Ora, o que a administração do banco propõe nesta altura é uma compensação, por esse esforço, equivalente a cerca de 33% do montante retido e susceptível de devolução. Adicionalmente, a administração propõe fazer a devolução na íntegra, mas de forma faseada no tempo. 

Ora, em nosso entender, existem condições para que este processo seja mais célere. E mais importante, que fique bem claro que não se está a distribuir ‘dividendos’ aos trabalhadores, mas apenas, e de forma muito parcial, a devolver aquilo que aos trabalhadores pertence. Não se trata de uma liberalidade, mas de um imperativo, no mínimo moral. 

Adicionalmente, o Millennium bcp, apesar da notável recuperação da sua saúde económica, financeira e da sua reputação, encontra-se na situação peculiar de ser o único grande banco que ainda não fechou um acordo de actualização das cláusulas de expressão pecuniária e remuneratória dos seus trabalhadores, relativo ao ano de 2018… 

A liderança, que parece estar no ADN do banco desde a sua criação, implica outras obrigações. Obriga, moralmente, o banco a tratar de forma liderante as relações laborais. Não faz sentido que os trabalhadores, reformados e pensionistas do Millennium bcp estejam sem qualquer actualização desde 2010. 

Por tudo isto, pugnando para que trabalhadores, gestores, accionistas e clientes estejam em uníssono em torno do Millennium bcp, e numa atitude inédita em 45 anos de democracia política e liberdade sindical, os trabalhadores, reformados e pensionistas do banco vão-se manifestar no dia 22 de Maio, juntamente com os seus sindicatos, com os dirigentes sindicais em peso, com as comissões sindicais, e com as estruturas representativas dos trabalhadores. 

Nunca estivemos todos, nem tantos, juntos desta forma. Importa que o Millennium bcp perceba a mensagem.

17.05.2019 - Jornal Económico

O 1º de Maio é um dia de celebração para todos aqueles que vivem do seu trabalho, ou das suas reformas, que também são fruto do seu trabalho. 

O dia 1º de Maio é o verdadeiro dia do contrato social que liga a sociedade portuguesa. Que me perdoem os admiradores de Camões, grupo do qual também faço parte, do fado, do futebol e de tantos outros sinais da nossa identidade colectiva nacional. Todos têm um papel no imaginário daquilo que é Portugal e a portugalidade. Ao contrário de outros dias que relembram vencedores políticos ou credos religiosos e que, nessa medida, não são universais, o 1º de Maio é a pedra basilar do modelo de sociedade que temos e que queremos ir aperfeiçoando. 

O Dia do Trabalhador, que noutras latitudes se comemora noutras datas, celebra a conquista do direito dos trabalhadores a uma jornada de trabalho que fosse compatível com o exercício de cidadania e com a família, entronizando a jornada de oito horas por dia e um dia de descanso semanal. Este pedido singelo, num tempo em que as jornadas de trabalho se eternizavam, sem descanso razoável, primeiro foi recebido a tiro pelas forças da ordem, depois com julgamentos e enforcamentos. Foi assim em 1886, em Chicago e noutras cidades nos EUA. 

Na altura, apenas se pedia aquilo que era justo, mas foi com sangue, suor e lágrimas que os trabalhadores, organizados em torno de estruturas sindicais, conseguiram aceder à dignidade do trabalho e da pessoa humana, e a um contrato social em que os ganhos passaram a ser repartidos de forma minimamente justa entre os trabalhadores e os detentores do capital. 

Alegar que o 1º de Maio é uma comemoração marxista não tem qualquer respaldo, aliás como não tem qualquer sustentação dizer que se trata de uma comemoração típica de regimes autoritários, que exibem a sua força em paradas para impressionar a opinião pública. Uns e outros celebram o 1º de Maio, ou ‘usam’ o 1º de Maio, mas esta data vai muito para além disso. 

O 1º de Maio é também o Dia do Trabalhador para a Igreja Católica, ou para os regimes democráticos. Diria que, no caso das sociedades democráticas em particular, o 1º de Maio é o símbolo por excelência do contrato social que lhe está implícito, do respeito pelo esforço, pelo mérito e pelo engenho. 

Todos sabemos como este contrato social está ameaçado pela digitalização, pelas economias de partilha que deixam na mão de poucos o que a muitos pertence, pelas empresas que não criam postos de trabalho, não pagam Segurança Social ou impostos nos países onde fazem negócios. 

O 1º de Maio é um dia de celebração para todos aqueles que vivem do seu trabalho, ou das suas reformas, que também são fruto do seu trabalho. 

Este é igualmente um dia de celebração para os sindicatos independentes e para os seus sócios, como é o caso dos sindicatos que integram a União dos Sindicatos Independentes (USI), Central Sindical que há 18 anos pugna pelo acesso ao Conselho Económico e Social da República Portuguesa. 

O 1º de Maio é um dia de celebração para aqueles que fazem erguer a sua voz, mesmo que não estejam alinhados à volta de lógicas partidárias, ou de terra queimada. Alguns observadores gostam de fazer crer que o sindicalismo é apenas isto, ou essencialmente isto. Não é verdade. O sindicalismo independente não é nada disso. Que fique muito claro: a grande maioria dos trabalhadores em Portugal não se revê nesse tipo de orientação sindical. 

O verdadeiro dia de Portugal e dos portugueses é o Dia do Trabalhador, e o 1º de Maio é o dia por excelência do grande contrato social que sustenta a nossa vida comum.

03.05.2019 - Jornal Económico

Numa Europa em que questões como a vaga de emigrantes, oriundos de África e do Médio Oriente, os tanques russos na Crimeia e na Ucrânia Oriental, a Nova Rota da Seda chinesa, entre outros assuntos, parecem dominar as preocupações do Conselho Europeu, se me permitem, gostaria de abordar a construção inacabada da União Bancária e os perigos que isso acarreta para uma pequena economia aberta como é o caso da nossa. 

Dizia, em Março, com todo o propósito, o primeiro-ministro António Costa que a União Bancária está num estádio imperfeito, ou incompleto, em que as autoridades europeias têm o poder de ‘resolver’ os bancos (e, por ora, apenas Portugal foi a cobaia), mas ainda não constituíram “a garantia comum de depósitos e a garantia comum para os fundos de resolução nacionais”. Portanto, supervisionam, impõem resoluções, mas os custos de eventuais más decisões incidem exclusivamente sobre os países cujos bancos foram (ou poderão vir a ser) ‘resolvidos’. 

Com uma União Bancária incompleta, em tempos marcados pela transição e pela mudança, há riscos à espreita e a carecer de outra atenção. É o caso das fintechs que operam livremente, a partir da internet e de apps, no mercado português. 

Nem de propósito, uma dessas fintechs, que se gaba de conquistar entre 300 e 400 novos utilizadores portugueses diariamente, tem sido alvo de escrutínio mais atento. Fundada por dois britânicos de ascendência russa, a dita fintech está a ser investigada pelos critérios laxistas em relação ao branqueamento de capitais e por ter desactivado os mecanismos automáticos de inibição de transacções suspeitas pelos seus clientes. Esta fintech comercializa cartões, virtuais ou físicos, recarregáveis, quais ‘cheques de viagem’ modernos, e ainda permite o acesso a uma ‘bolsa’ para compra ou venda de criptomoedas. Inicialmente tratava-se apenas uma aplicação para telemóveis. Porém, para surpresa de muitos observadores, recentemente conseguiu uma licença bancária europeia atribuída pelo Banco Central Europeu. 

De acordo com as referidas investigações, o responsável máximo alterou os sistemas informáticos, de forma a que aquilo que é a norma nos bancos de retalho não o fosse nesta fintech: a inibição de transacções e transferências sempre que alguma pessoa física, ou empresarial, conste das listas de suspeitos dos organismos internacionais de combate ao branqueamento de capitais, de financiamento ao terrorismo ou ao crime organizado. Coisa pouca, como se percebe facilmente. 

Sem surpresas, nestes últimos três anos, a fintech em questão viu sair dois administradores responsáveis pelo risco, dois directores com responsabilidades de prevenção de branqueamento de capitais, um responsável pelo sistema de controlo do cumprimento (compliance) e um administrador financeiro, entre outros. 

Uma autêntica ‘revolução’, esta União Bancária, imperfeita, que permite a concorrência desleal e ignora as mais elementares regras de bom senso. Uma União Bancária que impõe custos de cumprimento aos bancos de retalho, mas deixa que fintechs, sem modelo de negócio perceptível, sem presença física, possivelmente sem pagarem impostos nos mercados onde têm clientes, operem no espaço europeu de forma despreocupada em relação às regras e aos sistemas de controlo…

26.04.2019 - Jornal Económico

Uma vez mais, começou a temporada da negociação colectiva na banca em Portugal. Trata-se, este ano, de um processo negocial com acrescida importância, na medida em que incide sobre as próprias cláusulas de expressão pecuniária (como é o caso das remunerações e subsídios diversos) e sobre o próprio clausulado.

O que está em causa é a adaptação do texto dos Acordos Colectivos às novas realidades laborais na banca e a necessidade de conciliar o trabalho e a família. Temas como a formação profissional obrigatória fruto de imposições dos reguladores, o teletrabalho, a avaliação profissional e a redução da subjectividade, a maior protecção aos trabalhadores nas inquirições no processo disciplinar, as doenças prolongadas, as caixas móveis, entre outros assuntos, vão estar na agenda do único grupo negocial de expressão nacional, constituído pelo Sindicato Nacional dos Quadros e Técnicos Bancários (SNQTB), pelo Sindicato dos Bancários do Norte (SBN) e pelo Sindicato Independente da Banca (SIB). 

Em cima da mesa vão estar igualmente os temas pecuniários. Após mais um ano de recuperação dos níveis de rendibilidade da banca, de diminuição acentuada dos créditos em incumprimento, de acréscimo dos níveis de remuneração dos capitais próprios e da produtividade, é mais do que justo que uma parte desta recuperação seja partilhada com os trabalhadores portugueses, e não sirva apenas para a acumulação de capital em favor dos accionistas. 

E por isso, os níveis de inflação suportados pelos trabalhadores, os indicadores de produtividade e de remuneração dos accionistas, as taxas de rendibilidades e de descontos dos fundos de pensões bancários, todas estas questões, objectivas e concretas, deverão ser levadas em linha de conta nas actualizações das remunerações mensais efectivas de activos e reformados bancários. 

De uma vez por todas, estas matérias têm de ser tratadas de acordo com uma fórmula que afaste a subjectividade e possa servir de referencial para vários anos, acabando com a chicana comunicacional em que as diversas partes de um lado pedem um determinado valor e a outra, do outro lado, oferece um quinto desse valor. 

E, claro, acreditamos que todos, todos sem excepção, os sindicatos dos bancários e os representantes dos bancos, se devem sentar numa só mesa.

18.04.2019 - Jornal Económico

Não pode ocorrer uma retracção do risco suscitada por uma agenda política e mediática conjuntural, com evidentes efeitos negativos para o crescimento económico e para a nossa prosperidade?

15.04.2019 - Post facebook

              

O preconceito contra os bancos, os banqueiros e os bancários já ultrapassou o limite do razoável e, mais tarde ou mais cedo, vamos ter de regressar a um ponto de equilíbrio e de razoabilidade.

14.04.2019 - Post facebook

              

A devassa em curso sobre a concessão e as operações de crédito, que alguns querem fazer na praça pública, tem como efeito prático a retracção dos decisores actuais de crédito. Ao criar um efeito halo, onde medram inibições e preconceitos, minimizar riscos parece estar a ser o mote dos actuais decisores.

13.04.2019 - Post facebook

As mais recentes estatísticas do Banco de Portugal confirmam duas tendências muito claras: o crédito à habitação e o crédito às empresas estão a diminuir. Estas duas tendências ocorrem em contraponto ao que está a acontecer na zona euro, onde as duas tipologias de crédito estão a aumentar as suas taxas de variação homólogas. 

Apenas o crédito ao consumo tem vindo a incrementar a sua concessão em Portugal, em termos homólogos, e acima da variação na zona euro. Nesta coluna, demos nota anteriormente que muito deste crédito, que é concedido fora do sistema bancário clássico, não tem a mesma prudência dos bancos e, aqui e acolá, resulta da prática de técnicas de rapina, de créditos instantâneos, em que o mutuário ganha dinheiro não tanto com o empréstimo mas essencialmente a cobrar atrasos, juros de mora e a executar.

O abrandamento do crédito à habitação parece ser o efeito conjugado de duas circunstâncias. A primeira diz respeito às recomendações do Banco de Portugal, introduzindo limitações quanto aos rácios de empréstimo/avaliação, prazos e taxas de esforço. A segunda está relacionada com o efeito de ‘derramamento’ que o aumento dos preços nos centros das cidades do litoral (provocado pela procura de residentes não habituais, não apenas os vistos Gold, e investidores na hotelaria e alojamento local) está a ter nos preços das periferias, provocando a incapacidade e a retracção das famílias. 

Com o investimento público em mínimos históricos, com a produtividade estagnada em muitos sectores, com o motor das exportações notoriamente a abrandar, mais do que nunca o investimento das empresas é vital para aumentar o valor dos produtos, qualificar o trabalho, remunerar melhor os accionistas e os trabalhadores. 

Neste contexto, o facto de a concessão de crédito às empresas não financeiras estar em queda (taxa de variação homóloga de -0,6% versus +2,6% na Zona Euro), numa altura de expansão económica, é muito preocupante. 

Seguramente que há muitas e variadas explicações. Na ausência de bases empíricas, perdoem-me os leitores, mas tenho também uma visão muito clara sobre o tema: a devassa em curso sobre a concessão e as operações de crédito, que alguns querem fazer na praça pública, recuando aos últimos 20 anos, tem como efeito prático a retracção dos decisores actuais de crédito. Ao criar um efeito halo, onde medram inibições e preconceitos, minimizar riscos, de toda a ordem, parece estar a ser o mote dos actuais decisores. 

Inibir, ou fazer retrair, para além do razoável, os processos de tomada de risco nos bancos tem um impacto demasiado penalizador para o desenvolvimento económico. O preconceito contra os bancos, os banqueiros e os bancários já ultrapassou o limite do razoável e, mais tarde ou mais cedo, vamos ter de regressar a um ponto de equilíbrio e de razoabilidade. 

O risco faz parte da economia de mercado. Haverá sempre incerteza e por essa via negócios que fracassam. O que não pode ocorrer é uma retracção do risco, suscitada não por critérios técnicos mas por uma agenda política e mediática conjuntural, com evidentes efeitos negativos para o crescimento económico e para a nossa prosperidade.

12.04.2019 - Jornal Económico

Os centros de saúde são um instrumento de vital importância para assegurar a igualdade de oportunidades na prevenção e nos cuidados primários, uma condição quase basilar para se realizar o desígnio de sociedades que têm como prioridades promover o elevador social, a justiça e a integração.

10.04.2019 - Post facebook

 

 É de vital importância que os centros de saúde assegurem a todos os cidadãos um médico de família, que tenham especialistas em saúde oral, nutrição, psicologia, entre outras especialidades.

09.04.2019 - Post facebook

 

 As despesas de saúde têm crescido quase dois pontos percentuais acima do PIB nominal, ano após ano, em todos os países da OCDE. Perante esta realidade torna-se evidente a urgência na definição de opções orçamentais estruturais nesta área. “Passes sociais e cuidados primários: cara e coroa.

08.04.2019 - Post facebook

Os centros de saúde é o tema deste artigo, mas permitam-me que comece por assinalar que a recente medida governamental de redução dos preços dos passes sociais nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto teve o efeito de uma bomba: com relativamente pouco dinheiro, o Governo conseguiu atingir objectivos de solidariedade social, de promoção do transporte colectivo e de aumento do rendimento disponível.

Esta foi uma espécie de medida ‘três em um’ que vai beneficiar especialmente os trabalhadores mais jovens e as classes média e baixa. Trata-se de algo tanto mais importante se se tiver em conta que um jovem das classes média e baixa terá actualmente uma probabilidade não superior a 30% de vir a ser melhor sucedido materialmente que a geração que o antecedeu. Esta é uma realidade profundamente preocupante para o regime democrático e que sinaliza um problema de fundo: o elevador social parou de funcionar, ou funciona de forma muito intermitente. 

E é aqui que os centros de saúde entram neste artigo. O acesso à saúde é fundamental para que a igualdade de oportunidades não seja mera retórica sem conteúdo. Dito de outro modo, a intervenção governamental na área da saúde é fundamental para fomentar a igualdade de oportunidades e restaurar o elevador social. 

Em Portugal, tal como nos restantes países da OCDE, os gastos com a saúde, no período entre 2000 e 2016, em média, subiram o equivalente ao PIB nominal acrescido de mais 1,9%. Isto significa que os gastos de saúde, entre despesa pública e despesa das famílias, cresceram entre 4% e 6%. 

Naturalmente, existirá sempre espaço para uma optimização e para ganhos de eficiência, como os sistemas mutualistas e cooperativos têm ilustrado à saciedade. Ganhos que por vezes têm sido difíceis de obter devido à ausência dos adequados instrumentos de gestão na administração do SNS. 

Feita esta ressalva, em todo o caso a realidade é insofismável: as despesas de saúde têm crescido quase dois pontos percentuais acima do PIB nominal, ano após ano, em todos os países da OCDE. Perante esta realidade torna-se evidente a urgência na definição de opções orçamentais estruturais nesta área. 

Isto dito, importa notar que os sistemas e os países onde os custos de saúde têm estado mais equilibrados são aqueles onde os actores de proximidade, como é o caso das farmácias e dos centros de saúde, se complementam. 

Ora, de modo a garantir um menor esforço orçamental da parte do Estado e das famílias, é de vital importância que os centros de saúde assegurem a todos os cidadãos um médico de família, que tenham especialistas em saúde oral, nutrição, psicologia, entre outras especialidades. Estes são um instrumento de vital importância para assegurar a igualdade de oportunidades na prevenção e nos cuidados primários, uma condição quase basilar para se realizar o desígnio de sociedades que têm como prioridades promover o elevador social, a justiça e a integração. 

Por isso a questão inicial: os passes sociais e os cuidados de saúde primários são duas faces de uma mesma moeda de uma sociedade mais justa. A existência dos passes sociais não nos deve fazer esquecer do longo caminho que ainda há a percorrer noutras áreas, como é o caso da saúde de proximidade.

05.04.2019 - Jornal Económico

Todos sabemos como foram duros os sacrifícios pelos quais foi preciso passar nos últimos anos. Os resultados, porém, vão aparecendo e a lição a retirar não poderia ser mais clara. O rigor e a coragem são pré-condições essenciais para um futuro melhor.

03.04.2019 - Post facebook

              

Com a crescente credibilidade externa, será uma questão de tempo até que uma das grandes agências de notação coloque o rating da República Portuguesa na categoria de investimento.

02.04.2019 - Post facebook

              

A credibilidade reconquistada pela República Portuguesa, num processo iniciado com o Governo anterior e prosseguido pelo actual Executivo, é o que tem permitido a redução dos juros, a renegociação da dívida e poupança de milhões de euros em juros.

01.04.2019 - Post facebook

Esta semana, o Instituto Nacional de Estatística (INE) revelou que o défice em 2018 foi de 0,5% do PIB. Como era previsível, o Executivo procurou tirar partido da meta alcançada e a Oposição optou por desvalorizar, salientando a forma como se chegou a este valor. 

De facto, PSD e CDS têm razão quando realçam o contributo do aumento de impostos e da carga fiscal. O próprio INE reconhece o impacto relevante da receita fiscal e das contribuições para a Segurança Social, que, na prática, reflectem a evolução positiva da actividade económica e do emprego no último ano. 

Naturalmente, podemos abordar e analisar a forma como a meta foi alcançada, mas nada disso diminui o compromisso do actual primeiro-ministro e do ministro das Finanças relativamente à meta da consolidação orçamental propriamente dita. Esta é a questão fulcral e a grande incógnita quando este Governo entrou em funções. Teria António Costa vontade e condições políticas para prosseguir uma orientação governamental em linha com a orientação europeia? 

Em retrospectiva, a resposta é agora muito clara. 

Entrámos, portanto, no ano de 2019 com boas perspectivas. O défice alcançado no ano passado constitui um bom valor e reforça a credibilidade do Governo e da República Portuguesa. Actualmente, na frente externa, nenhum actor relevante coloca em causa a credibilidade política de Portugal e o compromisso nacional perante as metas de consolidação orçamental. 

Esta credibilidade, num processo iniciado com o governo anterior e prosseguido pelo actual Executivo, é o que tem permitido a progressiva e significativa redução dos juros. Na prática, esta credibilidade externa, que entretanto se reconquistou, tem vindo a permitir à República Portuguesa renegociar a dívida e poupar milhões de euros em juros. 

Este processo, no entanto, está longe ainda de estar terminado. Alguns protagonistas, aos primeiros sinais de bonança pensaram que as exigências de rigor e de restrição orçamental tinham os dias contados. Pura ilusão. 

A consolidação orçamental não é algo conjuntural ou circunstancial, nem os resultados alcançados até ao momento permitiram ainda a plena recuperação. Nesta altura, a República Portuguesa continua a ter uma notação que nos penaliza nos mercados e que custa ao Estado, aos bancos e às famílias muitos milhões de euros em juros. 

Esta é a próxima grande meta. Com a crescente credibilidade externa e com o reiterado compromisso perante os objectivos governamentais no domínio da consolidação orçamental, será uma questão de tempo, possivelmente não muito, até que uma das grandes agências de notação coloque o rating da República Portuguesa na categoria de investimento. 

Todos sabemos como foram duros os sacrifícios pelos quais foi preciso passar nos últimos anos. Os resultados, porém, progressivamente vão aparecendo e a lição a retirar não poderia ser mais clara. O rigor e a coragem, nesta como noutras matérias ou noutras áreas, são pré-condições essenciais para um futuro melhor.

29.03.2019 - Jornal Económico

Só um sindicato livre está na posse dos seus plenos poderes para fazer escolhas livres e para defender livremente os trabalhadores que representa. É esta a verdadeira importância do pagamento da última tranche da nossa dívida financeira.

28.03.2019 - Post facebook

 

Uma instituição mergulhada numa rota de insustentabilidade, dependente de terceiros, não serve inteiramente o seu propósito. Por isso, a sua independência, política, económica, financeira, é tão importante.

27.03.2019 - Post facebook

 

Os últimos três anos não foram fáceis. Não me canso de repetir. Os bancários foram os que menos tiveram culpa no que sucedeu, mas foram eles quem pagou a fatia maior da fatura.

26.03.2019 - Post facebook

Ao longo deste último ano em que tenho escrito regularmente nas páginas do Jornal Económico, regra geral, tenho evitado escrever de forma directa sobre a instituição cujos destinos tenho tido desde Dezembro de 2015 o privilégio de orientar. Permitam-me, no entanto, que abra hoje uma excepção, que aliás e em todo o caso partirá do concreto para uma ilação geral. 


Vamos aos factos. Muito recentemente, o Sindicato Nacional dos Quadros e Técnicos (SNQTB), instituição que lidero e no âmbito da qual tenho tido o privilégio de trabalhar com um grupo absolutamente exemplar de profissionais, liquidou a última tranche da sua dívida financeira à Caixa Geral de Depósitos. 

Para nós, ficará como um dia marcante na nossa história recente. Importa recordar, se me permitem, que quando os actuais órgãos sociais do SNQTB tomaram posse, em Dezembro de 2015, a dívida financeira da instituição era superior a 11 milhões de euros. 

Os últimos três anos não foram fáceis. Todos conhecemos o ciclo em que mergulhou a banca portuguesa a partir de 2011, com todas as convulsões que se fizeram sentir, bancos que deixaram de existir, reconfigurações accionistas profundas e muitos bancários a perder os seus postos de trabalho. Não me canso de repetir. Os bancários foram os que menos tiveram culpa no que sucedeu, mas foram eles quem pagou a fatia maior da factura. 

Com este panorama de fundo, menos bancários, um sector em crise e mutação, o SNQTB conseguiu não apenas contrariar a tendência e crescer em termos de número de associados, mas também arrumar a sua própria casa, voltando a trilhar um rumo de sustentabilidade. 

Permitam-me a aparente falta de modéstia, mas tenho muito orgulho na minha equipa e nas pessoas que comigo lideraram este duro processo. Com rigor e com uma gestão prudente, entre 2018 e 2019, o SNQTB amortizou antecipadamente cerca de sete milhões de euros, com isso poupando em juros mais de 400 mil euros, verba que foi integralmente devolvida aos sócios, através de aumentos nas comparticipações das suas despesas de saúde. 

Actualmente, há operadores de saúde que são notícia por causa das suas dívidas que se arrastam anos a fio. Da nossa parte, o SAMS Quadros, subsistema de saúde do SNQTB, paga aos fornecedores dentro dos prazos contratados, geralmente abaixo dos 60 dias. 

Nada disto, naturalmente, resulta de um capricho da nossa parte. A sustentabilidade é uma condição prévia para a sobrevivência de qualquer instituição, sindical, patronal, ou qualquer outra. 

Uma instituição mergulhada numa rota de insustentabilidade, dependente de terceiros, fruto da sua condição financeira (ou de outra), não serve inteiramente o seu propósito. Por isso, a sua independência, política, económica, financeira, é tão importante. 

Só um sindicato livre está na posse dos seus plenos poderes para fazer escolhas livres e para defender livremente os trabalhadores que representa. É esta a verdadeira importância do pagamento da última tranche da nossa dívida financeira. Mais do que nunca, somos um sindicato de bancários e cidadãos livres, independentemente das convicções pessoais de cada um. Poderia existir melhor forma de começar o ano?

22.03.2019 - Jornal Económico

A violência sobre as mulheres, no âmbito doméstico ou profissional, no caso do assédio, nunca poderá ser desculpada. A violência e a barbárie, seja noutros territórios e geografias, seja nas nossas comunidades, não são admissíveis.

20.03.2019 - Post facebook

   

O trabalho remoto, os horários flexíveis, a majoração de licenças de paternidade e maternidade, a rede de creches e deduções fiscais, o acompanhamento às reuniões escolares – estas são algumas das ‘batalhas’ que vamos introduzindo nos instrumentos de regulação colectiva de trabalho.

19.03.2019 - Post facebook

 

Hoje em dia, homens e mulheres estão, em plena igualdade, nos processos educativos, no mercado de trabalho e no desempenho de profissões, quaisquer que elas sejam. Uma realidade em que as mulheres participam de forma decisiva no mercado de trabalho.

18.03.2019 - Post facebook

Toda a minha vida vivi rodeado de mulheres. No seio da vida familiar, em primeiro lugar, com mulheres que trabalhavam e prosseguiam as suas carreiras profissionais. Mulheres essas que sempre foram determinadas, focadas e competentes. Mulheres que educaram os filhos e geriram as suas carreiras, amiúde com os cônjuges ausentes, em determinada altura das nossas vidas fruto da guerra colonial, e mais tarde por razões de ordem profissional. 


Toda a minha vida conheci casais em que marido e mulher trabalhavam e contribuíam de forma igual para as decisões comuns, fossem essas relativas a investimentos (o caso da aquisição de habitação própria ou de automóvel, por exemplo), à educação dos filhos, a poupanças ou quaisquer outras. Talvez no final dos anos 1960, e início dos anos 1970, esta normalidade que pessoalmente vivi não fosse a de muitas famílias portuguesas, mas era a minha. 

Felizmente este é hoje o padrão. Homens e mulheres estão, em plena igualdade, nos processos educativos, no mercado de trabalho e no desempenho de profissões, quaisquer que elas sejam. Uma realidade em que as mulheres participam de forma decisiva no mercado de trabalho, com taxas que só encontram paralelo nos países nórdicos. Estou grato ao meu país por ser assim. E por ter filhos que aqui vivem, crescem, estudam e que desejo que um dia venham também a aqui trabalhar. 

Existe, contudo, ainda espaço para melhorar e para que esta paridade tenha outras condições que permitam conciliar mais ainda o trabalho e a família. Por isso, ano após ano, procuro contribuir, junto dos grupos parlamentares, e no âmbito da negociação colectiva com os empregadores, para que existam condições que permitam que as carreiras profissionais e o mundo do trabalho em geral não se façam com o sacrifício das famílias. 

O trabalho remoto, os horários flexíveis, a majoração de licenças de paternidade e maternidade, a rede de creches e deduções fiscais, o acompanhamento às reuniões escolares – estas são algumas das ‘batalhas’ que vamos introduzindo nos instrumentos de regulação colectiva de trabalho. Ano após ano, num esforço nunca completo, tanto para os pais como para as mães.

Contudo, apesar deste progresso, um certo espírito marialva persiste ainda na sociedade portuguesa. Um espírito que não pertence, nem poderia pertencer, a qualquer tipo de cultura ou tradição digna do século XXI. 

Sejamos muito claros. A violência sobre as mulheres, no âmbito doméstico ou profissional, no caso do assédio, nunca poderá ser desculpada por um qualquer entorno cultural. A violência e a barbárie, seja noutros territórios e geografias, seja nas nossas comunidades, não são admissíveis. Já basta o flagelo do alcoolismo, que tanto potencia a violência e outros comportamentos deploráveis, e cujo combate nos deve mobilizar a todos. Não precisamos de ajudas supostamente derivadas da tradição. Por tudo isto, igualdade de género, sempre!

15.03.2019 - Jornal Económico

Há que elogiar o Banco de Portugal por ter emitido um aviso sobre as práticas de crédito ‘fácil’. Porém, precisamos [1] que a Investigação Criminal e o Ministério Público tenham um outro nível de recursos, [2] de reforçar a moldura criminal que enquadra este tipo de atuações, e [3] de banir a capacidade de comunicar destes predadores.

14.03.2019 - Post facebook

              

Atualmente pululam no éter pretensos facilitadores, cobrando juros e juros de mora que chegam a atingir mais de 100%. Estamos perante um setor selvagem onde tácticas musculadas de recuperação de crédito, nos casos em que não existem imóveis ou bens móveis, para dar em garantia, são a norma.

13.03.2019 - Post facebook

              

Hoje em dia abundam os anúncios que prometem resolver uma situação de aperto financeiro pontual. Longe de estarem credenciados para serem intermediários de crédito, estes anunciantes são verdadeiros abutres da desgraça, que exploram a necessidade alheia.

12.03.2019 - Post facebook

O crédito fácil e os abutres da desgraça alheia Quem nunca se deparou com a proliferação de créditos ‘fáceis’ na internet, nomeadamente nas redes sociais? Ou nas secções de classificados dos jornais de papel de grande tiragem? 

Hoje em dia abundam, um pouco por todo o lado, os anúncios que prometem resolver uma situação de aperto financeiro pontual, ou uma emergência ocasional. Regra geral, trata-se de anúncios feitos por particulares ou ‘empresas’ que, longe de estarem credenciados para serem intermediários de crédito, são verdadeiros abutres da desgraça alheia, que exploram a necessidade, ou o desejo irracional, de quem quer ter uma nova televisão, uma nova consola de jogos, ou que, pura e simplesmente, está tão endividado que não encontra respaldo para mais crédito na banca. 

Ao contrário do que alguns querem fazer querer, por ignorância ou má-fé, ao contrário destes intervenientes, os bancos não se comportam como abutres na sua relação com os seus clientes. Os bancos simulam o plano de prestações futuras, avaliam as taxas de esforço, praticam juros dentro dos parâmetros definidos pelo Banco de Portugal e calculam endividamentos máximos por proponente. Igualmente importante, as instituições de crédito bancário asseguram-se que as partes recebem e compreendem toda a documentação do contrato de crédito. 

Quando as famílias, ou as empresas, procuram ir além da sua capacidade teórica de endividamento, os bancos recusam de imediato conceder novos créditos. Repito, recusam, pura e simplesmente.

Infelizmente, em paralelo ao sector bancário, hoje em dia pululam no éter pretensos facilitadores, cobrando juros e juros de mora que chegam a atingir mais de 100%. Sim, leu bem: mais de 100%!

Trata-se de um mercado onde cheques pré-datados, automóveis e habitação própria permanente são entregues como caução de empréstimos concedidos pelos tais facilitadores, ou por quem os ‘emprega’. Estamos perante um sector selvagem onde tácticas musculadas de recuperação de crédito, nos casos em que não existem imóveis ou bens móveis, para dar em garantia, são a norma. 

Não se pense, porém, de forma errada, que este é um mercado sem expressão. Estamos a falar de um mercado onde milhares de pessoas andam perdidas e enroladas, numa espiral de crédito que consolida outros créditos e que só acaba quando a pessoa é despejada na rua. Este é um mercado onde são apanhados trabalhadores por contra de outrem e onde a desestruturação familiar torna mais frágeis ainda os devedores. 

À luz deste contexto, só posso, só podemos todos nós, elogiar o Banco de Portugal por ter emitido um aviso oportuno sobre as práticas de crédito ‘fácil’. Esteve bem, mas infelizmente não chega. Precisamos urgentemente que a Investigação Criminal e o Ministério Público tenham um outro nível de recursos especializados, de modo a cortar cerce esta forma moderna de burla e de crime. Precisamos igualmente de reforçar a moldura criminal que enquadra este tipo de actuações. Por último, mas não em último, precisamos de banir a capacidade de comunicar destes predadores. 

Ignorar esta realidade corresponde a uma forma de conivência com estes abutres da desgraça alheia. Pessoalmente, para mais sendo bancário, faço questão de aqui a denunciar sem estados de alma.

08.03.2019 - Jornal Económico

O trabalho temporário pode ser uma opção positiva, permitindo ajustar as preferências pessoais dos trabalhadores às necessidades pontuais dos empregadores. Pode ser assim, mas na verdade é raro que tal aconteça. Ainda que o espírito desta solução possa ter sido positivo na sua concepção, oferecendo às empresas alguma flexibilidade na gestão da sua mão de obra, importa dizer que, do ponto de vista dos trabalhadores, se libertos de condicionalismos na escolha, se trata de uma opção com expressão residual. 

Na sua origem, o trabalho temporário era uma forma de trabalho por projecto, ou por tarefa de complexidade elevada, típica de profissões intelectuais e artísticas. Porém, esta prática foi alastrando, apesar de a grande maioria dos trabalhadores temporários preferir e desejar outro tipo de vínculo de trabalho. 

Esta forma de trabalho precário começou por se estender às profissões relacionadas com as tecnologias de informação e comunicação, depois disseminou-se entre as profissões administrativas, e mais recentemente começou a proliferar entre as funções técnicas, de moderada ou elevada complexidade. 

O abuso reiterado de recurso ao trabalho temporário, agora vulgarmente denominado pelo uso do anglicismooutsourcing, é uma das chagas sociais do nosso tempo, cuja perigosidade tem vindo a aumentar e que passo a explicar. 

Hoje em dia, inúmeras empresas recorrem a fornecedores de trabalho temporário, ou outsourcing, para preencherem posições permanentes, numa absoluta negação do espírito que presidiu à criação do trabalho temporário. Temporário quer dizer, em posições não permanentes ou meramente em substituição, com prazo limitado, de trabalhadores permanentes ausentes. É isto que diz o artigo 175 e seguintes do Código do Trabalho. A figura legal destinava-se a prever acréscimos sazonais, ou não antecipáveis, de trabalho, projectos muito específicos, ou vacaturas de vagas permanentes enquanto decorriam processos de recrutamento, e pouco mais. 

Mas quando empresas de grande dimensão, fazendo pouco caso do espírito e da letra da lei, recorrem a empresas de trabalho temporário como forma de terem uma força de trabalho mais barata, pouco sindicalizada, e facilmente descartável, então temos seguramente vários problemas sérios à nossa frente.

O primeiro é a ausência de espírito de cidadania e de responsabilidade social das inúmeras empresas que recorrem a este expediente com laivos de semi-esclavagismo. O segundo é a falta de eficácia da actuação da Autoridade para as Condições do Trabalho, quer pela ausência de fiscalizações preventivas, quer por coimas ridiculamente baixas. O terceiro é a erosão da classe média e do sonho de que qualquer cidadão, mediante esforço e estudo, pode ascender no elevador social. A lista, infelizmente, poderia continuar não fossem as limitações de espaço. 

De facto, o preenchimento de posições permanentes por trabalhadores que são falsos temporários, que saltitam de cliente em cliente, engajados por empresas deste tipo de recrutamento, alguns deles há duas décadas como autênticos permanentes de empresas de trabalho temporário, traduz-se num muito baixo ou nulo investimento na qualificação desses trabalhadores, e na degradação das condições de trabalho, por vezes coexistindo num mesmo espaço, anos a fio, trabalhadores do quadro e trabalhadores temporários, lado a lado. 

Sejamos muito explícitos. Quando algumas empresas invocam a necessidade de uma alegada restruturação, reduzem os seus trabalhadores efectivos e, poucos dias depois, os substituem por uma vaga, em números idênticos, de trabalhadores temporários a ganharem metade, ou um terço, dos anteriores, meu caro leitor, creio que chegou a hora de nos indignarmos muito a sério. 

Quando funções permanentes são subcontratadas a empresas externas, que mais não fazem do que oferecer o mesmo trabalho em condições de remuneração que nos colocam num patamar digno de Terceiro Mundo, meus caros amigos, julgo que é tempo de dizer basta! 

Usado desta forma despudorada, tal como está a acontecer em cada vez maior número, o alegado trabalho temporário e o outsourcing são indignos, geradores de uma classe qualificada remetida a uma condição ‘operária’. É isto que explica em larga medida a vaga emigratória qualificada a que assistimos desde o início deste século. Quando gerações inteiras de licenciados só encontram emprego temporário falso, a pagar pouco mais que o salário mínimo, lamento dizer, mas colectivamente falhámos com estrondo. 

Chegou a hora de questionar os nossos líderes políticos sobre que tipo de sociedade e modelo social perfilham. Chegou o momento de nos questionarmos a nós próprios se vamos ficar, paciente e eternamente, a assistir à destruição do tecido social, à proliferação dos filhos adultos mas para sempre dependentes dos pais e avós, num processo de destruição maciça de sonhos e de rendimentos dos trabalhadores, a favor de ganância de um punhado de empresas e dos seus accionistas. 

Pessoalmente, não é isto que quero para os meus filhos ou para o meu país. Quero uma outra sociedade e estou disponível para, civicamente, lutar por ela. Recuso-me a aceitar, como cidadão e dirigente sindical, a normalização do recurso crescente a um subterfúgio que é uma autêntica bomba de destruição social. 

22.02.2019 - Jornal Económico

Permitam-me a provocação: infelizmente, temos muito mais em comum com a Venezuela do que apenas uma vibrante comunidade lusodescendente, agora remetida a um presente e um futuro incerto. 

A experiência política e económica venezuelana encerra uma lição e uma lembrança, que seriam irónicas, não fora o seu carácter trágico: nenhuma recomposição social, nenhuma redistribuição de rendimento, se faz contra a vontade dos cidadãos e contra as ‘leis’ da economia. 

Na Venezuela falta comida e combustíveis, cuidados de saúde e medicamentos, enfim, a lista poderia continuar. Mas falta também o respeito pelos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, como diversos observadores têm notado repetidamente, ainda que esse não seja o tema deste artigo.

Permitam-me destacar aqui em particular a falta de medicamentos e de cuidados primários de saúde. Da Venezuela chegam-nos quase diariamente relatos angustiados da falta generalizada de medicamentos, incluindo os mais básicos. Por estes dias, as farmácias e os hospitais não têm medicamentos e equipamentos, enfermeiros ou médicos. É com tristeza e preocupação que constatamos que reina o caos no país. 

Hoje, a Venezuela paga, também na área da saúde, o preço de escolhas passadas que foram erradas. A opção de tabelar preços, por exemplo, foi uma delas. Tal como foi a opção de impor condições draconianas de produção e comercialização de medicamentos e de equipamentos hospitalares. Os resultados, estão à vista, num panorama geral de escassez e penúria. Ainda assim, há quem insista em nada aprender com o passado e com as desastrosas experiências de diversos regimes totalitários e autoritários.

Por cá, curiosamente, vivemos dias de esquizofrenia política e partidária. Não começou agora, é certo, mas a tendência no sentido de privilegiar uma orientação económica centralizada e autoritária agravou-se significativamente no actual ciclo político. 

As farmácias, em particular, têm sido duramente castigadas por esta pulsão, por exemplo impondo condições de comercialização que empurraram os estabelecimentos para a insolvência, reduzindo as margens de comercialização muito para além do razoável, e permitindo que os medicamentos sejam exportados, para mercados livres de condicionalismos, claro está, o que tem provocado preocupantes rupturas de stocks em Portugal. 

Olhando o que se está a passar, quase que se é obrigado a concluir que existe algum ressabiamento contra os profissionais e os empresários farmacêuticos que fazem serviço público em todos os concelhos do país. Esta aparente saga impede hoje em dia uma farmácia média de operar com a dignidade exigida, a qualidade esperada e um mínimo razoável de rendibilidade. 

Sejamos muito claros. O que está em causa são os serviços de proximidade prestados pelas farmácias, todos os dias do ano e com profissionais qualificados. É disto que verdadeiramente estamos a falar. A diminuição do número de farmácias, ou o seu funcionamento em condições críticas, implicará que centenas de milhares de portugueses ficarão mais frágeis sem esses serviços de proximidade. 

Não tem que ser assim, como é evidente, e há boas razões para que assim não seja. As farmácias, como têm demonstrado repetidamente na sua relação com os subsistemas de saúde, fornecem serviços às populações que evitam a sobrecarga dos centros de saúde – importa não esquecer, já agora, que há ainda cerca de 500 mil cidadãos sem médico de família – e das urgências hospitalares. 

Acresce que as farmácias estão entre as instituições em que os portugueses mais confiam. Têm, aliás, bons motivos para isso. Ora, contratualizar e remunerar as farmácias por prestarem um serviço de proximidade que descongestiona o SNS é da mais elementar inteligência e racionalidade económica, com a vantagem de assim se prestar um melhor serviço aos cidadãos. 

Não faltam, aliás, áreas em que as farmácias têm uma capacidade notória para prestar um serviço de utilidade pública. A vacinação, a venda e administração de medicamentos a doentes crónicos, oncológicos, e HIV, são alguns dos exemplos, sem ser exaustivo, de experiências de sucesso na relação das farmácias com os subsistemas de saúde, em Portugal como noutros países europeus. 

Por tudo isto, urge dizer alto e bom som: as farmácias portuguesas funcionam bem e poderiam ser parceiras de excelência do SNS, fazendo com menos custo e mais qualidade aquilo que o SNS por vezes tem dificuldade em fazer. 

Seguramente só a cegueira ditada pela ideologia impedirá alguns intervenientes de ver e reconhecer o óbvio ululante. Na Venezuela, entretanto, paga-se todos os dias o duro preço de opções ideológicas erradas. E por cá, que escolhas vamos fazer? É mais importante perseguir as farmácias, ou cuidar do interesse dos cidadãos?

15.02.2019 - Jornal Económico

Semana após semana a comunicação social vai dando eco da revolta das populações perante mais um encerramento de um balcão dos Correios de Portugal. A administração da empresa, ainda no campo de batalha das percepções da opinião pública, vai anunciado como a cobertura capilar não diminuiu, mas apenas mudou de formato, estando agora ‘alargada’ a Juntas de Freguesia, talhos e mercearias do Portugal rural. 

Nesta batalha pela atenção da opinião pública surgiram os dirigentes partidários, amiúde reclamando a reversão da privatização dos CTT. Ou seja, pedindo a sua nacionalização. 

Pessoalmente acredito que a provisão de bens públicos deve ter um forte papel do Estado. Um papel essencialmente financiador e regulatório, mas não necessariamente de produtor desses mesmos bens públicos. Não acredito que, em muitos sectores, o Estado tenha que ser obrigatoriamente o fornecedor de bens públicos. Tem, sim, que assegurar que esses bens públicos são fornecidos em qualidade, quantidade e ao menor custo possível. 

Isto dito, não tenho qualquer dogma contra ou a favor das nacionalizações, privatizações ou reversões de qualquer espécie. Uma cuidada análise custo-benefício e uma busca do bem comum devem ser os princípios a nortear qualquer decisão. 

Compete ao Estado assegurar que a distribuição do correio se continua a fazer, com rapidez e fiabilidade, e verificando se as mercearias, os talhos e as Juntas de Freguesia cumprem com critérios de sigilo, segurança e eficácia. 

Tudo indica que a gestão dos CTT, numa manobra de perspicácia estratégica, resolveu não investir no negócio de distribuição de correio clássico, a quinta-essência dos Correios de Portugal. Uma decisão que veio, porventura, acelerar um declínio que se previa, mas que poucos anteciparam vir a ser tão rápido. 

Um desinvestimento na distribuição postal tradicional que parece ter sido feito através do desvio de recursos humanos e materiais para o negócio de banca de retalho. Um modelo low cost que oferece grátis o que tem custo. Uma opção de negócio que não equipara os seus trabalhadores aos bancários, numa evidente desvalorização das pessoas. 

Sobre isto, os nossos líderes partidários ainda não terão notado a incongruência de os trabalhadores do Banco dos CTT não terem ACT, ou deste banco oferecer o que os outros fazem pagar. As promoções dos supermercados merecem a atenção da Autoridade da Concorrência. As ofertas de contas sem despesas de manutenção não tiveram, até ver, a mesma dignidade ou importância. 

Em retrospectiva, aparentemente o Estado vendeu caro um negócio que estava a definhar. Por isso, para variar, fez um bom negócio. 

Nacionalizar, provavelmente pagando o valor porque foi vendido com algum tipo de correcção monetária majorante, parece ser um favor, involuntário decerto, que alguns políticos querem fazer aos accionistas. 

Por esse motivo e por outros, deverá Tintim perguntar ao pêndulo do seu indefectível amigo, o professot Girassol: estará a distribuição postal a ser canibalizada pelo banco postal? Do que precisam mais os portugueses: de mais um banco ou de uma boa distribuição postal?

08.02.2019 - Jornal Económico

Fechar os balcões da CGD nas regiões do Interior, para compensar os desmandos de um punhado de intervenientes, é impor uma pena tão pesada, que desacredita os princípios basilares de um Estado de Direito. Isto dito, competirá às autoridades judiciárias avaliar se tais desmandos foram fruto de incompetência, reiterada ao longo de quase duas décadas, ou se são um caso criminal.

07.02.2019 - Post facebook

              

A auditoria da EY tem o condão de nos relembrar que ao impor um conjunto de malfeitorias aos clientes e aos trabalhadores da CGD, através de um programa agressivo de encerramento de balcões e de colaboradores, por reformas antecipadas e rescisões, se optou por castigar aqueles que não têm culpa alguma no que se passou.

06.02.2019 - Post facebook

              

Dizer que foram apenas dois ou três indivíduos a fazer as malfeitorias é um argumento frágil. As responsabilidades são muito mais alargadas. Estamos perante um bom punhado de pessoas, em cada mandato, que foram solidários ou displicentes na condução da causa pública. Não são difíceis de identificar. Afinal de contas, os conselhos de crédito têm actas.

05.02.2019 - Post facebook

 

Nenhum trabalhador comum da CGD jamais propôs aos seus superiores hierárquicos a concessão de centenas de milhões de euros em crédito a especuladores bolsistas, sem que estes empenhassem capitais próprios consideráveis.

04.02.2019 - Post facebook

              

Vários créditos de milhares de milhões de euros foram concedidos pela CGD a indivíduos e empresas que não tinham experiência ou capitais próprios envolvidos que justificassem essas concessões. Estes créditos foram concedidos à revelia das recomendações, ou pareceres, dos serviços técnicos de análise de risco.

03.02.2019 - Post facebook

Em 2019, O SNQTB vai consagrar valiosos recursos para tentar mitigar a falha do Estado na prestação de cuidados continuados. Vamos mostrar, pelo exemplo, como é possível dar resposta e chamar o Estado às suas responsabilidades.

25.01.2019 - Post facebook

 

Os subsistemas de saúde não têm a vocação, nem os recursos financeiros, para serem substitutos do SNS na prestação de cuidados continuados. Ainda assim, como é evidente, não podem ficar indiferentes ao drama dos mais velhos.

24.01.2019 - Post facebook

 

A quase demissão do Estado na prestação de cuidados continuados coloca uma pressão insustentável sobre os descendentes familiares, sobre os subsistemas de saúde e sobre a rede de assistência de solidariedade social.

23.01.2019 - Post facebook

 

A oferta pública será inferior a 15% das necessidades do país, estando mais de 100 mil pessoas, a maior parte idosos com médio ou elevado estado de necessidade de cuidados continuados especializados, entregues às famílias e vizinhos, ou abandonados.

22.01.2019 - Post facebook

 

A rede pública de cuidados continuados é muito incipiente e tem falta de camas e de profissionais qualificados no sistema público. Os quadros de pessoal chegam a ser inferiores a um sexto do que preconizam as leis e os quadros regulamentares.

21.01.2019 - Post facebook

 

O recente movimento de três sindicatos bancários no sentido da cooperação, como iguais, no respeito pelas suas diferenças, mas sem nenhum propósito de se diluírem num projecto amorfo resultante de uma fusão, é um passo importante para impor um dique às forças que procuram materializar a desvalorização salarial e reduzir a dignidade dos trabalhadores.

20.01.2019 - Post facebook

Vários pensadores credenciados têm reflectido sobre as causas para o progresso das sociedades e nações. São célebres, aliás, as incursões filosóficas de grandes figuras do pensamento Ocidental em torno desta temática. É o caso de Santo Agostinho e São Tomás de Aquino, num passado mais distante, ou de Adam Smith, David Ricardo e Max Weber, com a sua ética protestante, num passado mais recente. Mas é também o caso de Jared Diamond na actualidade, aliás com enorme mediatismo. Em comum, em contextos históricos e filosóficos diversos, todos eles procuraram perceber os motivos que levam algumas organizações políticas, sociedades, nações ou Estados, a progredir, enquanto outras estagnam ou regridem. 

O papel da religião e da ética, dos micróbios ou da economia, cada um à vez, marcaram o tom deste debate milenar. Mais recentemente, o papel das estruturas políticas das sociedades e o seu relevo veio trazer uma nova luz a este debate. Seja pela analogia entre os impérios extractivos português ou espanhol, por comparação com os impérios mercantis neerlandês ou britânico, seja pela comparação entre a Coreia no Norte e a Coreia do Sul, uma realidade emerge: são as instituições criadas pelos homens que distinguem as nações e sociedades vencedoras das perdedoras. 

O que constatamos é que as sociedades mais inclusivas produzem melhores resultados no desenvolvimento económico e social, na medida em que são capazes de alinhar de forma mais produtiva os interesses de todas as partes envolvidas, dos consumidores aos trabalhadores, dos investidores aos gestores, entre outros. 

As sociedades inclusivas respeitam a lei, asseguram os direitos de propriedade e a fruição dos rendimentos do trabalho de cada um, incluindo os direitos futuros a um rendimento ou pensão, adquiridos pelo trabalho e pela paciência no investimento ao longo de uma vida. As sociedades inclusivas têm uma forte e capaz provisão de bens públicos (como é o caso da educação, saúde, infra-estruturas, administração da lei e da ordem, entre outras), independentemente de serem fornecidos pelo Estado, pelo sector social, ou por privados em contratos de concessão. 

Estas são algumas das pré-condições identificadas para que uma sociedade inclusiva promova o desenvolvimento económico e social. Sem elas dificilmente assistiremos à emergência de uma classe média com forte consciência social, cívica e política. 

Importa salientar tudo isto, numa altura em que os equilíbrios e as pré-condições se encontram em perigo de serem capturados por elites poderosas. Elites que procuram mudar as leis mais essenciais e que deveriam oferecer um horizonte de estabilidade alargado, como é o caso das leis do trabalho e das leis fiscais, para citar apenas duas áreas, e pressionam continuadamente o poder político no sentido da redução do fornecimento de bens públicos. Por outras palavras, regra geral, essas elites pretendem alterar o equilíbrio de poderes, de modo a captar e extrair rendimentos anormais à custa dos restantes cidadãos e do bem comum. 

Fenómenos desta natureza são evidentes e quase exercidos de forma grosseira em regimes políticos autoritários, ou totalitários, mas são muito mais subtis e invisíveis em regimes democráticos pluralistas. Desengane-se quem esteja tentado a pensar que fenómenos de tipo extractivo não ocorrem igualmente nas democracias pluralistas. 

A quase falência do Estado português, entre 2010 e 2012, apenas veio facilitar o avanço das forças que procuram apenas extrair e nada incluir. Forças que contaram com o apoio de líderes nacionais que pensaram, ingenuamente e por ausência de pensamento próprio, de que não há, ou não haveria, uma alternativa. 

O recente movimento de três sindicatos bancários no sentido da cooperação, como iguais, no respeito pelas suas diferenças, mas sem nenhum propósito de se diluírem num projecto amorfo resultante de uma fusão, é um passo muito importante para impor um dique às forças que apenas procuram materializar a desvalorização salarial e reduzir a dignidade dos trabalhadores. Uma tendência clara na banca, em Portugal, mas que, importa deixar claro, não se circunscreve apenas a este sector. 

A escolha é clara: queremos ser mais inclusivos como a Alemanha, a Coreia do Sul, o Japão, a Suécia, ou queremos ser meramente extractivos como Angola, o Brasil, ou o Zimbabwe e afins?

18.01.2019 - Jornal Económico

Uma das conquistas mais importantes do 25 de Abril foi a noção de direitos políticos óbvios (liberdade de associação, liberdade de expressão, entre outras) e de direitos sociais como sendo duas faces da mesma moeda. Foi nesta esteira ideológica de pluralismo político e social, largamente maioritária na sociedade portuguesa, que fermentou a vontade política que deu origem ao Serviço Nacional de Saúde (SNS). 

Naturalmente, hoje não se discutem os méritos do SNS, amplamente aceites, mas sobretudo os mecanismos e incentivos que devem ser introduzidos, ou melhorados, no sentido de assegurar a sua continuidade nas próximas décadas. 

A diminuição da mortalidade infantil, ou o prolongamento da esperança de vida, para patamares dignos de primeiro mundo, são talvez as maiores conquistas do SNS. Esta última tem sido algo menosprezada, agora que a nossa sociedade prossegue com afã o culto do novo. Em todo o caso, importa realçar que Portugal tem uma das maiores esperanças médias de vida, à nascença, no mundo inteiro. E isto, sendo um factor de elevação social, acarreta imensos desafios sobre os sistemas de previdência, trabalho e profissões, e saúde. 

A conjugação da queda da mortalidade infantil, o prolongamento da esperança de vida e a queda da natalidade, tornaram Portugal num dos países mais envelhecidos do mundo. Esta é uma tendência tanto mais preocupante na medida em que não se fizeram os investimentos público e privado necessários para assegurar uma reforma e velhice activas e com qualidade de vida. 

De facto, a rede pública de cuidados continuados em Portugal é muito incipiente e tem falta de camas e de profissionais qualificados no sistema público. Nos hospitais e nos agrupamentos de saúde pública, os quadros de pessoal, nas especialidades críticas para assegurar cuidados continuados às populações dependentes, chegam a ser inferiores a um sexto do que preconizam as leis e os quadros regulamentares.

Nesta altura, a oferta pública será inferior a 15% das necessidades do país, estando mais de 100 mil pessoas, a maior parte idosos com médio ou elevado estado de necessidade de cuidados continuados especializados, entregues às famílias e vizinhos, ou abandonados, pura e simplesmente. Esta realidade contempla tanto aqueles que estão acamados, totalmente dependentes, como os de menor estado de dependência, mas ainda assim a precisarem de assistência para banhos, higiene diária, cuidados de enfermagem, actividades lúdicas, toma de medicamentos, preparação de refeições, entre outras necessidades. 

A quase demissão ou ausência gritante do Estado coloca uma pressão insustentável sobre os descendentes familiares, quando existem, sobre os subsistemas de saúde e sobre a rede de assistência de solidariedade social.

Trata-se de uma pressão particularmente grave no caso dos subsistemas de saúde. Amiúde estabelecidos por contratação colectiva entre empregador e sindicatos, em sectores como o funcionalismo público, telecomunicações, serviços postais, banca, energia, entre outros, estes são meramente complementares, e não propriamente substitutivos do SNS. 

Os subsistemas de saúde, importa deixar bem claro, não têm a vocação, nem os recursos financeiros, para serem substitutos do SNS nesta matéria. Ainda assim, como é evidente, não podem ficar indiferentes ao drama dos mais velhos. Ignorar esta realidade seria um retrocesso civilizacional e uma negação do carácter mutualista dos subsistemas complementares. 

Do nosso lado, como sempre, não ignoramos os desafios. Em 2019 vamos consagrar valiosos recursos para tentar mitigar esta falha do Estado. Ironia do destino, um dos países do mundo com maior longevidade é simultaneamente um dos países onde a qualidade de vida no envelhecimento é menor. Naturalmente, cabe à sociedade exigir mais dos seus responsáveis políticos. Mas cabe também aos sistemas mutualistas liderarem, pelo exemplo, mostrando como é possível dar resposta e chamando o Estado às suas responsabilidades.

04.01.2019 - Jornal Económico

Com os lucros que os bancos vão registar em 2018, seria de esperar que os trabalhadores bancários fossem recompensados pelo seu esforço, empenho e dedicação.

03.01.2019 - Post facebook

A banca encontra-se, felizmente para todos, a recuperar. Este ano o sector registará um crescimento de mais de 80% dos seus resultados líquidos.

31.12.2018 - Post facebook

              

Os bancos continuam a pagar a fatura do despautério e da embriaguez irresponsável das duas décadas anteriores. Um legado muito duro que impede ainda hoje as nossas instituições de crédito de ter um rating que lhes permita emissões de dívida nos mercados a longo prazo.

28.12.2018 - Post facebook

              

É exequível proceder a um aumento mínimo para todos os trabalhadores bancários sem qualquer distinção.

26.12.2018 - Post facebook

Foram muitos dias e noites. Muitas semanas e vários anos. A estudar e a trabalhar, por vezes em simultâneo. Com ambição de ascensão social. Com vontade de deixar a sua marca, junto da organização, dos colegas e dos clientes. 

Tentando sempre chegar mais além. Fazer melhor. Contribuir para uma empresa bancária mais próspera. Não poupando com esforço, inteligência e empenho. 

Foram muitas as vezes que não vimos os nossos filhos crescer. Que não os acompanhámos na preparação dos trabalhos de casa. Muitos deveres familiares que foram relegados.

Muitas férias desmarcadas ou interrompidas abruptamente, por qualquer imperativo profissional. Muitas noites, vários fins-de-semana, que passámos a trabalhar, a estudar, a planear, a preparar. Tudo pelo brio de melhor fazer. 

Hobbies que não prosseguimos. Convívios a que faltámos. O salto para o ouro do Nélson Évora que não vimos em directo. Os grupos de amigos, recreativos, culturais, desportivos, a que fomos espaçando a nossa presença. Até os deixar, de mansinho. 

Estes são os profissionais abnegados. Muitos dos quais Quadros e Técnicos Bancários. “Que vestem a camisola”. 

Mas eis que, repentinamente, numa manobra nunca ensaiada desde 1975, os bancos outorgantes do ACT querem impor uma tabela de actualizações salariais que pune muitos dos profissionais abnegados e talentosos. 

Que lhes quer dar aumentos, sobre a base, de 0,25% a 0,5%. E que se recusam a explicitar que estes aumentos não serão absorvidos por reduções de igual valor na remuneração complementar. Ou seja, preparando-se para um aumento zero! 

Que fizeram um acordo com uma muito minoritária federação sindical (onde o maior dos seus sindicatos representa, por vezes apenas 2% e nunca mais de 20% dos trabalhadores activos de cada banco subscritor do ACT). Com aumentos globais de 0,75%, mas escondendo uma injusta discriminação entre bancários e níveis profissionais. Dividindo os bancários, numa manobra desajustada de uma sociedade democrática e livre. 

Claro que vos poderia dizer que seria mais útil que tal federação tivesse reunido esforços numa mesa negocial única, algo a que os convidámos e recusaram. A sua recusa valeu que os bancários saem todos a perder face a legítimas expectativas. E uns milhares, largos, a nada ganharem. Por isso, vos peço, em nome de tudo aquilo que ajudámos a construir; pelas nossas famílias a que demos menor atenção ao longo destes anos, que façam ao presidente executivo de vosso banco duas perguntas: 

– Serei eu filho de um Deus menor? 
– No ACT de 2016 (mas denunciado em 2011) impuseram uma contribuição “per capita” igual para o SAMS a cargos dos bancos, alegando que todos os bancários eram iguais (e com isso desviando 15% das receitas do SAMS Quadros em favor de terceiros). Como fica essa vossa argumentação? 

Bizarro que os bancos considerem alguns dos mais esforçados como filhos de um Deus menor. Estranha essa a forma de construir, motivar, desenvolver… Bizarro que esse acordo que distribui migalhas tivesse surgido de forma inopinada. 

Seremos filhos de um Deus menor? Está na sua mão questionar, mostrar a irracionalidade e o dislate da coisa.

21.12.2018 - Jornal Económico

É possível fazer uma actualização salarial que, sendo igual para todos, premeia o mérito, mas em simultâneo protege os que menos ganham.

21.12.2018 - Post facebook

              

Considera que é altura de recuperar o poder de compra perdido com a crise?

Em absoluto. Uma das coisas que é propalada mais vezes é dizer-se que em Portugal a legislação laboral é rígida, inflexível, mas todos os estudos empíricos demonstram que, em alturas de recessão, o nível do emprego em Portugal ajusta rapidamente, o que quer dizer que não tem nada a ver com a legislação laboral. E os portugueses são muito resilientes e muito razoáveis. E se nós virmos o grosso dos custos das empresas, vemos que são custos de contexto: localização, energia. E do que os empresários se queixam, além disso, é que ou a carga fiscal é excessiva ou tudo no quadro fiscal é muito incerto. E é contra estas incertezas que nós produzimos certezas. O que nós dizemos é: o acordo colectivo, tradicionalmente, traz certeza para cima da mesa, possibilita que as empresas e os investidores saibam qual é o quadro normativo com que vão trabalhar para os anos seguintes. Neste sentido, nós tentamos dar, do lado das relações laborais, um quadro de estabilidade – é claro, procurando recuperar poder de compra – que dá às empresas mais certezas. Muito mal seria que os bancos, tendo voltado à rendibilidade, não tivessem níveis para, de forma razoável, partilhar isto com os seus trabalhadores.

19.12.2018 - Post facebook

              

O SNQTB tem um fundo de greve robusto…

Sim, temos um fundo de greve canhão. Quando comecei nestas lides do sindicalismo, aprendi com um alemão que dirige o maior sindicato alemão que me dizia: “Paulo, antes de irmos para a negociação, mostro sempre quanto é que tenho na conta à ordem”. E aquilo marcou-me imenso, porque era tão óbvio e tão simples, era fácil dizer, mas difícil de fazer. O que nós fazemos é ter cuidado em manter a situação financeira muito equilibrada e isso permitiu-nos fazer um fundo de greve, que é um fundo de greve canhão, com oito milhões e 250 mil euros, o que permite pagar, no limite, uma greve prolongada, se for julgado necessário. Como tudo na vida, nós entendemos isto como uma bomba atómica e as bombas atómicas servem como elemento de negociação ou de dissuasão e não necessariamente para serem jogadas. De qualquer maneira, é um trunfo importante. Portanto, os bancários têm hoje uma capacidade reivindicativa teórica como nunca tiveram. E esta é a mensagem que acho que passámos.

17.12.2018 - Post facebook

Permitam-me que comece por aquilo que tem nota positiva e é merecedor de elogio: saúdo a atitude das administrações da Caixa Geral de Depósitos (CGD) e do Santander Totta (BST) que, em tempo útil, fecharam com os seus trabalhadores e seus representantes processos negociais complexos. 

Nestes dois casos, houve da parte destas instituições a preocupação de fazer uma actualização salarial que, sendo igual para todos (0,75%), premeia o mérito, mas em simultâneo protege os que menos ganham (terão actualizações maiores e que poderão chegar aos 2,5%). Igualmente relevante, importa notar que tanto a CGD como o BST atribuíram um aumento mínimo para todos os trabalhadores sem qualquer distinção. 

Os aumentos poderiam ter ido mais longe? 

Na minha opinião, sem dúvida que sim. Tenho perfeita consciência da frágil linha de gelo em que nos movemos e por isso, todos, accionistas e trabalhadores, têm de conter as suas legítimas expectativas.

Obviamente, os bancos continuam a pagar a factura do despautério e da embriaguez irresponsável das duas décadas anteriores, para não recuar mais. Um legado muito duro que impede ainda hoje as nossas instituições de crédito de ter um rating que lhes permita emissões de dívida nos mercados a longo prazo.

Em todo o caso, a banca encontra-se, felizmente para todos, a recuperar e este ano o sector registará um crescimento de mais de 80% dos seus resultados líquidos. Com lucros desta ordem de grandeza, naturalmente, seria e era de esperar que os trabalhadores fossem recompensados pelo seu esforço, empenho e dedicação. 

Porém, após meses de negociações inconsequentes com a Associação Portuguesa de Bancos (APB), o ano está próximo de se encerrar sem que se alcance um acordo geral sobre as actualizações salariais e demais cláusulas de expressão pecuniária. 

Contrariamente às administrações da CGD e do BST, há quem no sector prefira um rumo indigno. Um caminho alternativo que assenta na "punição" aos mais velhos em detrimento dos mais novos, e no "sacrifício" dos mais qualificados e com maiores responsabilidades. 

Estes administradores, com uma visão 1.0 do futuro da banca, olham para os trabalhadores como um custo e nada mais do que isso. Assim, em vez de premiarem os mais novos e em fase ascendente das suas carreiras, estes “burrocratas”, se me permitem que me apodere por momentos da expressão de Herberto Helder, preferem punir e redistribuir, numa manobra tacanha e digna de gente sem qualquer respeito pelos seus concidadãos. Entre os “burrocratas”, em pleno século XXI, há quem prefira ainda enveredar por manobras eticamente reprováveis e que mais não pretendem do que dividir a classe bancária. 

Atitude e pensamento que cheira a mofo, mais ainda nestes dias dominados pelas imagens dos “coletes amarelos” em França. Para que o mal triunfe, basta apenas que os bons não façam nada, observou em tempos, Edmund Burke. É absolutamente lamentável o cenário que se está a desenhar. Em todo o caso, nada que os trabalhadores bancários não resolvam, se necessário, nem que para isso tenham de avançar para um Natal bem "quente".

12.12.2018 - Jornal Público

A regularização da situação financeira foi uma promessa de campanha. O que foi feito?

Fez-se uma auditoria financeira, uma auditoria forense, renegociaram-se os contratos com os fornecedores, ajustaram-se as discrepâncias e algumas gorduras que existiam na forma de funcionamento. Reduzimos os custos fixos em 1,2 milhões de euros; reduzimos os custos dos órgãos sociais. E hoje a situação é completamente oposta: o nosso endividamento de curto prazo desapareceu, os pagamentos aos fornecedores estão todos em linha e o endividamento que temos é de médio e longo prazo, mas é menos de metade da nossa posição líquida de caixa. Portanto, isto quer dizer que, se as taxas de juro não fossem favoráveis, poderíamos pagar hoje toda a dívida. Temos um rácio de solvabilidade que é provavelmente ímpar entre as 100 maiores empresas portuguesas.
05.12.2018 - Post facebook

 

A regularização da situação financeira foi uma promessa de campanha. O que foi feito?

A melhor coisa a fazer é falarmos sempre a verdade e nós, no que toca a parte financeira, somos muito conservadores; somos “uma dona de casa”. A primeira coisa foi fazer uma auditoria financeira para apurar a real situação, perceber que havia práticas não conformes com as normas contabilísticas e cujo cumprimento não é opcional. Este sindicato, que se dizia, por fama, que era o mais rico do país, o que não é verdade, tinha uma situação financeira com algum desequilíbrio: dívidas de curto prazo a fornecedores, nomeadamente na saúde; dívidas de curto prazo à banca e uma situação em que o endividamento era bastante superior à liquidez. Paulo Alexandre Gonçalves Marcos Jornal Económico agosto de 2018

03.12.2018 - Post facebook

 

Como evoluiu a base associativa do SNQTB neste mandato?

Evoluiu muito bem. Partimos de uma base de cerca de 16.500 sócios, numa altura em que o sector teria 50 mil bancários, e passámos já os 19 mil sócios. Destes, a esmagadora maioria está no activo, num sector que terá agora [entre] 42 mil e 43 mil funcionários. Portanto, somos hoje a maior força sindical na banca e, pela primeira vez na nossa história, a maior força sindical de trabalhadores no activo em Portugal. Prestamos serviços a cerca de 60 mil pessoas. Tivemos um acréscimo de quase 3.000 sócios, partindo de uma base de 16 mil, o que dá um crescimento significativo. Quando chegámos, perdíamos dois associados por dia, agora, ganhamos sete. 

29.11.2018 - Post facebook

Segundo os dados divulgados recentemente pelo Eurostat, a autoridade estatística da União Europeia (UE), a taxa de poupança média dos portugueses fica, de forma continuada e reiterada, abaixo da média europeia. Pior do que isso. Olhando para os dados disponíveis, entre 2000 e 2017, é com muita preocupação que constato que os portugueses nunca pouparam tão pouco. A assimetria nos níveis de poupança entre Portugal e os nossos parceiros da UE, aliás, de acordo com os dados que já estão disponíveis, prossegue ao longo de 2018. 

Esta tendência estrutural, como não poderia deixar de ser, é um factor de enorme preocupação, na medida em que a poupança endógena, a poupança interna, é um factor de independência nacional. Não existindo essa poupança, ou sendo diminuta, tal significa que estamos muito mais dependentes de terceiros, precisamente daqueles que apresentam níveis de poupança mais elevados, o que constitui um potencial factor de vulnerabilidade externa. 

Diria que este diagnóstico, aqui simplificado por razões de espaço, é consensual e inequívoco. Não conheço ninguém minimamente relevante no panorama nacional ou internacional que diga o contrário. De facto, há um consenso teórico geral que se deve estimular e promover a poupança através do que se convencionou designar de segundo e terceiro pilares, uma vez que tal prática é do interesse individual e colectivo. 

O segundo pilar corresponde, no essencial, aos fundos de pensões que são constituídos no âmbito de uma relação laboral. As contribuições podem vir exclusivamente da empresa, ou de uma forma combinada da empresa e do trabalhador. Infelizmente, ao contrário do que seria desejável, sabemos que na actualidade são poucas as empresas que têm planos de pensões para os seus trabalhadores. 

O terceiro pilar assenta na poupança privada, exclusivamente individual, através de instrumentos como os PPR ou os fundos de pensões. Neste caso, os cidadãos adquirem estes produtos junto de bancos, de seguradoras, ou de sociedades gestoras de fundos de pensões e investimento. 

Ora, sendo a poupança uma questão de interesse individual, mas também de interesse nacional, seria de esperar incentivos fiscais da parte do Estado tanto às entidades empregadoras como aos cidadãos. Se, de facto, a poupança tem de ser uma prioridade e se, como se sabe, Portugal tem um problema estrutural neste domínio, nesse caso seria de esperar que o Governo apresentasse um estímulo à poupança através dos instrumentos de que dispõe para o efeito. 

Surpreendentemente, a leitura do Orçamento Geral do Estado (OGE), aprovado recentemente na generalidade na Assembleia da República, permite concluir que, uma vez mais, a preocupação com a poupança está ausente. Ainda que todos tenhamos consciência, incluindo o Governo, que é um imperativo nacional promover a poupança, constato que nesse âmbito não existe neste OGE qualquer estímulo de longo prazo para as empresas ou para os cidadãos. 

E assim sendo, no fundo, temos aquilo que merecemos, não é verdade? 

28.11.2018 - Jornal Público

Que balanço faz deste primeiro mandato na direcção do SNQTB?

Nós tínhamos um programa de choque para renovar e mudar. Apresentámos sete medidas para os primeiros 80 dias, que tinham muito a ver com recuperação da solvabilidade e da liquidez [do SNQTB], o que foi feito de forma exemplar e libertou recursos para aquilo que é essencial: tratar do bem-estar dos sócios, quer ao nível laboral, quer ao nível de saúde, cultura, recreio, turismo e, acima de tudo, formação. Depois de assegurar este primeiro momento, desenvolvemos três linhas de interesse: uma, eu diria que é a linha sindical – revitalizámos essa componente de defesa da classe; depois, gerimos de uma forma muito carinhosa aquilo que é a nossa jóia que é o SAMS Quadros. Somos o segundo operador [de saúde], a seguir à ADSE. Somos a marca mais reconhecida e mais admirada no que toca a cuidados de saúde e isso tem a ver com a nossa aposta, por exemplo, no apoio aos nossos sócios e beneficiários com doenças oncológicas, crónicas, degenerativas. Seremos o único subsistema em Portugal que criou equipas dedicadas e especializadas em todas estas fases da doença, da detecção ao prognóstico e ao tratamento. Portanto, uma abordagem holística que não encontro dos Pirenéus para cá.
27.11.2018 - Post facebook

Está preocupado com a crescente precariedade na banca?

Os gestores talentosos fazem crescer as receitas. Os que só cortam em pessoas não merecem o epíteto de gestores. Nenhum dos bancos estrangeiros a investir em Portugal actualmente elogiou as malfadadas reformas da legislação laboral, do período 2009-2013 – que vieram tornar mais precária a contratação colectiva, embaratecer o despedimento colectivo, diminuir o valor do trabalho, etc. – como factor de escolha de Portugal. Os bancos estrangeiros perceberam que a qualificação das pessoas, e não a legislação laboral ‘liberal’, é que explica o investimento.

22.11.2018 - Post facebook

 

No início do ano fez um pedido de concertação entre sindicatos no tema dos aumentos salariais. Esse pedido não deu frutos. Porquê?

Quando há duas partes em confronto há todo o interesse em que as partes falem unificadas. Quando chegámos percebemos que ao contrário dos bancos que falavam a uma só voz na APB, as diversas federações sindicais apareciam desgarradas, desligadas. E portanto escrevi aos meus homólogos. Fazia sentido trabalharmos em conjunto para maximizarmos o bem-estar dos trabalhadores. (...) Tenho esperança que havendo uma renovação geracional de dirigentes nas estruturas sindicais venham pessoas com menos histórico e pessoas com capacidade de fazer as pontes.

20.11.2018 - Post facebook

              

O SAMS Quadros continua a ser viável financeiramente?

Sim, absolutamente. Para a próxima década estamos perfeitamente seguros da nossa sustentabilidade e também da nossa capacidade de manter um elevado nível de serviços (saúde, sindicais, cultura), aos nossos sócios e beneficiários.

Sê-lo-á no médio e longo prazo?

Sem dúvida. Ambiciono trabalhar para que os meus sucessores possam celebrar as bodas de ouro e de diamante com uma invejável solvabilidade e nível de serviço.

16.11.2018 - Post facebook

              

O SNQTB é dos sindicatos com maior desafogo financeiro do país. A realidade da banca portuguesa em termos de trabalhadores pode fazer perigar essa realidade?

O SNQTB gere uma mutualidade de saúde considerada, unanimemente, como uma referência em Portugal. Adicionalmente, os desafios da atividade sindical são tremendos. Quer no reforço de meios clínicos, quer de saberes jurídicos e financeiro, para dar resposta a uns e outros desafios, tem o SNQTB dedicado parte considerável dos seus recursos. A dotação de um corpo clínico com várias especialidades; a criação de uma estrutura permanente para a Negociação Coletiva (REPER – IRCT) ou o reforço do Fundo de Greve (para 8,25 milhões de euros), são exemplos de um trabalho que nunca acaba. Nesse sentido, o SNQTB trabalha afincadamente para que uma parte cada vez maior das suas receitas sejam independentes da saúde financeira dos bancos. Hoje, perto de 20% das nossas receitas já são independentes das contribuições das entidades patronais para o subsistema de saúde.

14.11.2018 - Post facebook

 

Hoje, a realidade do país, da economia e da banca são muito diferentes do que em 1983. O SNQTB soube adaptar-se?

De quarenta sócios fundadores, em 1983, o SNQTB é hoje uma realidade incontornável: perto de 20 mil sócios, quase todos em idade laboral, e 60 mil beneficiários, afirmando-se como o maior sindicato português de trabalhadores no activo.

12.11.2018 - Post facebook

Recentemente, fui convidado para ser um dos três oradores de um painel dedicado ao financiamento da saúde em Portugal. Algo natural, atendendo a que o SAMS Quadros é uma entidade com 25 anos de actividade e uma referência, quer nos sistemas mutualistas quer no panorama mais lato dos subsistemas de saúde. 

O SAMS Quadros tem características únicas: é uma mutualidade, na medida em que ninguém é excluído em função de idade, patologias clínicas ou situação profissional. Nesse sentido, é muito diferente do mercado de seguros, que convive mal, por exemplo, com doenças crónicas, degenerativas e oncológicas. Mas, por outro lado, é também um subsistema que é financiado em partes quase iguais por empregadores e trabalhadores, pelo que a noção de solidariedade e de destino comum é um dos nossos traços indeléveis. 

Adicionalmente, somos um operador no ‘mercado’ da saúde que se distingue por contratar o que de melhor esse mesmo mercado oferece. Qualquer que seja a especialidade, estamos sempre focados na contratação dos melhores serviços e na sua avaliação constante (qualidade, integridade, preço, etc.). Quem não preenche os nossos requisitos, é excluído. É tão simples e directo como isto. 

Importa igualmente destacar que fomos pioneiros na introdução das pré-autorizações no mercado dos subsistemas, mas também na introdução de facturação electrónica na relação com os grandes grupos hospitalares, no reembolso de despesas mediante digitalização, no crédito em menos de 72 horas na conta de nossos sócios, e na introdução de orçamentos que permitam, aos nossos associados e beneficiários, uma efectiva comparação de preços entre os diferentes prestadores. 

O passo seguinte foi dado recentemente com o lançamento da rede “Escolha Informada SAMS Quadros”. Trata-se de um conjunto de prestadores, de entre os convencionados, cuja relação entre o preço e a qualidade é imbatível. Trata-se, de certo modo, de uma “escolha recomendada” como é apanágio, por exemplo, das entidades de defesa dos consumidores. 

Mais recentemente, na área das cirurgias, estabelecemos mais de 600 actos/operações com preço fixo, com mais de 30 entidades hospitalares, espalhadas um pouco por todo o país, com especial atenção dada ao interior de Portugal, evitando assim surpresas na conta final.

O trabalho continua e brevemente iremos estender a rede “Escolha Informada SAMS Quadros” a áreas dos meios complementares de diagnóstico e terapêutica, à medicina dentária, entre outras. 

Quando tanto se fala na sustentabilidade do financiamento da saúde, a primeira coisa que importa fazer é trabalhar no sentido de introduzir um choque de gestão. A saúde requer mais e melhor trabalho, e menos discussão ideológica. 

Acredito que revoluções, com a sua natureza disruptiva, não são a solução na gestão e no financiamento da saúde, mormente na área dos subsistemas. Pela nossa parte, estamos disponíveis para contribuir com a nossa tecnologia e conhecimento para ajudar outros subsistemas a serem mais eficientes e eficazes, mas mantendo sempre um elevado nível de serviço e comparticipações aos associados.

09.11.2018 - Jornal Económico

Estes 35 anos foram positivos naqueles que são os objetivos do sindicato?

Muito positivos. Foi possível criar uma verdadeira defesa dos direitos laborais dos bancários e serviços de assistência médica (SAMS Quadros) e social (Fundação Social Bancária-FSB), de aprendizagem ao longo da vida (FSB) ou de atividades culturais, desportivas e afins (SNQTB – Cultura e Recreio), Reforma (SGF) ou Segurança (MIS), ímpares no panorama da sociedade portuguesa. Isto sem amarras a nenhum poder, formal ou informal, sem subserviência a qualquer outra agenda que não seja a da classe bancária.
08.11.2018 - Post facebook

 

O SNQTB está a assinalar 35 anos. Como vão assinalar este número ‘redondo’? O Sindicalismo independente está de parabéns. Provámos que era possível criar e fazer crescer um sindicato verdadeiramente independente de poderes partidários, económicos ou outro. Vamos comemorar ao longo de um ano, até dia 9 de Julho de 2019, a data, com um conjunto de efemérides: palestras, conferências, livro, Caminhada e Corrida SAMS Quadros, inauguração de novas instalações regionais, entre outras iniciativas.

05.11.2018 - Post facebook

 

O encerramento de agências bancárias tem levado à redução do número de ATM Multibanco. Em simultâneo, surgiu uma rede independente de ATM que serve apenas para levantamentos, sem os serviços associados da rede Multibanco. Sem descurar que estamos numa economia livre, há um retrocesso na oferta ao consumidor. Como comenta?

A premissa da gratuidade do serviço Multibanco, sempre tentada e ameaçada pelo poder político, pode ter levado a um compreensível menor investimento na rede Multibanco, assim abrindo espaço para que redes ‘predadoras’ prestem serviços a turistas, mas também a residentes incautos.

30.10.2018 - Post facebook

Apesar das significativas melhorias ocorridas a partir de 2011, o Estado português permanece muito exposto a potenciais choques externos e, infelizmente, continua a crescer pouco.

Numa entrevista concedida ao Jornal Económico, o secretário de Estado Adjunto e das Finanças, Ricardo Mourinho Félix, disse que Portugal poderia “pagar mais dois mil milhões ao Fundo Monetário Internacional (FMI) este ano”. Actualmente, a República Portuguesa ainda tem mais de quatro mil milhões de euros de empréstimos junto do FMI. Segundo Mourinho Félix, o Governo português pretende fazer o “pagamento desses quatro mil a 4,5 mil milhões de euros ao longo dos próximos anos”.

Nesta matéria, as linhas de continuidade entre o actual e o anterior governos não poderiam ser mais evidentes. Apesar da pressão política passada para que se colocasse na agenda governamental a possibilidade de um haircut da dívida da República Portuguesa, o actual Governo de António Costa em nada alterou o rumo de restruturação ‘silenciosa’ da dívida pública adoptado pelo governo de Pedro Passos Coelho e prosseguido pela Agência de Gestão da Tesouraria e da Dívida Pública (IGCP). 

Um rumo prudente, sem riscos e sem custos desnecessários, tanto mais que, em 2017, Portugal registou a terceira maior dívida pública da União Europeia (UE). Segundo os dados revistos do Eurostat, a dívida pública portuguesa equivalia a uns pesadíssimos 124,8% do Produto Interno Bruto (PIB).

A dívida pública, portanto, disso não tenhamos a menor dúvida, continua a representar um risco gravíssimo, nomeadamente para a banca portuguesa. Importa, por isso, continuar este esforço disciplinado de restruturação ‘silenciosa’ da dívida pública. Um esforço com relevância acrescida se se tiver em conta que o Banco Central Europeu (BCE) terminará o programa de estímulos já em Dezembro e que daqui a um ano o próprio Mario Draghi será substituído por um novo presidente. 

À incerteza europeia enunciada há que adicionar outros riscos externos, como é o caso de uma eventual escalada, para além da que já existe actualmente, nas tensões comerciais entre os grandes blocos comerciais. Tudo isto numa altura em que o novo Orçamento Geral do Estado prevê um crescimento de 2,2% em 2019, uma previsão claramente optimista, se comparada com as previsões do FMI (1,8%) ou do Banco de Portugal (1,9%).

É indiscutível que a situação global portuguesa melhorou muito nos últimos anos, fruto do trabalho do anterior e do actual Governo. No caso da banca, em particular, o rácio de NPL, i.e. o stock de crédito de activos não rentáveis, continua a descer de forma continuada. Em todo o caso, o trabalho de casa não está terminado, muito longe disso. 

Na sua complexidade, a realidade é muito simples. Apesar das significativas melhorias ocorridas a partir de 2011, o Estado português permanece muito exposto a potenciais choques externos e, infelizmente, continua a crescer pouco. Ora, é neste contexto que se aproxima um novo ciclo eleitoral, algo que, como sabemos, tradicionalmente não estimula o sentido de responsabilidade. Saúda-se, por isso, a intenção manifestada pelo secretário de Estado Adjunto e das Finanças no sentido de se continuar a restruturação ‘silenciosa’ da dívida pública. Mais do que nunca, urge manter o rumo, por muito impopular que seja.

26.10.2018 - Jornal Económico

A banca está a reduzir o número de balcões e de profissionais. Num cenário de mudança tecnológica, é inevitável alguma alteração. Não teme, porém, que, sobretudo para os depositantes mais velhos e de regiões mais isoladas do país, possa estar a haver algum exagero?

Compete ao regulador, Banco de Portugal, impor uma carta de serviços bancários que assegure que alguns tipos de cidadãos possam continuar a beneficiar de serviços bancários de proximidade, com preço adequado: regiões do interior; pensionistas dos regimes não contributivos; pessoas com menores níveis de literacia, entre outras. Em alternativa, competiria ao banco estatal, CGD, esse papel. Infelizmente, nem os esforços, tímidos, do regulador parecem ser suficientes, nem à gestão da CGD foi atribuída essa missão no mandato que foi incumbida."
23.10.2018 - Post facebook

 

"O SNQTB está a negociar com a APB um novo pacote salarial. Num cenário de cortes físicos na banca, está otimista de que irão conseguir os aumentos pretendidos? Estou plenamente consciente que a nossa proposta é minimalista. A banca pode pagar aquilo que pedimos, recompensando o esforço dos trabalhadores bancários, tão duramente fustigados durante a crise de 2011-2015. O valor final vai depender da capacidade de mobilização e argumentação dos trabalhadores bancários, mas também, como não poderia deixar de ser, da boa fé negocial da APB."

20.10.2018 - Post facebook

Quase dois meses depois da denúncia do acordo de empresa, a administração do banco público continua sem dar sinal de vida. 

Nos meses de Verão, altura em que regra geral abranda o fluxo noticioso, é comum fazer notar que se está mergulhado na silly season, supostamente um período em que as notícias frívolas conquistam um espaço e uma visibilidade sem igual ao longo dos meses seguintes. 

Este ano, porém, a season teve muito pouco de silly, não faltando decisões e notícias relevantes. A banca não fugiu a esta tendência atípica, por assim dizer, e no final do passado mês de Julho, a Caixa Geral de Depósitos (CGD) denunciou unilateralmente o acordo de empresa assinado com os sindicatos e em vigor apenas desde 2016. Nessa mesma altura, juntamente com a denúncia, a administração do banco público fez seguir para os quatro grupos de sindicatos uma proposta de revisão global do respectivo clausulado. 

Em tempo oportuno, o Sindicato Nacional dos Quadros e Técnicos Bancários (SNQTB), a que presido, manifestou o seu desacordo quanto à oportunidade (tempo) e ao modo da denúncia do acordo de empresa apresentada por parte da administração da CGD. Na nossa perspectiva, a denúncia apresentada foi extemporânea ou, no mínimo, inoportuna, tendo em conta que o acordo de empresa em vigor tem data de 2016. Acresce que a denúncia global do acordo de empresa constituiu uma medida unilateral, não tendo a administração da CGD sequer procurado um consenso prévio relativamente a tal iniciativa. 

Isto dito, à proposta de revisão apresentada pelo banco público respondeu a nossa estrutura sindical, submetendo à apreciação da administração do banco público a sua contraproposta no final de Agosto, cumprindo escrupulosamente o prazo legal definido para esse efeito. Da nossa parte, ninguém foi de férias sem cumprir o que a lei estipulava, nunca perdendo de vista, como não poderia deixar de ser, os interesses dos trabalhadores que representamos, mas também o próprio interesse da instituição. 

A saber, e sem ser exaustivo, o nosso sindicato propôs à administração do banco público um aumento da tabela salarial de 3,96% e das cláusulas de expressão pecuniária, a consagração do direito à desconexão, o não abandono do direito à assistência médico-social, o reforço da protecção contra o assédio moral, a manutenção das anuidades e das diuturnidades, e a regulamentação da prestação de trabalho nas Caixas Móveis, que vieram substituir, de forma muito imperfeita, as agências da CGD que têm vindo a encerrar nalguns pontos do país. 

Ora, nos termos legais, apresentadas as propostas dos outorgantes da convenção colectiva, deveria ter-se seguido um período de negociações directas. Porém, contrastando com a urgência demonstrada pela denúncia surpresa do acordo de empresa efectuada pelo banco público, em pleno período de férias, após a apresentação da nossa contraproposta, a CGD remeteu-se a um total e inexplicável silêncio.

19.10.2018 - Jornal Público

"Na Fundação Social Bancária descemos drasticamente os custos com vencimentos e reforçámos substantivamente o apoio a causas sociais."

09.10.2018 - Post facebook

 

"Reduzimos os vencimentos dos membros dos órgãos sociais em 40%, tal como prometido, e cancelámos avenças desprovidas de racionalidade. Tal decisão, a par da redução acentuada de custos de estrutura, contribuiu para assegurar um sindicato muito profissional, mas mais ágil e flexível."

07.10.2018 - Post facebook

 

"Desmaterializámos os encontros de contas e criámos um extrato integrado e possibilitámos que os reembolsos de consultas possam ser feitos sem circulação física de documentos. Aplicámos as poupanças, obtidas na simplificação de circuitos, no alargamento do apoio à natalidade e ao parto." 

01.10.2018 - Post facebook

Juntando tudo, se compararmos com 2010, os bancos hoje têm menos 20% a 30% de trabalhadores, mas menos 30% a 50% de custos laborais. 

Depois do período de assistência económica e financeira, tutelado pela troika CE/BCE/FMI, entre 2011 e 2014, os últimos anos têm sido marcados pela recuperação dos resultados das empresas, cujos níveis de rendibilidade se aproximam dos valores médios históricos. 

Diversas categorias profissionais têm vindo a ser recompensadas pela resiliência, pelo cumprimento dos seus deveres profissionais, pelo zelo e pelo brio que colocaram no desempenho das suas obrigações. A título de exemplo, tal é o caso dos professores, enfermeiros, pilotos e pessoal de cabine, entre outros. E como estão os bancários? 

Os trabalhadores bancários são um dos baluartes da classe média e sempre estiveram do lado da solução e nunca do problema. Com elevado sentido de responsabilidade, os sindicatos que os representam sempre procuraram, e continuam a procurar, promover o emprego e a estabilidade sectorial. Infelizmente, importa lembrar, nos últimos anos este sentido de responsabilidade não tem sido percebido pelas entidades empregadoras como algo importante e a ser mantido. 

Os bancários perderam, entre 2010 e 2018, mais de dez pontos percentuais de poder de compra, isto considerando apenas a erosão provocada pela inflação. Estamos a falar de dez pontos percentuais de poder de compra sem contar com o “enorme aumento de impostos” decretado pelo ministro das Finanças, Vítor Gaspar, em 2012, e sem contar igualmente com o acréscimo dos impostos indirectos, nem com o aumento do custo de habitação nas cidades, ou com os aumentos nos preços dos combustíveis. 

Às diminutas ou inexistentes actualizações salariais, o Grupo Negocial das Instituições de Crédito (GNIC) subscritoras do Acordo Colectivo de Trabalho (ACT) do Sector Bancário, numa deriva que rompeu com um consenso social de décadas, denunciou o ACT do sector, promovendo mais ainda o embaratecimento do trabalho bancário. Juntando tudo, se compararmos com 2010, os bancos hoje têm menos 20% a 30% de trabalhadores, mas menos 30% a 50% de custos laborais. 

Ora, se uma prolongada crise pode explicar alguma coisa, pouco aceitável é o faz-de-conta com que o GNIC tenta entreter as Federações Sindicais do Sector Bancário. O mês de Outubro está prestes a chegar e o GNIC continua preso a uma concepção que vê os trabalhadores como um custo e não um activo precioso. 

O GNIC insiste em ignorar os resultados positivos, em crescendo, dos bancos, ou a redução dos níveis de crédito vencido ou em incumprimento. Igualmente importante, o GNIC ignora que as equipas de gestão têm vindo a recuperar as suas remunerações pré-crise.

Naturalmente, o esforço e a competência devem ser recompensadas. O mérito das equipas de gestão merece ser premiado, mas também o dos trabalhadores bancários, o que não tem acontecido, tanto no caso dos quadros e técnicos bancários, em particular, como dos trabalhadores bancários, em geral.

Importa recordar que nos dias muito difíceis, entre 2011 e 2014, os trabalhadores bancários se mantiveram inquebráveis nas suas funções, arrostando com a fúria de clientes lesados por algumas práticas de gestão que, no mínimo, foram imprudentes, quando não criminosas. Práticas, convém deixar muito claro, às quais os trabalhadores bancários foram alheios. 

É neste contexto de grande “amor à camisola” e de exigências legais e profissionais em crescendo que se percebe mal a posição do GNIC. Em cima da mesa está a proposta dos sindicatos de uma actualização, em linha com a inflação esperada, de 1,4% da remuneração mensal efectiva (RME), uma actualização de cerca de 3,5% das diuturnidades e do subsídio de almoço, e uma proposta para que os bancos criem fundos de pensões complementares aos existentes, com uma contribuição definida por parte das entidades empregadoras e facultativa para os trabalhadores. 

Como se verifica, trata-se de uma proposta muito razoável, que procura que neste ano de 2018 os bancários não percam poder de compra, que começa a resolver o tema das reformas muito baixas a que estão condenados os bancários admitidos antes de 2009, e que procura, por via das diuturnidades, demonstrar solidariedade para com os actuais reformados bancários.

Uma proposta tanto mais razoável se se tiver em linha de conta que este ano os principais bancos a operar em Portugal vão apresentar lucros, como um todo, e crescimentos na ordem dos 40% e 60%. Mais infeliz ainda nos parece a proposta do GNIC que, passados estes meses todos de negociações, propõe um aumento de 0,75% sobre a remuneração base (não a RME) e não quer discutir o tema das reformas paupérrimas e de eventuais soluções para as mitigar. 

Alguns destes bancos, note-se, são meras sucursais de bancos espanhóis que acordaram aumentos, no país vizinho, de mais do dobro do que é ‘oferecido’ em Portugal. Por acaso isto é revelador de uma postura negocial séria? 

Sejamos claros. Chega de faz-de-conta. Os trabalhadores bancários, como se procurou transmitir, merecem ser tratados com respeito e consideração pelo GNIC. Chegou o momento de dizer basta!

28.09.2018 - Jornal Económico

"Criámos toda uma abordagem holística ao tema das doenças de foro oncológico, crónico ou degenerativo, com majoração de tabelas, simplificação de procedimentos e a criação de um Gabinete de Apoio ao Doente."
26.09.2018 - Post facebook

 

"Alargámos a qualidade e a quantidade dos prestadores de saúde, em todo o país, com convenções de muito boa relação preço-qualidade. Possibilitamos aos nossos sócios uma Segunda Opinião Médica Internacional, para os casos e patologias clínicas de maior severidade."
18.09.2018 - Post facebook

A quem serviu a retirada dos sindicatos das comissões de acompanhamento? Quem beneficia com este aumento do risco sistémico? Quem lucra com tudo isto? 

Os fundos de pensões na banca, visando pagar as pensões de reforma por velhice ou por invalidez, foram instituídos por contratação colectiva, nos finais da década de 80 do século XX. Na ausência da integração dos bancários na segurança social, com a notável excepção dos trabalhadores do Banco Totta e Açores, este sistema, paulatinamente reforçado, funcionou como o verdadeiro pilar de um sistema misto de repartição e capitalização. 

A integração dos novos bancários na segurança social, a partir de meados da década passada, deixou a grande maioria da classe ainda beneficiária mas também refém do sistema criado com os fundos de pensões. 

Isto dito, o decreto-lei 12/2006 veio estabelecer a existência e o papel da comissões de acompanhamento, na vigilância sobre o cumprimento da política de investimentos, e da actuação das sociedades gestoras dos fundos, frequentemente detidas pelos próprios bancos. Como que um guardião independente, dotado de vontade política e de competência técnica. Pela sua complexidade, este papel veio a ser consagrado aos sindicatos outorgantes dos acordos colectivos de trabalho. 

Estas comissões de acompanhamento tiveram um papel crucial no evitar que a débâcle de alguns bancos tivesse ocasionado um sistema de colapso do fundo de pensões respectivo, tornado mais provável quando em muitos conselhos de administração pairava a noção de que os fundos de pensões eram instrumentos estratégicos do prolongamento dos balanços dos bancos. Foi a presença dos sindicatos que obviou a que os fundos de pensões ficassem prenhes de obrigações de clubes de futebol, papel comercial de emitentes falidos, ou dívidas do sector imobiliário convertidas em unidades de participação. Repito: foi o papel dos sindicatos bancários que evitou o colapso destes fundos. 

Resumindo, tínhamos até então um sistema com pesos e contrapesos que mitigou eventuais tentações de fraude, e que em muito ajudou o trabalho dos gestores de fundos de pensões e do regulador. 

Eis quando, desmentindo um aforismo tornado célebre por Otto Glória, de que em equipa que ganha, não se mexe, esteve em consulta pública no Verão(!) de 2015, com republicação em Setembro desse mesmo ano, uma alteração ao supracitado decreto-lei de 2016. Sem que ninguém se tenha dado conta, os sindicatos foram, na prática, ‘corridos’ deste papel de supervisão e vigilância. E foram substituídos pelos representantes, voluntariosos, eleitos dos participantes. 

Em processos ‘eleitorais’ que frequentemente estão muito longe de oferecer quaisquer garantias de transparência, isenção e igualdade de oportunidades. E saindo os sindicatos, com o seu peso técnico e político, substituídos que vão ser por trabalhadores atomizados. Sob a dependência hierárquica e de trabalho em relação ao empregador, não organizados, muitas vezes sem know-how para desempenharem um papel de escrutínio que é muito complexo. 

Só para relembrar: os fundos de pensões na banca, que se destinam a pagar reformas aos trabalhadores bancários no activo e admitidos antes do final da década precedente, gerem 6.000 milhões de euros de activos. Façamos, então, a pergunta que vale um milhão de euros: a quem aproveitou esta alteração legislativa feita em tempo estival? A quem serviu a retirada dos sindicatos das comissões de acompanhamento? Quem beneficia com este aumento do risco sistémico? Quem lucra com tudo isto? O país e os trabalhadores bancários, seguramente que não.

14.09.2018 - Jornal Económico

"Realizámos um investimento importante na modernização das estruturas informáticas e nos consultores clínicos do SAMS Quadros, tendo agora variadas competências (cirurgias, análises, estomatologia, imagiologia, entre outras)."
11.09.2018 - Post facebook

 

"Banco de Portugal deve impor carta de serviços bancários”

A banca está a reduzir o número de balcões e de profissionais. No cenário tecnológico, é inevitável alguma alteração, mas isso pode, se não for acautelado um patamar mínimo de oferta, ser um problema para os depositantes mais velhos e de regiões mais isoladas do país. O presidente do Sindicato Nacional Dos Quadros Técnicos Bancários, Paulo Gonçalves Marcos, considera que, para evitar esse cenário, o Banco de Portugal deve “impor uma carta de serviços bancários” para que alguns consumidores possam continuar a beneficiar de serviços bancários de proximidade e a preços adequados. A alternativa seria que o banco público assegurasse isso mesmo. Paulo Gonçalves Marcos lamenta, porém, que não haja resultados.
O Sindicato Nacional Dos Quadros Técnicos Bancários (SNQTB) está a negociar com a Associação Portuguesa de Bancos um novo pacote salarial (reclama 1,4% de atualização salarial sobre o nível, 3,5% no subsídio de almoço e 3,55% nas diuturnidades, aqui com reflexo também nas pensões). Num cenário de cortes físicos na banca, está otimista de que irão conseguir os aumentos pretendidos? Estou plenamente consciente que a nossa proposta é minimalista. A banca pode pagar aquilo que pedimos, recompensando o esforço dos trabalhadores bancários, tão duramente fustigados durante a crise de 2011-2015. O valor final vai depender da capacidade de mobilização e argumentação dos trabalhadores bancários, mas também, como não poderia deixar de ser, da boa fé negocial da APB.
A banca está a reduzir o número de balcões e de profissionais. No cenário tecnológico, é inevitável alguma alteração. Não teme, porém, que, sobretudo para os depositantes mais velhos e de regiões mais isoladas do país, possa estar a haver algum exagero? Compete ao regulador, Banco de Portugal, impor uma carta de serviços bancários que assegure que alguns tipos de cidadãos possam continuar a beneficiar de serviços bancários de proximidade, com preço adequado: regiões do interior; pensionistas dos regimes não contributivos; pessoas com menores níveis de literacia, entre outras. Em alternativa, competiria ao banco estatal, Caixa Geral de Depósitos esse papel. Infelizmente, nem os esforços, tímidos, do regulador parecem ser sufi cientes, nem à gestão da Caixa Geral de Depósitos foi atribuída essa missão no mandato que foi incumbida. 
O encerramento de agências bancárias tem levado à redução do número de ATM Multibanco. Em simultâneo, surgiu uma rede independente de ATM que serve apenas para levantamentos, sem os serviços associados da rede Multibanco. Sem descurar que estamos numa economia livre, há um retrocesso na oferta ao consumidor. Como comenta? A premissa da gratuidade do serviço Multibanco, sempre tentada e ameaçada pelo poder político, pode ter levado a um compreensível menor investimento na rede Multibanco, assim abrindo espaço para que redes “predadoras” prestem serviços a turistas, mas também a residentes incautos. 
O SNQTB está a assinalar 35 anos. Como vão assinalar este número “redondo”? O Sindicalismo independente está de parabéns. Provámos que era possível criar e fazer crescer um sindicato verdadeiramente independente de poderes partidários, económicos ou outro. Vamos comemorar ao longo de um ano, até dia 9 de julho de 2019, a data, com um conjunto de efemérides: palestras, conferências, livro, Caminhada e Corrida SAMS Quadros, inauguração de novas instalações regionais, entre outras iniciativas. Estes 35 anos foram positivos naqueles que são os objetivos do sindicato? Muito positivos. Foi possível criar uma verdadeira defesa dos direitos laborais dos bancários e serviços de assistência médica (SAMS Quadros) e social (Fundação Social Bancária-FSB), de aprendizagem ao longo da vida (FSB) ou de atividades culturais, desportivas e afins (SNQTB – Cultura e Recreio), Reforma (SGF) ou Segurança (MIS), ímpares no panorama da sociedade portuguesa. Isto sem amarras a nenhum poder, formal ou informal, sem subserviência a qualquer outra agenda que não seja a da classe bancária. 
Hoje, a realidade do país, da economia e da banca são muito diferentes do que em 1983. O SNQTB soube adaptar-se? De quarenta sócios fundadores, em 1983, o SNQTB é hoje uma realidade incontornável: perto de 20 mil sócios, quase todos em idade laboral, e 60 mil beneficiários, afirmando-se como o maior sindicato português de trabalhadores no ativo. 
O SNQTB é dos sindicatos com maior desafogo financeiro do país. A realidade da banca portuguesa em termos de trabalhadores pode fazer perigar essa realidade? O SNQTB gere uma mutualidade de saúde considerada, unanimemente, como uma referência em Portugal. Adicionalmente, os desafios da atividade sindical são tremendos. Quer no reforço de meios clínicos, quer de saberes jurídico-financeiro, para dar resposta a uns e outros desafios, tem o SNQTB dedicado parte considerável dos seus recursos. A dotação de um corpo clínico com várias especialidades; a criação de uma estrutura permanente para a Negociação Coletiva (REPER – IRCT) ou o reforço do Fundo de Greve (para 8,25 milhões de euros), são exemplos de um trabalho que nunca acaba. Nesse sentido, o SNQTB trabalha afincadamente para que uma parte cada vez maior das suas receitas sejam independentes da saúde financeira dos bancos. Hoje, perto de 20% das nossas receitas já são independentes das contribuições das entidades patronais para o subsistema de saúde. 
O SAMS Quadros continua a ser viável financeiramente? Sim, absolutamente. Para a próxima década estamos perfeitamente seguros da nossa sustentabilidade e também da nossa capacidade de manter um elevado nível de serviços (saúde, sindicais, cultura), aos nossos sócios e beneficiários. 
Sê-lo-á no médio e longo prazo? Sem dúvida. Ambiciono trabalhar para que os meus sucessores possam celebrar as bodas de ouro e de diamante com uma invejável solvabilidade e nível de serviço. No fi m de 2015, na campanha para a eleição como presidente do SNQTB, disse que faria mandaria fazer uma auditoria para apurar a situação patrimonial do sindicato, ao SAMS Quadros e a todas as empresas controladas pelo sindicato, assim como de que cortaria de imediato 40% das remunerações dos órgãos sociais. Foi feito? Os cortes nas remunerações dos órgãos sociais foram até superiores aos anunciados.
Quais os resultados das auditorias? A auditoria financeira implicou de imediato uma correção das contas de 2015, de valor muito significativo. A auditoria forense foi entregue ao Ministério Público, num âmbito de um processo de investigação à gestão anterior, e encontra-se um segredo de justiça.
No próximo ano há novas eleições para o SNQTB. Pensa recandidatar-se? Só haverá eleições no último trimestre de 2019. Para já, o meu foco e o foco da comissão executiva do SNQTB está centrado exclusivamente no trabalho diário que nos tem vindo a permitir cumprir as metas estabelecidas em 2015 e, em muitos aspetos, ir para além dos objetivos originalmente traçados. A decisão de me recandidatar, ou não, será anunciada em tempo próprio. Por ora, qualquer decisão sobre essa matéria, seria extemporânea.
07.09.2018 - Post facebook

 

"Mantivemos a tradição de gestão interna do subsistema SAMS Quadros, de forma a garantir o cunho de personalização e generosidade do seu perímetro de assistência. Respeitando os empregos e as carreiras dos nossos colaboradores do SNQTB."
06.09.2018 - Post facebook

 

"Nos últimos dois anos fomos o único sindicato da banca a crescer, aliás em contra-ciclo com os nossos congéneres que estão em perda moderada ou acelerada. É com muito orgulho que podemos dizer que crescemos mais de dois mil sócios, algo fundamental para a renovação e sustentabilidade do SNQTB e do nosso SAMS Quadros."
02.09.2018 - Post facebook

 

"Somos um sindicato da banca que, sem ganhos extraordinários, melhorámos de forma relevante o nosso desempenho económico."
29.08.2018 - Post facebook

Esta revisão do Código de Trabalho não responde à questão central: como é possível que Portugal seja um destino preferencial para os estrangeiros que querem cá viver mas seja tão duro para quem quer cá trabalhar?


A aprovação, no passado mês de Junho, na generalidade, das alterações ao Código do Trabalho, como resultado do acordo de concertação social, dominou uma boa parte da atenção do Governo, deputados, associações patronais e sindicatos. A discussão foi muito centrada em torno de ganhos e perdas, ou sobre o papel da concertação social e a legitimidade da Assembleia da República para fazer alterações ao acordo. Receio, no entanto, que a discussão esteja a fugir do essencial. 


O acordo de concertação social foi alcançado numa mesa negocial onde parceiros sociais muito relevantes, não herdeiros do ordenamento do PREC, estão ausentes: os sindicatos independentes (em inúmeros casos representando profissões de elevado conteúdo conceptual) e sectores patronais tão relevantes quanto o imobiliário, novos formatos de retalho, ou as tecnologias de informação. 


E isso não será irrelevante para aquilo que o acordo permitirá alcançar, i.e. redução potencial da precariedade de emprego, mas, mais importante, para aquilo que não permite. 

Esta revisão do Código de Trabalho, que entretanto baixou à comissão da especialidade, não responde à questão central: como é possível que Portugal seja um destino preferencial para os estrangeiros que querem cá viver, os reformados europeus, por exemplo, mas seja tão duro para quem quer cá trabalhar? Não responde às preocupações dos empresários, pois para estes a estabilidade fiscal e regulatória, ou os custos de energia e de mobilidade aérea, ferroviária e marítima, são bem mais importantes do que tornar mais barato o custo laboral. 

Não responde à necessidade de repor o consenso social, colocado em causa pelo descontrolo das contas públicas e pela tutela, subsequente, da troika. Esta, com base em ideologia que não encontra respaldo teórico ou empírico credível, preocupada que esteve com o ressarcimento dos credores internacionais, impôs uma violenta alteração do equilíbrio laboral. A diminuição das indemnizações por despedimento, ou a introdução da caducidade das convenções colectivas, foram e são dois exemplos nefastos da tentativa de desequilibrar as relações laborais.

Com isto, empobrecendo a classe média e as famílias, destruindo o tecido social, reduzindo a parte dos salários no rendimento nacional para níveis que se aproximam do terceiro mundo (e cada vez mais distantes dos países do norte da Europa). Ou um modelo perverso de flexi-segurança nórdica, com hiperflexibilização (desregulamentação) mas sem a segurança, nem os apoios no desemprego daqueles países.

Não respondem estas alterações ao Código de Trabalho ao tema conexo da fiscalidade despropositada que incide sobre o trabalho quando comparada com o capital (dividendos, mais valias bolsistas, royalties…). Nem ao tema dos activos intangíveis, derivados de marcas e acesso a dados pessoais e de consumo, apanágio dos gigantes norte-americanos e chineses da Internet, não serem tributados em Portugal. 

Não responde aos novos desafios introduzidos pela conciliação entre trabalho e família e não responde aos desafios trazidos pela digitalização. Não responde aos desafios de uma economia de "encomenda" onde microtransacções substituem as relações laborais estáveis. 

Não responde aos desafios de uma sociedade que ostraciza trabalhadores "velhos" (acima dos 40 anos) e que os condena, em reestruturações empresariais sucessivas, ao desemprego de longa duração e a reformas antecipadas de miséria. 
Valorizar a contratação colectiva e os cidadãos trabalhadores, e fazer alterações que traduzam uma capacidade prospectiva de antecipar as questões da globalização e digitalização é o que se espera da Assembleia da República e da discussão na especialidade a partir do próximo mês de Setembro. O que se espera e que exige, importa acrescentar."

28.08.2018 - Jornal Público

"O SNQTB é provavelmente o único sindicato na área da banca cujas contas são públicas, estão auditadas e certificadas, no caso pela EY (Ernst & Young) e têm parecer sem qualquer reserva por parte do ROC."
23.08.2018 - Post facebook

 

"Querer substituir a força técnica e política dos Sindicatos, nas comissões de acompanhamento dos Fundos de Pensões da Banca, por participantes individuais, é fator de perigo para a sustentabilidade das reformas dos bancários"
21.08.2018 - Post facebook

 

"A presença dos Sindicatos nas Comissões de Acompanhamento dos Fundos de Pensões da Banca, é fator de equilíbrio e de moderação para a gestão destes fundos."
19.08.2018 - Post facebook

É preciso dizer alto e bom som: privatizar a Caixa, por omissão, tornando-o igual a qualquer banco comercial, não serve os interesses de Portugal. Foi esta semana tornado público que a rede de balcões da Caixa Geral de Depósitos (CGD) deixou de ser a maior do país, como há cerca de cem anos nos habituámos. E de primeiro lugar, fruto de encerramentos massivos de balcões, a CGD passou a ser apenas a quarta maior rede de balcões. 


O que é trágico, dramático. Da Caixa esperar-se-ia uma natureza e um papel muito relevante na coesão nacional. Na presença de proximidade, fornecendo serviços bancários de qualidade a preços módicos, em especial às populações residentes no interior de Portugal; aos menos alfabetizados; aos de menores recursos financeiros. Da Caixa esperar-se-ia que uma parte significativa dos depósitos captados, em cada distrito ou município, fossem mutuados a empresas e particulares desses municípios, funcionando como agente de desenvolvimento e não como mero sugador de poupanças para serem aplicadas em projectos no litoral ou ao serviço de grandes empresas. 


Da Caixa esperar-se-ia um papel relevante no microcrédito e na resolução das falhas do mercado que, fruto de informação assimétrica, tende a concentrar o crédito em entidades do litoral e em grandes empresas ou particulares com empregos em grandes empresas ou funcionários públicos. 


Da Caixa esperar-se-ia um papel relevante na integração das empresas portuguesas no mercado ibérico. E no apoio às segundas e terceiras gerações de portugueses na diáspora, para quem a CGD poderia representar uma oportunidade de captar os capitais e o talento destes filhos e netos dos emigrantes, em prol de Portugal. 
Em menos de 30 anos a quota de mercado da CGD passou da vizinhança de 50% para pouco mais de 20%, aproximando-se perigosamente da irrelevância. A culpa desta ‘privatização’ sub-reptícia, ano após ano confirmada com perda de quota de mercado, encerramento de balcões e redução de trabalhadores, não pode ser assacada a esta administração. Esta limita-se a seguir a carta de missão que lhe foi entregue, depois da falência da República Portuguesa e da assistência externa da troika. 


Não se culpe a gestão actual ou a passada, mas sim todos nós, enquanto bancários ou contribuintes, que deixámos que o Estado esteja na iminência de perder um instrumento valioso de coesão social e económica e de colmatar as falhas de mercado. Primeiro foram os serviços do Estado que encerraram no interior: escolas, tribunais, delegações regionais dos ministérios, quartéis… Agora, qual prego no caixão, o balcão de proximidade da CGD. 
E eu, que sou insuspeito de simpatias marxistas ou colectivistas, tenho que dizer alto e bom som: privatizar a Caixa, por omissão, tornando-o igual a qualquer banco comercial, não serve os interesses de Portugal. 


E digo isto com o desprendimento de quem considera que a denúncia do acordo de empresa de 2016, feita pela administração da Caixa, é inoportuna no tempo e no modo como foi feita e carece de fundamentação. Com o desprendimento de liderar o maior sindicato português, mas o mais pequeno no seio dos trabalhadores da Caixa.
Qual a nossa esperança? Que o nosso sagaz e hábil primeiro-ministro consiga, junto de Bruxelas, que a CGD volte a ter um papel relevante de agente económico estratégico para Portugal. Que os contribuintes se indignem com esta privatização à socapa. Passos Coelho não tinha razão em querer privatizar a CGD. Mas assim, de forma menos explícita, o resultado vai ser o mesmo.

17.08.2018 - Jornal Económico

"Três maneiras de destruir uma cidade, qual delas a mais perniciosa: rendas congeladas; guerra; vistos Gold."
15.08.2018 - Post facebook

 

"Precisamos de investidores externos que criem emprego, façam florescer as artes ou as ciências (Gulbenkian). Não precisamos de especuladores imobiliários que expulsam a classe média das cidades."
12.08.2018 - Post facebook

A banca está a retomar, de forma significativa, a sua rendibilidade. Inevitavelmente, o retorno desse processo tem de se reflectir na actualização salarial. 


Numa altura em que de uma forma generalizada o sector da banca retoma a sua rendibilidade, de forma significativa e sustentada, como se tem visto, aliás, nas sucessivas apresentações de resultados, os sindicatos do sector regressam à mesa das negociações com a Associação Portuguesa de Bancos (APB).


Este processo negocial, em torno das cláusulas de expressão pecuniária do Acordo Colectivo de Trabalho (ACT), já decorre há algum tempo sem que a APB apresente propostas válidas, diria até negocialmente sérias, para um processo que se espera que venha a ser frutuoso e mutuamente vantajoso. Da parte do Sindicato Nacional dos Quadros e Técnicos Bancários (SNQTB), as propostas em cima da mesa não poderiam ser mais razoáveis. Aquilo que pedimos é uma actualização salarial sobre o nível do trabalhador bancário de apenas 1,4%, o que se repercute também, e como não poderia deixar de ser, nas isenções, um aumento do subsídio de almoço de 3,5%, e um aumento nas diuturnidades de 3,55%, o que também tem impacto nos rendimentos dos bancários reformados.

Como facilmente se percebe, não há nada de exagerado nestas propostas. Aliás, estas propostas afiguram-se tanto mais razoáveis se se tiver em conta que a banca já regressou aos lucros e tem vindo, inclusivamente, a premiar generosamente o esforço e a dedicação das suas administrações, como foi o caso recente do BCP. Ora, seguindo o mesmo princípio de generosidade, não creio que os bancos portugueses se possam queixar do esforço e da dedicação dos seus trabalhadores nos últimos anos. 


Dito isto, importa frisar que o SNQTB quer ainda corrigir uma grave injustiça relativa entre os bancários que entraram em funções antes de 2009 e aqueles que o fizeram depois dessa data. As alterações ocorridas no ACT nessa altura ditaram uma clivagem muito significativa e aquilo que pedimos é que se constitua um fundo de pensões de contribuição definida, i.e. um reforço de capital, para o qual os trabalhadores e os bancos irão contribuir para que se possa encurtar o fosso enorme entre o que se ganha no activo e o que se virá a ganhar na reforma. 


Se na Segurança Social estamos a falar de taxas de substituição entre os 75% e os 80%, na banca não é invulgar estarmos a falar de taxas de substituição de cerca de 50%. Ora, para não se condenar toda uma geração dos bancários mais velhos à miséria, algo que quero acreditar que estamos em sintonia com os bancos, convém tomar medidas imediatamente. 


No essencial, este é o espírito das nossas propostas e às quais, repito, a APB tem vindo a responder de forma negocial pouco séria. Os sindicatos dos bancários estão neste processo de forma construtiva e convinha que a APB assumisse uma atitude semelhante. A banca está a retomar, de forma significativa, a sua rendibilidade. Inevitavelmente, o retorno desse processo tem de se reflectir na actualização salarial. Outra coisa não seria de esperar de uma democracia liberal em que se pugna pelos devidos equilíbrios sociais, certo?

10.08.2018 - Jornal Público

"Para crescer o emprego, Portugal precisa de mais e melhor investimento produtivo. Não precisa de especuladores imobiliários ou foragidos à justiça internacional, travestidos de vistos “Gold”."
09.08.2018 - Post facebook

 

"Para crescer o emprego, Portugal precisa de uma legislação laboral mais equilibrada, que reconheça a dignidade a quem trabalha e que não pretenda uma desregulamentação desenfreada e terceiro-mundista."
07.08.2018 - Post facebook

 

Na legislação laboral falta repor a não caducidade das convenções coletivas. Sem isto, a parte dos rendimentos que é destinada aos trabalhadores continuará a diminuir face ao capital, rendas, dividendos, juros e afins…
27.07.2018 - Post facebook

 

As alterações que o Governo vai propor à legislação laboral, vão no sentido certo (redução da precariedade), mas pecam por pouca ambição.
25.07.2018 - Post facebook

 

O SNQTB, através da União dos Sindicatos Independentes, deu conhecimento das suas propostas de revisão ao Código de Trabalho à Presidente e ao Secretário Geral da UGT, bem como ao Secretário Geral da CGTP, apelando a que estas confederações sindicais pugnem pela aprovação das mesmas.
20.07.2018 - Post facebook

Sem espírito de corpo, sem determinação, não existem direitos sociais e políticos, nem uma classe média forte. 
Porque o Verão é sinónimo de férias, recomendo um par de leituras e alguns percursos culturais, qual companhia e alimento do intelecto. “Quem meteu a mão na Caixa” (Contraponto, Maio de 2018), da jornalista Helena Garrido, umas das mais experientes observadoras da realidade do sector bancário em Portugal. Com base em fontes públicas, e apenas estas, a autora deslinda como foi possível a Caixa Geral de Depósitos quase ter colapsado por sucessivas intervenções de pessoal político, pouco experiente e sabedor da coisa bancária. Estórias mirabolantes. O desrespeito pelos trabalhadores da Caixa e do seu saber e experiências. Leitura obrigatória para todos os cidadãos. Aqui se vê como alguns, alheios ao sector, têm vindo a fazer incidir sobre os bancários e os contribuintes, chamados a pagar com o seu posto de trabalho e os seus impostos, os desmandos desses personagens alienígenas ao sector financeiro. 
Se com a obra supracitada percebemos que as maleitas que alguns bancos padeceram foram alheios os bancários, com “O ataque aos milionários” (Esfera dos Livros, 2ed, Abril de 2015), o jornalista Pedro Jorge Castro mostra-nos, entre outras coisas, como de desenrolou o impressionante ataque às famílias dominantes da época (Champalimaud, Mello, Espírito Santo) e aos seus interesses económicos. Terá, quiçá, passado despercebido um outro aspecto, que me interessou sobremaneira: os bancários como uma classe combativa e reivindicativa, nos anos quentes pós-revolucionários. 
Claro que ninguém pode simpatizar com detenções arbitrárias, ou sem mandato judicial, como foi timbre nesse tempo, para citar apenas um dos aspectos menos salutares dos excessos cometidos. Mas ao ler os testemunhos dos sindicalistas bancários de 1975, transparece uma determinação, uma vontade de mudar e de corrigir assimetrias, que hoje encontramos em outros sectores profissionais: professores, médicos, enfermeiros, juízes, pilotos de aviação, entre outros. Talvez sem surpresa, aqueles que estão a conseguir recuperar alguns direitos e poder de compra, uns e outros tão maltratados durante a intervenção da troika. Sem espírito de corpo, sem determinação, não existem direitos sociais e políticos, nem uma classe média forte.
Em “Os vivos, o morto e o peixe frito” (Caminho, 2ª edição, 2014), o fabuloso escritor angolano, Ondjaki, prémio Saramago, dá-nos uma visão humorística da convivência da lusofonia em Lisboa, tendo como pretexto um jogo de futebol entre Angola e Portugal. Ou uma forma de nos recordar que tanto devemos aos emigrantes e imigrantes de que é feito Portugal. Isto é tanto mais importante quanto as pulsões nacionalistas parecem assolar a construção europeia. A inflexibilidade do euro, que impõe desvalorização de salários aos países do Sul da Europa como forma de ganhar capacidade concorrencial, e a recusa do estrangeiro, estão no cerne do risco de implosão da construção europeia. Construção europeia que tantos pensaram que seria eterna e sobre a qual assentou o “consenso social” português.
Entrementes, a Fundação Social Bancária promove, no dia 28 de Julho, uma visita à notável obra de arquitectura que é o Terminal de Cruzeiros de Leixões. E é parceira da Caminhada e Corrida do SAMS Quadros, em Belém, no dia 29 de Setembro. Duas actividades que sugiro aos leitores que reservem tempo na sua agenda. 
Finalmente, saúdo uma medida do Banco de Portugal, ao introduzir uma “recomendação” na forma como os bancos devem apreciar os riscos e a concessão de crédito à habitação. Pró-activo, inovador e muito profiláctico. Para o bem de todos. Doravante, talvez seja tempo de o Regulador olhar para a os créditos pessoais, instantâneos, por telefone e pela internet. Causa de miséria financeira nos EUA, e cuja filosofia e métodos estão a ser replicados neste cantinho à beira-mar plantado.

20.07.2018 - Jornal Económico

Os portugueses quando se reformam pela Segurança Social têm um fator de substituição de 80%; a maior parte dos bancários, tem de 50%...
17.07.2018 - Post facebook

 

O fator de substituição nas reformas dos Quadros e Técnicos Bancários é de cerca de 50%. Uma injustiça gritante, que urge corrigir.
15.07.2018 - Post facebook

 

Professores, pilotos, pessoal de voo, telecomunicações, energia, tantos exemplos onde a luta dos trabalhadores tem sido recompensada. Ainda faltam os bancários…
12.07.2018 - Post facebook

 

A combatividade e a persistência dos professores são um exemplo para a classe bancária. Quem não se resigna, alcança!
09.07.2018 - Post facebook

O CES precisa de se renovar, uma vez que na sua atual composição não engloba os sindicatos independentes nem algumas das franjas mais dinâmicas das empresas portuguesas. 
O frágil equilíbrio das relações de trabalho em Portugal foi quebrado com estrondo pela Troika entre 2011 e 2014. Num ápice, os aspectos menos salutares do código do trabalho foram realçados e novas disposições introduzidas, rompendo os equilíbrios e os consensos existentes, e reduzindo de forma dramática a relevância e o peso do Trabalho na distribuição de rendimentos, em favor de juros, dividendos, rendas, royalties, entre outras formas de remunerar o Capital.
Este desequilíbrio materializou-se, por exemplo, ao introduzir a caducidade das convenções colectivas e ao diminuir as indemnizações por despedimento, mas também ao ignorar o que todas as recessões têm mostrado em Portugal: o nível de emprego ajusta em baixa independentemente da legislação laboral. Este desequilíbrio materializou-se igualmente ao ignorar que os trabalhadores ‘maduros’ e a debilidade das empresas, mormente em termos de gestão, implicam que Portugal tenha um elevado desemprego estrutural entre as pessoas com mais de 45 anos. 
Partindo da premissa, errada, de que a legislação laboral portuguesa era inflexível, causadora de desemprego e desincentivadora de investimento, a Troika não encontrou no governo desse período uma disposição compenetrada, nem o suporte teórico, que lhe permitisse repelir um par de ideias perniciosas sobre uma alegada rigidez das leis laborais.

06.07.2018 - Jornal Económico

Como pode o Governo dizer que quer proteger o interior do país da desertificação e do abandono, ao mesmo tempo que permite na CGD uma gestão integralmente focada nos resultados operacionais e ignorando por completo as suas responsabilidades particulares?
06.07.2018 - Post facebook

 

Bruxelas impôs os famosos ‘remédios’, entre eles o encerramento de balcões, mas não disse quais teriam de ser encerrados. A decisão tem vindo a ser tomada pela administração da CGD sob o olhar tolerante do acionista Estado.
05.07.2018 - Post facebook

 

Durante muitos anos, diversos intervenientes apresentaram inúmeros argumentos em defesa da manutenção da CGD na esfera pública e, por consequência, contra a sua privatização. A CGD, por exemplo, era um instrumento que contribuía, através da sua rede de balcões, para a coesão territorial, prestando especial atenção ao interior do país.
03.07.2018 - Post facebook

 

É certo que o atual Governo, como qualquer outro, teria seguramente preferido evitar decisões que lhe criassem dificuldades junto da opinião pública, em todo o caso não é de todo seguro que as suas prioridades tenham sido as mais corretas, ou que, no meio de solicitações várias, tenha feito tudo o que estava ao seu alcance para conseguir um acordo melhor.
Independentemente disso podemos questionar para que serve uma CGD pública se os critérios de gestão são estritamente privados. O que diferencia hoje em dia a CGD, em termos de prioridades, de qualquer outro banco privado a operar no mercado bancário português? 
01.07.2018 - Post facebook

 

Até maio deste ano, saíram quase 350 trabalhadores da CGD à luz do plano de reformas e ao abrigo do processo de reestruturação em curso. Sabemos que todo este processo decorre da reestruturação negociada em Bruxelas. Os detalhes, porém, não são públicos, uma vez que a opacidade que caracterizou o processo não permite conhecer os pormenores da negociação.
29.06.2018 - Post facebook

Estamos perante um clássico: ao cidadão nenhuma falha é tolerada nas suas obrigações perante as Finanças e a Segurança Social. Ao menor lapso, o cidadão já sabe que a coima é garantida. O contrário, porém, quase sempre não é verdade. Regra geral, ao Estado é permitido o que não é ao cidadão, sem que daí decorra qualquer tipo de sanção.
Estarei a exagerar um pouco, porventura, mas vem isto a propósito do que se está a passar na Segurança Social por estes dias, em que as respostas aos pedidos de pensões chegam a demorar, nalguns casos, sete longos meses. 
Os atrasos são um facto impossível de escamotear e o próprio ministro do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social já reconheceu que o tempo médio entre a entrada do requerimento da pensão e a sua atribuição é “excessivo”. Daí, aliás, a sua decisão de reforçar a Segurança Social com mais 200 trabalhadores, sendo que a maior parte vai ser canalizada precisamente para o Centro Nacional de Pensões. 
É certo que estes atrasos são transversais a todos os pedidos de reforma e não afectam apenas os bancários. Infelizmente, no caso dos bancários aos atrasos gerais acrescem problemas adicionais que agravam ainda mais a demora na atribuição e pagamento das pensões pela Segurança Social. Tal é o caso das pensões dos antigos trabalhadores do BANIF. Tenho conhecimento de diversos casos de trabalhadores a quem foi recusada a atribuição de pensão de reforma. Uma recusa que decorre unicamente do desconhecimento da lei pelos funcionários da Segurança Social quanto ao novo regime aprovado em 2017. Problemas que se repetem no caso dos trabalhadores do antigo BPN, cujo regime legal específico tem vindo a gerar agravada demora na resposta por parte da Segurança Social. 
Os problemas específicos dos bancários não se ficam por aqui. Importa ainda salientar o facto de o subsídio de doença, pago pelas respectivas Instituições de Crédito, ser tributado em sede IRS, ao contrário do que sucede quanto aos subsídios de doença recebidos pelos restantes trabalhadores por conta de outrem. Dois pesos e duas medidas porquê?
Por último, mas não em último, queria ainda alertar que o simulador de pensões de reforma, recentemente disponibilizado pela Segurança Social, induz em erro os bancários e ex-bancários quanto às pensões a receber futuramente. Por manifesta inadequação face à realidade concreta dos bancários, tendo em conta o seu regime específico previdencial, o simulador indica uma pensão inflacionada face à que efectivamente virá a ser recebida.
Por tudo isto, dirigi uma carta ao senhor ministro Vieira da Silva alertando para estes problemas e para a necessidade de uma urgente e justa resolução. Enderecei igualmente uma carta à Comissão de Trabalho e Segurança Social solicitando uma audiência de modo a que seja também possível dar conhecimento ao Parlamento do acima exposto. O Estado é suposto ser uma pessoa bem na sua relação com os cidadãos. É apenas isso que quero e é para isso que darei sempre que possível o meu contributo.

08.06.2018 - Jornal Económico

Fusões são confusões”, diz e bem o ditado. Na banca ou nos sindicatos, em quase todo o lado. São também uma forma eficaz de destruir valor para trabalhadores, acionistas, e parceiros. E, geralmente, de beneficiarem apenas grupos de interesses (partidos e capital estrangeiro) em detrimento de clientes e trabalhadores.
30.05.2018 - Post facebook

 

Aumentos per capita superiores a 60% para a administração do BCP. E zero para os trabalhadores?!!! Era só o que faltava! 
29.05.2018 - Post facebook

 

No Acordo de Empresa, o Banco de Portugal queria impor o pior dos dois mundos: trabalhadores ora bancários ora funcionários públicos, de acordo com o critério de “mais barato e menos direitos”. 
28.05.2018 - Post facebook

 

O Banco de Portugal queria impor um Acordo de Empresa que mais não era que o mero Acordo de SAMS. Algo bizarro, que foi aceite pacificamente por um outro grande sindicato, mas em que o SNQTB não se revê.
27.05.2018 - Post facebook

 

Estamos atentos e temos posição sobre cada uma das propostas que a administração do BCP vai levar à assembleia-geral.
26.05.2018 - Post facebook

 

22 bancos em Portugal, a maior parte dos quais nunca ouvimos falar, praticam ‘dumping social’ ao não beneficiarem os seus trabalhadores com um Acordo Coletivo de Trabalho ou de um Acordo de Empresa.
25.05.2018 - Post facebook

Infelizmente, pessoas com elevadas responsabilidades parecem não descortinar nada mais que os seus pequenos interesses egoístas de curto prazo. 
Começo por recordar alguns pontos importantes sobre a vida recente do BCP. Estamos a falar de um banco de referência, com elevados padrões de inovação, excelente serviço a clientes e ética de trabalho, que quase entrou em colapso pela entrada de gestores que, por ganância e impreparação, se comportaram quais aves de rapina. 
Um banco que, fruto de um imenso profissionalismo e sacrifício dos trabalhadores, com cortes salariais, congelamento de carreiras e massivas rescisões de contrato de trabalho, a lealdade dos clientes, o empenho dos contribuintes que o financiaram através de empréstimos do Estado, a resiliência de alguns accionistas que acreditaram na recuperação, e uma gestão focada e preparada, elevaram novamente o BCP a uma posição de liderança e de referência. 
Em suma, quando os trabalhadores, os contribuintes, os clientes, os accionistas e os gestores perseguem um interesse comum temos uma receita de sucesso. E para isso é fundamental um elevado sentido ético, padrões morais irrepreensíveis, proporcionalidade nas decisões e empatia para com os outros. Estas são condições sine qua non para o exercício frutuoso de qualquer alto cargo de elevada responsabilidade. Aliás, como a história demonstra, a sua ausência destrói empresas e instituições que foram dominantes ou referências nos mercados. 
Infelizmente, as mais recentes decisões da administração executiva do BCP parecem confirmar que esta nada aprendeu com a história ou com o passado recente. Os aumentos per capita, em causa própria, superiores a 60%, enquanto tem os salários dos trabalhadores congelados e, pior ainda, enquanto não distribui dividendos nem devolve aos trabalhadores os ‘valores retidos’ aquando da redução temporária de vencimentos, correspondem a um perigoso desrespeito pelo bem comum. 
Qual cereja em cima do bolo, a administração executiva do BCP propõe uma dotação extraordinária para os fundos de pensões dos administradores de 612 mil euros por cada membro da equipa cessante, sem que tal generosidade tenha sido aplicada aos trabalhadores. 
Ora, com comportamentos tão desprovidos de sentido ético e de razoabilidade, os inimigos de uma sociedade aberta e plural esfregam as mãos de contentamento, uma vez que os mesmos propiciam terreno fértil à propagação da sua mensagem. 
Perante atitudes destas, sem qualquer razoabilidade, os extremistas que procuram destruir o consenso social e a classe média para implantarem uma ‘nova ordem’ mundial, sejam eles adeptos dos “amanhãs que cantam”, especuladores financeiros, ou offshores sem rosto, não precisam de se esforçar muito.
Infelizmente, pessoas com elevadas responsabilidades parecem não descortinar nada mais que os seus pequenos interesses egoístas de curto prazo. Em todo o caso, ainda vamos a tempo de nos indignarmos. A assembleia-geral de accionistas do BCP vai ser confrontada com as suas responsabilidades.

25.05.2018 - Jornal Económico

As isenções de horário de trabalho foram concedidas a muitos bancários como verdadeiros aumentos, promoções ou forma de fidelização laboral. Vir agora, 10 ou 15 anos depois da sua atribuição, ameaçar ou efetivar a sua retirada, é uma vergonha para os bancos que estão a tentar fazê-lo.
24.05.2018 - Post facebook

Importa conhecer os grandes devedores em incumprimento na banca, e especialmente quem são os beneficiários efetivos por detrás desses grandes devedores.
23.05.2018 - Post facebook

 

Tenho a certeza que a assembleia-geral de acionistas do BCP será muito participada. Muito mesmo.
22.05.2018 - Post facebook

 

A divulgação de listas dos grandes devedores em incumprimento em todos os bancos que receberam ajuda estatal, ou são do Estado, é uma questão da mais elementar transparência.
21.05.2018 - Post facebook

 

O reforço do fundo de pensões de contribuição definida da administração ocorre em simultâneo ao congelamento do fundo equivalente de pensões dos trabalhadores. Uns beneficiam de 4,9 milhões para 8 administradores executivos (612.500 euros por administrador), os outros (os trabalhadores), nada…
19.05.2018 - Post facebook

 

Alargamento do diferencial entre um trabalhador médio e um administrador executivo médio no BCP aproxima-se de um padrão terceiro-mundista. Em 2012 um administrador executivo auferia 576% mais que um trabalhador médio… agora aufere 982% mais…
18.05.2018 - Post facebook

 

Esta devolução dos cortes às remunerações dos trabalhadores então no ativo, não deve discriminar quem entretanto se tenha reformado.
17.05.2018 - Post facebook

 

Não devolução dos cortes efetuados aos trabalhadores, numa altura em que o BCP regressa aos lucros e a administração se premeia a si própria, torna-se moralmente insuportável.
16.05.2018 - Post facebook

 

Desde março que aguardamos a resposta do BCP ao nosso pedido de reunião para discutir a atualização salarial dos trabalhadores. Talvez estivessem demasiado atarefados a calcular os seus próprios aumentos…
15.05.2018 - Post facebook

 

Os salários da administração do BCP haviam sido cortados em 22%, aquando do período de ajuda estatal. Mas o aumento agora auto-atribuído foi, per capita, superior a 60% ... isto é … três vezes mais!
14.05.2018 - Post facebook

 

Aumento obsceno das remunerações da administração do BCP, enquanto os salários dos trabalhadores estão congelados há vários anos.
13.05.2018 - Post facebook

 

Em 9 de Junho faremos 35 anos enquanto sindicato livre e independente! Contra ventos e marés, o nosso muito obrigado aos milhares de sócios que tornam isto possível!
13.05.2018 - Post facebook

No espaço de poucos dias, surgiram duas notícias na comunicação social sobre as remunerações dos administradores do BCP. A primeira oriunda do relatório de contas, divulgado pela CMVM na segunda quinzena de Abril, que veio confirmar publicamente que a equipa de Nuno Amado auferiu em 2017 uma remuneração total bruta de quase 3,8 milhões de euros, o que representa face aos números de 2016 uma subida de quase 82%. 
A segunda notícia, publicada esta semana, dá conta da intenção do conselho de remunerações do BCP de levar à assembleia-geral, que terá lugar no próximo dia 30 de Maio, uma proposta para o pagamento extraordinário de 4,9 milhões de euros para os fundos de pensões dos actuais administradores executivos.
Naturalmente, registo com agrado a preocupação existente com a necessidade de remunerar justamente os administradores do BCP e a sensibilidade demonstrada no sentido de corrigir eventuais discrepâncias e distorções nas remunerações. 
Não vou aqui reflectir sobre esta décalage que se verifica entre as remunerações dos administradores e as dos trabalhadores. Nem vou também reflectir sobre o hiato temporal existente entre esta política de imediata remuneração dos administradores e o pagamento de dividendos que apenas começará em 2019, ou no distante ano de 2020. Um e outro são temas que por si só merecem espaço próprio noutros artigos. 
Mas não posso deixar de valorizar e registar o optimismo visível nesta política de remunerações e o que dela transparece quanto às perspectivas presentes e futuras. Manifestamente, depois de um período muito difícil, que obrigou, aliás, a instituição a ter de recorrer às famosas obrigações de conversão contingente (CoCos), o BCP parece viver dias de normalidade e de até de abundância. Não por acaso, certamente, a proposta para o pagamento extraordinário de 4,9 milhões de euros para os fundos de pensões dos actuais administradores executivos surge depois de a instituição divulgar que lucrou mais de 85 milhões de euros no primeiro trimestre, uma subida homóloga de 70%. 
Ora, perante tanto optimismo, parece-me ser da mais elementar justiça que a bonança inclua também aos trabalhadores. Por isso mesmo, o tema será certamente levantado na próxima assembleia-geral, de modo a incluir também o Fundo Complementar de Pensões dos trabalhadores, na medida em que todos devem beneficiar dos tempos de bonança. 
Mais do que os administradores, existem motivos acrescidos para recompensar os trabalhadores. Foram eles quem, em primeira instância e muito antes da actual administração entrar em funções, esteve sempre na linha da frente a dar a cara pela instituição e a defender a imagem e os interesses do BCP. Por isso, não há motivo algum para os administradores terem um tratamento diferenciado e privilegiado face aos restantes trabalhadores. 
Haja, portanto, sentido de justiça, de equidade e, sobretudo, bom senso, de modo a preservar a paz social e laboral no seio da instituição, uma realidade que apenas será mantida com o devido respeito por todos os intervenientes.

11.05.2018 - Jornal Eco

Somos um sindicato independente, que pensa pela sua cabeça. Sem subserviências a terceiros, sejam eles poderes políticos, empresariais ou associações mais ou menos secretas. Somos independentes com orgulho!
11.05.2018 - Post facebook

O desinteresse aparente pelos direitos dos trabalhadores contrasta com a preocupação de Francisco de Lacerda com a remuneração dos acionistas. 
Foi em Março de 2016 que o Banco CTT inaugurou os seus primeiros 52 balcões, aproveitando os espaços existentes nos correios nacionais. Dois anos depois, chegou aos 300 mil clientes, tem 255 mil contas de depósitos à ordem e está presente em 211 espaços. 
Segundo uma nota de research publicada pela CaixaBI, é do Banco CTT, no médio prazo, que poderá vir a maior mudança no perfil de negócio da empresa. E é o Banco CTT que poderá vir a ser a principal alavanca para que a empresa aumente o desempenho operacional e suporte a remuneração aos accionistas. 
Curiosamente, dois anos depois, apesar da história de sucesso e das expectativas elevadas depositadas no Banco CTT, os trabalhadores continuam sem beneficiar de um acordo colectivo de trabalho que clarifique as suas carreiras, ou mesmo de um acordo de empresa. Apesar de convidada em devido tempo a abrir negociações para o efeito, a administração dos CTT, liderada por Francisco de Lacerda, tem empurrado, de forma algo sobranceira, o assunto com a barriga. 
Um desinteresse aparente pelos direitos dos trabalhadores que contrasta com a preocupação de Francisco de Lacerda com a remuneração dos accionistas. Desde a sua privatização, entre 2013 e 2014, os CTT têm vindo a remunerar generosamente quem neles investiu. No final do processo de privatização, o Estado encaixou cerca de 909 milhões de euros. Ora, nesta altura, os accionistas já receberam em dividendos cerca de 329 milhões de euros. A preocupação de Francisco de Lacerda com os accionistas é tanta que nos últimos anos tem distribuído dividendos acima dos lucros registados. Em 2017, a situação atingiu o limiar do escândalo com uma distribuição de dividendos que foi duas vezes superior aos lucros, i.e. um payout de 209%. 
É verdade que os CTT já fizeram saber que vão regressar a uma política de remuneração accionista mais equilibrada e, por isso, baseada numa percentagem do resultado líquido gerado anualmente. Em todo o caso, importa que o regulador esteja atento perante sinais de aparente descapitalização da empresa.
Sejamos claros, os CTT, por iniciativa própria da sua administração ou por discreta intervenção das autoridades de supervisão, têm também de assegurar uma política de reinvestimento dos lucros e não apenas a remuneração prioritária dos accionistas. 
Nestes últimos anos, os trabalhadores, nomeadamente os do Banco CTT, têm sido o elo mais fraco na hierarquia das prioridades de Francisco de Lacerda. Esta ordenação das prioridades, de forma tão assimétrica, estará mais próxima do modelo capitalista norte-americano, mas não seguramente da cultura europeia que privilegia outro tipo de equilíbrio entre os interesses dos trabalhadores e dos accionistas.
Por isso, ou também por isso, é inadmissível que os trabalhadores do Banco CTT continuem ainda hoje sem ter as suas carreiras devidamente clarificadas. Dirão alguns leitores que estarei a ser demasiado duro. Talvez assim seja. Compete a Francisco de Lacerda provar que estou errado.

11.05.2018 - Jornal Económico

O SNQTB tem como ADN a presença e a proximidade junto dos sócios. Continuarei a visitar, um após outro, os locais de trabalho dos bancários.
10.05.2018 - Post facebook

 

A Ótica SAMS Quadros vai servir todos os bancários, sem discriminação. Num novo paradigma na assistência médica-social dos bancários e seus familiares.
09.05.2018 - Post facebook

 

Atualização salarial sobre a Remuneração mensal efetiva. É isso que vamos levar como proposta aos bancos. De pouco serve apenas atualizar as tabelas dos níveis.
07.05.2018 - Post facebook

 

O SNQTB quadriplicou o valor do Fundo de Greve, tendo agora mais de 8 milhões de euros destinados a esta forma de luta.
29.04.2018 - Post facebook

 

A greve é um último recurso, mas é um recurso legítimo, moral e legalmente.
29.04.2018 - Post facebook

Nos próximos anos, espera-se a continuação da melhoria de resultados, para os quais contribuirá a diminuição de imparidades e o aumento da margem e do produto bancário. 
O cenário macroeconómico previsto no Orçamento do Estado deste ano assenta no pressuposto de que a nossa economia continuará numa trajectória de crescimento em torno dos 2% e com uma inflação a rondar os 1,5%. 
Não é ainda uma trajectória com a escala de que necessitamos, mas, em todo o caso, estamos perante um contexto favorável para a economia, incluindo para a banca. Ora, relativamente ao sector bancário, é evidente que após uma forte reestruturação do sector, as instituições de crédito estão a regressar à obtenção de bons resultados.
De um modo geral, hoje temos uma melhor qualidade dos activos, alcançada através de um esforço de redução de crédito não produtivo; assistimos a um aumento do stock de crédito e dos recursos totais de clientes; e, em geral, deparamo-nos com uma melhoria dos resultados e das rendibilidades nos principais bancos.
Nos próximos anos, espera-se a continuação da melhoria de resultados, para os quais contribuirá a diminuição de imparidades e o aumento da margem e do produto bancário, dando continuidade à actual trajectória ascendente. Os principais bancos estimam obter rendibilidades dos capitais próprios superiores às actuais, numa altura em que já registam uma evolução bastante positiva face aos anos anteriores. 
Neste contexto, urge também encetar um plano de recuperação de rendimentos, assente em várias componentes, para os trabalhadores da banca. A primeira será um aumento mínimo de 1,5% sobre a remuneração mensal efectiva, de modo a compensar em parte a perda de rendimento, dado que no período entre 2011 e 2017 se registou uma inflação acumulada de cerca de 9%, sendo que o aumento das tabelas base salariais foi de apenas 1,5%.
A segunda componente terá natureza variável. É o equivalente a uma cláusula de boa fortuna que dependerá dos resultados do banco: mais 0,25% se o ROE for positivo; mais 0,25% se o ROE for superior ao do ano anterior; mais 0,5% se o ROA for positivo e superior ao ano anterior. Cumulativamente, no caso de o ROE ser igual ou superior a 5%, mais 0,75%, e no caso de o ROA ser igual ou superior a 1%, mais 0,75%. 
A terceira visa aproximar as tabelas de reforma às tabelas salariais, dado que os quadros bancários são muito penalizados na parte da reforma relativa à carreira contributiva anterior a 2011. Urge, por isso, aumentar de forma gradual os valores das pensões até que igualem a tabela base salarial para cada nível, num processo que deverá ocorrer num período máximo de cinco anos.
Creio que se trata de uma proposta razoável, sobretudo se as administrações bancárias tiverem uma visão de negócio moderna e que não se limita a olhar para os seus trabalhadores como um custo inevitável e indesejável. Ninguém mais do que os bancários deseja que as suas instituições de crédito tenham êxito. Importa, por isso, fazer reflectir nas suas remunerações essa ambição e esse espírito de corpo.
27.04.2018 - Jornal Económico

A Isenção de Horário de Trabalho é uma componente da retribuição de muitos bancários que tem uma natureza permanente e não circunstancial.
19.04.2018 - Post facebook

Quem se opõe à recuperação de rendimentos pelos bancários? A divisão negocial é um erro que, a persistir, será pago pelos bancários. Um erro que alguns não percebem, ou fingem não perceber, bem instalados que estão na sua zona de conforto.
As Instituições de Crédito em Portugal vivem dias de bonança sem igual no passado recente. Assim, em nome da justiça social e em sintonia com esta nova fase, chegou a hora de dar início a um plano de recuperação de rendimentos pelos bancários. Por isso, é fundamental que todas as forças sindicais no sector se juntem numa mesa negocial única. Ora, nesta altura, quatro forças sindicais, num total de sete, estão já alinhadas à luz desta estratégia negocial. Três sindicatos, porém, persistem na vertigem suicida e improdutiva da negociação isolada. 
Essas forças sindicais, que insistem de forma infantil em não integrar uma mesa negocial única que permita dar início ao processo de recuperação de rendimentos, terão solicitado um aumento sobre as tabelas de níveis remuneratórios de 3% e recebido como resposta, por parte da Associação Portuguesa de Bancos, uma contraproposta de aumento de 0,4%…!
Eis os resultados de uma estratégia sectária e divisionista, ignorando as vantagens da constituição de uma única frente negocial. Naturalmente, os bancários não compreendem e não se revêem em comportamentos estéreis de matriz isolacionista. Opções desta natureza até poderiam ter tido sentido num passado distante, mas são um anacronismo no presente.
Os sindicatos devem ser independentes de todos os poderes. Por isso, não tem qualquer sentido que um partido político inste os seus militantes a filiarem-se em sindicatos, numa estratégia que aliás só pode ser entendida como um instrumento de tomada do poder sindical. 
É neste caldo de cultura de fronteiras nem sempre muito claras, de sindicalistas sem obra, sem reconhecimento profissional, que encontramos os isolacionismos e a recusa em concertar esforços. É aqui que encontramos uma incapacidade em partilhar visões estratégicas e formas de organização comuns aos vários sindicatos que permitam dar início ao processo de recuperação de rendimentos. 
Há estruturas sindicais que parecem não perceber a realidade moderna. Algo compreensível, de certo modo, tendo em conta que existem dirigentes sindicais cuja autoridade não decorre do seu currículo, do seu exercício profissional, do seu domínio técnico, cultural ou científico. Tudo o que têm para exibir são lustros ou décadas de sindicalismo. Que legitimidade ética tem alguém para representar os trabalhadores quando há duas décadas não exerce a profissão? Que trabalhadores se sentirão representados por estes dirigentes desfasados da realidade?
A divisão negocial é um erro que, a persistir, será pago pelos bancários. Um erro que alguns não percebem, ou fingem não perceber, bem instalados que estão na sua zona de conforto. Não deixa de ser irónico e triste que o principal obstáculo a uma política de recuperação de rendimentos esteja na incapacidade de algumas forças sindicais de sair das suas trincheiras. 
Ainda estão a tempo, em todo o caso, assim haja vontade de pensar, antes de tudo, nos bancários.

02.03.2018 - Jornal Económico

O SNQTB defende uma plataforma negocial conjunta, em que os diferentes sindicatos democráticos cooperem estrategicamente com vista a salvaguardarem os interesses dos bancários. No mês passado, em nome do Sindicato Nacional dos Quadros e Técnicos Bancários (SNQTB), o maior sindicato de trabalhadores bancários no activo, propus ao SBSI, ao SBC e ao SBN que, no âmbito da renegociação do Acordo Colectivo de Trabalho para 2018, se reunissem todas as forças sindicais numa única mesa negocial.
A minha proposta teve como objectivo reforçar a posição dos sindicatos e dos seus desígnios junto das Instituições de Crédito, mas até ao momento a resposta dos restantes sindicatos do sector foi um estranho e incompreensível silêncio formal. 
Há décadas que a Federação de Sindicatos Independentes da Banca (FESIBA), da qual faz parte o SNQTB, e a Federação do Sector Financeiro (FEBASE), em que SBSI, SBC e SBN estão integrados, partem para as negociações com as Instituições de Crédito de forma separada. 
O resultado desta incapacidade estratégica, desta ausência de um diálogo produtivo entre sindicatos do mesmo sector, que permita uma posição negocial única, tem vindo a gerar, ciclo negocial após ciclo negocial, apenas um resultado: ganham os bancos e perdem os bancários. 
A minha recente proposta pretende, precisamente, alterar a relação de forças negocial entre bancos e bancários. Afinal, como lembra a sabedoria popular, a união faz a força. 
Que fique bem claro: o SNQTB não pretende com esta proposta de mesa negocial única preparar uma antecâmara rumo a uma fusão de estruturas sindicais. Se é essa a preocupação de alguns, pois que fiquem tranquilos. O SNQTB é totalmente contra tudo o que seja monopólio: partido único, sindicato único, fornecedores únicos de telecomunicações ou de energia, para dar apenas alguns exemplos.
Porém, o SNQTB é absoluta e totalmente a favor de uma plataforma negocial conjunta, em que os diferentes sindicatos democráticos cooperem estrategicamente com vista a salvaguardarem os interesses dos bancários.
Regresso ao início: a minha recente proposta aos restantes sindicatos no sector, visou tomar a iniciativa no sentido de uma conjugação de esforços que possibilite uma posição única na renegociação do ACT, e que permita reforçar a posição dos sindicatos e os seus propósitos junto das Instituições de Crédito.
O SNQTB não pode obrigar terceiros a adoptar uma posição negocial conjunta que favoreça a relação de poder a favor dos sindicatos. No entanto, importa que fique claro que quem inviabilizar uma posição negocial conjunta terá de explicar aos seus associados, e aos bancários em geral, por que motivo preferiu manter um status quo negocial do qual apenas beneficiam as Instituições de Crédito.
Termine como terminar este processo, o SNQTB sairá de consciência tranquila, sabendo que tudo fez para salvaguardar os interesses dos bancários e dos seus associados em particular, eles que são, afinal, a grande razão de ser da sua existência.

02.02.2018 - Jornal Económico

Confesso que me encheu de esperança o facto de o ministro das Finanças, Fernando Medina, ter anunciado que as empresas do setor empresarial do Estado teriam de atualizar as remunerações dos seus trabalhadores em 5,1%.

 

Em primeiro lugar, porque a concretizar-se esse valor se situa no intervalo, ainda que inferior, para as previsões da inflação para o ano de 2023; em segundo lugar porque transmite um potente sinal para as empresas e entidades do setor privado e social; e em terceiro porque significaria que não se continuaria o ciclo de empobrecimento dos trabalhadores e das famílias portuguesas.

 

Porém, ao mesmo tempo, e em sinal contrário, o Governo anunciou mais um apoio extraordinário. Desta vez trata-se de 240 euros para cerca de um milhão de famílias. Por princípio, nada tenho contra apoios do Estado a quem mais precisa. Mas esta decisão, contra tudo o que tem vindo a ser repetido, banaliza o que deveria ser extraordinário e não ataca as raízes do problema. E as causas profundas são os salários demasiado baixos que empurram os trabalhadores para situações onde a igualdade de oportunidades é uma miragem.

 

Em Portugal precisamos que as multinacionais digitais, os reformados e os expatriados estrangeiros paguem aqui os seus impostos, no primeiro caso em função do valor acrescentado que obtêm a partir do mercado português, e nos outros que paguem não abaixo da fiscalidade de um cidadão médio português.

 

Além disso, precisamos de parar a enxurrada de jovens portugueses que emigram. Necessitamos de atuar sobre as políticas públicas, promovendo uma fiscalidade amiga da natalidade e do investimento que cria emprego. E urge dinamizar a contratação coletiva. Estes três vetores são chave para o crescimento sustentado e equilibrado dos salários.

 

Não precisamos de mais palavreado sobre nómadas digitais e quejandos. Precisamos, isso sim, de jovens que queiram trabalhar e estabelecer família em Portugal.

 

Reforçar a contratação coletiva e os sindicatos são peças decisivas, se quisermos melhores salários e que os nossos filhos e netos encontrem oportunidades profissionais dignas em Portugal. Aqui, como em qualquer outro país civilizado e democrático, a realidade é insofismável: as maiores taxas de sindicalização correspondem a melhores salários e melhores políticas remuneratórias.

 

Contudo, reforçar a contratação coletiva não tem nada a ver com anúncios de fachada, de pretensos acordos de rendimentos celebrados a um domingo entre o Governo e certos parceiros sociais.

 

Reforçar a contratação coletiva tem que ver com uma política de valorização salarial para os corpos técnicos do funcionalismo público e com o retomar dos investimentos que a valorizam, como seja o reforço dos meios financeiros sindicais, a reintrodução do princípio do tratamento mais favorável para os trabalhadores, numa moratória de uma década nas denúncias e caducidades unilaterais e a possibilidade de impugnação de despedimento coletivo mesmo tendo recebido a indemnização legal.

 

Tudo o resto é folclore para enganar néscios.

 

23.12.2022 - Jornal Económico

O futuro do Sistema Nacional de Saúde (SNS), que fique muito claro, interessa a todos os portugueses, mesmo aqueles que são beneficiários de um subsistema de saúde complementar, ou que têm um seguro de saúde de coberturas e capitais generosos. Interessa a todos nós porque é um tema de cidadania e de boa aplicação dos nossos impostos, mas também porque, no caso dos grandes riscos assimétricos para os quais as famílias e os subsistemas têm recursos limitados para lhes fazer face, só o Estado lhes pode responder. Estou a pensar, por exemplo, nas pandemias, doenças oncológicas e degenerativas, ou nas doenças crónicas agudas.

 

Como se depreende, é muito importante que consigamos ver para além da pontual saturação das urgências, ou da substituição das administrações hospitalares.

 

Verdadeiramente importante é que nos concentremos em resolver os desafios que se colocam no âmbito dos gestores do SNS, dos médicos de família e na articulação dos cuidados primários com cuidados continuados ou sociais. Passo a explicar.

 

Diversos estudos feitos no âmbito do NHS, no Reino Unido, onde o nosso SNS foi beber a sua inspiração, mostram à saciedade que os gestores hospitalares e dos centros de saúde sofrem de níveis de stresse, de horários, de cargas de trabalho absurdas e de prazos de entrega exíguos, típicos de profissões como os consultores de gestão, ou certas posições no sector das tecnologias de informação. Estes profissionais assumem níveis de responsabilidade, tanto orçamental como de impacto sobre as pessoas, que em nada são inferiores aos de um gestor de topo de uma qualquer organização do sector privado ou social.

 

Porém, não auferem das remunerações, nem dos instrumentos de gestão, ao dispor dos consultores, dos diretores-gerais ou dos administradores executivos do sector privado. Por isso, cuidar dos gestores intermédios, na linha da frente dos cuidados primários ou emergenciais, deve ser condição primeira de qualquer governante. Urge rever as suas remunerações, a autonomia, as carreiras e os instrumentos de premiação. Não é preciso inovar, numa primeira fase. Basta replicar o que de bom se observou nas PPP da saúde em Portugal e que foram terminadas sem que a sua substituição tenha produzido melhores ou mais eficientes resultados.

 

Por outro lado, não existe um SNS ou subsistemas de saúde saudáveis sem se resolver o problema da falta de médicos de medicina geral e familiar. Isto dito, estes terão de ter carreiras que lhes possibilitem tempo para investigação, acesso a práticas diferenciadas e inovadoras, horários flexíveis para conciliarem o trabalho com a família, níveis de remuneração que possibilitem medir e estimular a produção e compensar a dedicação. Concursos desertos na especialidade, ou USF de tipo B e C que tardam em se generalizar, são sinais de um problema que se agrava, ano após ano. Precisamos de mais pragmatismo e de menos dogma.

 

Uma nota final sobre as urgências e as unidades de cuidados intensivos. Todos sabemos que estão cheias de cidadãos idosos, muitos dos quais não têm para onde ir em caso de alta hospitalar. O Estado tem de investir no sector social para que se fortaleça uma rede de cuidados continuados de assistência ou paliativos, e tem também de investir em unidades residenciais e no apoio domiciliar. A integração dos cuidados primários com os cuidados sociais é vital para poupar recursos e dar acrescido bem-estar aos cidadãos. O internamento hospitalar prolongado, não sendo necessário, é a mais cara e mais desumana forma de cuidado social que podemos dispensar aos idosos.

 

Em suma, as prioridades são muito simples: autonomia acrescida para os gestores, mais médicos de família e integração dos cuidados primários com os cuidados sociais. O resto, perdoem-me a franqueza, é espuma.

 

Jornal Económico - 09.12.2022

Um dos princípios basilares em que assenta a democracia liberal é o da igualdade. Por isso, o artigo 13º da Constituição estabelece que todos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei. Mais claro não poderia ser.

 

Levanto esta questão a propósito do Decreto-Lei nº 57-C/2022, de 6 de setembro, que teve como propósito mitigar os efeitos da inflação no poder de compra dos reformados e pensionistas, pagando um complemento extraordinário de meia mensalidade.

 

Medida que não posso deixar de saudar, tendo em conta os impactos da inflação sobre o bem-estar das famílias e dos trabalhadores. Sem um esforço legislativo e uma liderança política determinada, os portugueses poderão ser confrontados com uma tempestade perfeita, no âmbito da qual terão a maior perda de poder de compra dos últimos 70 anos.

 

Naturalmente, merece o meu elogio qualquer medida que, com equilíbrio e proporcionalidade, vise mitigar o brutal aumento que as famílias sentem nos preços de energia, combustíveis, cuidados de saúde e alimentação. Muito haveria de dizer sobre o oportunismo de grandes empresas em aumentar os seus preços, de forma desmesurada neste contexto, ou sobre o enquadramento legislativo que fragiliza a negociação coletiva.

 

Isto dito, conquanto sempre do lado de quem pensa nas pessoas e tem na pessoa humana, e na sua dignidade, o cerne da sua atuação política, não posso deixar de deplorar que o supracitado decreto-lei viole de forma tão flagrante o princípio da igualdade, separando portugueses e ostracizando cerca de 50 mil bancários reformados.

 

É para mim claro que a redação do supracitado decreto-lei feriu o princípio da igualdade, discriminando os bancários reformados, e outras classes sociais a quem o Estado Novo impôs um modelo de previdência e que a democracia não conseguiu integrar em tempo útil na Segurança Social.

 

Por essa razão, o meu sindicato escreveu ao primeiro-ministro, pediu audiências aos grupos parlamentares, solicitou um parecer a reputado constitucionalista e solicitou aos grupos parlamentares que indagassem o Governo e fizessem propostas de alteração do decreto-lei em sede de propostas para o Orçamento do Estado.

 

Infelizmente, o tema não tem tido na comunicação social a atenção que merece, nomeadamente entre os colunistas. O Dr. Luís Marques Mendes foi a exceção, por agora, a quem agradeço o serviço cívico que prestou e a sensibilidade social demonstrada.

 

Com ou sem a devida atenção, este assunto continuará a merecer a minha atenção e energia. Por isso, estive reunido recentemente com o gabinete do primeiro-ministro, a quem salientei o facto de se estar perante uma violação do princípio da igualdade e a quem fiz notar que se trata de uma questão sem grande expressão material para o Estado.

 

Porque é uma questão de justiça; porque a igualdade é uma pedra basilar da democracia; porque é fácil e de baixíssimo impacto material, continuarei a pugnar para que esta discriminação seja corrigida. Porque o que acontece hoje aos reformados bancários pode acontecer a qualquer um. A qualquer um dos leitores. Em todo e qualquer contexto.

 

25.11.2022 - Jornal Económico

Um dos temas mais relevantes na gestão das sociedades, das instituições, ou das empresas, é a necessidade de os decisores, sejam eles políticos ou gestores, dedicarem algum do seu tempo a calçarem, em sentido figurado, os sapatos dos seus clientes, trabalhadores ou eleitores.

 

Não é por acaso que retalhistas, companhias aéreas, cadeias de comida rápida, para citar apenas alguns exemplos, têm programas que colocam, regularmente, os seus gestores e executivos em atendimento direto e presencial aos clientes.

 

É unânime notar que representa uma mais-valia perceber o que pensam os clientes, quais as suas expectativas e como se comportam. Talvez se justifique ter menos uma reunião interna semanal e em alternativa dedicar algumas horas ao contacto e à observação dos clientes. Será por decerto uma forma de melhor gerir e de se diferenciar dos concorrentes, demasiado envolvidos em processos internos e presos numa armadilha de processos de decisão onde todos pensam da mesma maneira, provêm dos mesmos estratos sociais, possuem níveis de rendimento equivalentes e por aí adiante.

 

Estas observações são válidas igualmente para que os decisores dediquem algum tempo a perceber os seus trabalhadores e os demais afetados pelas suas opiniões e decisões, incluindo os decisores políticos, no âmbito das suas declarações e das suas medidas que impactam na vida dos cidadãos.

 

Vem isto a propósito de recentes declarações do governador do Banco de Portugal e do ministro das Finanças. Embora reconhecendo que a alta das taxas de juro (Euribor) trará dificuldades às famílias que tenham crédito à habitação, um e outro referiram que a subida dos encargos mensais será previsivelmente mais baixa do que a aquela que ocorreu há uma década, no rescaldo da crise financeira desencadeada pelo colapso das hipotecas subprime nos EUA.

 

Permitam-me discordar. Primeiro, porque a subida das taxas de referência (Euribor) está a ser mais rápida que aquilo que foi antecipado há apenas um mês atrás. Depois, e muito importante, porque o mercado imobiliário residencial português sofre de três efeitos muito específicos.

 

A saber: os preços em Portugal subiram de forma expressiva de 2019 a 2022 (29% de aumento, neste período, quase seis vezes mais que em Espanha); a extrema velocidade com que as prestações de crédito à habitação sobem por efeitos da Euribor (e em Portugal a quase totalidade dos empréstimos à habitação são de taxa variável), em contraste com economias da Europa Central, do Reino Unido ou dos EUA, onde predominam as taxas fixas; e, finalmente, o rácio de endividamento líquido (muito concentrado em crédito à habitação) das famílias portuguesas, em percentagem do seu rendimento líquido é de 126% (sendo de 91% em Itália, 102% na Alemanha ou 106% em Espanha, por exemplo), acima de vários outros países relevantes na UE.

 

Dito de forma muito clara, enfrentamos uma combinação demasiado única e potencialmente tão nociva que os governantes e reguladores terão de tentar fazer mais do que negar publicamente o que aí vem. Até porque desta vez o problema é mais português que espanhol, italiano, francês ou alemão. Esperar passivamente pela solidariedade, ou por soluções europeias, talvez seja descuidado.

 

O senhor ministro e o senhor governador deveriam calçar os sapatos do cidadão comum, quanto antes, para assegurar o menor dano possível às famílias e aos bancos credores.

 

11.11.2022 - Jornal Económico

Escutei, com toda a atenção, a recente entrevista do senhor ministro da Saúde, Manuel Pizarro. Nesta coluna, já aqui destaquei a esperança no seu bom desempenho governativo, matéria mais de cidadania do que de afirmação política.

 

Entre as várias ideias e afirmações do senhor ministro, interessou-me em particular o que disse sobre os medicamentos, nomeadamente que a despesa pública nessa área está a crescer a 10% ao ano, o que não é sustentável. E aludiu, assim o interpretei, a uma potencial concertação negocial por parte da indústria farmacêutica, insensível aos montantes e quantidades que o Estado adquire anos após ano.

 

Também nos subsistemas de saúde se sente a despesa com os medicamentos a subir de forma acelerada e se percebe que o movimento, se continuado, é simplesmente insustentável.

 

Neste espaço, já anteriormente convidei o novo ministro a debruçar-se sobre a prática de certos operadores que cobram margens de 1000% na administração de medicamentos em ambiente hospitalar. Realcei também que é estranho que o Ministério da Saúde se remeta a um silêncio incompreensível sobre isto.

 

Num Estado que regula tanta coisa, é estranho o mutismo, num país onde a oferta estatal é frágil, para ser simpático, na medicina geral e familiar, na estomatologia, na oncologia ou nas cirurgias programadas. E onde as famílias e as empresas privadas pagam, em percentagem das despesas de saúde, mais, muito mais, que nos congéneres europeus.

 

É notório que as farmácias comunitárias estão a registar ruturas de stocks, não só de medicamentos de marca, mas sobretudo de genéricos. E que apesar dos genéricos serem apenas metade do mercado português de medicamentos, há um conjunto de problemas que estão a afetar este mercado em toda a Europa e demais países da OCDE, pelo que importa ter uma visão do conjunto, sem a qual continuaremos a ter falhas importantes de abastecimento nas farmácias.

 

Num contexto de inflação mundial nos mercados de matérias-primas (a título de exemplo, o preço do amido, que chega da Ucrânia e que é utilizado nos genéricos, subiu quase 300% este ano), agravado pela guerra e pelas disrupções das cadeias logísticas com origem na China, não basta dizer que queremos limitar o crescimento da despesa dos medicamentos. É preciso ir mais além.

 

Urge olhar de forma mais estratégica e integrada. Seria importante privilegiar a aquisição de medicamentos fabricados na Europa e em países da OCDE, para que se possa controlar a qualidade e estabilizar a produção através de compras programadas e contratualizadas a prazos mais longos. Acresce que é igualmente preciso regular os preços dos medicamentos em ambiente hospitalar no setor privado. Convém relembrar que quase metade dos portugueses usufruem de subsistemas, seguros ou planos de saúde. E estes portugueses também merecem ser protegidos numa relação onde o desequilíbrio de forças é notório.

 

Só desta forma controlaremos a despesa em medicamentos do Estado, das famílias e evitaremos ruturas indesejáveis nas farmácias.

 

28.10.2022 - Jornal Económico

Foi com pompa e circunstância que o senhor primeiro-ministro anunciou recentemente o “acordo de médio prazo para a melhoria dos rendimentos, dos salários e da competitividade”, alcançado na Comissão Permanente de Concertação Social do Conselho Económico e Social de Portugal continental.
 
Naturalmente que nos regozijamos com a escolha da Concertação Social, e não das ruas ou dos tribunais, como local de afirmação estratégica e prospetiva.
 
Estranhamos que sobre o ano de 2022 e a brutal perda de poder de compra dos trabalhadores e das suas famílias, não tenha existido uma palavra, nem uma medida eficaz de mitigação dos efeitos da inflação.
 
Recordo, porque a memória é sempre importante, que quando o primeiro-ministro José Sócrates, fazendo fé na Comissão Europeia, adotou políticas pró-cíclicas, mais tarde os poderes europeus não demonstraram a devida solidariedade e a República Portuguesa foi obrigada a implorar clemência perante os credores internacionais. Lembro igualmente que os portugueses sentiram, ao longo de três longos anos de resgate uma perda dolorosa de poder de compra. Agora, ao invés de três anos, bastou um ano!
 
A juntar à catástrofe de o ano de 2022 estar a ser particularmente penoso, o propalado acordo vem consubstanciar novas perdas de poder de compra para 2023.
 
Percebe-se mal se as empresas e que empresas vão implementar os aumentos. Parece ser apenas uma mera recomendação.
 
O próprio Estado, numa cegueira estratégica de consequências que se sentirão ao longo de décadas, parece querer desvalorizar os quadros técnicos (médicos, enfermeiros, professores, economistas, juristas, engenheiros, entre outros) ao propor para os mesmos aumentos muito inferiores aos que serão auferidos por funcionários menos qualificados.
 
Como se não bastasse tudo isto, esta Concertação Social é pouco representativa e por essa via cada vez mais frágil. Nela não estão representados alguns dos setores empresariais mais relevantes, como é o caso das imobiliárias, distribuição moderna e tecnologias de informação. Igualmente importante, importa notar que cerca de nove décimos dos trabalhadores não se sentem seguramente representados pela única central sindical que assinou o dito acordo.
 
Por tudo o que acima se refere de forma sucinta, é difícil não deduzir que se trata apenas de um acordo para “inglês ver”, por assim dizer, em que o Estado não dá o exemplo, as empresas a ele não se vincularão certamente, tal como não se vincularam desde já duas das três centrais sindicais existentes em Portugal.
 
Convenhamos que para acordo de médio prazo para a melhoria dos rendimentos, dos salários e da competitividade é curto, muito curto.
 
14.10.2022 - Jornal Económico

Queria começar por referir a expetativa positiva em relação à nova dupla à frente do Ministério da Saúde: Manuel Pizarro e Fernando Araújo. A combinação entre um político experiente e um gestor maduro é, no mínimo, suscetível de criar uma certa esperança de que algo vai mudar. Agrada-me, sobremaneira, a experiência de gestão de Fernando Araújo, no complexo teatro operacional da saúde. É algo de que estamos muito necessitados.

 

Infelizmente, no Serviço Nacional de Saúde (SNS) abundam os gestores de perfil meramente administrativo, sem nunca se terem exposto a outros setores e a outras entidades patronais, que não o SNS e o Estado. É curto, muito curto. O resultado desta endogamia, apesar de sucessivos reforços orçamentais e de quadros, tem vindo a ser uma sangria sem fim à vista.

 

Paulatinamente, os portugueses têm feito a sua escolha, votando com os pés em relação ao SNS. Por isso, atualmente mais de três milhões de portugueses têm um seguro ou um plano de saúde, numa clara demonstração de desconfiança em relação ao estatal SNS. Ou seja, numa década, o mercado de seguros de saúde privados duplicou em Portugal.

 

Mais do que nunca, precisamos de um Estado regulador e com capacidade de ajudar a modelar um verdadeiro sistema nacional de saúde, articulando a resposta social, aguda e de emergência (SNS) com a resposta mutualista, os subsistemas e os prestadores privados capitalistas.

 

Necessitamos igualmente de um reforço da regulação e dos poderes para tal. Intervindo para suprir as falhas de mercado. Legislando no sentido de evitar abusos de posição dominante dos privados. Inibindo a concentração entre operadores e a subida de preços que, a coberto da pandemia e da inflação, vários operadores maximizadores de lucro estão a tentar fazer.

 

E certas práticas de operadores privados gananciosos têm de ser alvo de um travão. Sem ser exaustivo, gostaria de saber qual a opinião dos novos responsáveis sobre a cobrança de kits Covid-19 (máscaras, batas, etc.) a preços especulativos; sobre os preços dos medicamentos administrados em ambiente cirúrgico (de um simples paracetamol aos mais complexos citostáticos); ou até sobre a recente tentativa de fazer subir os preços dos serviços em valores várias vezes superiores à capacidade de financiamento dos subsistemas e dos bolsos das famílias.

 

Os operadores privados ignoram a realidade financeira dos subsistemas. O alegado excedente da ADSE, para citar apenas um exemplo, é um mito, pois nada se diz sobre as provisões que seriam necessárias fazer para que este subsistema, ou qualquer outro, pudesse assegurar no futuro os benefícios de coberturas presentes.

 

De referir ainda que as empresas, na sua grande maioria, por este caminho não conseguirão aguentar os aumentos dos prémios de seguros coletivos de saúde dos seus trabalhadores.

 

Portanto, mais do que despejar o precioso dinheiro dos contribuintes (impostos hoje ou dívida futura) sobre o SNS, importa repensar um verdadeiro serviço nacional de saúde, suscetível de usar de forma integrada os recursos estatais, mutualistas, cooperativos e privados. Urge, por isso, definir campos de atuação e reforçar a interdependência entre os vários operadores. Os portugueses não estão contentes com o SNS, mas existe mais saúde para além do SNS.

 

Regular as subidas de preços privados na saúde (para três milhões de cidadãos) talvez seja tão ou mais necessário que limitar as subidas nos preços das rendas (para um milhão de inquilinos).

 

16.09.2022 - Jornal Económico

O Governo português, só no primeiro semestre, coletou em impostos mais dois mil milhões que o orçamentado. Sinal de que a inflação, com desemprego baixo, é boa para a arrecadação fiscal.

 

Também não se tem passado uma semana sem que tenhamos conhecimento de mais um Governo europeu que toma medidas resolutas para minimizar a carestia de vida que esta inflação está a provocar nos trabalhadores, nos aforradores, nas famílias e nas empresas que não conseguem ter poder de mercado para impor preços mais altos aos seus clientes.

 

Ou que uma associação de defesa dos consumidores venha alertar que, desde o início do ano, o cabaz básico de compras mensais de uma família média portuguesa subiu mais de 200 euros de preço.

 

Ou que todas as empresas distribuidoras e comercializadoras de energia doméstica anunciem aumentos significativos dos preços a cobrar nos próximos meses.

 

Por isso é nosso dever cívico pedir ao Governo que tome medidas para mitigar este processo coletivo de empobrecimento em curso, transversal a todas as famílias e a uma grande parte das micro e pequenas e médias empresas (PME). Devolvendo uma grande parte, uma parte significativa, dos dois mil milhões arrecadados de forma extraordinária, gentileza da inflação.

 

E não precisa de inventar nem de tentar premiar apenas pequenos grupos de cidadãos. O Governo deve ter a ambição de ser geral, porque abrangente e punitiva é a inflação, qual praga do Egito, que não poupa ninguém.

 

Vários outros países europeus têm dado o mote. Sem ser muito exaustivo, foram tomadas medidas temporárias para reduzir o IVA sobre os preços da energia doméstica ou das PME, outras generalizadas a nível de IRS (atualização dos escalões e redução de taxas), na tributação das empresas, nos passes sociais dos transportes coletivos (onde em Portugal um trabalhador ou estudante pode pagar cerca de 30 vezes mais que na Alemanha), entre tantas outras.

 

O que se percebe mal é que os nossos parceiros europeus tenham sido decisivos nesta matéria, ainda durante a primavera, e em Portugal, enquanto a classe média definha, o Estado beneficie os reformados estrangeiros que vivem num país seguro, com belíssimas infraestruturas (pagas pelos nossos impostos e por fundos europeus), e as grandes empresas anunciem resultados sólidos (muitas em valores inéditos nas últimas décadas).

 

Estranha-se que os órgãos intermédios da sociedade civil (igrejas, universidades, associações profissionais, uma certa central sindical) não se indignem contra a chacina da classe média. Como já referi num artigo anterior, esta inflação, com os pífios aumentos salariais nos funcionários públicos e com o cutelo sobre a contratação coletiva), é mais penalizadora que o enorme aumento de impostos do ex-ministro das Finanças Vítor Gaspar.

 

Não importa quase nada, neste contexto, saber das fintas do Enzo, golos do Gonçalo, das azias do Sérgio, dos amuos do Rúben, nem mesmo das trapalhadas ministeriais sobre incêndios e florestas.

 

Queremos ação e devolução dos dois mil milhões de euros!

 

02.09.2022 - Jornal Económico

As notícias sobre o fundo de pensões dos trabalhadores do BCP marcaram os últimos dias. Numa conference call com analistas, o CFO do Banco notou que a subida das taxas de juro criou uma almofada de 684 milhões no fundo de pensões do BCP e, nesse contexto, admitiu a possibilidade de se utilizar essa folga para se melhorar os rácios de capitais do Banco.
 
Assim. Sem mais, nem menos. É lançada para o espaço público uma possibilidade que não foi discutida no local próprio. Qual balão de ensaio de uma ideia, a ver se a coisa passava e ninguém a ela se opunha.
 
Para o situar, caro leitor, talvez se justifique revisitar aqui um passado não muito distante. Durante anos a fio, os impactos no financiamento dos fundos de pensões foi o constrangimento que servia de pretexto para que os aumentos de salários e pensões fossem o mínimo possível, o financiamento dos Serviços de Assistência Médico-Social (SAMS) inadequado e, no caso do BCP, que a idade de reforma fosse adiada, prolongando a vida ativa. Esta foi a realidade das últimas duas décadas.
 
Entretanto, os trabalhadores bancários passaram também eles próprios a contribuir para o fundo de pensões. Ou seja, no atual contexto, os fundos de pensões beneficiam de financiamento oriundo das entidades empregadoras, mas também de contribuições dos próprios trabalhadores.
 
Portanto, o propósito de querer usar o excesso do fundo de pensões (um excesso conjuntural e derivado da subida acentuada das taxas de referência das obrigações), sem antes compensar os trabalhadores, reformados, pensionistas e SAMS por anos de perda de poder de compra, do nosso ponto de vista é imoral e contará com a nossa oposição.
 
Como sempre, debatendo ideias, com elevação, respeitando as opiniões divergentes.
 
Termino com uma breve referência às medidas anti-inflação anunciadas ou previsivelmente em vias de ser anunciadas. A nível empresarial, deu um sinal promissor o Bankinter que, por sua iniciativa, tomou um conjunto de iniciativas para mitigar os impactos da inflação junto dos seus trabalhadores.
 
A nível político, esteve bem o novo líder do PSD ao apresentar cinco propostas, muito meritórias, no âmbito do que designou de Programa de Emergência Social. Esteve bem também o Governo dos Açores com as suas propostas de desagravamento fiscal por via de mexidas no Imposto sobre os Produtos Petrolíferos (ISP), bem como com o previsível aumento da remuneração complementar dos trabalhadores regionais da administração pública, entre outras medidas.
 
Falta agora entrar em cena o Governo. Com a folga financeira de que beneficia, o primeiro-ministro tem margem para apresentar um programa alargado de mitigação da inflação.
 
19.08.2022 - Jornal Económico
 
A ideia de eventualmente se taxar lucros excessivos entrou na discussão política nacional. Trata-se de um tema recorrente na Europa e que, no mínimo, remonta à tentativa de taxar lucros excessivos de certas empresas devido aos efeitos externos da Primeira Guerra Mundial. Tendo surgido nessa altura, o tema reapareceu nas últimas três décadas através da aplicação extraordinária, pontual e limitada, por governos conservadores, trabalhistas e liberais em países como os EUA, Espanha, Reino Unido, Itália, ou a Roménia, para citar apenas alguns exemplos.
 
Em suma, estamos a falar de se tributar lucros caídos qual maná do céu, isto é, que não resultam das ações e decisões das empresas, mas que são o resultado de alterações exógenas de mercado, geralmente associadas à guerra e inflação elevada, e tendo por base de comparação o que era ‘normal’ antes, seja isso feito através de uma meta de retorno de capitais próprios, ou através de uma média dos lucros.
 
Isto dito, do ponto de vista da eficiência económica, estamos perante impostos interessantes, pois que minimizam alterações de comportamento das empresas (existe muito material empírico sobre isto, apesar da desinformação veiculada pelas centrais patronais/empresariais) e são simples de cobrar.
 
A pandemia, a guerra na Ucrânia, as políticas monetárias laxistas dos bancos centrais e a inflação daí derivada, criaram empresas e indivíduos que lucraram anormalmente, amiúde por sacrifício de outras partes da sociedade, nomeadamente as famílias e as empresas utilizadoras intensivas de energia.
 
É relativamente simples de compreender que os setores que beneficiaram pelo facto de termos ficado confinados (como por exemplo as plataformas de conteúdos digitais, os facilitadores de trabalho remoto, os produtores de vacinas e de máscaras, os entregadores de encomendas, o retalho alimentar), ou que beneficiaram da alta dos preços de energia (mormente os produtores e distribuidores), não tiveram especial mérito na obtenção do maná que lhes caiu do céu diretamente para o regaço.
 
Vem tudo isto a propósito dos anúncios de resultados, em alta significativa, por parte dos bancos. À vez, os presidentes executivos dos principais bancos, Paulo Macedo, Miguel Maya, João Oliveira e Costa, António Ramalho e Pedro Castro e Almeida, tentaram desmistificar o tema.
 
De forma resumida, uma boa parte dos lucros dos bancos deriva da anulação de provisões relacionadas com expetativas de imparidades resultantes da pandemia e das moratórias. Moratórias que foram, importa recordar, verdadeiro serviço público, não remunerado, prestado por bancários e bancos. Setor financeiro que, com a bomba-relógio que se previa apocalíptica das moratórias, ainda teve que se confrontar com um Adicional de Solidariedade para suportar os custos da pandemia (de que ele seria o setor potencialmente mais afetado), em complemento à Contribuição Extraordinária (que passou a ordinária, ad aeternum), IRC, não dedução de IVA, contribuições para fundos de resolução, tudo isto numa panóplia ineficiente e moralmente absurda.
 
Como ficou implícito nas declarações dos presidentes executivos dos bancos, a remuneração dos capitais próprios das instituições de crédito, fruto de uma política de taxas diretoras negativas, veio provocar na última década um nível historicamente baixo de retorno de capital. E mesmo o recente aumento da rendibilidade apenas permite tornar o setor mais atrativo nos mercados de capitais que sustentam a sua modernização e expansão.
 
Ou seja, é pura demagogia confundir os lucros anormais de plataformas de motoristas com os lucros ‘normais’ dos bancos. Mas também é pura demagogia que os mesmos bancos, e algumas centrais sindicais, tenham alinhado em atualizações de salários e pensões para 2022 que são dez vezes inferiores ao nível da inflação, numa concertação que deixa os trabalhadores bancários mais pobres e os acionistas mais ricos. Poderemos esperar dos presidentes executivos dos bancos o mesmo nível de preocupação com os seus trabalhadores que têm com a tentativa de se taxarem como anormais os lucros normais da banca?
 
Era esta a questão que a imprensa, os poderes públicos e os cidadãos deveriam ter feito aquando das apresentações de resultados.
 
05.08.2022 - Jornal Económico

Decorreu na semana passada, em Lisboa, uma reunião da Federação Ibérica dos Sindicatos Independentes da Banca e do Setor Financeiro (FISBANCA), com sedes em Lisboa e Madrid, e de qual o SNQTB foi um dos cofundadores e é um dos sindicatos liderantes.

 

Com dois propósitos se fez esta reunião. Por um lado, discutir a admissão de uma nova federação espanhola de sindicatos de quadros da banca. Por outro, debater a situação dos trabalhadores bancários à escala peninsular e formas de obter voz e representatividade em Bruxelas.

 

Vamos por partes. O alargamento da FISBANCA, a ser votado em próxima assembleia-geral, permitirá que tenhamos intervenção à escala micro e macro em vários grandes bancos e caixas (Caixa Bank/BPI, Santander, BBVA, novobanco, Ibercaja, Banca March, Fenacam/Crédito Agrícola Mútuo, Sabadell, Abanca, Caixa Geral, só para citar alguns) com dimensão regional, nacional ou peninsular relevante.

 

É o reconhecimento de que problemas comuns carecem de abordagens combinadas, fruto de experiências e saberes.

 

A FISBANCA corresponde a um movimento de mobilização e concertação a vários níveis. Na negociação das convenções coletivas, na defesa dos postos de trabalho e da assistência médico-social, nos protestos de rua ou na veiculação de ideias junto dos decisores do setor financeiro ou legislativo e executivo. Na elaboração de análises prospetivas que permitam antecipar reconversões de carreiras, pressionar para uma melhor redistribuição de rendimentos a favor do trabalho, tornar a fiscalidade mais amiga de trabalhadores, famílias e consumidores.

 

Isto dito, no âmbito da FISBANCA, procuraremos também sensibilizar os parlamentares europeus, bastante atentos a temas como a transição digital ou energética, para a temática dos processos brutais e massivos de destruição de emprego na banca do Sul da Europa.

 

Claro que isto de sindicatos independentes, profissionais, acutilantes e focados na sua missão única de defender os trabalhadores, e só estes, não agrada a alguns. Cada vez mais minoritários, diga-se. E que por via da sua crescente irrelevância procuram perpetuar alguma influência através de medidas legislativas que iludem a representatividade laboral que há muito perderam. Por isso se querem perto do poder, na esperança de que algum maná lhes caia no regaço, verdadeiro substituto do trabalho que há muito deixarem de fazer.

 

22.07.2022 - Jornal Económico

É oficial. A inflação portuguesa atingiu o nível mais alto em quase 30 anos e superou a média da União Europeia.
 
Escuso de relembrar os dirigentes monetários que diziam que a inflação seria coisa passageira ou de pouca monta. Ou alguns governantes que prometeram que em 2023 é que a reposição dos rendimentos das famílias se faria. Uma promessa vã, está bem de ver. Ou os dirigentes sindicais que sem luta ou contestação assinaram acordos minorantes querendo condicionar os sindicatos independentes e tomando os trabalhadores por néscios.
 
Importa exigir o fim de promessas vãs e de tergiversações. E concentrar a nossa atenção naquilo que pode ser feito pelos nossos governantes para que trabalhadores, reformados, aforradores e famílias não se vejam brutal e definitivamente empobrecidos.
 
Claro que isto requer um governo concentrado na gestão interna e menos preocupado com os areópagos europeus. A saber:
 
Actualização dos escalões de incidências das taxas e das deduções à coleta e ao rendimento do IRS de acordo com as projeções realistas de inflação (algo em torno de 6%), incluindo uma subida do valor isento de tributação em igual percentagem. Refletindo o acréscimo de despesas de alimentação, transporte, educação, habitação, aquecimento, saúde.
 
Introdução de um verdadeiro coeficiente familiar desde o primeiro filho e até à idade adulta (ou enquanto durassem os estudos superiores e coabitassem com os progenitores).
 
Redução de um ponto percentual da taxa de IRS para todos os escalões de rendimento.
 
Alargamento do passe social de transportes coletivos a todas as regiões do país (e não apenas para as grandes regiões metropolitanos do litoral), com um custo trimestral igual ao alemão: nove euros.
 
Redução de cinco pontos percentuais no imposto sobre produtos petrolíferos. Aqui, copiando os casos espanhol, alemão, britânico.
Fim da caducidade das convenções coletivas e necessidade de fundamentação e arbitragem em caso de denúncia unilateral ou falta de acordo sobre as actualizações de salários e demais prestações de expressão pecuniária. Aqui valorizando os trabalhadores.
 
Limites aos aumentos de preços aos consumidores domésticos de energia (compensando os prestadores, se for caso disso), com aumentos nunca superiores a 4%, tal como fez a França.
Finalmente, um apoio extraordinário a todas as famílias, em moldes similares ao feito na Alemanha, para mitigar os efeitos inflacionistas: 300 euros para cada contribuinte; com 100 euros adicionais por cada criança e 100 euros extra para cada beneficiário de subsídio de desemprego ou rendimento social de inserção ou similar.
 
Menos conversa, mais governação, é o que se requer. Ou arriscamo-nos, num singelo ano, a empobrecer tanto quando durante os anos de assistência condicionada pela troika.
 
08.07.2022 - Jornal Económico
Tenho acompanhado as notícias sobre as dificuldades sentidas pelo Serviço Nacional de Saúde (SNS) com tristeza, irritação e estupefação. Tristeza porque a inércia e a ausência de reformas que caracterizou os últimos anos era por demais evidente. Em virtude disso, era uma questão de tempo até que ocorresse uma tempestade perfeita que aliasse os problemas crónicos de gestão, a falta de recursos humanos e as recorrentes limitações financeiras. Irritação porque sou um acérrimo defensor do SNS.
 
Custa-me ver uma das maiores construções da nossa democracia sofrer danos reputacionais e operacionais que apenas beneficiam interesses particulares. E estupefação perante a ligeireza com que os problemas estruturais que afetam o SNS são tratados superficialmente no espaço público e na arena política.
 
O que se está a passar no SNS é um desastre presente e futuro, com impactos óbvios e outros nem tanto. Naturalmente, os mais pobres e por consequência os mais desprotegidos, sem alternativas ao seu alcance, não têm qualquer outra hipótese. O SNS é a única opção ao seu dispor. Se o Estado não investe e não reforma o sistema de saúde, são eles quem está na linha da frente a sofrer as consequências da inércia política e governamental. É lamentável que assim seja, numa sociedade que se quer solidária e que tem orgulho em o afirmar.
 
Quem tem um seguro ou um subsistema de saúde está mais protegido. Perante as dificuldades sentidas pelo SNS pode sempre recorrer a outros prestadores de cuidados de saúde, sejam eles privados ou do setor social, não lucrativo. Porém, a ausência de reformas e de investimento pelo Estado no SNS também tem impactos para quem tem seguros. Afinal, o seu acréscimo de consumo repercute-se nos prémios futuros das apólices ou no seu grau de cobertura. Não há almoços grátis.
 
O mesmo se passa com os subsistemas de saúde. Estes são complementares e não substitutivos do SNS. Contudo, se os beneficiários os utilizarem cada vez mais numa lógica substitutiva, tal gera impactos financeiros que, em teoria, impõem uma de duas soluções.
 
A primeira é a entidade financiadora aumentar o seu esforço de financiamento. Na Banca, por exemplo, as instituições de crédito não têm reforçado o seu financiamento para fazer face aos aumentos nos preços praticados nos atos médicos, ou ao acréscimo de consumo. A segunda opção, na ausência de viabilidade da primeira e perante a pressão financeira do consumo acrescido, passa por ser menos generoso no perímetro de comparticipação. É uma tendência que, infelizmente, por mais ganhos de eficiência que se procurem alcançar, não pode ser posta de parte.
 
Portanto, o que se passa com o SNS interessa diretamente a todos os portugueses. Aos que não têm alternativas, em primeiro lugar e de forma mais óbvia, mas também aos portugueses que ao SNS recorrem com menos frequência.
 
Regresso, por isso, ao início. O que está a ocorrer é uma catástrofe, e o bem comum impõe que se reforme e se invista no SNS. Existindo, estou certo (digo-o sem qualquer ironia), um consenso nacional sobre esta necessidade, o que o impede, afinal?
 

24.06.2022 - Jornal Económico

Quero começar por felicitar a Ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Dra. Ana Mendes Godinho. Aprecio a forma como exerce o seu ministério. Vale isto a propósito da muito falada Agenda do Trabalho Digno, apresentada e aprovada em Conselho de Ministros, que desejo que passe para letra de lei antes de decorrido o ano civil.

 

Grosso modo, daquilo que nos é dado a conhecer, corresponde ao que tinha sido apresentado pelo anterior Governo, nas vésperas do Orçamento de Estado que viria a ser chumbado.

 

Alguns, ditos parceiros sociais, lamentam que o documento não tenha sido discutido em sede de Comissão Permanente de Concertação Social (Conselho Económico e Social). Talvez a senhora Ministra tenha relevado na curiosa composição dessa mesma Comissão Permanente, anquilosada e possivelmente não representativa da nova realidade do mundo do trabalho, tão evidente que é a ausência de sindicatos independentes e de representantes de empresas de áreas como as tecnologias de informação e comunicação, construção civil e obras públicas, entre outras. Terá achado, porventura, que mais representativa será a Assembleia da República, coisa que bem compreendemos, pelo motivo que aduzimos.

 

Isto dito, importa salientar e valorizar aquilo que de mais positivo o documento parece indiciar: um esforço concertado e persistente na redução da precariedade laboral. Elenco, ainda, medidas como o reforço dos poderes da Autoridade para as Condições do Trabalho; a presunção de contrato de trabalho para os trabalhadores das plataformas; o alargamento da compensação para 24 dias por ano em caso de cessação do contrato a termo certo ou incerto; impedir a subcontratação externa (outsourcing) para postos de trabalho que tenham sido alvo de despedimento coletivo e extinção de posto de trabalho; o reforço das garantias da licença parental exclusiva do pai, não dependente da elegibilidade da mãe; o reforço da arbitragem para a prevenção de vazios de cobertura na negociação coletiva; a reposição dos valores de pagamento de horas extraordinárias. Entre tantas outras, de cariz muito positivo, gradualistas, moderadas e suscetíveis de caminharmos para um trabalho mais digno.

 

Bravo, senhora Ministra!

 

Contudo, para reforçar a fatia dos salários e pensões no rendimento nacional, coisa tantas vezes anunciada pelo Governo, mas cuja realização estrutural tarda em se realizar, arrastando a classe média para um empobrecimento paulatino, agora menos silencioso pela alta da inflação, sugiro à senhora Ministra um conjunto de medidas adicionais: aumento de salários e pensões da Função Pública, em 2022, em linha com a inflação esperada (é de elementar justiça e sinaliza uma orientação para a iniciativa privada); reposição integral do princípio do tratamento mais favorável enquanto valor orientador do Direito do Trabalho; eliminação do dever de devolução da indemnização pelo trabalhador que pretenda impugnar judicialmente o despedimento coletivo ou por extinção do posto de trabalho; aumento do valor isento de IRS nas indemnizações por acordo mútuo de cessação do contrato de trabalho; e, finalmente, reforçar a Conciliação e a Mediação enquanto meios independentes de resolução de conflitos na negociação coletiva (as quais não devem ser alvo de suspeita de poderem ser caixas de ressonância da política de rendimentos de entidades patronais ou do governo).

 

Importa também que, para além da independência, a ACT, os Juízos de Trabalho e a DGERT tenham os meios para exercerem os seus deveres.

 

Como pode ver, senhora Ministra, com exceção do aumento dos salários da Função Pública, nenhuma destas medidas custa dinheiro ao Estado. Mas elas, em conjunto, permitirão que a Agenda do Trabalho Digno concretize o seu potencial e não fique a meio daquilo que deveria e poderia ser!

 

09.06.2022 - Jornal Económico

As previsões económicas têm vindo a rever em alta as projeções para o crescimento em 2022, com mais produto, mais exportações de bens e serviços, mormente o turismo. Também têm sido muitos os observadores que têm apontado ao que esta combinação de maior crescimento, lucros corporativos em alta, inflação persistente e disrupções nas cadeias de abastecimento global está a provocar: o empobrecimento célere da classe média trabalhadora e dos reformados.

 

Houve quem se tenha apressado a fechar negociações, em sede de contratação coletiva, das tabelas e cláusulas de expressão pecuniária. Um absurdo, tendo em conta que estamos perante um ano carregado de incertezas, nomeadamente sobre evolução dos preços. Uma precipitação que ocorreu em vários setores, infelizmente.

 

O caso da banca é paradigmático.

 

Mesmo antes de a guerra na Ucrânia ser uma realidade, dissemos que a subida das taxas de juros, que se estava a antecipar nos mercados secundários de dívida, levaria os bancos centrais a subir as taxas diretoras. Taxas positivas, de nível moderado, fazem funcionar a função de receitas dos bancos oriundas dos depósitos.

 

Adivinhava-se, por isso, o fim da anormalidade histórica de taxas de juros negativas. E era antecipável que os próximos trimestres seriam de sólidos desempenhos económicos na banca a operar em Portugal.

 

Confirmou-se.

 

As centrais sindicais (USI, UGT e CGTP), por unanimidade, têm pedido aumentos intercalares ou revisão dos acordos entretanto assinados. Todas o pediram para a função pública, cientes do seu efeito de arrastamento para a negociação privada.

 

Muitos dirigentes sindicais e economistas chamaram a atenção para o imposto inflacionista subjacente à não atualização dos escalões do IRS, pelo menos ao nível da inflação estimado pelo Governo, aquando da apresentação do Orçamento do Estado.

 

Sabemos que na maior parte dos casos não será exequível exigir a uma só parte que pague o imposto inflacionista. Não poderão ser só os trabalhadores nem apenas as empresas. O Estado, como aliás fez recentemente a propósito dos combustíveis, tem também que dar o exemplo.

 

Mas todos terão que fazer a sua parte. Do nosso lado, queremos valores de atualização das tabelas e demais cláusulas de expressão pecuniária que estejam em linha com a capacidade, com os níveis de produtividade e rendibilidade das empresas. É sabido que o fundamentámos assim, como aliás o fazemos todos os anos.

 

O Governo tem que liderar pelo exemplo, mexendo nos escalões do IRS e desagravando alguns impostos sobre certos bens. As empresas e os setores que tiverem condições para tal deverão proceder a um aumento intercalar, extraordinário, dos salários (e no caso dos fundos de pensões estabelecidos por contratação coletiva, das pensões dos reformados).

 

O imobilismo de muitos setores empresariais, a sua aversão a partilhar com os seus trabalhadores, em breve vai gerar um impulso de redistribuição por decreto. É uma inevitabilidade que os lucros extraordinários, nomeadamente na banca, turismo, energia, gerados por uma situação económica anormal, sejam taxados. Importa lembrar, porventura que foi com um governo conservador, de Margaret Thatcher, que os lucros extraordinários do setor financeiro foram taxados. E que toda a Europa tem vindo a taxar os lucros das empresas do setor da energia.

 

Muitas empresas podem, desde já, fazer um aumento intercalar. Uma sociedade justa exige uma repartição equilibrada. É mais sensato redistribuir já do que esperar pela inevitável taxação que resultará do clamor popular, se nada for feito de forma voluntária.

 

27.05.2022 - Jornal Económico 

Um jornal de referência publicou recentemente um artigo sobre a remuneração média dos tenistas profissionais comparativamente aos atletas de hóquei no gelo norte-americano. Federer, Nadal, Djokovic, McEnroe, Borg, Laver, Sampras, Lendl, para citar apenas os mais notórios das últimas décadas, foram desportistas com reconhecimento global, figuras e embaixadores de marcas. Eles próprios foram marcas globais de um desporto símbolo de elegância, classe e beleza.

 

No espectro oposto, com a exceção dos cidadãos dos EUA e do Canadá, poucos conhecem o hóquei no gelo, o jogo ou os seus praticantes. Contrariamente ao ténis, o hóquei no gelo não é um desporto com audiências globais e decerto que os seus praticantes mais eméritos não são marcas globais nem embaixadores de marcas aspiracionais ou de luxo.

 

Tomando como referência o jogador situado na posição do ranking 200, em cada um dos desportos, no ténis os rendimentos dão apenas para um profissionalismo pouco acima do nível de sobrevivência enquanto no hóquei os ganhos são cerca de dez vezes superiores!

 

Como é possível que um desporto global, como o ténis, tenha os seus praticantes (com exceção de um punhado dos jogadores de topo) com dificuldades em estabelecer uma profissão estável e o outro, hóquei no gelo, menos mediático, consiga dar em meia dúzia de anos de profissão os rendimentos de toda uma vida de um trabalhar médio?

 

Os tenistas não têm sindicatos. Os hoquistas têm. Simples.

 

Na concertação social, com os representantes das ligas profissionais, os tenistas não conseguem uma divisão equitativa dos resultados obtidos pela indústria. Cruel resultado. Mas o individualismo, a anomia social e a falta de liderança dos tenistas a isto os conduziu, minando as bases de desenvolvimento futuro do ténis.

 

Isto para nos relembrar a todos da importância dos sindicatos e da concertação social. E como em Portugal, em 2022, temos desafios imensos que advêm do imposto inflacionista e da perda de rendimentos que ela causa nos trabalhadores, reformados, pensionistas e aforradores.

 

É dever de todos, sindicatos, empresas e Governo, encontrar mecanismos que mitiguem a perda de poder de compra dos rendimentos do trabalho. Compete ao Governo usar com critério o seu poder de aligeirar a carga fiscal sobre o trabalho (nomeadamente atualizando os escalões de IRS para os valores de inflação esperada) e praticar uma atualização intercalar dos vencimentos da função pública, usando para isso o seu magistério de influência de modo que o mesmo aconteça no setor privado.

 

As empresas, especialmente dos setores que ganham com a nova realidade monetária e geoestratégica, talvez aquelas que o novo ministro da Economia aludiu a propósito de um imposto sobre ganhos extraordinários, terão que atualizar os salários e demais cláusulas de expressão pecuniária.

 

Mas não chega. Compete à concertação social, no seio das empresas, dos setores profissionais ou em fóruns regionais e nacionais, discutir e implementar medidas que estimulem a poupança privada para a reforma dos trabalhadores e das empresas em prol destes. Estimulando os pilares complementares na construção de reformas dignas. Adicionalmente, vai sendo tempo de a concertação social estabelecer mecanismos de distribuição de lucros pelos quadros e trabalhadores.

 

Porque nós acreditamos que o estudo, o trabalho, a determinação, a ambição de querer fazer bem o trabalho de cada qual são pilares do mérito e da meritocracia. E por isso a distribuição de lucros, como instrumento de motivação, terá que ter um equilíbrio diferente entre quadros e trabalhadores, equipas de administração e acionistas. E nesta área também a concertação social terá um papel relevante a desempenhar.

 

13.05.2022 - Jornal Económico

Muito possivelmente, o feriado do 1º de maio é a única data consensualmente celebrada e comum a todos os Estados, independentemente da sua forma de organização do poder político. Nas repúblicas ou monarquias, democracias liberais ou regimes autoritários, Estados capitalistas ou comunistas, em todos o Dia do Trabalhador é formalmente assinalado com pompa e circunstância.

 

Infelizmente, nos últimos dois anos, a coberto do combate à pandemia, como se a distribuição assimétrica dos rendimentos existente não fosse já suficiente perniciosa, assistimos a um acentuar das desigualdades em desfavor do fator trabalho. A este propósito, refira-se, não é preciso ser marxista, o que não sou, ou influenciado pelas teses de Karl Marx, para constatar o óbvio ululante e que, aliás, está bem documentado por reputadas instituições internacionais. As desigualdades continuam a agravar-se um pouco por todo o mundo.

 

Desigualdades que não parecem preocupar por aí além o senhor primeiro-ministro, António Costa. O Orçamento do Estado (OE), na sua versão deste mês, parece ser estranhamente similar às versões do ciclo do senhor ex-ministro das Finanças, Mário Centeno. Sem que os portugueses se apercebam, o OE vem consolidar um enorme aumento de impostos sobre as famílias, através de não atualização das tabelas dos escalões de IRS, da inflação e de um aumento mínimo para os funcionários públicos. Na prática, os trabalhadores dos setores público e privado estão a ser sacrificados em benefício das remunerações de acionistas (e do capital) e do combate ao défice.

 

Ora, num contexto político, económico e social de maioria absoluta, hoje mais do que nunca, o movimento sindical não se pode abster de ter uma função assertiva e combativa. Dito por outras palavras, um papel não constrangido por lealdades e prioridades exteriores aos interesses dos trabalhadores.

 

Permitam-me, aliás, que a partir daqui enderece uma especial saudação aos sindicatos sem quaisquer obediências ou filiações, aqueles que são verdadeiramente independentes e sem amarras, e por isso não alinhados com estratégias de poder partidário. Alguns deles integram a União dos Sindicatos Independentes (USI), confederação sindical constituída em 2000, a que tenho o orgulho e a honra de presidir.

 

Estou absolutamente convicto que a independência dos sindicatos é uma condição absolutamente crucial para lutar contra o empobrecimento de trabalhadores e reformados. Porque os sindicatos independentes são consistentes na sua doutrina e prática, focados apenas e só nos interesses dos trabalhadores que representam (e que, por isso, não assinam acordos minorantes para os trabalhadores).

 

Ainda se justifica a comemoração do 1º de maio?

 

Claro que sim. Os desafios mudam, assumem novas roupagens e formatos aparentemente diferentes (teletrabalho, plataformas digitais, etc.), mas no essencial o tempo não muda o seu objeto: a defesa, sempre difícil e desafiante, do desprotegido fator trabalho. Sem outras lealdades que não seja perante os trabalhadores que os sindicatos têm o privilégio e a honra de representar.

 

Viva o 1º de maio!

 

29.04.2022 - Jornal Económico

Já todos percebemos que o ano em curso, do ponto de vista sindical, vai ser muito difícil.

 

Em primeiro lugar porque o contexto europeu não ajuda. Depois de dois anos de enorme instabilidade provocada pela pandemia, com os inevitáveis impactos económicos e financeiros no Estado e nas empresas, está agora em curso maior crise de segurança na Europa desde a Segunda Guerra Mundial. Os indicadores de desempenho das economias europeias, como não poderia deixar de ser, têm vindo a refletir esta adversidade global.

 

No plano interno, por sua vez, a maioria absoluta obtida por António Costa foi em simultâneo uma bênção e uma maldição. O líder do PS libertou-se da sua dependência parlamentar relativamente ao PCP e ao BE, mas por sua vez estas forças políticas, com especial destaque para a primeira, reconquistaram também elas a sua autonomia estratégica.

 

É por isso previsível que, em linha com o seu tradicional posicionamento ideológico e político, algumas forças sindicais optem por endurecer os seus protestos, regressando à mobilização de rua que tão ausente esteve na anterior legislatura.

 

Reação pavloviana, dirão alguns, com o devido respeito. Mas o que dizer de certas confederações patronais cujo comportamento mimético é igualmente previsível, tendo sempre por ponto de partida a rejeição de aumentos salariais e a mão estendida perante o Estado? Pela mesma bitola, não é também pavloviano?

 

O sindicalismo precisa de se reinventar, frisam por vezes alguns observadores. Certo. E as confederações patronais, não? Em que empresa portuguesa se encontra, tal como acontece na Alemanha, um representante sindical na sua administração? Que empresas portuguesas têm aumentos salariais indexados aos ganhos de produtividade, à inflação e, em última instância, aos seus resultados anuais?

 

Os nossos gestores ‘modernos’, na verdade, têm uma visão muito antiquada, e que passa por maximizar o valor do acionista e alocar o mínimo valor possível aos custos de mão-de-obra. E por isso, claro, recebem prémios chorudos.

 

Há um outro caminho?

 

Claro que sim. Pela parte que me toca, posso falar do lado sindical. Um caminho que passa por salvaguardar apenas e só os direitos dos trabalhadores, sem dependências partidárias ou outras obediências. Esse é o caminho da USI – União dos Sindicatos Independentes, que lidero, a única confederação sindical autónoma e independente em Portugal.

 

Na USI rejeitamos a pretensão hegemónica das outras centrais sindicais de dividirem entre si a representação dos trabalhadores. Estamos do lado certo da história, como os factos demonstram. Atualmente, há cada vez mais sindicatos independentes, o que seguramente atemoriza alguns. A nós, o sindicalismo independente não nos assusta nada. É o nosso espaço natural.

 

E num ano tão exigente como este, ninguém melhor do que uma estrutura sindical independente para defender apenas e só os direitos dos trabalhadores. Cá estaremos para isso.

 

14.04.2022 - Jornal Económico

O intervalo no curso da História que se abriu em 1989/1991 terminou com estrondo neste primeiro trimestre de 2022 com a invasão russa do território soberano da Ucrânia. Ainda é cedo para saber os contornos concretos que emergirão desta gravíssima crise europeia, mas ainda assim é evidente que, do ponto de vista estratégico, a Federação Russa será a grande perdedora de uma “guerra de escolha” que desencadeou com base num evidente erro de avaliação.

 

De facto, a elite russa nunca esperou uma resposta política tão enérgica contra si e com sanções financeiras tão duras. Olhando para o passado, a regime oligárquico russo pensou que os seus bens parqueados nos EUA, no Reino Unido e na Europa, em geral, estavam a salvo. (A este propósito, recomendo, se me é permitido, a leitura dos mais recentes livros de Casey Michel e Oliver Bullough sobre a penetração dos interesses da cleptocracia russa nos EUA e Reino Unido.)

 

Porém, a reação Ocidental, em parte determinada pela mobilização das opiniões públicas, ultrapassou todas as expectativas, levando a um isolamento russo ao qual nem a China poderá valer de forma eficaz.

 

Confrontado com o falhanço evidente, resta a Vladimir Putin encontrar no terreno, e do ponto de vista militar, as condições que lhe permitam, política e diplomaticamente, sair do buraco em que se colocou. Em todo o caso, independentemente do acordo a encontrar, é por demais evidente que o resultado final será desastroso para os interesses russos.

 

Como nota o professor Michael Beckley, num ensaio publicado na revista “Foreign Affairs”, não há nada como um inimigo comum e um sentimento agudo de ameaça para consolidar uma ordem internacional. À China se pode agradecer, numa primeira instância, o contributo para forjar uma nova ordem internacional. À Rússia, acrescento, devemos agradecer também o impulso para enquadrar esta disputa em termos de uma rivalidade sistémica entre regimes democráticos e autocráticos.

 

Não haja ilusões. Esta competição terá enormes custos de curto prazo, nomeadamente no âmbito da defesa ou da reformulação da globalização tal como a